GOTAS DE REFLEXÃO - EVANGELHO DOMINICAL
Ambientação:
Sejam bem-vindos amados irmãos e irmãs! O tema da "convocação" e da "reunião" universais percorre a Escritura em todos os seus livros e define a experiência tanto de Israel como da Igreja. O povo eleito percebe a unidade como a de uma reunião continuamente provocada pela convocação de Javé. O quadro dessas reuniões é quase sempre cultural e sacrifical e se reporta à grande reunião na qual se concluiu a aliança, e preludia a reunião escatológica universal. Quando os profetas evocam o futuro messiânico, apelam para o tema da assembléia em que Javé reunirá não só as doze tribos de Israel, mas todas as nações da terra. A Igreja é a Assembléia de todas as Nações, pois o desígnio de reunião de todas as nações se realiza em Cristo. A reunião universal se fará em torno do Cristo Crucificado, que ressuscita dos mortos. Entoemos cânticos jubilosos ao Senhor!
(coloque o cursor sobre os textos em azul abaixo para ler o trecho da Bíblia)
PRIMEIRA LEITURA (Is 25,6-10): - "Este é o nosso Deus, esperamos nele, até que nos salvou; este é o Senhor, nele temos confiado: vamos alegrar-nos e exultar por nos ter salvo"
SALMO RESPONSORIAL 22(23): - "Na casa do Senhor habitarei, eternamente."
SEGUNDA LEITURA (Fl 4,12-14.19-20): - "O meu Deus proverá esplendidamente com sua riqueza a todas as vossas necessidades, em Cristo Jesus. Ao nosso Deus e Pai, a glória pelos séculos dos séculos. Amém."
EVANGELHO (Mt 22,1-14): - "Por que muitos são chamados, e poucos são escolhidos"
Homilia do Diácono José da Cruz – 28º Domingo do Tempo Comum – Ano A
"A hora da Festa..."
Quem é que tem coragem de recusar a um convite para uma festança, feito por uma pessoa muito especial? O churrasco já está no ponto, o chope geladinho e esperando para ser bombado para o copo, a comida especial, regada a iguarias já está nas panelas, cheirando a gostoso, a um canto uma mesinha com aquelas batidas deliciosas, e ainda mais, uma banda musical de primeira já está no palco, a espera da platéia... e como se não bastasse tudo isso, lá pelas tantas vai rolar um bailão que promete varar noite a dentro, e de madrugada será servido um café colonial. "Se perder uma festa assim, vou chorar três dias sem parar" dizia um amigo, naqueles tempos em que a gente dava uma de penetra... e depois se mandava de fininho na hora que a bendita gravata do noivo vinha vindo...
Deus preparou algo de maravilhoso para o ser humano, algo que os olhos jamais contemplaram como nos diz o apóstolo Paulo, nada há neste mundo que possa corresponder à beleza dessa vida plena em Deus. E tudo começou com a encarnação de Jesus Cristo a festança já começou aí... e teve alguns que não entenderam. E olhe que Deus não guardou segredo da surpresa que queria fazer á humanidade, desde o tempo mais antigo já vinha anunciando, dando sinais de que esse tempo chegaria. Os convidados especiais reagiram da pior maneira possível, porque tem mais essa ainda, no começo a Festa não era para todos, só para os privilegiados de Israel, eles foram os primeiros a quem Deus manifestou o seu amor, isso é inegável!
Mas quem diria, no tempo das promessas até que acreditaram, apesar dos percalços, mas quando chegou o tempo da feliz realização, quando a festa iria começar prá valer, uns foram trabalhar no campo, outros foram negociar, e outros mais estressados agrediram os servos e os mataram... E quem pensou que o Dono da Festa ia cancelar tudo, se enganou, se os "bacanas" e os "bonitões" não deram a mínima, o Senhor mandou abrir os portões da sua casa e convidou a todos os que estavam parados pelas esquinas, o convite continua sendo especial, mas agora, basta que o convidado aceite: "Por favor, venham na minha casa comer, beber, dançar, ouvir músicas e se divertir até o amanhecer, tem muita comida e bebida, quero que todos participem da minha alegria, pois meu Filho celebra suas núpcias...
Bom, os novos convidados atenderam rapidinho esse convite tão bom, parecia aquelas liquidação das grandes lojas, o povão invadiu mesmo, e a sala do banquete ficou lotada. Até aqui tudo bem, mas daí no versículo final parece que baixou o mau humor no Patrão, ele flagrou um sujeito que não estava vestido com a veste nupcial, e não só botou o cara prá correr como ainda mandou amarrar o coitado e jogá-lo lá fora na escuridão....E o evangelho conclui, "muitos são os chamados, mas poucos os escolhidos"
Que negócio é esse? Se o coitado foi convidado em uma esquina, claro que estava vestido meio de qualquer jeito, ninguém falou que os convidados tinham de vestir alguma roupa especial... E parece que o evangelho termina sem graça... Com um final não muito feliz, pelo menos para o sujeito que não estava com a roupa adequada...
Bom; aqui vamos esquecer-nos do sentido literal do texto e da história da Festa, isso é só um modo das comunidades de Mateus refletirem que em Jesus Cristo, Deus chama a todos os homens, sem nenhuma distinção, para virem participar com ele, de uma vida em comunhão, que já começa nessa vida, e que um dia chegará a sua plenitude...Tentar viver uma forma de Cristianismo. que não tenha a Jesus Cristo e seu evangelho, como referência de vida, é dar uma de "bicão" nessa Festa, São Paulo em sua teologia Batismal, chama isso de "REVESTIR-SE do homem novo, revestir-se de Cristo, e sem essa roupa nova que nos transforma em outro Cristo, e que nos configura totalmente a ele, seu jeito de pensar e seu modo de agir, seremos sempre "Penetras" no Reino, e corremos o risco de ficar de fora, justo no melhor da Festa...
José da Cruz é Diácono da
Paróquia Nossa
Senhora Consolata – Votorantim – SP
E-mail jotacruz3051@gmail.com
Homilia do Padre Françoá Rodrigues Costa – 28º Domingo do Tempo Comum – Ano A
“O banquete do Cordeiro”
Ultimamente tenho indicado muito um livro de Scott Hahn, “O Banquete do Cordeiro – a Missa por um convertido” (Loyola, 2002), no qual o autor explica de maneira bastante envolvente vários aspectos do mistério da santa missa desde uma perspectiva apocalíptica. O livro é muito interessante e descortina várias realidades veladas aos nossos olhos acostumados a ver somente o que se nos mostra patentemente. Entre outras coisas, afirma o autor logo na “introdução”: “insisto que vamos realmente ao céu quando vamos à missa, e isso é verdade a respeito de toda missa de que participamos, independentemente da qualidade da música ou do fervor da homilia. Não é questão de aprender a “ver o lado brilhante” de liturgias desleixadas. Não se trata de adotar uma atitude mais caridosa para com vocalistas desafinados. Trata-se de algo que é objetivamente verdade, algo tão real quando o coração que bate dentro de você. A missa – e quero dizer toda missa – é o céu na terra”.
“Dizei aos convidados que já está preparado o meu banquete (…). Vinde às bodas!” (Mt 22,4). Jesus deixou-nos esse prodígio de amor, que é a eucaristia, para que participemos de suas alegrias eternas. Ele instituiu o sacramento do seu corpo e do seu sangue no contexto de uma ceia e se deu em alimento para que nós, fortalecidos, pudéssemos chegar à glória celestial. Mas a eucaristia não é somente um banquete, nem é um simples banquete. Trata-se de um banquete sacrificial. O Catecismo da Igreja Católica faz essa conexão – eucaristia-ceia – já que o Novo Testamento também o faz: “Jesus expressou de modo supremo a oferta livre de si mesmo na refeição que tomou com os Doze Apóstolos na “noite em que foi entregue” (1 Cor 11,23). Na véspera de sua Paixão, quando ainda estava em liberdade, Jesus fez desta Última Ceia com seus apóstolos o memorial de sua oferta voluntária ao Pai, pela salvação dos homens: “Isto é o meu corpo que é dado por vós” (Lc 22,19). “Isto é o meu sangue, o sangue da Aliança, que é derramado por muitos para remissão dos pecados” (Mt 26,28)” (Cat. 610).
Fomos convidados para participar do banquete nupcial do Cordeiro. Quem é esse Cordeiro com letra maiúscula? Explica-nos o evangelista João: “Eu vi no meio do trono, dos quatro Animais e no meio dos Anciãos um Cordeiro de pé, como que imolado” (Ap 5,6). Tinha-se anunciado que o Leão abriria o livro selado (cfr. Ap 5,5), mas aparece um Cordeiro que, efetivamente, pode abrir os sete selos (cfr. Ap 6,1). Aparente contradição! O que tem a ver um leão com um cordeiro? Jesus tem a fortaleza de um leão e a mansidão de um cordeiro. O Cordeiro de Deus, Jesus, aparece “de pé, como que imolado”. Outra aparente contradição! Quem está de pé não está imolado, que está imolado não está de pé; mas, explica-nos a Bíblia de Jerusalém, trata-se do “cordeiro que foi imolado para a salvação do povo eleito (cf. Jo 1,29+; Is 53,7). Ele traz as marcas de seu suplício, mas está de pé, triunfante (cf. At 7,55), vencedor da morte (1,18) e por esta razão (…) senhor de toda a humanidade” (Bíblia de Jerusalém, Ap 5,6, nota z).
O sacrifício do Cordeiro foi oferecido ao Pai, mas também foi oferecido a nós. Pelo poder desse Cordeiro salvador, Jesus, e pela ação do Espírito Santo, atualiza-se em cada missa o mistério da sua Páscoa. Em cada missa nos encontramos com o mistério do Cristo morto e ressuscitado, e, ao encontrar-nos com esses fatos diante de nós, somos transportados à eternidade. Explico-me: o sacrifício de Cristo oferecido ao Pai foi aceito eternamente pelo Pai que o tem sempre diante dos seus olhos. Pois bem, esse mesmo sacrifício que o Pai tem diante de si se nos torna presente em cada santa missa: o céu desce à terra e a terra entra em contato com o céu. Mais ainda, para que a nossa participação seja mais intensa, Deus ofereceu-se em comida, isto é, Jesus na comunhão nos faz participar do banquete que ele mesmo preparou para nós.
Que triste seria se desprezássemos tanto amor de Deus! Como eu participo da santa missa? Desejo, de verdade, que chegue o momento de participar da próxima missa? Procuro ir bem preparado para participar do banquete que o Senhor fez para mim, para a minha salvação e para o fortalecimento do meu apostolado? Encontro na santa missa o centro da minha vida espiritual?
Pe. Françoá Rodrigues Figueiredo Costa
Publicação Especial - Dogmática / Doutrina
(Extraído do site Presbíteros)
O mistério da Igreja, esta jovem de 2000 anos
Pe. Françoá R. F. Costa - Sacerdote secular da Diocese de Anápolis
Os Padres da Igreja gostavam de comparar a Igreja à lua, pois assim como a lua recebe toda a sua luz do sol, assim também a Igreja recebe toda a sua luz de Cristo[1]. Meditar sobre o Mistério da Igreja é também meditar sobre o que somos enquanto cristãos, somos Igreja.
O sol que ilumina a Igreja, Cristo, é também quem mantém a sua jovialidade. A Igreja não envelhece, ela passa por fases que a levam ao amadurecimento no curso da história. Contudo, a vitalidade essencial que lhe vem do Pai em Cristo pelo Espírito Santo é sempre a mesma, a de Deus enquanto participada por essa criatura sua, a Igreja, que acolhe no seu seio a nova criação, a humanidade redimida no sangue do Cordeiro que tira o pecado do mundo.
1 – O Mistério da Igreja: sua origem, fundação e missão.
“Para perscrutar o mistério da Igreja, convém meditar primeiro sobre sua origem no desígnio da Santíssima Trindade e sobre sua realização progressiva no curso da história”[2].
Podemos pensar no mistério da Igreja, isto é, considerando-a, ela mesma, como um mistério; também podemos falar da Igreja do mistério, enquanto que ela é depositária do Mistério de Cristo. A Igreja na terra é – como diz o Concílio Vaticano II[3] – como um sacramento, ou seja, sinal vísivel de uma realidade invisível. A Igreja, Mistério de comunhão entre Deus e os homens, e destes entre si e com Deus, é sacramentum communionis, sacramento da comunhão: ela visibiliza o mistério de união com Deus e com os demais.
