GOTAS DE REFLEXÃO - EVANGELHO DOMINICAL
Ambientação:
Sejam bem-vindos amados irmãos e irmãs! Entre todas as orientações que o Concílio Vaticano II encaminhou ou pôs em relevo, uma das mais importantes e significativas é sem dúvida o apelo à unidade fundamental da família humana. Visando o universalismo, os povos caminharão à luz de Cristo e há sempre uma estrela no céu. Celebramos hoje a salvação de todos os povos na manifestação de Jesus como Rei universal. Inspirados na interpretação que fizeram os Padres da Igreja, ofereçamos ao Menino de Belém o ouro da nossa fé, em reconhecimento à sua realeza; o incenso da nossa esperança, em adoração a Ele como nosso Deus; e a mirra do nosso amor, em reconhecimento ao seu mistério pascal, que culminou com a sua morte redentora na cruz. Sintamos o júbilo real de Deus em nossos corações e cheios dessa alegria divina entoemos cânticos jubilosos ao Senhor!
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PRIMEIRA LEITURA (Is 60,1-6): - "Levanta-te, acende as luzes, Jerusalém, porque chegou a tua luz, apareceu sobre ti a glória do Senhor."
SALMO RESPONSORIAL 71(72): - "Eis que vem o Senhor Soberano, tendo em suas mãos poder e glória."
SEGUNDA LEITURA (Ef 3,2-3a.5-6): - "os pagãos são admitidos à mesma herança, são membros do corpo, são associados à mesma promessa em Jesus Cristo"
EVANGELHO (Mt 2,1-12): - "Quando entraram na casa, viram o menino com Maria, sua mãe. Ajoelharam-se diante dele, e o adoraram. Depois abriram seus cofres e lhe ofereceram presentes: ouro, incenso e mirra."
Homilia do Diácono José da Cruz – Solenidade da Epifania do Senhor
"Ao verem a estrela, os magos sentiram uma grande alegria!"
A visão que os astronautas tiveram do espaço sideral foi a mesma, mas cada um reagiu de maneira diferente, afirma uma revista científica, que um russo, ao chegar ao espaço e contemplar os planetas, entre eles a terra como uma bola azul, teria afirmado em seu retorno “estive tão alto e não vi deus algum”, ao contrário de um americano que ao contemplar a beleza da criação presente nas estrelas, planetas e na imensidão do universo, confessou emocionado que diante dessa beleza, é impossível não se perceber a presença de uma força Criadora, que só pode ser Divina.
O mesmo sinal alegrou a um, porque o convenceu da existência de Deus, enquanto que ao outro, deus estava ausente de tudo isso.
Desde que o mundo é mundo, e o primeiro homem pisou nessa terra, Deus se revelou e continua a se revelar através de sinais, convidando cada ser humano a fazer a experiência da fé, porém, cada homem reage diferente. Nesse evangelho segundo São Mateus, na festa da epifania, podemos perceber nitidamente duas reações diferentes diante do Deus que se revela, o rei Herodes e sua corte, que tinham informações precisas sobre o acontecimento, longe de se alegrarem, ficaram perturbados diante do nascimento de um novo rei, já os Magos, ao verem a estrela, encheram-se de alegria e puseram-se a caminho, atraídos pela luz.
Assim, em nossa vida, podemos também nos deixar mover pela fé, fazendo de Jesus o sentido maior, único e verdadeiro da nossa existência, ou podemos então ignora-lo e ficarmos a vida inteira estacionados no limite da nossa lógica humana. A explicação dos sábios da corte, de que o grande rei teria nascido em Belém, deve ter provocado uma gargalhada em geral, pois Belém era apenas uma referência histórica por causa do Rei Davi, porque na realidade era um vilarejo de pastores, periferia da periferia.
A novidade na economia ou na política, só pode acontecer em Brasília ou nas grandes metrópoles brasileiras, onde está o poder político e econômico, uma viagem em busca de algo realmente importante, e que signifique mudanças na vida do povo, como o nascimento de um grande líder, só pode no sentido periferia – centro, e não o contrário. Em se tratando do messias, que era um tema religioso e político ao mesmo tempo, Jerusalém seria o palco das atenções, e não a pequenina e desprezível Belém.
As estruturas poderosas do mundo têm conhecimento e informações importantes sobre o nascimento do menino, porém, os poderosos não se movem pela fé, mas sim pelo poder e pelo interesse político e econômico. Quando os magos buscam informações no palácio de Herodes, só encontram mentira, hipocrisia e falsidade, dos que conheciam a verdade das profecias.
Quando retomam o caminho de Belém, a estrela reaparece no céu, sinalizando que estão na direção certa, oOs interesses escusos dos poderosos, motivados pelo egoísmo, não deixam o homem enxergar o sinal de Deus onipresente. O palácio do grande rei Herodes multiplicou-se pelo mundo inteiro e para eles, Deus é um perigoso concorrente, porém, para pessoas como os Magos, que se movem pela fé, Deus é causa de sua alegria e a razão primeira de sua vida. A força e a salvação que vem de Deus, nos leva a dar a ele o melhor que temos por isso os magos abriram seus cofres, ensinando-nos assim que devemos abrir nossos corações.
A Igreja é o Sacramento da Salvação para toda a humanidade, sua missão ao evangelizar é conduzir todo homem para Deus, como a estrela guiou os magos do oriente. Perguntemo-nos então, se o nosso modo de viver como cristãos em comunidade, tem ajudado as pessoas a buscarem a Jesus e a fazerem experiência dele em suas vidas. Será que algumas vezes a “corte do rei Herodes” não nos atrai mais do que a manjedoura?
José da Cruz é Diácono da
Paróquia Nossa
Senhora Consolata – Votorantim – SP
E-mail jotacruz3051@gmail.com
Homilia do Padre Françoá Rodrigues Costa – Solenidade da Epifania do Senhor
“Viemos adorá-lo!”
A epifania é a manifestação de Cristo aos povos pagãos representados nos magos do Oriente que vieram visitá-lo e adorá-lo em Belém. Todos nós sabemos que Deus “deseja que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade” (1 Tm 2,4). Todos são chamados à salvação, à santidade, à felicidade eterna.
Há muitas pessoas bem intencionadas que, ainda que não conheçam Jesus Cristo, no fundo gostariam de conhecê-lo. Nós, os cristãos, devemos ser os instrumentos eficazes nas mãos de Deus para dá-lo a conhecer e para fazê-lo amado entre os homens e as mulheres deste mundo. Hoje em dia, como outrora, muitos fazem a seguinte pergunta: “Onde está o rei dos judeus que acaba de nascer? Vimos a sua estrela no oriente e viemos adorá-lo” (Mt 2,2). O que responder?
Onde está Deus? O cristão tem que saber a resposta a essa pergunta para apresentá-la aos seus semelhantes. Mas um cristão que não procura estar perto de Deus através da oração, dos sacramentos e da caridade, não poderá dar a resposta certa. Muitos seres humanos continuam tateando na escuridão com uma pequena lanterna pendurada na mão e com uma tênue luz, a da consciência; esta é a luz que não os deixa apagarem-se completamente em meio a tantos ventos fortes das propagandas enganosas. Essas pessoas perguntam a si mesmas e aos que passam ao seu lado: onde está Deus?
Infelizmente e frequentemente percebe-se o silêncio dos cristãos omissos que não são capazes de intuir essas necessidades mais profundas das almas imortais que se encontram em composição com os corpos destinados à decomposição, mas também à ressurreição. Será que esses cristãos continuam vendo a estrela, que é Cristo? Será que eles não se “mundanizaram”? Por exemplo: frequentemente fala-se muito de justiça social, e isso é muito importante, mas deve-se falar em primeiro lugar da justificação, da graça, de Deus, do Reino eterno. Não podemos perder a nossa perspectiva autenticamente cristã que, logicamente, repercute neste mundo fazendo-o mais justo e solidário. Assim como quem fica exposto ao sol se aquece, de maneira semelhante quem se expõe diante de Deus também se esquenta e acende o mundo ao seu entorno.
Os pagãos desejavam adorar o Senhor. Afirmam-no categoricamente: “viemos adorá-lo!” Até quando permaneceremos na nossa letargia sem dar-nos conta desse desejo mais profundo de todo coração humano: encontrar-se com o seu Criador e prestar-lhe homenagem?
Sigamos o conselho de São Leão Magno: “deveis empenhar-vos em ser úteis uns aos outros, para que no reino de Deus, onde se entra graças à integridade da fé e às boas obras, resplandeçais como filhos da luz”. Ajudemo-nos mutuamente para não perdermos o sentido de Deus, do sagrado e do ser humano à luz de Deus. Que nada nem ninguém venham a ofuscar a nossa visão clara das coisas deste mundo sob o prisma da luz de Deus. Desta maneira, não nos esqueceremos do desejo mais profundo dos homens e das mulheres que encontraremos diariamente: felicidade! E só se pode ser feliz com Deus.
