GOTAS DE REFLEXÃO - EVANGELHO DOMINICAL
Ambientação:
Sejam bem-vindos amados irmãos e irmãs! A liturgia do 3º Domingo do Tempo Comum propõe-nos a continuação da reflexão iniciada no passado domingo. Recorda, uma vez mais, que Deus ama cada homem e cada mulher e chama-os à vida plena e verdadeira. A resposta do homem ao chamamento de Deus passa por um caminho de conversão pessoal e de identificação com Jesus. A resposta é pessoal, mas o compromisso é comunitário. Sintamos o júbilo real de Deus em nossos corações e cheios dessa alegria divina entoemos cânticos jubilosos ao Senhor!
(coloque o cursor sobre os textos em azul abaixo para ler o trecho da Bíblia)
PRIMEIRA LEITURA (Jonas 3,1-5.10): - "Através da história do envio do profeta Jonas a pregar a conversão, vemos como o povo responde ao chamado."
SALMO RESPONSORIAL 24(25): - "Mostrai-me, ó Senhor, vossos caminhos, Vossa verdade me oriente e me conduza."
SEGUNDA LEITURA (1 Coríntios 7,29-31): - "O cristão deve ter consciência de que "o tempo é breve". Deus nos convida a viver com o olhar no mundo futuro – quer dizer, a dar prioridade aos valores eternos."
EVANGELHO (Marcos 1,14-20): - "O Evangelho de hoje nos mostra o convite que Jesus faz a toda a humanidade para se tornarem seus discípulos e para integrarem a sua comunidade."
Homilia do Diácono José da Cruz – 3º Domingo do Tempo Comum
"Na ínfima Galiléia começa algo novo para a humanidade"
Longe dos Palácios dos Poderosos do Império Romano, e do sistema religioso centralizado no Templo de Jerusalém, sem nenhuma comunicação prévia aos Escribas, Doutores da Lei e outros homens importantes da Comunidade Judaica, lá na desprezível Galiléia dos pagãos algo de totalmente novo começa a acontecer depois que João foi preso... Quanta ingenuidade dos poderosos achando que prendendo João Batista iriam calar a voz de Deus...
Sai de cena alguém que era somente uma voz do deserto, para entrar na vida pública aquele que é o próprio Verbo Encarnado, não foram os homens que interromperam a chegada do Reino de Deus anunciado por João, mas foi a vontade de Deus que fez chegar o tempo oportuno que havia se completado, de agora em diante Deus não mandará avisos, Ele próprio vai falar e tornar-se caminheiro junto ao seu povo...
Um projeto grandioso como esse, o único, verdadeiro e mais importante para toda humanidade, começa na Galiléia, Deus não se alia aos poderosos para fazer o Reino acontecer, mas busca os mais fracos e desprezíveis, que esperam por algo novo e guardam no coração a esperança de uma mudança para melhor, mas que só dependa de Deus, seu desígnio e sua iniciativa.
A Igreja de Cristo não pode querer construir o reino fazendo parceria com Instituições poderosas, pois o Reino não depende de nenhum poder humano, nem de algum sistema econômico ou ideologia política partidária, mesmo porque, no sistema conhecido como Padroado, Igreja e estado caminhavam juntos no poder, dentro de um imperialismo que só atrasou a Missão da Igreja de Evangelizar.
É essa a verdadeira e sincera conversão, romper com todo e qualquer sistema que queira manipular o homem e ser o Dono da Vida, o Homem é Filho de Deus e a Vida um dom que pertence unicamente a ele. Conversão é mudança de mentalidade e de atitude, uma volta e uma busca permanente de Deus a única Fonte de Vida. Os primeiros seguidores de Jesus eram simples pescadores, considerados impuros diante do sistema religioso juntamente com outras categorias marginalizadas e desprezadas.
Eles conhecem Jesus, ouvem suas palavras e a sua proposta de darem uma "guinada de 90 graus" em suas vidas e aceitam com sinceridade de coração. Não foram arrebatados dentro do templo, não entraram em êxtase em uma espécie de encantamento, mas Jesus de Nazaré os procurou em seu ambiente de trabalho, na labuta diária, com as mãos cheirando peixe.
Impactados pelo anúncio de Jesus, não pediram um tempo para pensarem n o assunto, afinal, deixar para trás trabalho e família, não é coisa que se possa fazer da noite para o dia... Mas o nosso evangelho, que não é uma reportagem jornalística, apenas quer nos mostrar a urgência que devemos ter ao responder o Senhor que nos chama para algo novo. Em nossa labuta diária, através de pessoas e acontecimentos Jesus continua a nos chamar, Ele poderia, de maneira violenta nos arrebatar e invadir a nossa vida, mas com a humildade de sempre, m manifestada na sua encarnação, vida, paixão e morte na cruz, nos faz uma proposta e um convite...
Afinemos bem os nossos ouvidos e o nosso coração, e não percamos mais tempo, vamos responder com generosidade a este chamado, como fizeram aqueles primeiros discípulos, que deixando tudo para trás, o seguiram...
José da Cruz é Diácono da
Paróquia Nossa
Senhora Consolata – Votorantim – SP
E-mail jotacruz3051@gmail.com
Homilia do Padre Françoá Rodrigues Costa – 3º Domingo do Tempo Comum
“Qual é a minha vocação?”
“Vinde após mim; eu vos farei pescadores de homens” (Mc 1,17). Estamos ainda no mês de janeiro e, graças a bondade de Deus e a sabedoria da nossa Mãe Igreja, estamos meditando nesses primeiros domingos alguns temas importantíssimos na configuração da própria vida cristã. Hoje o Evangelho nos leva a fazer oração sobre a realidade da vocação.