O Catecismo da Igreja Católica fala da Igreja como um projeto nascido no coração do Pai, prefigurada desde a origem do mundo, preparada na Antiga Aliança, instituída por Jesus Cristo, manifestada pelo Espírito Santo e consumada na glória[4]. Diz ainda: “A Igreja está na história, mas ao mesmo tempo a transcende. É unicamente “com os olhos da fé” que se pode enxergar em sua realidade visível, ao mesmo tempo, uma realidade espiritual, portadora de vida divina”[5].
Ela é um mistério revelado paulatinamente até que chegasse a plenitude dos tempos (Cfr. Gal 4,4) e Jesus Cristo – que é a plenitude e o mediador da Revelação – a fundasse. Em primeiro lugar: como a Igreja é um projeto nascido no coração do Pai, e como o Pai é eterno, podemos dizer que a Igreja existe desde toda a eternidade no coração de Deus.
Como foi dito anteriormente, a Igreja é mistério de comunhão dos homens com o Pai no Filho pelo Espírito Santo. Esse elemento é central para compreender a Igreja: Comunhão. Deus chama toda a humanidade para viver em comunhão com ele, de tal maneira que podemos dizer que a Igreja é a humanidade redimida e em comunhão com a Trindade beatíssima. Deus chama à comunhão. “A palavra “Igreja” ["ekklésia", do grego "ekkaléin" - "chamar fora"] significa “convocação”. Designa assembléia do povo, geralmente de caráter religioso. É o termo usado freqüentemente no Antigo Testamento grego para a assembléia do povo eleito diante de Deus, sobretudo para a assembléia do Sinai, onde Israel recebeu a Lei e foi constituído por Deus seu povo santo… O termo “Kyriakä”, do qual deriva “Chruch”, “Kirche”, significa “a que pertence ao Senhor”… “A Igreja” é o povo que Deus reúne no mundo inteiro. Existe nas comunidades locais e se realiza como assembléia litúrgica sobretudo eucarística. Ela vive da Palavra e do Corpo de Cristo e se torna assim, Corpo de Cristo”[6].
O amor da Trindade pela humanidade fez com que a Igreja fosse prefigurada na arca de Noé, na assembléia de Israel, no templo de Jerusalém etc. Deus criou o ser humano para fazê-lo participante de sua vida divina, não existe um só ser humano que não tenha esse fim sobrenatural. E o meio através do qual esse fim sobrenatural se realiza é a Igreja. Ao mesmo tempo que a Igreja é o meio pelo qual se realiza essa comunhão com Deus, ela também é – com relação ao mundo – a finalidade de todas as coisas[7].
Quando o homem e a mulher pecaram, o Senhor prometeu a salvação (Cfr. Gn 3,15). A partir daí começou o tempo de preparação da Igreja. Alguns Santos Padres falaram até da Ecclesia ab Adamo, a Igreja desde os tempos de Adão, e da Ecclesia ab Abel, a Igreja desde os tempos de Abel. “A preparação longínqua do Povo de Deus começa com a vocação de Abraão, a quem Deus promete que será o pai de um grande povo. A preparação imediata tem seus inícios com a eleição de Israel como povo de Deus”[8].
Quando chegou o momento Cristo instituiu a sua Igreja: “o Senhor Jesus dotou sua comunidade de uma estrutura que permanecerá até a plena consumação do Reino. Há antes de tudo a escolha dos Doze, com Pedro como seu chefe. Representando as doze tribos de Israel, eles serão a pedra de fundação da nova Jerusalém. Os Doze e os outros discípulos participam da missão de Cristo, de seu poder, mas também de sua sorte. Por meio de todos esses atos, Cristo prepara e constrói a sua Igreja.
“Mas a Igreja nasceu primeiramente do dom total de Cristo para nossa salvação, antecipado na instituição da Eucaristia e realizado na Cruz. “O começo e o crescimento da Igreja são significados pelo sangue e pela água que saíram do lado aberto de Jesus crucificado.” “Pois do lado de Cristo dormindo na Cruz é que nasceu o admirável sacramento de toda a Igreja”. Da mesma forma que Eva foi formada do lado de Adão adormecido, assim a Igreja nasceu do coração traspassado de Cristo morto na Cruz”[9].
Podemos observar que o Catecismo não utiliza apenas uma passagem para explicar-nos a fundação da Igreja, como a conhecida “tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela” (Mt 16,18). É verdade que essa passagem continua mantendo toda a sua importância nesse contexto, pois trata-se de uma promessa do Senhor, já realizada, pois a Igreja foi fundada. O Catecismo da Igreja fala de “atos fundacionais de Cristo”: a reunião de discípulos, a escolha dos Doze, a primazia de Pedro no grupo dos Doze, a instituição da Eucaristia, o Mistério Pascal. Como tudo o que Deus faz ad extram, ou seja, o que acontece fora da vida íntima de Deus, são ações comuns às três divinas Pessoas da Trindade, entenderemos também a função importantíssima do Espírito Santo, que é Espírito do Pai e do Filho, em Pentecostes e nos primeiros anos da Igreja neste processo fundacional. O Espírito Santo pode ser chamado co-fundador da Igreja com Cristo. A Igreja é fruto da missão conjunta do Filho e do Espírito Santo, enviados pelo Pai.
A Igreja foi manifestada pelo Espírito Santo. “Terminada a obra que o Pai havia confiado ao Filho para realizar na terra, foi enviado o Espírito Santo para santificar a Igreja permanentemente”[10]. Esta Igreja também será consumada na glória quando Cristo volte em sua glória[11]. Então a Igreja estará para sempre resplandecente de santidade.
A missão da Igreja é a mesma de Cristo: a salvação da humanidade. Ela continua a missão de Jesus Cristo. “Por ser “convocação” de todos os homens para a salvação, a Igreja é, por sua própria natureza, missionária enviada por Cristo a todos os povos para fazer deles discípulos”[12]. O Cristo glorificado que recebeu do Pai toda autoridade, todo poder, faz com que sua Esposa participe desta mesma autoridade, deste mesmo poder: a missão de Cristo sacerdote, profeta e rei faz-se presente por participação na missão da Igreja, Povo sacerdotal, profético e régio.
2 – Povo de Deus, Corpo de Cristo, Templo do Espírito Santo
Outrora Deus fez para si um povo, o Povo de Israel. Ele enviou o seu Filho para salvar esse povo, o qual não aceitou – na maioria de seus membros – o Messias enviado. Então Deus formou para si um Novo Povo, a Igreja, constituído pelos que nascem pela fé e pelo Batismo; este povo tem por Chefe Jesus Cristo; como condição, a dignidade da liberdade dos filhos de Deus; como lei, o mandamento novo de amar como Cristo mesmo nos amou; como missão, ser sal da terra e luz do mundo; como meta, o Reino de Deus, do qual a mesma Igreja já é germe[13]. O Novo Povo de Deus é um povo sacerdotal, profético e régio, e todo e qualquer batizado participa dessas três funções de Cristo[14].
A Igreja é também o Corpo de Cristo. Distingamos: o corpo físico do Senhor é aquele que ele tem agora no céu, corpo glorioso; o corpo eucarístico do Senhor é o que nós temos no Sacramento da Eucaristia, trata-se de uma presença substancial, não-física; o corpo místico do Senhor é a Igreja. É São Paulo quem usa essa bela imagem: “Com efeito, o corpo é um e, não obstante, tem muitos membros, mas todos os membros do corpo, apesar de serem muitos, formam um só corpo. Assim também acontece com Cristo. Pois fomos todos batizados num só Espírito para ser um só corpo” (1 Cor 12,12-13).
“A comparação da Igreja com o corpo projeta uma luz sobre os laços íntimos entre a Igreja e Cristo. Ela não é somente congregada em torno dele; é unificada nele, em seu Corpo”[15]. O “Christus totus – Cristo total” é Cristo-Cabeça e a Igreja-Corpo. Esta união maravilhosa existente entre Cristo e sua Igreja não impede a distinção que há entre os mesmos; daí a importância de outra bela imagem: a Igreja é a Esposa de Cristo: “ela é a Esposa imaculada do Cordeiro imaculado, a qual Cristo “amou, pela qual se entregou, a fim de santifica-la” (Ef 5,26). Efectivamente, a consideração da Igreja como esposa tem a vantagem de balancear a anterior, já que ao apresentar a Igreja como corpo poderia dar-se o perigo de uma divinização confusa da Igreja; a Igreja é também esposa e, como toda esposa, distinta do esposo. Desta maneira, fica claro que a Igreja é creatura Verbi, criatura do Verbo de Deus.
A Igreja é também Templo do Espírito Santo, que nela habita, vivicando-a e santificando-a; ele é o “Dominus et Vivificans – Senhor e Doador de vida”, é ele quem distribui os dons da Cabeça (Cristo) ao Corpo (Igreja). “O Espírito Santo é “o Princípio de toda ação vital e verdadeiramente salutar em cada uma das diversas partes do corpo”"[16]. Essa ação misteriosa do Espírito Santo se percebe não só na Igreja enquanto instituição, mas também em cada cristão que se deixa conduzir docilmente por seu amor e poder. O Espírito do Pai e do Filho habita no coração dos filhos de Deus por graça e, dessa maneira, cada cristão é templo vivo da presença de Deus onde quer que se encontre.
3 – Una, Santa, Católica e Apostólica
a) A Igreja de Cristo é una e única.
É una por sua Fonte, a Trindade Beatíssima, um só Deus em três Pessoas; por seu Fundador, Jesus Cristo; por sua Alma, o Espírito Santo[17]. Alguém poderia perguntar: se a Igreja é una com uma indivisibilidade tão fundada, como explicar a diversidade que há nela? A resposta pode dar-se na mesma linha do que antes foi dito: Deus é um, mas também é trino; a Igreja é una, mas também guarda em si a diversidade. Esta variedade de povos, culturas, espiritualidade, ritos, não impedem a unidade da Igreja. Ela desprende todo o vigor de sua unidade em meio de tão rica variedade.
Em concreto, para verificar o grau de unidade que alguém tem com a Igreja de Cristo é importante fixar-se nos vínculos de unidade. Logicamente, o vínculo dito “invisível” não é verificável pois se trata da graça de Deus, que faz com que haja “a caridade, que é o vínculo da perfeição” (Cl 3,14). Além do vínculo invisível, existem os vínculos visíveis, que sim são verificáveis: a profissão de uma única fé recebida dos apóstolos, a celebração dos Sacramentos, a sucessão apostólica (através do Sacramento da Ordem, que mantém a concórdia na Família de Deus que é a Igreja). Classicamente, isso tem sido expressado assim: comunhão na Fé, nos Sacramentos e no Regime[18].
Em sentido estrito, para que alguém esteja em plena comunhão com a Igreja são necessários todos os vínculos, sem excluir a graça de Deus. Não será dificil concluir, a partir da consideração anterior que nós, os que estamos em plena comunhão com a Igreja Católica mediante os vínculos externos ou visíveis, podemos não estar em plena comunhão se consideramos o estado de graça. É doutrina católica que não é possível saber com certeza de fé se estamos ou não na graça de Deus. Consequência: nunca presumir! É verdade que sempre podemos, supostos os meios sobrenaturais adequados, confiar que estamos em graça; no entanto, sempre com o santo temor de Deus e a consciência de que quem nos salva é o Serhor. Somos a comunidade dos salvados em busca da salvação!
Talvez alguém se assustaria com a afirmação tão clara que os filhos da Igreja ousam dizer nos tempos atuais: a Igreja de Cristo é a Igreja Católica. Contudo, isso é verdade: a Igreja que Jesus Cristo quis e fundou é a Igreja Católica, a única Igreja de Cristo, entregue a Pedro e aos demais Apóstolos. “Esta Igreja, constituída e organizada neste mundo como uma sociedade, subsiste na (“subsistit in“) Igreja Católica governada pelo sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhão com ele”[19].