Adorar! Nós devemos ser os primeiros a prostrarmo-nos diante do Deus Criador, Redentor e Santificador dos seres humanos. Não podemos perder a dimensão de adoração no cristianismo. Para uma pessoa que entendeu isso, dá pena ver como em alguns ambientes se trata a eucaristia, o grande dom atual de Deus aos homens! Dá pena observar algumas celebrações eucarísticas: sem zelo e sem a observação das prescrições da Igreja para a correta celebração da santa missa, por parte dos ministros de Cristo; entre conversinhas e atendimentos de celulares, por parte de muitos fiéis que participam do santo sacrifício da missa. Desta maneira, não poderíamos apontar a adoração como momento de encontro com Deus! Eles, os que não conhecem a Deus explicitamente, desejariam conhecê-lo e adorá-lo. Mas, nós que o conhecemos… Será que o conhecemos mesmo?
Pe. Françoá Rodrigues Figueiredo Costa
Texto Especial - Dogmática / Doutrina
(Extraído do site Presbíteros - Elaborado pelo Pe. Ignácio, dos padres escolápios)
A Sagrada Escritura e a Sagrada Tradição
A Igreja sempre considerou as Sagradas Escrituras, e continua a considerar, juntamente com a Sagrada Tradição, como regra suprema da sua fé[1].
Uma só fonte da Revelação
Há uma íntima conexão entre a Sagrada Escritura e a Sagrada Tradição da Igreja, já que ambas brotam do único manancial divino, têm idêntico objetivo e tendem ao mesmo fim[2].
Dentro de uma correta interpretação, podemos dizer, sem receio de errar, que a Sagrada Escritura contém toda verdade revelada por Deus e que a Sagrada Tradição, sozinha, é via pela qual é possível conhecer certas verdades reveladas. Porém, essas concepções podem gerar a ideia de que existem duas fontes separadas da Revelação, o que não é certo.
Para melhor enxergar o valor individual de cada uma e assim dar-lhes o mesmo afeto e veneração, torna-se conveniente dizer que existe uma relação orgânica entre elas, uma unidade intrínseca. Ambas têm a mesma origem e inspiração divina. O que as distingue é somente o modo como comunicam as verdades.
De fato, para a vida da Igreja a Sagrada Escritura é mais acessível e prática, já que nela todos os fiéis podem encontrar num só livro – a Bíblia -, as verdades de fé e costumes que Deus quis revelar ao seu povo, a fim de transmiti-las a todos os povos. Enquanto que a Sagrada Tradição está disseminada em muitíssimas e variadas obras. Mas, sem perderem as suas diferenças e propriedades particulares, Escritura e Sagrada Tradição se unem e se fundem para construir um único depósito da Palavra de Deus[3]. Por isso, quem quiser compreender com precisão todas as questões relacionadas com a fé e os costumes, deve aferi-las com uma e com outra. Não podemos contar só com a Escritura e nem só com a Sagrada Tradição, porque não há dois rios – um escrito por inspiração divina e outro oralmente transmitido pela assistência de Deus – onde podemos beber a água viva das verdades reveladas, mas há uma só torrente, formada por essas duas correntes que se juntam e se integram.
A fonte única do sistema é Cristo, o Verbo Encarnado, verdadeira Palavra de Deus enviada aos homens, plenitude da Revelação. Dessa fonte emanam, para formar um só manancial, a Sagrada Escritura e a Sagrada Tradição, unidas como as águas de um rio o estão ao seu leito. Assim, é impossível conceber uma Escritura independente da Sagrada Tradição, nem uma Sagrada Tradição independente da Escritura. Não há necessidade de subordinar para unir, nem de separar para distinguir. Ambas são e formam a vida da Igreja.
A Sagrada Tradição explica as Escrituras santas
A Sagrada Tradição da Igreja é onde melhor encontramos a interpretação e compreensão correta daquilo que Deus diz na Sagrada Escritura e de onde extraímos as certezas de todas as verdades reveladas por Ele e que não podem ser conhecidas apenas com as Escrituras. E isso é assim por estar na Sagrada Tradição a condensação dos estudos e escritos que os santos dos primeiros séculos do cristianismo fizeram das divinas letras.
Esses homens, ainda que menos imbuídos de erudição profana e de conhecimento de línguas que os estudiosos modernos, no entanto, se distinguem por certa suave perspicácia das coisas celestes e pela agudeza de raciocínio, pelas quais penetram nas profundidades da palavra divina e põem em evidência tudo quanto pode conduzir ao conhecimento da doutrina de Cristo e à santidade[4].
A Escritura, além do mais, necessita da Sagrada Tradição para que conheçamos a sua existência, a sua legitimidade, a sua autenticidade e a sua integridade[5].
Por outro lado, a Sagrada Tradição não poderia dar vida à Igreja se estivesse à margem da Sagrada Escritura, já que não foi assim que atuaram os seus testemunhos, que em seus escritos mostram extraordinariamente como amaram os livros santos.
E para entender definitivamente a união inseparável que há entre a Sagrada Tradição e a Sagrada Escritura, basta que digamos que a Sagrada Tradição não é outra coisa que a mesma vida da Igreja. Vida que se desenvolve e continua a se desenvolver organicamente desde seu nascimento, passando pelos escritos de pessoas santas, que souberam aproveitar-se dos tesouros contidos nos livros sagrados para enriquecer e dar vigor à Igreja. Vida que o Magistério Eclesiástico incrementa com o alento dado pelo Espírito, que é quem, da parte de Jesus Cristo, ensina a verdade (cfr Jo 14, 15-26).
Por tanto, não há nenhuma sombra de dúvida de que a Sagrada Tradição não só produz um influxo vital para a vida da Igreja, se não que é a mesma vida da Igreja, porque, intimamente unida e compenetrada com a Sagrada Escritura, busca a gloria de Deus e a participação de toda a criação nessa gloria.
Daí que a Igreja, no empenho de tronar prática as aportações do Concílio Vaticano II, tem estudado e atualizado os seus documentos, como o fez no último Sínodo sobre a Palavra. E fruto desse empenho são estas palavras do Papa Bento XVI: “é importante que o Povo de Deus seja educado e formado claramente para se abeirar das Sagradas Escrituras na sua relação com a Tradição viva da Igreja, reconhecendo nelas a própria Palavra de Deus. É muito importante, do ponto de vista da vida espiritual, fazer crescer esta atitude nos fiéis”[6].
[1] Constituição “Dei Verbum”, n. 21
[2] Constituição “Dei Verbum”, n. 9
[3] Constituição “Dei Verbum”,, n 10
[4] Cfr. Papa Pio XII, “Divino afflante Spiritu”, em Enchiridion Biblicum, n. 554, pp. 219-220.
[5] Constituição “Dei Verbum”, n. 8
[6] Papa Bento XVI, Exortação Apostólica Pós Sinodal “Verbum domini”, n. 18.
EXCURSUS: NORMAS DA INTERPRETAÇÃO EVANGÉLICA
- A interpretação deve ser fácil, tirada do que é o evangelho: boa nova.
- Os evangelhos são uma condescendência, um beneplácito, uma gratuidade, um amor misericordioso de Deus para com os homens. Presença amorosa e gratuita de Deus na vida humana.
- Jesus é a face do Deus misericordioso que busca o pecador, que o acolhe e que não se importa com a moralidade ou com a ética humana, mas quer mostrar sua condescendência e beneplácito, como os anjos cantavam e os pastores ouviram no dia de natal: é o Deus da eudokias, dos homens a quem ele quer bem e quer salvar, porque os ama.
Interpretação errada do evangelho:
- Um chamado à ética e à moral em que se pede ao homem mais que uma predisposição, uma série de qualidades para poder ser amado por Deus.
- Só os bons se salvam. Como se Deus não pudesse salvar a quem quiser (Fará destas pedras filhos de Abraão).
Consequências:
- O evangelho é um apelo para que o homem descubra a face misericordiosa de Deus [=Cristo] e se entregue de um modo confiante e total nos braços do Pai como filho que é amado.
- O olhar com a lente da ética, transforma o homem num escravo ou jornaleiro:aquele age pelo temor, este pelo prêmio.
- O olhar com a lente da misericórdia, transforma o homem num filho que atua pelo amor.
- O pai ama o filho independentemente deste se mostrar bom ou mau. Só porque ele é seu filho e deve amá-lo e cuidar dele.
- Só através desta ótica ou lente é que encontraremos nos evangelhos a mensagem do Pai e com ela a alegria da boa nova e a esperança de um feliz encontro definitivo. Porque sabemos que estamos na mira de um Pai que nos ama de modo infinito por cima de qualquer fragilidade humana.
Ambientação:
Sejam bem-vindos amados irmãos e irmãs! Na oitava do Natal se celebra a festa de "Maria, Mãe de Deus". Na verdade, as leituras bíblicas põem a tônica no "filho de Maria" e no "Nome do Senhor", mais do que em Maria. De fato, a antiga "benção sacerdotal" é ritmada pelo nome do Senhor, repetido no início de cada versículo; o texto de São Paulo acentua a obra de libertação e salvação realizada por Cristo, na qual é engastada a figura de Maria, graças à qual o Filho de Deus pôde vir ao mundo como verdadeiro homem; o evangelho termina com a imposição do nome de Jesus, enquanto Maria participa em silêncio do mistério deste filho nascido de Deus. Essa atenção preponderante sobre o "Filho" não reduz o papel da Mãe; Maria é totalmente Mãe porque esteve em total relação com Cristo; por isso, honrando-a, o Filho é mais glorificado. Quanto ao título de Mãe de Deus, exprime a missão de Maria na história da salvação, que está na base do culto e da devoção do povo cristão, uma vez que Maria não recebeu o dom de Deus só para sí, mas para levá-lo ao mundo. Sintamos o júbilo real de Deus em nossos corações e cheios dessa alegria divina entoemos cânticos jubilosos ao Senhor!
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PRIMEIRA LEITURA (Nm 6,22-27): - "O Senhor te abençoe e te guarde! O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face, e se compadeça de ti!"
SALMO RESPONSORIAL 66(67): - "Tua bênção, Senhor, nos ilumine, Tua face, Senhor, sobre nós brilhe! Teu poder encerra paz e retidão, bênçãos e frutos por todo este chão."
SEGUNDA LEITURA (Gal 4,4-7): - "Assim já não és escravo, mas filho; e se és filho, és também herdeiro."
EVANGELHO (Lc 2,16-21): - "... deram-lhe o nome de Jesus, como fora chamado pelo anjo antes de ser concebido."
Homilia do Diácono José da Cruz – Solenidade de Santa Maria - Mãe de Deus
"SANTA MÃE DE DEUS, MARIA - JESUS, A PAZ QUE O MUNDO DESEJA"
Primeiro de ano é o “Dia Mundial da Paz” e talvez muitos se perguntem, o que adianta celebrar esta data se no mundo há ainda tanto ódio, conflito, guerras e mortes absurdas em um total desrespeito á vida? É bom entendermos que paz, não significa ausência de problemas, mas sim presença de Deus em nossa vida e nesse sentido, a paz que o homem tanto quer e sonha, já foi plantada em meio aos homens quando Jesus encarnou-se entre nós, através de Maria.
Na graça e salvação que Jesus nos trouxe tudo se renova só que precisamos compreender o agir de Deus que é diferente dos homens, a paz no mundo, da maneira como entendemos, só é possível se os poderosos das grandes nações fizerem um pacto de pararem com a guerra, com os conflitos e desentendimentos, essa paz dificilmente irá acontecer embora todos a desejemos com intensidade.
A paz é antes de tudo um dom, um presente, que em Jesus, Deus oferece ao homem; podemos aceitá-lo ou rejeitá-lo, e quando o aceitamos, deixamos de ser meros expectadores e começamos a fazer uma nova história, por isso o evangelho nos coloca os pastores como protagonistas. Eles poderiam ter ignorado a mensagem do anjo e permanecerem em suas pastagens o resto da noite, mas ao verem a luz e ouvirem o anúncio alegre, puseram-se á caminho de Belém, e ao encontrarem tudo como o anjo lhes havia informado, disseram a José e Maria o que lhes fora dito sobre o menino. O testemunho dos pastores ajudará José e Maria a compreenderem melhor a missão que lhes fora confiada. Mas a grande mudança acontece nos pastores, que se abriram e acreditaram na boa nova. E agora, todos se admiram ao ouvir aqueles homens, tido como mentirosos e brigões, cujo testemunho não valia nos tribunais. Agora, eles que são os últimos da sociedade, tornam-se os primeiros anunciadores da boa nova. Quanto a Maria, guardava todas essas coisas em seu coração. Muitas vezes, nos esquecemos facilmente das coisas que não conseguimos explicar, só guardamos em nós aquilo que é lógico e explicável.
A fé e a confiança em Deus nos leva a aceitar certos fatos, que a nossa lógica não explica, mas que sabemos ser o jeito de Deus agir. Maria se fez serva do Senhor, não era necessário Deus explicar tudo, a todo o momento, Deus não nos deve nenhuma explicação.
Deus se faz ouvir e se deixa ver, é uma experiência íntima e pessoal que nos leva a glorificá-lo e louvá-lo.
Por isso a criança deverá se chamar Jesus, Emanuel, Deus conosco. Ele é a paz, desejada e sonhada pela humanidade, dom que Deus coloca ao nosso alcance, mas ao mesmo tempo algo a ser conquistado, e que só se concretiza quando percebemos, como os pastores, que ele caminha conosco, como irmão e parceiro, na construção de um mundo novo.
José da Cruz é Diácono da
Paróquia Nossa
Senhora Consolata – Votorantim – SP
E-mail jotacruz3051@gmail.com
Homilia do Padre Françoá Rodrigues Costa –Solenidade de Santa Maria - Mãe de Deus
“Theotokos: Mãe de Deus”
Maria é Mãe de Deus porque Jesus é Deus! Todas aquelas passagens da Sagrada Escritura que dizem que Jesus é o Filho de Deus e que ele nasceu de Maria são argumentos a favor desta verdade de fé. Ora, se Jesus é Deus e Maria é Mãe de Jesus, a conclusão necessária é que Maria é Mãe de Deus. A passagem do Evangelho de hoje nos transmite que Jesus foi “concebido no seio materno” de Maria (Lc 2,21).
No século II, os Padres da Igreja estavam de acordo que Jesus nasceu de Santa Maria Virgem e foi gerado verdadeiramente dela, ex Maria Virgine. Essa verdade também estava presente na piedade dos fiéis, que desde o século III rezavam aquela oração: “À vossa proteção recorremos, Santa Mãe de Deus, não desprezeis as súplicas que vos dirigimos em nossas necessidades, mas livrai-nos sempre de todos os perigos, ó Virgem gloriosa e bendita”. Parece que foi no Egito que surgiu a expressão Theotokos (Dei Genitrix = geradora de Deus, Mãe de Deus) para falar da maternidade divina.
No entanto, no século V, o Patriarca de Constantinopla, Nestório, opôs-se decididamente a essa verdade de fé. Ele dizia que em Cristo há duas pessoas, a humana e a divina, que se uniam através duma espécie de “pessoa de união”. Como a pessoa divina de Jesus tem como referência o próprio Pai eterno, consequentemente Maria só poderia ser Mãe da pessoa humana de Jesus. Na falsa opinião de Nestório, Maria é Mãe de Cristo (da sua pessoa humana) e não Mãe de Deus. Essa afirmação escandalizou os cristãos da época: a doutrina de Nestório vai contra a fé que nos foi transmitida pelos Apóstolos de Jesus Cristo.
São Cirilo de Alexandria, chamado “o teólogo da encarnação”, em consonância com o Papa Celestino I, defendeu com inteligência e fervor que foi o Verbo, a segunda Pessoa da Santíssima Trindade, quem se fez carne e que Maria é, portanto, a Mãe de Deus. O Concilio de Éfeso (ano 431) ratificou essa doutrina e esclareceu que Maria é Mãe de Deus não porque “a natureza do Verbo ou a sua divindade tivesse tido origem da Santa Virgem, mas porque dela nasceu o santo corpo dotado de alma racional, à qual o Verbo uniu-se substancialmente, e assim se diz que nasceu segundo a carne” (DZ 251). Resumindo: em Cristo há uma só Pessoa, a divina, e duas naturezas, a humana e a divina; é a Pessoa divina quem se encarna assumindo assim a natureza humana. Por outro lado, não conheço nenhuma mulher que seja mãe da natureza humana em geral, mas de Antônio, Joaquim, Maria, etc., de pessoas concretas; as mães não são mães de naturezas abstratas, mas de indivíduos. Santa Maria também, ela é Mãe de uma Pessoa, do Verbo do Pai; logicamente, não porque ela tenha gerado a Pessoa divina na eternidade, mas porque ela a gerou segundo a humanidade quando chegou a plenitude dos tempos (cf. Gl 4,4), ou seja, dela nasceu o Verbo feito carne, Jesus Cristo: ela é Mãe de Deus enquanto que o Verbo fez-se carne nela.
Quando o Povo fiel soube que o Concilio de Éfeso proclamara que Maria é Mãe de Deus, encheu-se de grande júbilo. Nós também, em união com os cristãos de todos os tempos, alegramo-nos com essa verdade e damos graças a Deus porque ela também é nossa Mãe. Que bom começarmos um novo ano com uma celebração em honra de Nossa Senhora! Ela sempre nos leva a Jesus, o seu conselho para o ano que se inicia é este: “Fazei tudo o que ele vos disser” (Jo 2,5). Se fizermos o que a nossa Mãe nos diz seremos muito felizes durante esse ano e durante toda a vida, seremos guiados por uma Mãe tão boa e nos sentiremos seguros.