O que fazer então com o ecumenismo? Será o que antes se afirmou não desmorona essa tentativa de unidade? Não. O ecumenismo não pode ser confundido com o “falso irenismo”, com meias verdades, com maneiras suaves fundadas na ignorância. Com o movimento ecumênico, a Igreja tem procurado fazer realidade o desejo de Cristo de que todos sejam um (Cfr. Jo 17,21), e fá-lo na verdade e na caridade. Apesar de ser um trabalho difícil, o ecumenismo precisa ir adiante. O primeiro gesto ecumênico a ser feito, porém, é o da oração; precisamos rezar muitas vezes a oração que Cristo rezou: “que todos sejam um“. No Concilio Vaticano II, “por «movimento ecuménico» entendem-se as actividades e iniciativas, que são suscitadas e ordenadas, segundo as várias necessidades da Igreja e oportunidades dos tempos, no sentido de favorecer a unidade dos cristãos. Tais são: primeiro, todos os esforços para eliminar palavras, juízos e ações que, segundo a equidade e a verdade, não correspondem à condição dos irmãos separados e, por isso, tornam mais difíceis as relações com eles; depois, o «diálogo» estabelecido entre peritos competentes, em reuniões de cristãos das diversas Igrejas em Comunidades, organizadas em espírito religioso, em que cada qual explica mais profundamente a doutrina da sua Comunhão e apresenta com clareza as suas características. Com este diálogo, todos adquirem um conhecimento mais verdadeiro e um apreço mais justo da doutrina e da vida de cada Comunhão. Então estas Comunhões conseguem também uma mais ampla colaboração em certas obrigações que a consciência cristã exige em vista do bem comum. E onde for possível, reúnem-se em oração unânime. Enfim, todos examinam a sua fidelidade à vontade de Cristo acerca da Igreja e, na medida da necessidade, levam vigorosamente por diante o trabalho de renovação e de reforma”[20]. Uma observação que vale a pena fazer neste momento é que a conversão das pessoas à uma determinada Igreja ou Comunidade Eclesial não vai em contra do ecumenismo. Caso um irmão de uma confissão evangélica queira alcançar a plena comunhão com a Igreja Católica será sempre bem recebido e nós, os católicos, devemos alegrar-nos imensamente de que essa pessoa alcance a plenitude dos meios para a sua salvação.
Para que fique mais claro: uma pessoa chega a pertencer a Igreja de Cristo pelo batismo. Qualquer batizado pertence à Igreja de Cristo, que subsiste na Igreja Católica. Isso quer dizer, a efeitos práticos, que um cristão de uma comunidade eclesial evangélica pertence à Igreja de Cristo, mas não pertence a ela totalmente; de fato, quanto esse cristão vem à Igreja Católica fala-se que ele alcançou a plena comunhão com a Igreja. Com outras palavras, antes de ser católico ele pertencia à Igreja de Cristo, mas só parcialmente; depois de vir à Igreja Católica ele alcançou a comunhão plena com essa Igreja.
b) A Igreja é Santa
Esse é um artigo do Credo que talvez, inclusive para muitos cristãos, resulte um pouco difícil de aceitar. O problema é que ao ver a vida de alguns discípulos de Cristo, inclusive de membros da hierarquia, muitas pessoas se assustam. No entanto, é preciso dizer, não deveriam assustar-se: a Igreja está composta de seres humanos, e como tais, falíveis. Quando uma pessoa olha para si mesmo e vê a capacidade que tem para cometer os piores pecados já cometidas por outros, não se assustará mais; ao contrário, pedirá a misericórdia de Deus e para si, para seus irmãos e para toda a humanidade. O artigo da fé continúa de pé, a Igreja é santa, “é aos olhos de Deus, indefectivelmente santa. Pois Cristo, Filho de Deus, que com o Pai e o Espírito Santo é proclamado o ‘único Santo’, amou a Igreja como sua Esposa. Por ela se entregou a fim de santificá-la. Uniu-a a si como seu corpo e cumulou-a com o dom Espírito Santo, para a glória de Deus.” A Igreja é, portanto, “o Povo santo de Deus”, e seus membros são chamados “santos”"[21]. Como explica-se, por tanto, a existência de membros pecadores dentro da Igreja? É preciso distinguir a Igreja enquanto Corpo de Cristo, intimamente unida ao seu Senhor, totalmente santa, e os membros desse Corpo, santos e pecadores. Essa distinção, porém, oferece uma dificuldade clara: já que o corpo está formado pelos membros do mesmo, como pode acontecer que esse corpo seja santo e os membros desse corpo sejam pecadores? Assim explica J.-H. Nicolas: “A Igreja é santa porque ela é o Corpo de Cristo, o meio de sua presença no mundo e na história depois da Ascensão. Essa santidade é total porque não depende da santidade dos seus membros, mas da santidade de Cristo, que Ele torna presente. Mas, nós não podemos dizer que Ele faça uma abstração total da santidade dos seus membros (…)
“A santidade objetiva da Igreja pode crescer? Parece que de duas maneiras: quantitativamente, à medida que a Igreja se espalha pelo mundo; qualitativamente, segundo a esplendor e a força do seu testemunho. Desde este ponto vista existe sem dúvidas fases de progresso e de regresso, de acordo com as épocas e com os lugares. Cada vez que um membro da Igreja peca, na medida que ele peca, ele se separa da Igreja ao mesmo tempo que de Cristo. Existem graus nesta separação (…). Mas se tal pessoa é membro da Igreja, não o é em razão de seus pecados, nem mesmo com seus pecados, mais apesar dos seus pecados[22]. Uma observação ao que foi transcrito é que como o batismo imprime um selo indelével, o pecador nunca se separa totalmente da Igreja.
A maneira explicada acima poderia dar a impressão de que tudo ficou resolvido. Para balancear melhor apresentamos também a visão de outro grande teólogo de nossos dias, o então Cardeal Ioseph Ratzinger em seu livro “Introdução ao Cristianismo”. Primeiramente, o autor faz notar a irritação que sentimos, cristãos e não-cristãos, quando afirmamos que a Igreja é Santa. Isto é assim porque vemos tantas miserias humanas no seio da Igreja que alguém já teve coragem de dizer: “Isso já não é uma noiva, é antes um monstro terrivelmente deformado e feroz”. Dante Aligieri “viu sentada no carro da Igreja a meretriz da Babilônia”[23]. Em tudo isso, vemos sempre o sonho de uma perfeição imaculada dentro da distinção preto ou branco. Acontece, no entanto, que esta perfeição sine macula, sem mancha, só se dará na Nova Terra e nos Novos Céus. Não! Creio na Santa Igreja Católica não se refere em primeiro lugar à santidade dos seus membros, mas “consiste naquele poder de santificação que Deus exerce nela apesar da pecaminosidade humana. (…) O próprio Deus prendeu-se aos homens, ele deixou prender por eles. A Nova Aliança (…) é graça concedida por Deus, e esta não recua diante da infidelidade do ser humano. (…) Como a liberalidade do Senhor nunca foi revogada, a Igreja continua sendo sempre aquela que é santificada por ele e na qual a santidade do Senhor que se torna presente e que escolhe como recipiente de sua presença, num amor paradoxal, também e justamente as mãos sujas dos homens. É santidade que brilha como santidade de Cristo em meio ao pecado da Igreja”[24].
Jesus Cristo, em seu caminar terreno, se relaciona com os pecadores: não os condena, os aceita em sua companhia, come com eles; “essa mistura indiscriminada chegou a ponto de ele mesmo ser transformado “em pecado” (…). Não é a Igreja simplesmente a continuação dessa atitude de Deus que se mistura com a miserabilidade humana?”[25]. Outro ponto interessante nesta questão é observar que a santidade da Igreja “não está em primerio lugar nos órgãos que a organizam, reformam, governam, e sim naqueles que simplesmente crêem e que recebem nela o dom da fé que se torna a sua vida”[26]. Ratzinger manifesta uma primazia do dom de Deus sobre a correspondência humana: a Igreja é Santa porque manifesta a santidade de Jesus Cristo nos dons administrados, que é vida de seus fiéis. Assim como a communio sanctorum, a comunhão dos santos, se refere em primeiro lugar às coisas santas, a fé e aos sacramentos da fé, assim também a santidade da Igreja se refere em primeiro lugar à santidade de Jesus Cristo presente na Igreja através de seus dons, não é à toa que a Igreja é chamada justamente communio. Neste sentido fica claro que Ratzinger não tem nenhum problema em dizer que a Igreja é Santa e ao mesmo tempo falar dessa santidade “em meio ao pecado da Igreja”[27], de “santidade imperfeita da Igreja”[28]. Chega até mesmo a afirmar que o Concilio Vaticano II falou da Igreja Santa e pecadora, mas timidamente[29].
As duas visões teológicas sobre a santidade da Igreja ajuda-nos a ter uma visão bastante equilibrada sobre esta questão. Não é possível andar por aí dizendo que a Igreja é pecadora. Isso é um disparate! A Igreja é Santa, é assim que rezamos no Credo. À hora de explicar as coisas tampouco vale omitir as dificuldades do problema: há pecadores no seio da Igreja que é Santa. Eis aqui duas verdades “aparentemente” contraditórias que precisam ser conjugadas. Quando se entende cada vez mais esta questão, será mais fácil também comprender que a Igreja pode ser sempre reformada, renovada e, de fato, o Espírito Santo faz isso constantemente em seu Templo Santo.
c) A Igreja é Católica
A nossa reflexão sobre a catolicidade da Igreja também terá como motor o texto do Catecismo: “a palavra “católico” significa “universal”… A Igreja é católica em duplo sentido. Ela é católica porque nela Cristo está presente. “Onde está Cristo Jesus está a Igreja Católica.” Nela subsiste a plenitude do Corpo de Cristo unido à sua Cabeça, o que implica que ela recebe “a plenitude dos meios de salvação” que ele quis: confissão de fé correta e completa, vida sacramental integral e ministério ordenado na sucessão apostólica. Neste sentido fundamental, a Igreja era católica no dia de Pentecostes e o será sempre, até o dia da Parusia. Ela é católica porque é enviada em missão por Cristo à universalidade do gênero humano”[30].
Como a Igreja Universal, Católica, é enviada à universalidade humana, é preciso concluir que Deus chama a todos os seres humanos a pertencer ao seu novo Povo[31]. A Igreja é instrumento universal de salvação e, consequentemente, continua válida aquela verdade: extra Ecclesiam nulla salus – fora da Igreja não há salvação, já que toda salvação vem de Cristo, e Cristo sempre leva consigo a sua Igreja, que é o seu Corpo. Será que a Cabeça anda por aí separada do Corpo? Cabeça fora do corpo ou corpo fora do corpo significa morte. De fato, o Concílio Vaticano II afirmou: “não podem salvar-se aqueles que, sabendo que a Igreja católica foi fundada por Deus por meio de Jesus Cristo como instituição necessária, apesar disso não quiserem nela entrar ou nela perseverar”[32]; afirmou também: “Aqueles, portanto, que sem culpa ignoram o Evangelho de Cristo e sua Igreja, mas buscam a Deus com coração sincero e tentam, sob influxo da graça, cumprir por obras a sua vontade conhecida por meio do ditame da consciência podem conseguir a salvação eterna”[33]. Essa salvação, no entanto, se dá por Cristo e na Igreja, porém de uma maneira misteriosa no âmbito do que podemos chamar “caminhos extraordinários da graça”. Com tudo isso, fica sempre firme o dever o direito da Igreja de levar a Boa Nova a todos os homens[34].
Uma consequencia espiritual para o cristão de pertencer à Igreja Católica será a de procurar ser cada vez mais “universal”. O católico precisa ter o coração grande, não pode olhar só para a sua vida, sua paróquia, sua diocese. Precisa pensar em todos os cristãos e enviar ajuda espiritual a todos os irmãos no mundo inteiro. Essa dimensão tão essencial do catolicismo poderia ser vivida, por exemplo, pensando no Papa e suas intenções e unindo-se a elas frequentemente. Desde Roma a todo o mundo e desde cada Igreja Local, unida à Igreja Capital, Roma, a todos os cristãos no mundo inteiro. Nessa dimensão universal não podemos esquecer-nos tampouco dos irmãos que terminam a sua purificação na Igreja padecente nem dos irmãos que são-nos de grande ajuda na Igreja celestial, à qual tendemos.
d) A Igreja é Apostólica.
O Catecismo diz que a Igreja é apostólica “por ser fundada sobre os apóstolos, e isto em um tríplice sentido:
- ela foi e continua sendo construída sobre o “fundamento dos apóstolos” (Ef 2,20), testemunhas escolhidas e enviadas em missão pelo próprio Cristo;
- ela conserva e transmite, com a ajuda do Espírito que ela habita, o ensinamento, o depósito precioso, as salutares palavras ouvidas da boca dos apóstolos;
- ela continua a ser ensinada, santificada e dirigida pelos apóstolos até a volta de Cristo, graças aos que a eles sucedem na missão pastoral: o colégio dos bispos, “assistido pelos presbíteros, em união com o sucessor de Pedro, pastor supremo da Igreja”[35].