Como ser cristão e não ser mariano? Entende-se sem compreender. Ser cristão e não ser mariano é uma contradição! Sinceramente, é difícil compreender esses cristãos, que ao levarem o nome de Cristo não querem levar o de Maria! Não podemos ser indelicados e pouco elegantes para com Nosso Senhor desmerecendo a sua própria Mãe, aquela que ele tanto ama. Não é verdade que nós também nos sentiríamos ofendidos se alguém começasse a falar mal de nossas mães? Temo pelos que não amam Nossa Senhora!
Hoje também é o dia mundial da paz. Peçamos ao nosso único Salvador Jesus Cristo, por intercessão de Santa Maria Rainha da Paz, que nos conceda a paz, a verdadeira paz!
Feliz Ano Novo!
Pe. Françoá Rodrigues Figueiredo Costa
Texto Especial - Espiritualidade / Meditações / Pastoral
(Extraído do site Presbíteros - Elaborado pelo Pe. Ignácio, dos padres escolápios)
Os demônios do apostolado
“Sejam advertidos, pois, os que são muito ativos, que pensam abarcar o mundo com suas pregações e obras exteriores, que fariam muito mais bem á Igreja e agradariam muito mais a Deus, sem falar no bom exemplo que dariam, se gastassem ao menos a metade deste tempo em estar com Deus em oração… Com isso, fariam mais e com menos trabalho com uma só obra do que com mil, alcançando merecimento de sua oração e recobrando forças espirituais com ela; do contrário, tudo não passa de agitação, de fazer pouco mais que nada e, às vezes, nada e, outras vezes, dano”(São João da Cruz)
Preâmbulo
Uma boa prática profissional, para que seja eficaz, humanizadora e aceitável aos seus beneficiados, requer competência científica e certos valores da parte do profissional.
Um médico deve ser competente: sem competência, ele não pode prestar um serviço à saúde e sua profissão se torna ineficiente; para ter êxito, requer também certas qualidades e atitudes de espírito: inspirar confiança, estar disponível ao enfermo, ter tino, ser confidente… Este conjunto de valores conformam o que se chamaria em linguagem cristã “a espiritualidade” de um médico.
O apostolado, a “profissão apostólica”, exige condições análogas: competência e uso de métodos pertinentes, certos conteúdos e temas que é preciso conhecer, uma mensagem adequada a transmitir… Exige, igualmente, certas atitudes, convicções e valores espirituais da parte do apóstolo. É o que propriamente constitui a “espiritualidade” de um médico.
Entretanto, o apostolado, por sua própria natureza, é diferente de qualquer outra profissão ou atividade: sua espiritualidade é essencial para sua eficácia: a atitude do apóstolo é condição necessária para o fruto de seu apostolado.
Pois, um médico competente, ainda que seja medíocre de espírito e eticamente falando, pode ter êxito e curar pacientes. Mas um apóstolo carente de espírito, normalmente não alcançará êxito decisivo e profundo, a não ser aparente. Dizemos “normalmente”, porque pode suceder que Deus, em sua bondade, faça grandes coisas através de um servidor medíocre. Na realidade, aqui o espírito é mais necessário do que a habilidade.
Por que as coisas são assim? Basicamente porque o apostolado é uma profissão de Deus feito homem, e não é uma profissão humana. Seu objeto é transmitir o caminho, a verdade e a vida de Deus e não a do ser humano. Por isso, Jesus Cristo é o único apóstolo, e os seres humanos são apóstolos na medida em que Jesus os chama para tal e lhes comunica seu poder.
Daí que o espírito e os valores do apóstolo, vêm total e unicamente de sua relação com Jesus Cristo: ele é um eleito dele, seu enviado e seu instrumento, ao mesmo tempo livre e dependente do poder apostólico de Deus. Daí nascem todas as atitudes, os valores e as convicções que configuram a espiritualidade do apostolado.
Estes valores, os encontramos em Jesus, que é sua fonte e modelo, e nos santos por imitação de Cristo. Naqueles que ainda não são santos, estes valores também estão presentes, mas mesclados com incoerências múltiplas e com tentações mais ou menos consentidas. Por isso, um bom modo de conhecer o espírito do apostolado é conhecer as incoerências e tentações a que está submetido. O espírito bom ressalta por contraste com o espírito mau, e se conhece melhor uma virtude, ao conhecer os “demônios” que a tentam.
Vejamos alguns dos “demônios” mais corriqueiros do apostolado. Para identificá-los, sirvamo-nos da experiência, vista a partir do ideal cristão do apostolado. Através das tentações, este ideal revelar-se-á a nós por contraste, como a sombra revela a luz.
1. O Messianismo
O demônio do messianismo induz o apóstolo a constituir-se no centro de toda atividade pastoral em que está engajado. É uma tentação que vai penetrando sutilmente sua vida, até levá-lo a sentir-se indispensável em tudo.
O messianismo constitui basicamente uma atitude deficiente em relação a Deus: eu sou o “piloto” e o Senhor é o “co-piloto” ajudante. Quem cai nesta tentação, não é que deixe de levar Deus em conta, de rezar e de recorrer a ele diante dos problemas, mas o faz para que Deus simplesmente lhe ajude no apostolado que ele próprio dirige e planeja. Em última análise, se busca incorporar o Senhor em nosso trabalho e não de incorporarmo-nos no trabalho de Deus, que é o específico do apostolado: Deus é o “piloto”, e eu sou o “co-piloto” ajudante. Trata-se, inconscientemente, de substituir o messianismo de Cristo, o único evangelizador, pelo nosso messianismo pessoal.
Esta atitude diante de Deus, se projeta numa atitude deficiente também para com os demais que colaboram conosco. Tornamo-nos incapazes de delegar responsabilidades ou tarefas: não confiamos verdadeiramente nas pessoas, com exceção de uns poucos, habitualmente réplica fiel de nós mesmos, acabando rodeados unicamente por eles. É uma tendência que costuma agravar-se no transcurso dos anos.
Existe sempre uma relação entre a atitude diante de Deus e a atitude frente aos outros e vice-versa. Assim, a desconfiança nos colaboradores do apostolado, reflete uma desconfiança em Deus, que é justamente o que vai implícito no demônio do messianismo. Pois, confiar realmente em Deus, supõe uma confiança prudencial nos outros. E, por sua vez, a confiança nos outros também implica Deus, pois foi ele quem os foi chamando e colocando-os como companheiros nossos de trabalho.
O messianismo tem também conseqüências negativas nos resultados externos do apostolado, ao menos a longo prazo, além de comprometer o fruto profundo da evangelização. Em primeiro lugar, a atitude messiânica não deixa os outros crescerem, uma vez que a expansão e maturação da obra apostólica não caminham paralelamente, como devia ser, com a maturidade e crescimento daqueles que a levam a cabo. Em segundo lugar, sucede, então, que as iniciativas e criações do apostolado messiânico, não contribuem necessariamente para formar pessoas, nem para preparar sucessores. Normalmente, o apóstolo messiânico se identifica a tal ponto com sua obra que, quando ele desaparece ou se translada, ela se acaba: era demasiadamente pessoal e não havia substitutos preparados.
O verdadeiro apostolado que constrói o Reino de Deus a partir da Igreja ali onde ela ainda não está, contribui sempre para fazer desabrochar a própria Igreja: seus evangelizadores e comunidades. Também se aprende a ser cristão aprendendo a evangelizar, e isso não é possível sem realmente assumir responsabilidades. Um apóstolo maduro revela, entre outras coisas, que alguém confiou nele.
2. O Ativismo
O demônio do ativismo não significa ser muito ativo ou muito trabalhador, ou ter muitas ocupações e apostolados diversos. Ser ativo, apostólico, não é ser “ativista” como tentação.
O ativismo se produz na medida em que aumenta a distância e a incoerência entre o que um apóstolo faz e diz, entre o que ele é e o que ele vive como cristão. É verdade que na condição humana aceitamos como normal a inadequação entre o “ser” e o “agir” mas, no caso do ativismo, ela é acentuada e tende a crescer, não a diminuir, como seria o ideal do processo cristão.
O ativismo tem muitas expressões. Uma delas é a falta de renovação na vida pessoal do apóstolo. Neste caso, normalmente a oração é insuficiente e deficiente. Não há momentos prolongados de silêncio e retiro. Não se cultiva o estudo, apenas se lê. Nem sequer se deixa tempo para descansar o suficiente e repor-se. Paralelamente, há sobrecarga de trabalho, de atividades múltiplas, e a agenda de compromissos costuma estar cheia. O ativista dá a impressão de que é necessário, como estilo de vida, um grande volume de trabalho externo. Daí a criação de um círculo vicioso, cuja origem – excessiva atividade ou negligência em renovar-se – não é fácil identificar: por um lado está o aumento de atividades que faz cada vez mais difícil tomar as medidas de renovação interior, e que são as que conduzem ao crescimento no “ser”; por outro lado a incapacidade (que tende a crescer) de renovar-se tende a compensar-se e disfarçar-se com a entrega a um ativismo desenfreado. Em última análise, o ativismo é a desculpa do “escapismo”.
O ativismo também se exprime numa das distorções mais radicais do apostolado: colocar toda a alma nos meios de ação e de apostolado, no que se organiza e se faz, esquecendo-se de Deus, quem é, afinal de contas, por quem se faz, se organiza e se trabalha. Com isso, o apóstolo se transforma num profissional que multiplica iniciativas, habitualmente boas, não parando para discernir, para perguntar a Deus se são necessárias ou oportunas ou se é preciso fazê-las agora e desta maneira. Assim, os meios do apostolado acabam obscurecendo seu sentido e seu fim.
Outra expressão do demônio do ativismo é não trabalhar ao ritmo de Deus, substituindo-o pelo próprio ritmo. Isso ocorre quando se vai mais rápido ou mais lento do que Deus. Normalmente, o ativista, pelo menos num primeiro momento, costuma pecar por aceleração. É o resultado da desproporção, sempre existente, entre a visão e os projetos do apóstolo e a realidade das pessoas envolvidas. O normal é que um agente de pastoral tenha mais visão que sua comunidade e que seu povo, e saiba antes e melhor que eles onde e como chegar. Além disso, as pessoas não respondem ao ritmo que a gente quer, pois o ritmo do crescimento corresponde ao ritmo de Deus e não das previsões da gente. O ritmo de Deus é constante, mas de um processo lento. Os seres humanos, como as plantas e o resto da criação, não mudam e nem crescem à força, artificialmente, queimando etapas. É preciso esperar e ter paciência sem, com isso, deixar de educar, cultivar e exigir: é preciso ser como Deus, adequando-nos ao seu ritmo e forma de agir e transmitir a vida.
Pedagogicamente, esta forma de ativismo pode ser desastrosa. Ao acelerar o ritmo das pessoas e dos processos, não somente se dificulta o crescimento destas pessoas, como se pode também destruir e “queimar” muitas delas; outras se afastarão e será muito difícil recuperá-las. Em todo caso, dado o aparente fracasso de seu projeto, o ativista, uma vez tendo experimentado o demônio da impaciência apostólica, facilmente cai na tentação do desânimo. “Aqui, com essa gente, não se pode fazer nada”. Pois, a impaciência e o desânimo são gêmeos. Ambos são filhos do orgulho, da auto-suficiência, do esquecer que “tanto o que planta como o que rega não são nada, e sim Deus que faz crescer” (1 Cor 3,7).
3. Fazer da confiança em Deus uma farsa
A principal característica deste demônio do apostolado é, obviamente, esquecer que a desconfiança na gente mesmo, acompanhada por uma total confiança em Deus, é a essência da espiritualidade do apóstolo. A tentação é pôr a confiança em Deus num segundo plano, como um recurso em caso de necessidade e de emergência, esquecendo de fazê-lo presente nos apostolados ordinários e cotidianos. Ao não colocar a confiança em Deus, com toda a convicção da alma, se está pondo a confiança na gente mesmo, ainda que se diga o contrário. Quando se trata dos resultados profundos e teológicos da evangelização (o Reino da graça) e não de resultados psicológicos ou de pura influência humana, é preciso confiança absoluta no Senhor e desconfiança absoluta na gente mesmo. No apostolado, as duas confianças não podem fazer-se presentes simultaneamente: ou se confia realmente em Deus e se desconfia da gente, ou se confia na gente e se desconfia de Deus.
Desconfiança ou confiança na gente é aqui uma qualidade teológica e não psicológica. Isto é, não se trata de ser inseguro, com complexo de inferioridade, não reconhecer dons e condições humanas e de vida cristã que Deus nos deu, certamente em abundância. A confiança humana e psicológica é necessária ao apóstolo. A desconfiança de que estamos falando está num outro nível, no âmbito dos frutos do Espírito. E paradoxalmente, uma autêntica confiança no Deus do apostolado comunica ao apóstolo a confiança psicológica que lhe pode faltar diante da evidência de suas limitações humanas.
O evangelizador que colocou sua confiança nele mesmo e não no Senhor, como atitude habitual e profunda (tão profunda que muitas vezes nem percebe mais que Deus está presente, tornando-se cego em sua auto-suficiência), reforça esta tentação com certos tipos de êxito proporcionados pelas suas qualidades humanas e sua influência. Ora, as atividades apostólicas seguem as leis da eficácia humana, que é sempre exitosa num primeiro momento, mas que nem sempre está ligada à graça e à obra permanente de Deus. Todos conhecemos evangelizadores inteligentes, preparados e com muitas qualidades, que exerciam grande atração e influência. Talvez por esta razão, colocavam sua confiança apostólica em si mesmos, mais do que em Deus. Evangelizadores estes, que durante alguns anos brilharam no apostolado. Eram convidados para pregar retiros e dar conferências, suscitaram vocações sacerdotais e tiveram muitos seguidores. Num determinado momento, surgiram algumas contradições e fracassos e, quase da noite para o dia, se apagaram. E mais, muitos de seus jovens seguidores, com o tempo, se distanciaram da Igreja. Os grupos e comunidades que tinham formado não perseveraram e as vocações que haviam suscitado foram se retirando do seminário… O que aconteceu? Deus deu-lhes a entender “Eu não estou contigo”. Deus deixou este apóstolo sozinho, revertendo sua promessa de “estarei convosco até o final dos tempos” (Mt 28,20). Apenas concedeu-lhe os resultados de sua auto-suficiência.
O colocar a confiança primeiramente em Deus e não na gente mesmo, tem uma caricatura: recorrer à confiança de Deus nas ocasiões em que a gente não fez o que devia fazer na atividade apostólica, ou em momentos que a gente se comportou de maneira irresponsável ou não se preparou como devia. Estas confianças oportunistas são uma manipulação da verdadeira confiança em Deus. Ora, a confiança, para que seja autêntica, supõe que o apóstolo tenha se preparado e trabalhado como se tudo dependesse dele e que, uma vez feito tudo o que estava ao seu alcance, às vezes até ao heroísmo, não põe sua confiança em seu trabalho e em sua preparação, mas no poder de Deus.
4. Não confiar na força da verdade
Este demônio é uma variante da pouca confiança em Deus, ainda que seja uma tentação com características próprias.
A verdade cristã, exposta por Cristo e transmitida pelo magistério da Igreja, apresenta desafios doutrinais e morais que hoje vão na contracorrente das ideologias e dos critérios éticos das culturas dominantes e secularizadas. Verdades como a vida depois da morte, a confiança na providência amorosa de Deus, o valor positivo do sofrimento, da cruz ou da austeridade, a necessidade, às vezes, de crer ou de aceitar sem entender, assim como o valor da castidade ou da virgindade, da preservação do matrimônio ou da defesa da vida, ainda que em casos extremos, não são hoje afirmações “populares”. Inclusive para os que crêem nelas, não deixam de ser uma pedra de tropeço quando lhes afetam pessoalmente.
Ora, diante disso, todo apóstolo está exposto à tentação de vacilar, de não oferecer a verdade de Cristo tal como ela é (ainda com as necessárias considerações pedagógicas de tempo, oportunidade, etc.), supondo que ela não vai ser seguida ou aceita, ou que é inconveniente fazê-lo. É desta maneira que nas diversas formas do apostolado da palavra se passa por cima de certas verdades ou se cai na ambigüidade, confiando mais na prudência humana, que não se confunde com a conveniente pedagogia, do que na força e no poder de persuasão da própria verdade. Cai-se igualmente nesta tentação na formação de pessoas, na hora de oferecer um conselho, uma orientação, uma esperança… Em lugar das exigências e da luz do Evangelho, se oferece às pessoas mera experiência humana, conselhos “razoáveis”, privando-as da oportunidade de conhecerem progressivamente a verdade que nos faz livres.
Confiar na força do apostolado supõe para o apóstolo ter a convicção de que a verdade da fé e da moral coincide com a humanização do ser humano e seus grandes ideais. É preciso crer que na verdade está o autêntico bem das pessoas e, portanto, sua única felicidade verdadeira.
5. Pregar problemas e não certezas
Este demônio leva a confundir os distintos níveis e momentos do apostolado da palavra. Há momentos e públicos em que o que se espera é uma conversa ou uma palestra sobre alguma questão em discussão, conjecturas, opiniões e problemas de Igreja. Mas, em se tratando da catequese, da homilia, da pregação missionária, é necessário sempre transmitir a mensagem cristã, que é a mensagem de Cristo, em toda a sua integridade. Neste âmbito, as pessoas esperam receber as certezas da fé para renovar a própria vida. Elas não esperam e nem querem que seus qüestionamentos e perguntas lhes sejam devolvidos sem resposta. Muito menos querem que se repitam relatos de conflitos e de problemas, sem estarem iluminados com as certezas da fé. A essência da evangelização é anunciar uma mensagem e não problemas. Estes podem ser anunciados, mas só como ponto de partida. Trata-se de anunciar certezas e não conjecturas ou opiniões pessoais.
As causas desta tentação podem ser várias: uma poderia ser a falta de critério, de experiência ou de discernimento por parte do apóstolo; outra, a tendência em projetar seu estado interior. Ora, quando se vacila em relação a convicções, quando a vida cristã é mais um conjunto de problemas e de perguntas do que de certezas, a tendência é transmitir isso aos outros. O ditado antigo que diz: “a boca fala do que o coração esta cheio”, se aplica ao apostolado ao pé da letra.