É importante entender também que Colégio Episcopal cuja cabeça é o Papa é a sucessão do Colégio Apostólico cuja cabeça é Pedro. Um bispo entra no Colégio Episcopal no momento da sua ordenação episcopal, ou seja, um bispo em concreto não é um sucessor de um apóstolo em concreto, mas é sucessor dos apóstolos, a sucessão é de colégio a colégio, não individual. Apenas o Papa sucede individualmente a um apóstolo, Pedro.
Quando dizemos que a Igreja é Romana queremos expressar uma faceta do que chamamos apostolicidade e universalidade. Efetivamente, o apóstolo Pedro, posto à frente do grupo dos Doze Apóstolos, foi martirizado em Roma. Por desígnio de Deus, Roma estaría para sempre ligada a Pedro e aos seus sucesores. A missão de Pedro na Igreja – missão de unidade na catolicidade- deveria continuar; sendo assim, todos os que se sentariam na Cátedra de Pedro seriam seus sucessores postos à frente dos bispos e de todos os fiéis.
4 – Os fiéis de Cristo – Leigos, Vida Consagrada, Hierarquia.
Uma pessoa torna-se fiel de Cristo ao ser batizada. Este Sacramento é a porta, por ele se entra na Igreja de Cristo: “Entre todos os fiéis de Cristo, por sua regeneração em Cristo, vigora, no que se refere à dignidade e à atividade, uma verdadeira igualdade, pela qual todos, segundo a condição e os múnus próprios de cada um, cooperam na construção do Corpo de Cristo”[36].
Essa vocação comum de fiel não existe, no entanto, em estado puro. A ação do Espírito Santo a configura de tal manera que o cristão será sempre um fiel leigo ou um fiel da vida consagrada ou um fiel ministro sagrado.
a) Os leigos
Os leigos são aqueles aos quais é específico “por sua própria vocação, procurar o Reino de Deus exercendo funções temporais e ordenando-as segundo Deus… A eles, portanto, cabe de maneira especial iluminar e ordenar de tal modo todas as coisas temporais, às quais estão intimamente unidos, que elas continuamente se façam e cresçam segundo Cristo e contribuam para o louvor do Criador e Redentor”[37]. Podemos observar que o Concilio Vaticano II entende a vocação do fiel leigo no marco da vocação universal à santidade, comum a todo membro da Igreja, e situa o apostolado laical no meio das atividades temporais que realiza. “Uma vez que, como todos os fiéis, os leigos são encarregados por Deus do apostolado em virtude do Batismo e da Confirmação, eles têm obrigação e gozam do direito, individualmente ou agrupados em associações, de trabalhar para que a mensagem divina da salvação seja conhecida e recebida por todos os homens e por toda a terra”[38]. A Igreja não considera o trabalho evangelizador do leigo como uma espécie de “prolongação da mão” da hierarquia eclesiástica. O leigo pode e deve fazer apostolado porque recebeu essa missão de Cristo na Igreja no momento do seu batismo; ele não precisa pedir permissão ao bispo ou ao presbítero para evangelizar, fá-lo-á pelo simples e sublime fato de estar configurado com Cristo, Sacerdote, Profeta e Rei, e, em consequência, em virtude do sacerdócio comum, ou existencial, do qual é portador. O que foi dito até o momento nem vai em deterioro da obediência que todos os fiéis devem aos seus Pastores, nem impede que em várias ocasiões o apostolado dos leigos seja organizado pelas estruturas da Igreja.
O fiel leigo realiza o seu apostolado em primeiro lugar na família, no trabalho e em qualquer outra tarefa temporal que exerça. Num segundo momento, poderá também ajudar nas atividades paroquiais. Talvez isso poderia ser ainda hoje novedoso. E não deveria sê-lo! Talvez é exatamente por causa de uma mal interpretação da função do leigo na Igreja e no mundo que tenhamos tão poucos leigos coerentes entre seus iguais fermentando todos os ambiente com a luz e a caridade de Cristo. Se os leigos fossem mais conscientes da sua missão, o Brasil não teria, por exemplo, algumas leis injustas que atualmente suplantam a moral, não só a cristã, mas inclusive os principios mais básicos da estrutura humana. De fato, a moral cristão não vai contra o ser humano, mas o plenifica como ser humano.
A santidade, na mente do Concilio Vaticano II, não é privilégio de um estado de vida na Igreja, todos estão chamados à santidade. Todos os batizados estão obrigados a buscar a santidade de vida no próprio estado, seja solteiro, casado, celibatário, sacerdote, leigo ou religioso. É importante lembrar-nos que a santidade, que em primeiro lugar é obra da graça de Deus, cada santo é uma obra de Deus; é também fruto do esforço pessoal que se concreta na vida de oração - sacramental, pessoal e penitencial (oração dos sentidos) – e na prática das boas obras. Santo é aquele que ama a Deus e, por amor a Deus, ama a todos sem distinção.
b) A vida consagrada
Ainda que a expressão vida consagrada não especifique muito o que é a vida religiosa, dado que todo fiel é consagrado a Cristo, utilizá-la-emos aqui como sinônimo de vida religiosa e de vida daqueles que professam os conselhos evangélicos de maneira semelhante à dos religiosos, se trata da vida daqueles fiéis que professam publicamente os chamados conselhos evangélicos de pobreza, castidade e obediência. O Catecismo depois de esclarecer que tais conselhos são propostos a todo seguidor do Senhor, diz que “a perfeição da caridade à qual todos os fiéis são chamados comporta para os que assumem livremente o chamado à vida consagrada a obrigação de praticar a castidade no celibato pelo Reino, a pobreza e a obediência. É a profissão desses conselhos em um estado de vida estável reconhecido pela Igreja que caracteriza a “vida consagrada” a Deus”[39].
A pobreza, a castidade e a obediência podem e devem ser vividas por qualquer cristão como virtudes; a diferença do religioso é que eles, além de vivê-las como virtudes, as vivem como votos. A diferença entre um religioso e um leigo, por exemplo, não é que o religioso deva ser mais santo que o leigo; a vocação à santidade é para todos conforme o ensino da Igreja. Para compreender melhor as vocações na Igreja é preciso que penetremos cada vez mais nas isondáveis riquezas do mistério de Cristo e de sua Igreja. O Corpo Místico de Cristo, a Igreja, é Virgem e Esposa, está na terra e está no céu, é humana e ao mesmo tempo está na esfera sobrenatural… Parece contraditório? Não é que seja contraditório, simplesmente há tanta luz que não consiguimos ver bem. Cada vocação na Igreja destaca um aspecto do mistério de Cristo e de sua Igreja. O religioso, por exemplo, mostra na maneira de viver as suas relações com o mundo o carácter escatológico da Igreja, recorda aos demais fiéis que esse mundo passa e que precisamos, todos nós, ter o coração nas coisas do alto vivendo ao mesmo tempo e plenamente entre os nosso iguais.
c) O ministério na Igreja
Os sacramentos da Iniciação Cristã – Batismo, Confirmação, Eucaristia – permitem que o ser huamno llegue a participar do Mistério de Cristo e da Igreja. O sacramento da Ordem faz com que alguns membros do Povo de Deus sejam constituídos ministros de seus irmãos, servidores do sacerdócio comum. Desta maneira, dá-se nesse Povo de Deus um primeiro binômio de carácter sacramental: fiéis y ministros, que, configurado pela doação carismática do Espírito Santo – em conjunto com a ação de Cristo -, dá lugar às chamadas “posições eclesiológicas históricas” na Igreja: leigo, ministro, religioso.
Os ministros da Ordem Sagrada – bispos, presbíteros, diáconos – constituem a assim chamada hierarquia da Igreja: “para apascentar e aumentar continuamente o Povo de Deus, [Cristo] instituiu na Igreja diversos ministérios, para bem de todo o corpo. Com efeito, os ministros que têm o poder sagrado servem os seus irmãos para que todos os que pertencem ao Povo de Deus, e por isso possuem a verdadeira dignidade cristã, alcancem a salvação”[40].
Os Bispos são os sucessores dos apóstolos; o Papa, que também é um Bispo – o Bispo de Roma – é sucessor do apóstolo Pedro, apenas ele sucede individualmente a um apóstolo, já que a sucessão que se dá nos demais bispos é colegial. Todos os bispos têm o múnus de ensinar, santificar e reger a Igreja de Deus, em comunhão com o Bispo de Roma, que tem a primazia, como S. Pedro também a tem entre os apóstolos. Cada bispo tem toda a potestade sagrada sacramentalmente, isto é, não a recebe por delegação do Papa; claro está que no exercício dessa sacra potestas, poder sagrado, é preciso estar em comunhão com a cabeça do Colégio Episcopal, o Romano Pontífice.
Os Presbíteros são os cooperadores dos Bispos. Recebem também o múnus de ensinar, santificar e reger o Povo de Deus, em comunhão com o Bispo. Em todo sacerdote está garantizado que nas ações sacramentais quem atua é Cristo; o sacerdote age in Persona Christi Capitis, dessa maneira os fiéis sempre recebem os dons de Cristo através da Igreja, ainda que o sacerdote seja um ministro indigno. Não há dúvida que o sacerdote, como recentemente recordava o Papa Bento XVI no seu discurso aos participantes da Reunião Plenária da Congregação para o Clero (16/03/2009), deve tender à perfeição, à santidade de vida. Os ministros da Ordem Sagrada, penso especialmente nos sacerdotes seculares (diocesanos), não fazem votos de pobreza, obediência e castidade, não são religiosos no sentido anteriormente explicado. Tudo isso, como é lógico, não deve levar à conclusão errônea de que eles não vivam essas realidades como virtudes. Todo cristão deve ser pobre, obediente, casto, humilde, misericordioso, afável etc. Em consequência, o sacerdote também e, além do mais, por um novo título, o da sua ordenação, que o põe à frente do povo de Deus representando o mesmo Cristo. O sacerdote deve estar adornado de todas as virtudes cristãs, de todas as virtudes do Coração sacerdotal de Cristo.
Os diáconos são aqueles que servem o Povo de Deus na “diaconia” (no serviço) da liturgia, da palavra e da caridade, em comunhão com o Bispo e seu presbitério[41]. Atualmente a Igreja vive uma dupla modalidade do único diaconato: diaconato transitorio e diaconato permenente. Ainda que essa terminologia deixe a desejar, o que se quer expressar com ela é que alguns homens são ordenados diáconos com vistas ao presbiterado (diaconato transitório), outros o são de maneira estável (diáconos permanentes). Estes últimos podem ser escolhidos entre homens casados e ao receber o diaconato de modo permanente não pretendem ser sacerdotes, o que desejam é realizar um serviço ao Povo de Deus tendo recebido o sacramento da ordem no grau do diaconado.
Santo Inácio de Antioquia tem uma frase lapidada sobre a hierarquia eclesiástica: “segui todos o Bispo, como Jesus Cristo [segue] o Pai, e o presbitério como aos apóstolos; quanto aos diáconos, respeitai-os como a lei de Deus. Que ninguém faça sem o Bispo nada que diz respeito à Igreja”[42].
5 – A “Communio Sanctorum”
“A comunhão dos Santos é precisamente a Igreja”[43]. Essa comunhão se dá nos bens espirituais: na fé, nos sacramentos, nos carismas, na caridade etc; também se dá entre a Igreja do céu e a da terra, que se manifesta especialmente com a intercessão dos santos e na comunhão com os mesmos. Encontramo-nos na “única família de Deus. “Todos os que somos filhos de Deus e constituímos uma única família em Cristo, enquanto nos comunicamos uns com os outros em mútua caridade e num mesmo louvor à Santíssima Trindade, realizamos a vocação própria da Igreja”[44].
A comunhão que se dá entre as tres Pessoas da Santíssima Trindade e os santos no céu se deixa ver como em um espelho aqui nesta terra. Um dia, quando a Igreja seja toda ela gloriosa, existirá apenas a comunhão em sua realização máxima, a Igreja in Patria. No entanto, já agora podemos viver essa comunhão dos santos. Não nos esqueçamos que os santos no céu intercedem por nós, que o louvor que eles tributam ao Deus uno e trino na glória celeste é participado aqui na terra na liturgia da Igreja; além do mais, cada cristão pode ajudar os demais irmãos com a sua oração, sacrificio e caridade. Tudo isso é viver a comunhão dos santos.