A comunidade cristã se edifica basicamente sobre a fé, a esperança e a caridade de seus membros. Ela não se edifica sobre as dúvidas, as confusões e as problematizações compartilhadas.
6. Reduzir a esperança
Este demônio seculariza o anúncio da esperança cristã. Ora, esta se funda nas promessas de Cristo: a ressurreição depois da morte, a vida eterna, a certeza de seu amor e de sua graça nesta vida que tornam possível o ser humano ser santo em qualquer circunstância, viver com dignidade e ser capaz de superar o mal moral e a tentação em todas as suas formas. Esta é a esperança que essencialmente alimenta o apostolado.
Neste caso, a tentação consiste em transmitir uma mensagem de esperanças humanas em detrimento da esperança cristã fundamental. O apóstolo prega e promove a confiança em relação a um futuro social e político melhor, a superação de uma enfermidade, de um problema humano ou da pobreza, ou promete ainda o êxito das libertações que a humanidade busca nos dias de hoje… Entretanto, ainda que estas esperanças humanas sejam legítimas e se deva lutar por elas, não estão garantidas por Cristo para esta terra. Não sabemos com certeza se elas se realizarão. Anunciá-las como esperança cristã seria enganar as pessoas e reduzir o Evangelho a uma mensagem de libertações humanas legítimas ou de otimismo no porvir, o que não é alheio ao apostolado, mas que não tem a certeza da esperança cristã.
Reduzir a esperança é esvaziar o anúncio da vocação do ser humano à vida eterna, à santidade, à fé e á caridade como o motor e o valor supremo das libertações humanas. É converter o apostolado em inspiração de expectativas humanas e de empenho para um mundo melhor, coisas boas e que desafiam o cristianismo, mas que não deveriam reduzir sua essência, que é a proclamação de Cristo como a verdadeira esperança do ser humano.
7. Perder o sentido das pessoas
Este demônio converte o apóstolo num executivo da pastoral. Alguns cargos e trabalhos se prestam mais a isso, mas em todo caso, o resultado, progressiva e às vezes imperceptivelmente, se dá de maneira semelhante. Isso ocorre quando o apóstolo se vai deixando absorver de tal modo pelo administrativo, o organizativo, o planejamento e a supervisão, que já não tem tempo, e sobretudo espaço psicológico, para dedicar-se às pessoas pelas quais trabalha, para dedicar-lhes o tempo necessário e para estar próximo delas.
O demônio da despersonalização do apostolado faz com que o apóstolo esteja tão dedicado aos meios de ação e de serviço, que esqueçe das pessoas a quem serve e em função das quais estão organizações e programas que tanto o absorvem.
Esta tentação pode tomar outras formas. Por exemplo, o apóstolo que se converte em executivo pastoral, poderá ter a tendência a dar um valor excessivo aos planos, aos programas e às linhas de ação, esquecendo-se da realidade das pessoas que devem levar a cabo tudo isso. Acaba impondo esquemas às pessoas em lugar de adaptar os esquemas e programas à realidade delas. E assim, realidade o apóstolo executivo vão se tornando cada vez mais distante.
O ponto de partida de todo apostolado são as pessoas, com suas possibilidades e seus limites, e não os esquemas, por melhores e mais ideais que sejam.
8. Fazer acepção de pessoas
Deste demônio praticamente ninguém escapa. Não é fácil tomar consciência desta tentação. Ele ataca até o apóstolo mais espiritual, não porque não saiba disso, mas por cegueira. Por isso a expulsão deste demônio implica um longo caminho de iluminação das motivações apostólicas, que como toda iluminação de motivos normalmente se faz durante a vida toda.
Habitualmente nesta tentação do apostolado (salvo que tenha caído em níveis muito baixos), as acepções e discriminações de pessoas não são motivadas por preconceitos graves: racismo, classicismo, nacionalismo, tratamento diferenciado de ricos e pobres, etc. Estes graus de discriminação normalmente não estão presentes na pastoral da Igreja, a não ser em casos extremos. O demônio da acepção de pessoas costuma apresentar-se de maneira mais sutil.
Trata-se aqui de dar mais tempo, interessar-se mais e estar mais disponível às pessoas em geral e para os membros da comunidade cristã que têm mais qualidades humanas, que são mais inteligentes, mais interessantes ou agradáveis, mais simpáticos e atraentes… Conseqüentemente, se deixa de modo sutil num segundo plano, os que são menos dotados, mais opacos e menos atraentes, menos inteligentes e gratificantes… Esta é a forma mais comum de acepção de pessoas no apostolado, tanto mais sutil, profunda e persistente, quanto mais inconsciente ela for.
Além disso, no apostolado, no caso da predileção pelos pobres, ela não pode restringir-se ao nível sociológico, que é sempre essencial, é verdade. Ela precisa chegar igualmente a todos os “pobres” em qualidades humanas externas, psicologicamente discriminados em atenção e acolhida. Ora, o apostolado não pode guiar-se unicamente pelo critério da eficácia, que aconselha investir preferencialmente nos mais dotados e nos líderes potenciais. Deve, igualmente, testemunhar o primado da caridade fraterna, que se revela preferencialmente com os desprezados e esquecidos.
9. 0 sectarismo
O demônio do sectarismo leva o apóstolo a isolar-se em seu campo de trabalho, em suas idéias, em seu grupo… Pouco a pouco, ele vai perdendo seu sentido de pertença e de integração numa Igreja mais ampla, mais rica, numa Igreja universal, na qual todo cristão é solidário em seus êxitos e cruzes, em seus problemas e conquistas, seja em seu país ou no mundo todo. O apóstolo sectário se fecha em sua visão das coisas, nos limites de sua experiência e, través disso, vê e julga a Igreja. Com isso, sua visão deixou de ser verdadeiramente católica.
O sectarismo tem sintomas pessoais e grupais. No nível pessoal, um dos mais típicos, é o isolar-se. O apóstolo trabalha sozinho, sem integrar-se numa missão de conjunto. Não participa das reuniões programadas para esta finalidade, nem de encontros de atualização e de capacitação. Não lhe interessa incorporar-se a critérios e planos comuns, a instâncias de avaliação ou revisão, nem procura relacionar-se com outros evangelizadores.
Conseqüentemente, o sectário isola seu trabalho do resto. Faz “sua coisa” e tem “sua gente”, sua própria experiência e sua visão do apostolado. Tudo o que é diferente de sua visão e experiência é questionável: só vê “poréns” e defeitos. A própria autoridade pastoral da Igreja é ignorada ou criticada quando não concorda com sua visão e idéias próprias .
Outro sintoma desta tentação é reduzir o apostolado a um só tema ou pouco mais, a uma determinada linha de pastoral, como grupos de oração, direitos humanos, liturgia, jovens… O resto não interessa.
Isto não quer dizer que não deva haver evangelizadores especializados. É que o bom especialista precisa ter uma visão mais ampla e de conjunto.
O resultado é que o apóstolo se torna sectário também em relação às pessoas ás quais se dirige. Se ele for monotemático, sua freguesia habitual também o será: falará sempre ao mesmo público, que partilha sua visão e seus interesses limitados. Ora, isso leva ao perigo de suscitar comunidades tão sectárias quanto ele.
O demônio do sectarismo pode ser, portanto, também grupal. Não se trata, porém, do que é normal no apostolado e na Igreja, isto é, o fato de pessoas mais afins em espiritualidade, em pastoral ou simplesmente por pertencerem a uma mesma geração, formarem grupos de trabalho, de vida cristã ou de amizade. Isto não é sectarismo, ainda que todo grupo afim precise saber que poderia estar exposto a esta tentação. O sectarismo grupal consiste em fechar-se nas idéias do grupo ou do movimento teológico, pastoral, espiritual… Os participantes do grupo acabam pensando que têm a melhor versão da verdade ou toda a verdade, que sua orientação é privilegiada, que não têm muito que receber de outros grupos ou movimentos de Igreja.
Este tipo de sectarismo nos faz marcadamente proselitistas, ignorando o legítimo pluralismo. Não há integração com outros movimentos em tarefas comuns: se costuma ter a própria agenda. Esta tentação pode conduzir, sutilmente, a fazer da própria espiritualidade, da própria pastoral ou de sua teologia, em principio legítimas, uma ideologia, um integrismo conservador, progressista ou de qualquer outra cor.
10. Fechar-se em sua própria experiência
Este demônio não é sectário, nem tem muita gravidade. E uma tentação mais benigna e sutil Basicamente, consiste em elevar as experiências apostólicas pessoais à categoria de princípio universal. Se tal ou tal experiência foi boa, todos os que trabalham neste tipo de apostolado deveriam fazê-la. Se a experiência foi má, ninguém deveria fazê-la. E caso se esteja numa posição de autoridade, se procurará simplesmente suprimi-la.
A tentação está em esquecer que toda experiência é relativa: tem circunstâncias próprias, agentes e evangelizadores próprios, tempo e lugar próprios e irrepetíveis. Assim, o que não deu resultado positivo num certo momento, com determinadas pessoas e num certo conjunto de circunstâncias, não significa que não possa dar resultados com protagonistas e circunstâncias diferentes.
Com o passar dos anos, evidentemente, esta tentação se agrava, dado que o apóstolo já acumulou um número significativo de experiências falidas e frustrantes. A tendência, então, é instalar-se e promover só o que deu resultado a ele próprio, desconfiando de outras experiências e iniciativas.
A verdadeira sabedoria, em contra-partida, consiste em não deixar-se condicionar pelos fracassos, nem pelo acervo positivo das experiências passadas, mas em estar disposto a tentar outras formas de apostolado e a abrir-se à experiências de outros.
11. Esperar do apostolado uma carreira gratificante
Este demônio do apostolado é muito ativo. O apostolado da Igreja é bastante organizado e hierarquizado, como é normal que aconteça em toda instituição humana que tem uma missão a cumprir. Assim, na Igreja, há cargos e tarefas de maior autoridade ou de maior poder ou prestígio que outras. Também existem títulos e honras externas: a Igreja mantém isso com sábio realismo e consideração com a condição humana. A tentação está em ir identificando o apostolado com uma carreira eclesiástica e sua importância e eficácia profunda com o cargo que se ocupa.
O demônio das gratificações terrenas pode tentar de muitas maneiras. A maneira mais rude é quando se une ao apostolado a ganância pelo dinheiro, fazendo dele, não tanto no nível das convicções como na prática, uma profissão lucrativa, seguramente mais generosa e idealista que outras. Algo muito deferente é ganhar a vida com o trabalho apostólico, sem ânsias de lucro, sobretudo quando se está dedicado a ele em tempo integral. Quando esta tentação se agrava, se chega a fazer do apostolado a aparência de um negócio que, embora não seja “negócio” estritamente falando, é suficiente para tirar-lhe a credibilidade. Esta tendência pode levar o apóstolo a interessar-se exclusivamente pelas tarefas apostólicas remuneradas, perdendo, com isso, o sentido da gratuidade no serviço e na evangelização.
Uma outra tentação mais sutil deste demônio, é esperar reconhecimento e até elogios das pessoas e da hierarquia da Igreja. Quem cai nesta tentação, passa a necessitar deste tipo de gratificação para manter seu entusiasmo e seu élan. Pareceria que no apostolado não se devesse buscar agradar a Deus, mas recompensas humanas. Quando não há elogios e reconhecimentos explícitos, se interpreta isso como uma ingratidão e uma falta de valorização, provocando uma baixa na própria motivação e entrega. De modo semelhante, quando há críticas por parte das pessoas com quem trabalha ou da hierarquia da Igreja, o apóstolo se sente rechaçado e perseguido. Mais uma gota d’água, e o apóstolo deixará o seu trabalho.
Entretanto, talvez o demônio mais sutil se dá na aspiração de postos e cargos; na necessidade de que toda mudança de apostolado signifique igualmente uma promoção. Há uma expectativa latente por “ascender”. O apóstolo marcado por esta tentação, se não ascende em tempo, fica ressentido e, às vezes, se “desestrutura”. Trata-se de um demônio sutil, que costuma fantasiar-se de “anjo da luz” (2 Cor 11,14): dissimula a ambição de promoções e postos com a desculpa do apostolado mais eficaz, de serviço à Igreja, etc… Na prática, se faz da “carreira” um fator de apostolado, e da ascensão um referencial constante, em geral não totalmente consciente. O resultado desta tentação é a imperfeição das motivações: lhe interessa não só servir à Igreja gratuitamente e seguir a Cristo pobre, mas ficar bem com todos e “ganhar pontos”. Esta tentação produz também uma falta de liberdade no apostolado e uma preocupação pela própria imagem. Evita-se toda discordância ou oposição legitima com a autoridade, que em certos momentos pode ser um dever no apostolado, não tanto por lealdade, mas pelo interesse de mostrar-se agradável e dialogante.
12. Perder o gosto pelo apostolado
Este demônio transforma a evangelização em rotina e num dever, quando deveria ser a principal fonte de alegria para a apóstolo. A alegria e a plenitude interior de colaborar com a vinda do Reino de Deus e de trabalhar na vinha do Senhor devem ser para o apóstolo uma experiência constante.
Esta tentação está ilustrada precisamente na parábola dos operários contratados para a vinha, em que alguns chegam cedo e outros mais tarde (Mt 20,lss). Os que haviam trabalhado o dia inteiro, se queixam de que seu salário é igual ao daqueles que haviam trabalhado só uma hora. Ora, o que eles não tinham compreendido, é que o salário não era importante, nem era a verdadeira gratificação pelo seu trabalho. Seu prêmio e gratificação era o próprio fato de terem dedicado o dia inteiro à vinha do Senhor, com a satisfação e a alegria que isso lhes poderia ter ocasionado.
O apóstolo que sucumbe a esta tentação, fará de seu apostolado um trabalho a mais, como outros, limitado pelo peso do dever e da rotina. Como os operários que trabalharam o dia todo, trabalhará bem e com dedicação, mas perderá de vista o sentido último do que ele faz: um trabalho para a eternidade, pelo qual Deus age nele, para libertar a condição humana e semear vida de fé, de esperança e de amor a Deus e aos outros, que é o Reino de Deus que se antecipa.
É no apostolado que o apóstolo encontra sua alegria e o sentido de sua vida. É parte de sua alegria comprovar o bem que Deus faz através dele, e dar graças a Deus, sem vanglória, porque Cristo o elegeu como seu instrumento livre e responsável, para “dar fruto que permaneça” (Jo 15,16). O que não dispensa o apóstolo de, sem perder a paz e sua entrega alegre, também pedir perdão com humildade, pois devido às suas falhas pessoais e falta de santidade, Deus não pôde fazer através dele todo o bem que ele queria. Pedir perdão porque, por ele não ter sido melhor, muitos não se tornaram melhores, nem se converteram e nem recuperaram a esperança.
O gosto e a gratuidade por trabalhar na vinha do Senhor não deve fazer-nos complacentes. Há muito o que mudar e do que nos arrepender no apostolado. Por nossa falta de santidade, seus frutos, reais pela graça de Deus, são, às vezes, medíocres.
13. A instalação
O demônio da instalação, às vezes com boas desculpas, corrói no apóstolo o espírito de superação em todos os aspectos. É uma tentação que costuma chegar, ainda que nem sempre, com o passar dos anos e a chegada da maturidade. Ela se expressa no fato do apóstolo ter encontrado seu cantinho, seu ritmo e seu modo de trabalhar, e de se ter arraigado em seus critérios e idéias. Ele é consciente de que o apostolado da Igreja avançou, que ele apresenta novos desafios e exigências, mas não tem disposição para mudar e renovar-se. Aos mais jovens que trabalham junto dele, os deixa fazer, mas não se deixa questionar. Pode até participar de reuniões e cursos de renovação, mas estes não têm influência sobre ele. Tudo o que ele espera é o que o deixem em paz, instalado em sua pastoral que, além do mais, costuma realizar de forma irrepreensível. Apesar disso, é possível até que ocupe altos cargos na Igreja.
Esta tentação, que vai tomando conta lentamente e se faz inevitável quando o apóstolo perde a espiritualidade do trabalho, costuma ir combinada com a instalação em seus próprios defeitos. Provavelmente nem se trate de algo realmente grave, mas o dinamismo espiritual está estancado. Sob uma aparência exterior honesta, há uma mediocridade interior. Desanimado, já não tem suficiente esperança e nem confiança em Deus para melhorar e, tacitamente, já fez um pacto com seus defeitos e mediocridade que ele pensa, falsamente, que não pode ou não vale a pena superar. “Eu sou assim mesmo…”.
Este demônio induz a pensar, sobretudo depois de certa idade, que se tem o direito de buscar compensações e de aburguesar-se. E, então, o apóstolo termina contentando-se com as exigências mínimas.
14.Carecer de fortaleza ou vigor
Este demônio debilita o apóstolo em algo que é fundamental para exercer um apostolado de envergadura, abnegado e constante, apesar de toda sorte de contradições: a fortaleza.
Este debilitamento e carência adquire formas contrárias às que caracterizam a fortaleza apostólica. Afeta, em primeiro lugar, o vigor físico, que não pode ser o mais relativo no apostolado. Não se pode, por exemplo, menosprezar a saúde das pessoas. Afeta, também, os hábitos alimentares: a gente pode tornar-se exigente em qualidade e quantidade; no horário; apega-se a certos hábitos; chegando à incapacidade de dar um sentido evangélico ao comer pouco ou nada, caso o serviço pastoral o requeira. O mesmo ocorre com o sono e o descanso, que muitas vezes o serviço pede sacrificar. Converte-se numa dificuldade habitual viajar em meios populares, a pé, em transporte coletivo. Se busca sistematicamente o meio mais rápido e cômodo, com a desculpa da eficácia apostólica, sem discernimento, uma vez que, em muitos casos, a escusa pode ser válida. Também o cuidado excessivo da saúde e a adoção de todas as formas de prevenção às quais recorrem os mais privilegiados, pode tornar mais aguda esta fase de austeridade e fortaleza. Poderia-se agregar outros exemplos.