6 – Maria, Mãe de Cristo e da Igreja
Maria Santíssima é Mãe de Cristo, portanto Mãe de Deus e Mãe da Igreja, já que esta é o Corpo de Cristo. Ela é Mãe da Cabeça e dos membros. “Por sua adesão total à vontade do Pai, à obra redentora de seu Filho, a cada moção do Espírito Santo, a Virgem Maria é para a Igreja o modelo da fé e da caridade. Com isso, ela é “membro supereminente e absolutamente único da Igreja”, sendo até a “realização exemplar (typus)” da Igreja. Mas seu papel em relação à Igreja e a toda a humanidade vai ainda mais longe. “De modo inteiramente singular, pela obediência, fé, esperança e ardente caridade, ela cooperou na obra do Salvador para a restauração da vida sobrenatural das almas. Por este motivo ela se tornou para nós mãe na ordem da graça”"[45].
Nós, os filhos de Deus por graça, nunca podemos ter medo de venerar a Mãe de Jesus. Não se trata de um ato de idolatria! Nada mais contrário à piedade cristã! Os cristãos de todos os tempos louvaram a Santa Maria sabendo que estavam realizando aquelas palavras que o Espírito Santo colocou nos lábios dela: “Por isto, desde agora, me proclamarão bem-aventurada todas as gerações” (Lc 1,48). É preciso que confiemos também na força ecumênica da devoção a Nossa Senhora. Ela é Mãe, e como toda boa mãe está muito interessada na reunião de todos os seus filhos na Casa pensada por Deus para todos que é a Igreja Católica.
[1]Cfr. Catecismo da Igreja Católica (Cat.), 748.
[2] Ib. 758.
[3] Cf. Constituição Dogmática Lumen Gentium (LG), 1.
[4] Cfr. Cat. 759-769
[5] Ib.770.
[6] Ib.751-752.
[7] cfr. Ib.760.
[8] Ib.762.
[9] Ib.765-766
[10] Ib. 767.
[11] Cfr. Ib. 769.
[12] Ib. 767.
[13] Cfr. Cat.782.
[14] Cfr. Ib. 783.
[15] Ib. 789.
[16] Ib. 798.
[17] Cfr. Ib. 813.
[18] Cfr. Ib. 815.
[19] LG 8.
[20] Decreto sobre o ecumenismo Unitatis Redintegratio, nº 4.
[21] Cat. 823.
[22] A última frase no original francês diz assim: “Mais si quelqu’un est membre de l’Eglise, ce n’est ni en raison de ses péchés, ni même avec ses péchés, mais malgré ses péchés” (A tradução é nossa: NICOLAS, J.-H., Synthése Dogmatique, Éd. Universitaires, Paris ³1991, págs. 699-700).
[23] RATZINGER, J., Introdução ao cristianismo, Edições Loyola, São Paulo 2005, p. 250.
[24] Ib., p. 251.
[25] Ib., p. 252.
[26] Ib., p. 253.
[27] Ib., p. 251.
[28] Ib., p. 252.
[29] Cf. Ib., p. 250.
[30] Cat. 830-831.
[31] Cf. LG 13.
[32] LG 14.
[33] LG 16.
[34] Cfr. Cat. 848.
[35] Cat. 857.
[36] Cat.872.
[37] LG 31.
[38] Cat.900.
[39] Cat. 915.
[40] LG 18.
[41] Cfr. Cat. 875.
[42] Ad Smyrn. 8,1.
[43] Cat. 946.
[44] Ib. 959.
[45] Ib. 967-968.
EXCURSUS: NORMAS DA INTERPRETAÇÃO EVANGÉLICA
A interpretação deve ser fácil, tirada do que é o evangelho: boa nova.
- Os evangelhos são uma condescendência, um beneplácito, uma gratuidade, um amor misericordioso de Deus para com os homens. Presença amorosa e gratuita de Deus na vida humana.
- Jesus é a face do Deus misericordioso que busca o pecador, que o acolhe e que não se importa com a moralidade ou com a ética humana, mas quer mostrar sua condescendência e beneplácito, como os anjos cantavam e os pastores ouviram no dia de natal: é o Deus da eudokias, dos homens a quem ele quer bem e quer salvar, porque os ama.
Interpretação errada do evangelho:
- Um chamado à ética e à moral em que se pede ao homem mais que uma predisposição, uma série de qualidades para poder ser amado por Deus.
- Só os bons se salvam. Como se Deus não pudesse salvar a quem quiser (Fará destas pedras filhos de Abraão).
Consequências:
- O evangelho é um apelo para que o homem descubra a face misericordiosa de Deus [=Cristo] e se entregue de um modo confiante e total nos braços do Pai como filho que é amado.
- O olhar com a lente da ética, transforma o homem num escravo ou jornaleiro:aquele age pelo temor, este pelo prêmio.
- O olhar com a lente da misericórdia, transforma o homem num filho que atua pelo amor.
- O pai ama o filho independentemente deste se mostrar bom ou mau. Só porque ele é seu filho e deve amá-lo e cuidar dele.
- Só através desta ótica ou lente é que encontraremos nos evangelhos a mensagem do Pai e com ela a alegria da boa nova e a esperança de um feliz encontro definitivo. Porque sabemos que estamos na mira de um Pai que nos ama de modo infinito por cima de qualquer fragilidade humana.
Ambientação:
Sejam bem-vindos amados irmãos e irmãs! A alegoria da vinha inaugura o tema das núpcias de Javé com Israel, tema que voltará frequentemente na literatura bíblica. Às vezes, Israel é designado como vinha, outras vezes, como a esposa acariciada e depois repudiada. Nesse cântico de Iasaías, as duas linhas se misturam perfeitamente, através de uma como que superposição de imagens. A intervenção do profeta lembra o papel do amigo do esposo. A figura da vinha, como aliás a da esposa, se tornam como que um exemplo da história da salvação, do modo de agir de Deus perante seu povo e o mundo inteiro. O amor de Deus pelos homens se revela de modo dramático, mas por fim é sempre o amor que triunfa sobre a recusa e a infidelidade do homem. Entoemos cânticos jubilosos ao Senhor!
(coloque o cursor sobre os textos em azul abaixo para ler o trecho da Bíblia)
PRIMEIRA LEITURA (Is 5,1-7): - "...eu esperava deles frutos de justiça – e eis injustiça; esperava obras de bondade – e eis iniqüidade."
SALMO RESPONSORIAL 79(80): - "A vinha do Senhor é a casa de Israel."
SEGUNDA LEITURA (Fl 4,6-9): - "Não vos inquieteis com coisa alguma, mas apresentai as vossas necessidades a Deus, em orações e súplicas, acompanhadas de ação de graças."
EVANGELHO (Mt 21,33-43): - "A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; isto foi feito pelo Senhor e é maravilhoso aos nossos olhos."
Homilia do Diácono José da Cruz – 27º Domingo do Tempo Comum – Ano A
"OS FRUTOS DA VINHA"
Recorro a lembranças da minha adolescência ao iniciar esta reflexão, tínhamos no fundo do quintal um belo caramanchão de maracujá que meu pai zelava com carinho, lembro que as flores muito bonitas e perfumosas, pareciam os cravos com que Jesus foi crucificado. Na época dos frutos nos deliciávamos com o suco que era uma gostosura e isso sem contar com a sombra fresca em dia de muito calor, onde tínhamos um velho banco de madeira sendo o local preferido para um descanso ou uma leitura.
Lendo esse evangelho e lembrando-se do meu pai, nas manhãs de verão, cavocando, podando, fazendo limpeza nas folhas do maracujeiro, reflito que é isso que Deus espera de cada um a quem, através do seu Filho, confiou a missão de cuidar do seu reino no meio dos homens. A liderança religiosa daquele tempo se esquivava dessa missão, e ainda aproveitava-se dela, para levar vantagem, isso é como se tivéssemos no quintal um maracujeiro, que nos desse flores, folhas, sombra e frutos, sem que lhe déssemos qualquer atenção. Benefício sem dar nada em troca chama-se exploração.
É um pouco isso que acontece nos chamados crimes ambientais, onde o homem explora a natureza, tira dela todo lucro possível, e nada faz para restaurar a perda, daquilo que consumiu. Jesus confiou à igreja a missão de anunciar, e ser expressão do Reino de Deus, ele a arrendou, para que todos os batizados tomassem conta dela, cuidassem com carinho e produzisse os frutos que o mundo precisa.
A comunidade é essa vinha, como igreja ela é sinal e expressão do reino de Deus, a parábola fala que os vinhateiros homicidas, não só negaram dar os frutos aos enviados pelo proprietário, como também foram violentos para com eles, e quando acolheram acolherem o Filho, o fizeram com a intenção de matá-lo para se apossar da sua herança. “Em nossas comunidades cristãs, não espancamos ninguém, e muito menos matamos quem quer que seja” devem estar pensando os leitores, míngüem na comunidade quer apossar-se de algo que pertence a outro. Será que não?
Mas dá para se pensar que, matar alguém, nem sempre significa por um fim a sua vida biológica, podemos matar de muitas formas, desprezo, indiferença, preconceito, divisões, intrigas, calúnias, falta de paciência, compreensão, moralismo exagerado com os que erram. Deus confiou-nos a Igreja para que, como aquele maracujeiro do fundo do meu quintal, ela produza frutos doces, dê sombra, acolhendo e abrigando as pessoas, exale o perfume do amor verdadeiro, da retidão e da justiça, para que a comunidade seja um Oasis no meio desse imenso deserto quente e íngreme, que às vezes é a vida das pessoas, por conta de tantos fatores sociais, econômicos e familiares.
Nesse sentido, olhando por esse ângulo, a palavra de Deus nos questiona se em nossas comunidades as pessoas saem saciadas e felizes. Será que, pertencer a comunidade ou ir a nossas celebrações, é para as pessoas motivo de alegria e prazer? E trazendo a reflexão em nível pessoal, será que nós próprios somos uma videira viçosa, onde as pessoas encontram abrigo e refúgio? Nossos frutos são saborosos, as pessoas comentam sobre a doçura deles, ou trazem um azedume que gera maledicência e até reclamação?
Matar o Filho do Dono da vinha, é não anunciá-lo, não testemunhá-lo, esquecer seus ensinamentos e colocar em nossa vida outros valores e tendências ditadas pelo egoísmo. Na sexta feira santa da paixão, uma grande multidão sempre lota as igrejas e acompanha o Cristo morto, a gente se pergunta por que, e nesse evangelho encontramos a resposta, as vezes somos também meio homicidas e anunciamos um Cristo morto, em nome da modernidade, da ciência, da tecnologia, um Cristo morto pelo relativismo, em lugar de ser simples arrendatários muitas vezes nos achamos donos da vinha que é a igreja, é como se o cristianismo fosse apenas uma filosofia de vida, um pensamento e uma ideologia muito bonita, mas que logo é sufocada pelas ideologias que o mundo nos propõe.
O proprietário enviou servos para buscarem os frutos que lhe pertencem, enviou seu próprio Filho que veio para ser acolhido e nos ensinar como produzir os frutos. Estamos em um aprendizado constante com a sua palavra e a eucaristia, temos aulas práticas e o manual de como cuidar da Vinha, que é a Palavra de Deus. Esforcemo-nos para corresponder, e não deixemos que as pragas do pecado destruam ou torne inexpressiva a Vinha do Senhor, pois disso, nós todos, enquanto povo de Deus, iremos um dia prestar contas ao proprietário, que nos confiou sua vinha, seu reino, plantado por Jesus no meio dos homens.
José da Cruz é Diácono da
Paróquia Nossa
Senhora Consolata – Votorantim – SP
E-mail jotacruz3051@gmail.com
Homilia do Padre Françoá Rodrigues Costa – 27º Domingo do Tempo Comum – Ano A
“Agraciados e desgraçados”
A palavra “agraciado” soa bem aos nossos ouvidos, não posso afirmar a mesma coisa do seu antônimo. Mas não se erra ao afirmar-se que des-graçado significa sem-graça. Os lavradores da parábola que nós escutamos eram agraciados: eram dignos da estima do seu senhor que lhes confiara a sua vinha. Mas caíram na desgraça: perderam a vinha e morreram por causa da própria ambição. Grande contradição a da vida daqueles homens: querendo a herança, perderam a vida, perderam até mesmo a possibilidade de ambicionar a herança.
Aqueles lavradores tinham uma ambição desleal. Eles eram invejosos. Não estou falando mal deles, simplesmente tento glosar o que eles mesmos disseram: “eis o herdeiro! Matemo-lo e teremos a sua herança” (Mt 21,38). É fato que os lavradores não suspeitavam duma coisa: o filho queria fazer deles participantes da sua herança. Mas, pobres coitados! Os lavradores, que poderiam ser uns ricos herdeiros por graça do seu senhor, acabariam sendo homicidas e exterminados sem piedade. Eram uns homens miseráveis porque eram egoístas e invejosos. Temos que ter cuidado: poderíamos ser uns desgraçados, inclusive ambicionando coisas boas.
Mais ainda, provavelmente, se tivessem ficado com a herança teriam se matado entre eles, cada um defendendo os próprios “direitos”. Como a estória daqueles três “amigos” que eram assaltantes. Conta-se que na hora de dividir o produto do roubo resolveram “comemorar”. Sendo assim, um deles foi comprar uma garrafa de whisky para fazer a festa. Este, muito esperto, resolve ficar com tudo só para ele e coloca veneno na garrafa para que os outros morram. Enquanto isso os outros dois “amigos” planejam o seguinte: ficar com tudo para eles. Quando chega o que fora comprar o whisky, os outros dois o matam e, para comemorar tomam o whisky… Péssimo resultado! Morreram todos! É fato: quem não sabe partilhar não serve para ter.
A parábola que o Senhor Jesus nos contou no dia de hoje é um resumo de toda a história da salvação com os seus progressos e os seus regressos. Da parte de Deus, ele sempre a fez progredir. No que diz respeito ao ser humano, havia progresso quando ele correspondia à vontade de Deus; regresso, quando as pessoas se rebelavam contra o querer de Deus. Finalmente, “Deus enviou o seu próprio Filho, que nasceu de uma mulher e nasceu submetido a uma lei, a fim de remir os que estavam sob a lei, para que recebêssemos a sua adoção” (Gl 4,4-5). Desta maneira, o homem pôde corresponder perfeitamente à vontade do Pai. Jesus, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, viveu intensamente a vontade do seu Pai do céu.
“Hão de respeitar o meu filho” (Mt 21,37). Mas não! Mas será que hoje em dia se respeita o Filho de Deus que morreu e ressuscitou pela nossa salvação? A ingratidão é uma coisa penosa, machuca o coração e fere os sentimentos mais profundos. Às vezes, a ingratidão é mais dolorosa que um ato de violência física. O Coração do nosso Pai do céu é alvo de constantes ingratidões. Deus nos oferece a felicidade e nós pensamos que as suas exigências santas são como uma espécie de moral de escravos ou de infelizes. Deus oferece o que é bom, o que constrói o ser humano, mas nós continuamos com a “cabeça dura” e o “nariz empinado” querendo construir a própria felicidade à margem de Deus. Dá a impressão que às vezes o homem quer colocar-se no lugar de Deus. O certo é que há várias tentativas de construir um espaço sem Deus, sem religião, sem valores; enfim, um mundo que se encaminharia à destruição por mãos do próprio homem. A pessoa humana é um ser maravilhoso, mas pode transformar-se num pobre desgraçado.
Não estou sendo pessimista se afirmo que se a vinha não está nas mãos de Deus, as uvas apodrecerão os dentes de quem as comer. Isto é, qualquer felicidade que deixa a Deus de fora é uma fantasia. Como poderia ser verdadeiramente feliz alguém que renuncia a algo que lhe é tão próprio como a dimensão religiosa da vida? Como pode alcançar a felicidade alguém que era escravo, foi libertado, mas não quer viver segundo aquilo que é tão próprio do seu ser: a liberdade? Como pode ser feliz alguém que opta por desprezar aquele que quer fazê-lo feliz dando-lhe a herança dos filhos?
Pe. Françoá Rodrigues Figueiredo Costa
Comentário Exegético - 27º Domingo do Tempo Comum
(Extraído do site Presbíteros)
EPÍSTOLA (Fl 4, 6-9)
(Pe. Ignácio, dos padres escolápios)
SEM ANSIEDADE: Nada vos perturbe, mas em toda oração e petição com ação de graças, vossos pedidos sejam conhecidos por Deus (6). Nihil solliciti sitis sed in omni oratione et obsecratione cum gratiarum actione petitiones vestrae innotescant apud Deum. Paulo escreve da prisão e, não obstante, a recomendação de alegria é própria desta carta. Por isso, termina a primeira parte pedindo: resta, irmãos meus, que vos regozijeis no Senhor (3, 1). A alegria cristã nasce de fontes mais profundas que as alegrias das categorias humanas. É um elemento, esta alegria, integrante da vida de um cristão, pois está formando parte das petições -fazendo sempre com alegria oração por vós em todas as minhas súplicas- e na iminência da morte Paulo tem uma palavra alegre: folgo e me regozijo com todos vós. São os amados e queridos, que constituem, como ele diz, minha alegria e coroa. Nesta carta, Paulo se preocupa de que todos vivam unidos; e para isso recomenda tanto as virtudes cristãs, com o exemplo da humildade de Cristo, como as virtudes humanas que enumera no versículo 8 deste trecho: verdade, honestidade, justiça, pureza. O cristão deve ser perfeito, de modo que os próprios pagãos estimem sua conduta como uma consequência de uma filosofia que nada tem a desejar da dos estóicos e cínicos do momento. Nada vos PERTURBE [merimnatelo<3309>=solliciti sitis] é o imperativo do verbo merimnö com o significado de ter ansiedade, estar preocupado, perturbado, como em Mt 6, 25: Por isso vos digo: Não andeis preocupados quanto à vossa vida, pelo que haveis de comer ou pelo que haveis de beber; nem quanto ao vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Entre as diversas recomendações, Paulo em primeiro lugar cita a oração, que não deve ser um pedido de bens materiais ou espirituais, mas antes uma ação de graças. ORAÇÃO [proseuchë <4335>=oratio] é a oração de petição como em Mt 17, 21: esta casta de demônios não se expulsa senão pela oração e pelo jejum. PETIÇÃO [deësis<1162>=obsecratio] com o significado de rogo, súplica, solicitação. O exemplo é Lc 1, 13: Mas o anjo lhe disse: Zacarias, não temas, porque a tua oração foi ouvida. Em grego, temos a simples oração [proseuchë] como ato de devoção e de religiosidade, súplica [deësis] como expressão de uma necessidade pessoal, que pode ser dirigida até a um homem; e finalmente, intercessão [enteuxis] que indica uma conversação filial do homem com Deus, como um filho com seu pai. Sai duas vezes em 1Tm 2.1.: Admoesto-te, pois, antes de tudo, que se façam deprecações [deëseis= obsecrationes], orações [proseuchas=orationes, intercessões [enteuxeis = postulatones], e ações de graças, por todos os homens. Na outra vez que enteuxis sai é em 1Tm 4,5 em que enteuxis está unida a palavra [logos] de Deus: Porque pela palavra de Deus e pela oração [enteusis] é santificada. PEDIDOS [aitëmata<156>=petitiones] em grego, uma demanda, uma solicitação, um pedido formal como em Lc 23, 24: Pilatos julgou que devia fazer o que eles demandavam.
A PAZ: E a paz de Deus a que supera todo entendimento, guardará vossos corações e vossas mentes em Cristo Jesus (7). Et pax Dei quae exsuperat omnem sensum custodiat corda vestra et intellegentias vestras in Christo Iesu. A PAZ [eirënë<1515>=pax] de Deus é diferente da paz humana. É a bênção divina que traz descanso, esperança de salvação e felicidade a quem se encontra nos braços de Deus como filho amado. Tudo provém de que Cristo é o príncipe da paz e com ela se identifica, pois justificados pela fé, estamos em paz com Deus por nosso Senhor Jesus Cristo (Rm 5, 1). GUARDARÁ [frourësei <5432> =custodiat] futuro de froreuö de significado proteger, guardar, conservar, reservar, manter, sustentar e, finalmente, preservar. Paulo usa este verbo em Gl 3, 23: Mas, antes que a fé viesse, estávamos guardados debaixo da lei, e encerrados para aquela fé que se havia de manifestar. O CORAÇÃO, [kardia<2588>=cordum] segundo o pensar da época era o centro da vida espiritual, fonte dos pensamentos, paixões, desejos, apetites, afetos, propósitos e empenhos. É o Leb do AT. A MENTE [noëma <3540>=intelligentia] a inteligência ou o pensamento. Paulo usa o termo em 2 Cor 3, 14 falando dos judeus: Eles tinham o entendimento fechado. Ainda hoje, quando leem os livros da antiga aliança, esse mesmo véu continua por levantar, pois só com Cristo é que ele desaparece. Diante desta última frase, entendemos que Paulo ensina como pela oração podemos descobrir o verdadeiro sentido da presença de Cristo em nossas vidas.
VALORES DESEJÁVEIS: Do resto, irmãos, quantas são verdade, quantas honestas, quantas justas, quantas puras, quantas agradáveis, quantas dignas de encômio, se algo virtuoso, se algo digno de louvor, essas coisas pensai (8). De cetero fratres quaecumque sunt vera quaecumque pudica quaecumque iusta quaecumque sancta quaecumque amabilia quaecumque bonae famae si qua virtus si qua laus haec cogitate. Uma vez firme a fé em Cristo Jesus, Paulo dirige sua doutrina aos valores humanos que devem adornar todo cristão, que por ser tal, não deixa de ser homem e viver entre os homens e como tal, dele se espera uma conduta irrepreensível. O que é VERDADEIRO [alethë<227>=vera] embora o grego use o plural neutro que o latim respeita, nas línguas vernáculas é melhor usar o singular. Assim diremos: tudo o que é verdadeiro. RESPEITÁVEL [semna <4586> =pudica] coisas dignas, honoráveis, dignas de respeito. JUSTO [dikaia<1342>iusta] também em plural, como coisas conformes à lei. SEM IMPUREZA [agna<53>=sancta] ou limpas e puras. AGRADÁVEL [prosfilë<4375>=amabilia] coisas agradáveis ou amáveis, DIGNO DE APLAUSO [eufëma<2163>=bonae famae] dignas de aprovação, de boa fama. Se existe alguma VIRTUDE [aretë<703>=virtus] no sentido bíblico, poder divino; no sentido humano, conduta excelente que chamamos hoje de virtude. Se alguma coisa é LOUVÁVEL [epainos<1868>=laus] plausível, reconhecível como digna de aplauso. PENSAI [logisesthe<3049>=cogitate] imperativo do verbo logizomai, de significado considerar, avaliar, se propor, intentar, almejar. Paulo, no contato com o mundo, escolhe a verdade e o bem que claramente dominam a conduta da maioria dos homens.
A TRADIÇÃO: As que também aprendestes e recebestes e ouvistes e vistes em mim, essas praticai e o Deus da paz estará convosco (9). Quae et didicistis et accepistis et audistis et vidistis in me haec agite et Deus pacis erit vobiscum. Paulo agora propõe como modelo de vida os seus ensinamentos –aprendestes, recebestes e ouvistes – e a sua conduta pessoal – vistes. APRENDESTES [emathete<3129>=didicistis] do verbo manthanö com o significado de aprender. RECEBESTES [parelabete<3880>=accepistis] é o receber da tradição, transmitido oralmente, como indica pelo OUVISTES [ëkousate<194>=audistis] aoristo do verbo akouö, ouvir. Essas palavras indicam a força da tradição que a Igreja Católica sempre tem proposto como acompanhante da escrita bíblica que é interpretada essencialmente por essa tradição como fonte da exegese da Escritura. Finalmente Paulo apresenta sua vida como modelo, escrevendo VISTES [<eidete>=vidistes] EM MIM. Oxalá todo evangelizador pudesse apresentar sua vida como modelo a ser seguido pelos evangelizados! Não é a primeira vez que Paulo se propõe como modelo. Ver Fl 3, 17: Sede também meus imitadores, irmãos, e tende cuidado, segundo o exemplo que tendes em nós, pelos que assim andam A consequência é que se isso é praticado, o Deus da paz estará com eles. DEUS DA PAZ [‘o Theos tës eirënës] é uma frase que Paulo usa como saudação final em suas cartas. Assim em Rm 15, 33 e 16, 20, 2 Cor 13, 11 e 1 Ts 5, 23. Em 1 Cor 14, 33 podemos ver uma explicação desta frase paulina: Porque Deus não é Deus de confusão, senão de paz, como em todas as igrejas dos santos. Paulo estima a união dos fiéis como um fato extremamente importante, como Jesus pedia ao Pai: E eu já não estou mais no mundo, mas eles estão no mundo, e eu vou para Ti. Pai santo guarda em teu nome aqueles que me deste, para que sejam um, assim como nós (Jo 17, 11). Seguindo, pois, os ensinamentos de Paulo e imitando sua conduta, haverá entre os filipenses união e paz, que Paulo deseja de todo o coração.