A tentação afeta igualmente a fortaleza psicológica, tanto mais necessária que a física para o verdadeiro apostolado. Neste campo, é preciso educar-se num alto grau de resistência psicológica, o que não exclui ser emocionalmente vulnerável como todo ser humano normal. A fortaleza consiste em assimilar os golpes psicológicos, sem desanimar e, muito menos, desestruturar-se. Esta deve ser a atitude diante das críticas injustas ou parciais, diante das calúnias, das acusações… E, logicamente, diante das perseguições e das diversas formas de sofrimento, que podem chegar ao martírio, por causa do Reino. A aspiração de muitos apóstolos à última bem-aventurança – “bem-aventurados os perseguidos por minha causa e a justiça do Reino” -, não se improvisa, e é vã se não for preparada e se não estiver acompanhada pela aceitação das provações e crises psicológicas, com fortaleza evangélica.
A tentação pode ser mais grave se a provação da fortaleza provém do interior da Igreja. Um dos piores sofrimentos do apóstolo é o da “contradição dos bons”, de sua comunidade, de seus irmãos e companheiros de trabalho, de autoridades da Igreja. Em certos momentos do apostolado, em muitas ocasiões em que se trata de experimentar ou inovar dentro daquilo que é legítimo, o apóstolo precisa aceitar, com coração sadio e atitude evangélica, ser minoria ou simplesmente estar sozinho. Por isso, necessitará fortaleza diante das tensões e conflitos existentes no interior da Igreja, diante das incompreensões, das suspeitas, da falta de confiança e de colaboração.
A fortaleza apostólica purifica, amadurece e prepara para o futuro. O demônio da inércia e da fragilidade mantém o apóstolo na adolescência, numa certa mediocridade rotineira, dificultando-lhe exercer o melhor serviço da Igreja, agora e no futuro.
15. A inveja pastoral
O demônio da inveja não é alheio ao apostolado. Trata-se de um demônio universal. Obviamente, sua ação entre os apóstolos não tem os resultados devastadores que tem na política, na arte ou em outras atividades do “mundo”: as invejas no interior da Igreja são muito menos graves, mas se apresentam de uma forma sutil.
A tentação se expressa habitualmente em forma oblíqua. Manifesta-se com a tendência em encontrar e assinalar, à primeira vista, defeitos em todas as iniciativas pastorais e em atividades apostólicas que se destacam e se sobressaem do comum. Se despreza toda forma de apostolado que tem algo de diferente, com comentários, piadas, etc. Também no corpo apostólico da Igreja se sofre a tentação do corpo social: defender a mediocridade e derrubar tudo o que se sobressai e que, por isso, questiona. A tentação se manifesta também mediante o cinismo diante de trabalhos, iniciativas ou apóstolos que querem viver radicalmente seu chamado à evangelização. O cinismo é a expressão mais sutil da inveja; é seu melhor disssolvente.
Agora, em alguns casos, o demônio da inveja apostólica se revela em forma direta, em formas de rivalidade e de competição latente ou aparente. Esta tentação atua em todos os meios e níveis, normalmente dissimulada pelo “zelo pela verdade”, pelo “serviço do Reino” etc., palavras que escondem, às vezes, inveja pela reputação ou pelo êxito de um companheiro de apostolado.
Este demônio age também entre os teólogos, campo em que nem todo conflito ou disputa teológica está inspirada na busca da verdade; costuma haver questões pessoais misturadas. Age nos meios pastorais, em todos os níveis. Quantas vezes, apóstolos valiosos, projetos e experiências prometedoras são marginalizados, postergadas sem motivo, ou ignoradas, por questões de rivalidade!
O demônio da inveja pastoral leva a considerar projetos ou atividades de outros, como uma ameaça à própria influência apostólica. Quando se cai nesta tentação, o relacionamento apostólico fica inevitavelmente comprometido.
16. Perder o sentido do humor
Este demônio dramatiza e faz vítimas. Neste caso, o sentido do humor consiste em ver o lado bom das coisas, ainda que aparentemente de todo negativas; consiste em aprender a relativisar, a olhar “desde fora” as situações que nos afetam. O sentido do humor, por isso, ajuda a equilibrar as coisas, a não dramatizar e não ver tudo de maneira trágica. Ter sentido de humor é não fazer-se de importante, não levar a sério títulos, nem os problemas, nem os conflitos pastorais e eclesiais. É rir sadiamente da gente mesmo, das situações e de seus protagonistas.
O demônio que arranca ou adormece o sentido do humor, arrasta progressivamente o apóstolo à crítica sistemática, ao azedume, ao complexo de vítima que dramatiza tudo o que o afeta desfavoravelmente. O apóstolo que se dá muita importância, que acha seu trabalho o máximo, que busca cargos importantes ou que simplesmente se leva muito a sério, perde a simplicidade evangélica e, com ela, o sentido cristão do humor.
O apostolado requer o sentido do humor. A Igreja também precisa de humor e, obviamente, todos nós. O sentido do humor é uma qualidade tão humana quanto cristã. Trata-se de uma qualidade presente nos santos, nos apóstolos e nos missionários mais atraentes. Teve importância no apostolado de ontem e tem no de agora.
De fato, em tempos de particular tensão e conflito na vida apostólica e da Igreja em geral, o sentido do humor se torna imprescindível. Por isso, contribuir com seu desaparecimento da vida eclesial e pastoral constitui uma tentação permanente, um demônio. Os cismas, heresias, dissidências, divisões, conflitos insolúveis e falta de diálogo e de comunhão são atitudes de pessoas que normalmente perderam o sentido do humor; que dão grande importância a si mesmos e às suas idéias. Sem sentido de humor, qualquer contradição, reprovação ou questionamento provindos da Igreja, é um drama, uma perseguição. Portanto, um apóstolo sem sentido de humor é um apóstolo vulnerável e débil.
Em última análise, o sentido do humor forma parte da fortaleza cristã e, certamente, a propicia.
Este texto é um extrato do livro do teólogo chileno Segundo GALILEA, Tentación y Discernimiento, Narcea, Madrid 1991, p. 29-67.
EXCURSUS: NORMAS DA INTERPRETAÇÃO EVANGÉLICA
- A interpretação deve ser fácil, tirada do que é o evangelho: boa nova.
- Os evangelhos são uma condescendência, um beneplácito, uma gratuidade, um amor misericordioso de Deus para com os homens. Presença amorosa e gratuita de Deus na vida humana.
- Jesus é a face do Deus misericordioso que busca o pecador, que o acolhe e que não se importa com a moralidade ou com a ética humana, mas quer mostrar sua condescendência e beneplácito, como os anjos cantavam e os pastores ouviram no dia de natal: é o Deus da eudokias, dos homens a quem ele quer bem e quer salvar, porque os ama.
Interpretação errada do evangelho:
- Um chamado à ética e à moral em que se pede ao homem mais que uma predisposição, uma série de qualidades para poder ser amado por Deus.
- Só os bons se salvam. Como se Deus não pudesse salvar a quem quiser (Fará destas pedras filhos de Abraão).
Consequências:
- O evangelho é um apelo para que o homem descubra a face misericordiosa de Deus [=Cristo] e se entregue de um modo confiante e total nos braços do Pai como filho que é amado.
- O olhar com a lente da ética, transforma o homem num escravo ou jornaleiro:aquele age pelo temor, este pelo prêmio.
- O olhar com a lente da misericórdia, transforma o homem num filho que atua pelo amor.
- O pai ama o filho independentemente deste se mostrar bom ou mau. Só porque ele é seu filho e deve amá-lo e cuidar dele.
- Só através desta ótica ou lente é que encontraremos nos evangelhos a mensagem do Pai e com ela a alegria da boa nova e a esperança de um feliz encontro definitivo. Porque sabemos que estamos na mira de um Pai que nos ama de modo infinito por cima de qualquer fragilidade humana.
CAMPANHA DA VELA VIRTUAL DO SANTUÁRIO DE APARECIDA
CLIQUE AQUI, acenda uma vela virtual, faça seu pedido e agradecimento a Nossa Senhora Aparecida pela sagrada intercessão em nossas vidas!
QUE DEUS ABENÇOE A TODOS NÓS!
Oh! meu Jesus, perdoai-nos, livrai-nos do fogo do inferno,
levai as almas todas para o céu e socorrei principalmente
as que mais precisarem!
Graças e louvores se dê a todo momento:
ao Santíssimo e Diviníssimo Sacramento!
Mensagem:
"O Senhor é meu pastor, nada me faltará!"
"O bem mais precioso que temos é o dia de hoje! Este é o dia que nos fez o Senhor Deus! Regozijemo-nos e alegremo-nos nele!".
( Salmos )
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