EVANGELHO (Mc 12, 1-12; Lc 20, 9-19)
OS ARRENDATÁRIOS INDIGNOS
INTRODUÇÃO: É a terceira parábola de Jesus dirigida contra os representantes da autoridade em Israel (Mt 20, 1-16 [dos trabalhadores da vinha]; 21, 28-32 [dos dois filhos] e 21, 33-43 [esta de hoje]). Na parábola de hoje, com alguns momentos de alegoria, podemos distinguir a razão pela qual foi retirado o Reino aos judeus. Encontramos nela, Jesus como a pedra angular do novo edifício, que será o próximo Reino. Também o particular conceito eclesiológico de Mateus, refletido no versículo 43: o Reino deve dar frutos como a vinha da parábola; do contrário, os dirigentes do mesmo serão reprovados. Daí o traspasso do Reino de Deus como nação escolhida, a um novo povo que, no caso, serão os gentios. A Nova Igreja não terá como fundador Moisés, mas Jesus, que é constituído pedra angular como remate do edifício. A parábola tem rasgos alegóricos e conecta com o canto da vinha da primeira leitura. Esta parábola dos vinhateiros homicidas constitui um compêndio da história da salvação desde a Aliança do Sinai até a pessoa de Cristo, o Filho assassinado pelos arrendatários homicidas fora da cidade. E a vinha que representava o antigo Israel, agora significa o novo Israel, a igreja como Reino de Deus.
OUTRA PARÁBOLA: Escutai outra parábola. Certo homem era dono da casa, que plantou uma vinha e a rodeou com uma cerca e cavou nela um lagar e edificou uma torre e a arrendou a agricultores e ausentou-se (33). aliam parabolam audite homo erat pater familias qui plantavit vineam et sepem circumdedit ei et fodit in ea torcular et aedificavit turrem et locavit eam agricolis et peregre profectus est. OIKODESPOTËS Mateus fala de um homem que era OIKODESPOTËS, ou seja, dono da casa ou como traduz o latim pater famílias; a bíblia de Jerusalém traduz por proprietário. Marcos e Lucas, em lugares paralelos só falam de um certo homem. Nas vezes que esta palavra aparece sempre é para se referir a um chefe de família que tem bens e pode usar os serviços de servos ou empregados. Um verdadeiro proprietário duma casa e de bens que exigem o serviço de empregados. A VINHA: A palavra AMPELON é traduzida por vinha, mas hoje dificilmente entendemos o verdadeiro significado da palavra. Como vemos nos relatos de Marcos e Mateus, o trabalho não se reduzia a plantar, mas também era o de construir uma cerca ou muro, o lagar e a torre de vigilância. Parece que isto não era infrequente na época, pois a vinha era com os olivais, a base da economia de mercado na época. Em Isaías (5, 10), falando da infertilidade da terra por castigo divino, temos: dez jeiras [espaço de terra que uma junta de bois pode arar num dia] da vinha produzirão 45 litros de vinho [uma metreta]. E um coro [450 litros] de sementes só dá um efá [45]. As vinhas eram mais produtivas que os campos de cereais de trigo e cevada. A vinha era símbolo do povo de Israel, cuidado com esmero por Jahweh como vemos no salmo 80, 9: Arrancaste uma vinha do Egito e para transplantá-la expulsaste as nações. Isaías 3, 14, fala dos dirigentes de Israel como sendo não guardadores, mas devastadores da vinha: Vós sois os que consumistes esta vinha; o que roubastes do pobre está em vossa casa. Mas muito mais que essas anteriores citações é importante o início do capítulo V de Isaías, que diz: Vou cantar a meu amado o cântico do meu amigo para a sua vinha. O meu amado tinha uma vinha em uma encosta fértil. Ele cavou-a, removeu a pedra e plantou nela uma vinha de uvas vermelhas. No meio delas construiu uma torre e cavou um lagar. Com isso, esperava que ela produzisse uvas boas, mas só produziu uvas azedas. Agora, ó moradores de Jerusalém e homens de Judá, servi de juízes entre mim e minha vinha. Que me restava ainda fazer à minha vinha que eu não tenha feito? Por que quando eu esperava que ela desse uvas boas, deu apenas uvas azedas? Agora vos farei saber o que vou fazer de minha vinha! Arrancarei a sua cerca para que sirva de pasto. Derrubarei o seu muro para que seja pisada; reduzi-la-ei a um matagal: ela não será mais podada, nem cavada: espinheiros e ervas daninha crescerão no meio dela. Quanto às nuvens, ordenar-lhes-ei que não derramem a sua chuva sobre ela. Pois bem, a vinha de Jahweh dos Exércitos é a casa de Israel, e os homens de Judá são a sua plantação preciosa. Deles esperava o direito, mas o que produziram foi a transgressão; esperava a justiça, mas o que apareceu foram gritos de desespero. (5,1-7).
O FRUTO: Quando, pois, se aproximou o tempo dos frutos enviou seus escravos aos agricultores para receberem seus frutos (34). Cum autem tempus fructuum adpropinquasset misit servos suos ad agricolas ut acciperent fructus eius. Na vida real, o fruto era recolhido pelo proprietário em dinheiro, após a vindima. Temos o relato de um dono que enviou seu servo para recolher mil denários de uma vinha. A vinha tem como base as vides ou videiras, que são plantas lenhosas e, portanto, muito perduráveis de até 100 anos. Uma nova videira precisa de 3 a 4 anos para dar frutos. Por isso, segundo a lei (Lv 19, 23-25), os frutos dos três primeiros anos serão considerados como frutos de um incircunciso e os frutos do quarto ano serão entregues como primícias, como sagrados, numa festa de louvor a Jahweh. No inverno ela deve ser adubada e também no início da floração deve ser podada tirando sarmentos velhos para não carregar o tronco ou cepa com incrementos que produziriam galhos menos produtivos. Entre os brotos de primavera estão as gemas e filamentos que são apreciados pelo gado caprino e até pelos humanos, como comida esquisita. Os sarmentos são úteis, do ponto de vista de lenha, para um fogo sem fumo e com bastante intensidade calórica. Regiões existem onde esta maneira de fazer churrascos ou assar pimentões é tradicional em terras em que as vinhas constituem cultivos normais. As traduções vernáculas falam de servos [do latim servi], mas o grego douloi deve ser traduzido por escravos, como faz a literal de Green. A espanhola fala de criados. Mas, no tempo de Jesus, os criados das casas ricas eram escravos. Sendo os enviados escravos compreende-se melhor, embora seja injusta, a conduta dos arrendatários.
OS ENVIOS: E os agricultores tendo tomado os escravos dele, a um espancaram e a outro mataram e a outro apedrejaram (35). Et agricolae adprehensis servis eius alium ceciderunt alium occiderunt alium vero lapidaverunt. PRIMEIRO ENVIO: Chegada a hora da colheita, enviou seus escravos [doulos] para receberem os frutos que lhe correspondiam. Os lavradores, agarrando os servos, espancaram um, mataram outro e o terceiro apedrejaram (Mt 34-35). Porém, tanto Marcos (3) como Lucas (10) reduzem o número a um só servo, que foi espancado e despachado vazio. É este um lugar em que Mateus, nem sempre estritamente histórico especialmente nas parábolas, enriquece os ditos de Jesus para transformar a parábola numa alegoria mais em conformidade com os fatos históricos do passado? Como explicarmos essas diferenças que não são essenciais e não mudam a parábola quod ad sensum? Não existe inconveniente num relato em que a ideia central é mantida e até reforçada para melhor entendimento dos leitores. Mas estas diferenças devem ter uma correspondente razão nos escritos dos outros evangelistas. E encontrar a razão dessas diferenças é evidentemente exegese verdadeira. Mas dizer sem motivo que uma narração é trabalho do evangelista e não pertence aos fatos ou ditos de Jesus só porque não concorda com nosso modo ideológico de pensar, isso não é método histórico nem rigor exegético.
SEGUNDO ENVIO: De novo, enviou outros escravos em maior número dos primeiros, e lhes fizeram de modo semelhante (36). Iterum misit alios servos plures prioribus et fecerunt illis similiter. Outros escravos, em maior número, foram tratados do mesmo modo (Mt 36). De novo (Mc), ou em vista disso (Lc) enviou-lhes outro escravo ao qual esbordoaram na cabeça, e insultaram (Mc 4), ou segundo Lucas (11), o espancaram e insultando-o o enviaram vazio.
TERCEIRO ENVIO: Mais tarde, enviou-lhes o seu filho, dizendo: respeitarão meu filho (37). Porém os agricultores, tendo visto o filho, disseram entre eles: este é o herdeiro. Vamos, matemo-lo e possuiremos a herdade dele (38). E, tendo o agarrado, jogaram fora da vinha e o mataram (39). Novissime autem misit ad eos filium suum dicens verebuntur filium meum. Agricolae autem videntes filium dixerunt intra se hic est heres venite occidamus eum et habebimus hereditatem eius, et adprehensum eum eiecerunt extra vineam et occiderunt. Marcos dirá que o terceiro envio foi depois de outros muitos, e a uns espancaram e a outros mataram (12, 5). Lucas limita o número do terceiro a um só indivíduo (20, 17) e eles, após feri-lo, o arrojaram. Como vemos, não existe uma ordem clara nos envios e nos tratamentos dos servos pelos arrendatários. É o que parece ser produto da redação dos diversos evangelistas que tinham um respeito supremo pelas palavras diretas de Jesus, mas que sabiam que era impossível recordar os detalhes das parábolas que eles ordenavam segundo normas de redação mais conformes às suas maneiras de relatá-las. A moderna edição da bíblia de King James distingue perfeitamente as palavras de Jesus em vermelho, da redação do evangelho em letra negra comum. Se esta interpretação vale para as introduções como egeneto [sucedeu] de Lucas, ou levantou-se e disse de Mateus, podemos sem dúvida ampliar a redação para parágrafos que nada dizem à essência do evangelho. ALEGORIA DOS SERVOS-ESCRAVOS? Já falamos no comentário do domingo XXIV como os administradores eram em geral escravos domésticos. Como a parábola tem elementos alegóricos, fundados precisamente no parágrafo anterior, sabemos que a vinha representa o povo de Israel, que o dono da vinha é Javé-Deus e que os arrendatários eram os dirigentes do povo, especialmente os religiosos. Logo os servos são evidentemente os profetas. De fato, os judeus distinguiam entre antigos profetas como Moisés, Josué, Juízes, Samuel, Davi e os profetas compreendidos no reinado de Davi; e os últimos profetas, a começar por Isaías e terminar com Malaquias. Isso poderia explicar as duas levas de douloi [escravos] da parábola, segundo Mateus. A primeira antes do exílio (586 a.C.) e a segunda, após o mesmo (539 a.C.). De fato, sabemos que muitos dos profetas foram rejeitados e até perseguidos pelos reis, tanto de Israel como de Judá. Elias teve que fugir por sua vida (1 Rs 19, 3), e lemos de Jeremias que provavelmente, após ser jogado numa cisterna, foi levado ao Egito para morrer lá, segundo alguns, de modo discutível (Jr 43,1-7). Temos Miqueias que foi esbofeteado por Sedecias falso profeta (2 Cr 18, 23). Alguns dos profetas foram mortos à espada como vemos em 1Rs 19, 14 ou Dn 111, 33. Finalmente temos Zacarias que foi apedrejado no pátio do templo segundo 2 Cr 24, 21 por ordem do rei Joás. Vemos como a palavra profeta tem um sentido muito mais amplo que o do enviado diretamente por Deus: é o sentido do justo, do santo, diríamos nós. Temos também dois textos de Jesus sobre a sorte dos profetas nas mãos dos antigos dirigentes de Israel: vós que sois filhos dos que mataram os profetas (Mt 23, 31) ou na lamentação de Jesus em Mt 23, 37 sobre Jerusalém que matas os profetas e apedrejas os que te são enviados; por isso, pedirão contas do sangue de todos os profetas …do sangue de Abel até o sangue de Zacarias que pereceu entre o altar e o santuário (Lc 11, 50-51). E em Hebreus 11, 36-37: escárnios, açoites, prisões, lapidações, serramentos e mortes com a espada. O FILHO (37-39): Após a terceira leva inútil, o dono da vinha apela para a distinção e excelência do filho. Não era um escravo comum, mas o filho único, o herdeiro. Mateus só fala do filho, mas Marcos (6) e Lucas (13) falam do filho amado ou o amado, que logicamente indica o herdeiro. Mesmo que Mateus só fala do filho sabemos, com certeza, que era único porque os agricultores falam de matá-lo para herdar a propriedade. Isto era lógico já que não tendo herdeiros diretos, segundo a lei, os bens pertenciam aos que cultivavam os mesmos, quando faltasse o dono. Foi o caso de Abraão que, ao não ter filhos, disse ao Senhor que um dos servos de minha casa será meu herdeiro (Gn 15, 3). Era o uso capientis. Eles se apoderam do filho herdeiro, o expulsam da vinha como se não fosse sua propriedade, e o matam fora dela. Em Marcos o crime é ainda mais repugnante; pois, morto dentro da vinha, o cadáver é lançado fora aparentemente sem sepultá-lo, o que constituía, segundo os costumes da época, um ato de maldição, porque os cadáveres insepultos se deixavam propositadamente para serem comida de cães e aves de rapina. Assim vemos na maldição de Elias sobre a casa de Acab (1 Rs 21, 24). Por isso, Tobias arrisca sua vida para enterrar os mortos de Israel (2, 7). Além disso, um cadáver tornava impuro o lugar e isso impedia se aproveitar dos frutos da vinha. Tomando esta passagem como alegórica, vemos como Jesus foi morto fora dos muros de Jerusalém, que precisamente era, segundo os profetas, a vinha particularmente amada de Jahveh, como vemos em Isaías 5, 3.
PERGUNTA E RESPOSTA (40-41): Portanto, quando vier o dono da vinha que fará àqueles agricultores? (40). Disseram-lhe: De modo ignominioso os destruirá e arrendará a vinha a outros agricultores os quais lhe entregarão os frutos nos seus tempos próprios (41). Cum ergo venerit dominus vineae quid faciet agricolis illis. Aiunt illi malos male perdet et vineam locabit aliis agricolis qui reddant ei fructum temporibus suis. Que vos parece? (21, 28) Está dirigida aos chefes dos sacerdotes e aos anciãos do povo (21, 23). E agora também pergunta aos mesmos que irá fazer o dono com esses vinhateiros? (40). Logicamente a resposta não podia ser outra, dadas as leis do olho por olho do tempo: Destruirá de maneira ignominiosa esses infames e arrendará a vinha a outros vinhateiros que entregarão os frutos no tempo devido (41). Marcos dirá que o dono virá e destruirá os vinhateiros para dar a vinha a outros. Em Lucas é o próprio Jesus que responde a si mesmo usando as palavras de Marcos (16). Ante esta proposição de Jesus os ouvintes exclamaram: Não seja [assim] (16). Isso indica que eles entenderam muito bem o significado oculto da parábola. Nesta conclusão há duas proposições que podemos considerar como complementares: a destruição dos assassinos e a entrega da vinha a outros arrendatários que sirvam melhor aos propósitos do dono, que são, em definitivo, obter os frutos devidos de sua propriedade.
O COMENTÁRIO DE JESUS (42-43): Diz-lhes Jesus: Nunca leste nas Escrituras: (A) pedra que os construtores rejeitaram, esta se tornou em cabeça de ângulo; da parte de (o) Senhor foi feita e é admirável aos nossos olhos? (42). Por isso, vos digo que será arrebatado de vós o Reino d(o) Deus e será dado a uma nação que produza os frutos dele. Dicit illis Iesus numquam legistis in scripturis lapidem quem reprobaverunt aedificantes hic factus est in caput anguli a Domino factum est istud et est mirabile in oculis nostris. Ideo dico vobis quia auferetur a vobis regnum Dei et dabitur genti facienti fructus eius. Marcos traz a sentença íntegra que em Lucas é mais breve. Que significa CABEÇA DE ÂNGULO? Os três evangelistas falam com o mesmo termo cabeça de ângulo [Kefalê gonias]. Vejamos os dois textos do AT. Salmo 144, 12: Que nossos filhos sejam na sua mocidade como plantas viçosas e nossas filhas como pedras angulares lavradas como colunas de palácio. E o Salmo 118,22: A pedra que os construtores rejeitaram, essa veio a ser a principal pedra angular. Isto procede do Senhor e é maravilhoso aos nossos olhos. Como vemos até palavra por palavra os dois textos gregos coincidem. Que era a pedra cabeça de ângulo? Provavelmente havia uma pedra para cada um dos quatro ângulos da casa sobre os alicerces da mesma. Daí a principal [uma das quatro]. As quatro eram escolhidas e lavradas [como colunas Sl 14, 12] para dirigir toda a obra desde o início, como balizas da mesma. Delas, poderiam se tirar as cordas de alinhamento para a construção. Jeremias profetiza uma tal destruição de Jerusalém que dela não se poderiam tirar pedras nem para o ângulo nem para os fundamentos (52, 26). Parece que o resto da casa era de material que podemos chamar tipo argamassa. Por isso as pedras angulares eram especialmente lavradas e escolhidas, pesadas e especialmente desenhadas. Isaías 28, 16 diz: Eis que firmo em Sião uma pedra, uma pedra a toda prova, uma pedra angular preciosa, estabelecida para sua fundação. No NT temos textos sobre esta pedra base. At 4, 11: Ele (Jesus) é a pedra rejeitada por vós, os construtores, mas que se tornou a pedra angular. E 1 Pd 2, 6: Eis que ponho em Sião uma pedra angular [akrogöniaion], eleita e preciosa: quem nela crê não será confundido. Os judeus sabiam que na construção das sinagogas, casas de pedra, havia diferença em relação a construção das casas comuns de adobes. No entanto, existiam duas pedras importantes: uma era a que ocupava o ângulo da edificação nos fundamentos e era a que servia de base para a construção. A outra era a pedra remate do arco de entrada do edifício. O salmo 118 fala de Israel que como povo foi desprezado, oprimido e quase aniquilado pelos povos e reis pagãos, mas que foi escolhido por Deus como base das promessas messiânicas. Como vemos em Atos e na carta de Pedro a pedra angular é a pedra sobre a qual todo o edifício era planificado. Paulo fala de que o único fundamento é Jesus Cristo (1 Cor 3, 11). Os judeus costumavam chamar seus rabis e doutores de construtores, porque eles estudavam continuamente os fundamentos do mundo que era a lei. Quem é a pedra rejeitada pelos construtores em tempos de Jesus? Evidentemente é ele mesmo. O costume do mestre da construção de revisar as pedras e aceitar, ou rejeitar as mesmas, está na frase de Pedro em At 4, 11 que temos citado acima. Como afirmava Lucas por meio da palavra profética de Simeão seria alvo de contradição (Lc 2, 34). Por isso, o mesmo evangelista registra um parágrafo próprio dele que diz: Quem tropeçar nessa pedra ficará quebrado e sobre quem cair essa pedra será esmagado. Por esta última frase alguns comentaristas falam da pedra angular como sendo a pedra remate superior do arco da entrada. Porém podemos explicar o fato da pedra cair porque aqui estamos dentro de uma linguagem metafórica em que não devemos abranger como realistas todos os requisitos da comparação. A TRANSFERÊNCIA: O reino, que era a grande promessa de Israel, será arrebatado dos dirigentes do povo e será dado a uma nação que produza os frutos esperados. Qual é a nova nação? Evidentemente, pela História, devemos pensar em Roma. E os frutos é a aceitação de Jesus como o novo Senhor. É uma profecia que, em tempos dos escritos evangélicos, ainda não podia ser confirmada. Somente com o Imperador Teodósio (379-394) o cristianismo foi declarado religião do Estado. A separação entre o Cristianismo e o Judaísmo, efetivada teologicamente em 325 no Primeiro Concílio de Niceia, era agora lei (388) sob os imperadores romanos.
REFLEXÃO:
1) Qual foi a razão última pela qual os dirigentes de Israel não entraram no novo Reino como povo escolhido? Diríamos que a razão imediata era o seu interesse material na religião que a transformava numa fonte de rendas e, portanto, numa visão espúria da espiritualidade religiosa.
2) Em segundo lugar, seu orgulho que não permitia que alguém interpretasse a lei de modo diferente do seu. Segundo sua interpretação, os pobres estavam longe de Deus, considerando a pobreza como uma espécie de rejeição e castigo divinos, como era interpretada a doença. Quem pecou, este ou os pais para nascer cego? Perguntarão os discípulos (Jo 9,2). Do mesmo modo, a pobreza era considerada como o pior dos castigos divinos e a riqueza como o melhor dos benefícios. Nós vemos no evangelho uma clara alusão a esta cosmovisão, quando, após Jesus declarar que um rico dificilmente entrará no Reino dos céus, a pergunta dos discípulos será de um desânimo total: Então quem poderá se salvar? (Mt 19,25). A doutrina de Jesus devia escandalizar os legistas e peritos da lei, quando em suas bemaventuranças declara o Reino como herança dos pobres.
3) Com respeito à razão última, é Paulo quem o explica na sua epístola aos romanos: Tanto judeus como gentios se tornaram pecadores. Na frase de Paulo estão sob o império do pecado (9,13). Mas Deus, gratuitamente pela fé em Cristo, salva o homem; porque se a lei veio para que proliferasse a falta, porém onde proliferou o pecado superabundou a graça (5,21). E logicamente a graça foi maior ao admitir os pagãos ao Reino.
4) Podemos perguntar: e nós? Qual é a razão para que o Reino não seja o valor principal – o tesouro, a pérola – em nossas vidas? Cada um de nós poderá dar uma resposta particular, mas existe uma geral e comum nos tempos modernos: o estado de bem-estar, confundido com a felicidade final, que nos transforma em verdadeiros ricos, num mundo de quase absoluta pobreza espiritual. E no lugar das bemaventuranças, dirigidas aos pobres, aos que sofrem, aos que choram, aos que são perseguidos, encontramos as censuras de Jesus que atingem os ricos, os fartos, os que aparentemente são felizes.
EXCURSUS: NORMAS DA INTERPRETAÇÃO EVANGÉLICA
A interpretação deve ser fácil, tirada do que é o evangelho: boa nova.
- Os evangelhos são uma condescendência, um beneplácito, uma gratuidade, um amor misericordioso de Deus para com os homens. Presença amorosa e gratuita de Deus na vida humana.
- Jesus é a face do Deus misericordioso que busca o pecador, que o acolhe e que não se importa com a moralidade ou com a ética humana, mas quer mostrar sua condescendência e beneplácito, como os anjos cantavam e os pastores ouviram no dia de natal: é o Deus da eudokias, dos homens a quem ele quer bem e quer salvar, porque os ama.
Interpretação errada do evangelho:
- Um chamado à ética e à moral em que se pede ao homem mais que uma predisposição, uma série de qualidades para poder ser amado por Deus.
- Só os bons se salvam. Como se Deus não pudesse salvar a quem quiser (Fará destas pedras filhos de Abraão).
Consequências:
- O evangelho é um apelo para que o homem descubra a face misericordiosa de Deus [=Cristo] e se entregue de um modo confiante e total nos braços do Pai como filho que é amado.
- O olhar com a lente da ética, transforma o homem num escravo ou jornaleiro:aquele age pelo temor, este pelo prêmio.
- O olhar com a lente da misericórdia, transforma o homem num filho que atua pelo amor.
- O pai ama o filho independentemente deste se mostrar bom ou mau. Só porque ele é seu filho e deve amá-lo e cuidar dele.
- Só através desta ótica ou lente é que encontraremos nos evangelhos a mensagem do Pai e com ela a alegria da boa nova e a esperança de um feliz encontro definitivo. Porque sabemos que estamos na mira de um Pai que nos ama de modo infinito por cima de qualquer fragilidade humana.
CAMPANHA DA VELA VIRTUAL DO SANTUÁRIO DE APARECIDA
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QUE DEUS ABENÇOE A TODOS NÓS!
Oh! meu Jesus, perdoai-nos, livrai-nos do fogo do inferno,
levai as almas todas para o céu e socorrei principalmente
as que mais precisarem!
Graças e louvores se dê a todo momento:
ao Santíssimo e Diviníssimo Sacramento!
Mensagem:
"O Senhor é meu pastor, nada me faltará!"
"O bem mais precioso que temos é o dia de hoje! Este é o dia que nos fez o Senhor Deus! Regozijemo-nos e alegremo-nos nele!".
( Salmos )
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