Deus chamou a cada um de nós – leigos, sacerdotes, religiosos – para sermos pescadores de homens. Sendo isso verdade, não nos esqueçamos de que antes de sermos pescadores nós fomos pescados pelo Senhor. E isso tem uma importância enorme: considerar-se pescado pelo Senhor é saber-se na mesma barca de Cristo governada visivelmente pelo sucessor de Pedro e que navega rumo à eternidade, à santidade, à felicidade. Todos e cada um de nós, ao considerarmo-nos pescados por Cristo, somos conscientes de que a Igreja vai adiante também com a nossa santidade pessoal. Sem dúvida, a Igreja é indefectível, isto é, chegará à escatologia, será fiel até o fim; mas nós, que também somos Igreja, precisamos ser fiéis de verdade, ou seja, santos. O primeiro chamado que Deus nos dirigiu foi a vocação à santidade, chamou-nos desta maneira: “vinde após mim”. Estas palavras significam discipulado, seguimento, imitação fiel, santidade!
Na Igreja todos temos vocação: a universal, à santidade; outra, específica. Esta vocação específica nada mais é que a maneira concreta de realizarmos a vocação universal à santidade: uns se santificarão como leigos no meio do mundo, levando todas as coisas a Deus desde dentro das mesmas realidades temporais; outros, santificar-se-ão através do ministério sacerdotal, no qual se dedicarão inteiramente ao serviço dos seus demais irmãos na fé ministrando-lhes a Palavra de Deus e os Sacramentos da fé, governando o Povo de Deus com a autoridade do próprio Cristo; outros, finalmente, encontram o seu caminho de santidade na vida consagrada através dos conselhos evangélicos de pobreza, obediência e castidade vividos em comunidade e como sinal da vida eterna presente no meio de nós. Em cada uma dessas vocações se deve viver o seguimento do Senhor: vinde após mim! Segue-me com o teu amor e a tua fidelidade!
A vocação é uma realidade norteadora de toda a nossa vida. Quem tem uma meta sente-se motivado a procurar determinados meios para conseguir o objetivo vocacional. Para cada cristão é capital saber o chamado específico que Deus lhe faz: qual é a minha vocação? Pergunta-se a filha ou o filho de Deus interessado no cumprimento da vontade amorosa do seu Pai do céu.
Nesse sentido, é muito importante que os pais ajudem os seus filhos a descobrirem a própria vocação. Uma vez descoberta a vontade do Senhor para um dos seus, os pais devem respeitar o caminho que o Senhor escolheu para eles e que eles aceitaram livremente para a glória de Deus, o bem dos outros e a consecução da própria felicidade. Neste sentido, é interessante notar o fato de que Zebedeu, pai de João e de Tiago, que contava com a ajuda de seus filhos no ofício de pescadores, não os impediu de seguirem Jesus. Gosto de pensar em Zebedeu como um homem bom que, apesar das próprias necessidades laborais, entendia que os seus filhos iam estar muito bem na companhia do Messias, de Jesus Cristo. Também a mulher de Zebedeu será contada entre o grupo daquelas mulheres piedosas que seguiram o Cristo (cf. Mt 27,56).
Ajudados ou não pelos pais, cada pessoa deve sentir-se responsável diante de Deus pela resposta que lhe dá ao chamado feito para segui-lo. Cada um é responsável pela própria vocação e ninguém o substitui na resposta e na conservação do chamado. A grande maioria da juventude será chamada para a vocação laical e matrimonial; alguns serão chamados à entrega a Deus no celibato apostólico. Destes últimos, uns permanecerão no estado laical, outros receberão o sacramento da ordem, outros ainda se dedicarão ao Senhor na vida religiosa. No dia de hoje, vamos pedir ao Senhor que muitos jovens descubram a sua vocação, o sentido das suas vidas, o encanto do seu existir.
Pe. Françoá Rodrigues Figueiredo Costa
Comentário Exegético – 3º Domingo do Tempo Comum - Ano B
(Extraído do site Presbíteros - Elaborado pelo Pe. Ignácio, dos padres escolápios)
EPÍSTOLA (1 Cor 7, 29-31)
INTRODUÇÃO: Estamos num contexto moral em que Paulo responde a umas questões como é o matrimônio, especialmente se misto (7, 12-17). Respondendo uma carta, Paulo prefere a virgindade, mas declara que o matrimônio não é ilícito. E termina que o tempo de vida é tão efêmero que o melhor é usar das coisas como se não fossem eternas, mas caducas, esperando sempre pelo que será definitivo.
A LIMITAÇÃO DAS COISAS: Pois isto vos digo, irmãos, a oportunidade limitada. O resto é para que também os que têm mulheres sejam como se não tivessem (29). Hoc itaque dico fratres tempus breve est reliquum est ut qui habent uxores tamquam non habentes sint. OPORTUNIDADE [kairos<2540>=tempus] entre os diversos significados de um período de tempo está o de tempo oportuno, o tempo certo, o tempo devido, como em Mt 24, 45: Quem é, pois, o servo fiel e prudente, que o seu senhor constituiu sobre a sua casa, para dar o sustento a seu tempo? Como tempo favorável temos At 24:25: E, tratando ele (Paulo) da justiça, e da temperança, e do juízo vindouro, Félix, espavorido, respondeu: Por agora vai-te, e em tendo oportunidade te chamarei. Aqui no versículo atual, o tempo de que fala Paulo é o tempo anterior à segunda vinda de Cristo. Esta esperança da vinda do Senhor Jesus, como triunfante de seus inimigos, era a expectativa comum de todas as primitivas comunidades. O fundamento era a profecia de Jesus da destruição de Jerusalém e do templo. Para um judeu isso era o fim. E o novo mundo seria o definitivo. Não uma era diferente, mas um mundo novo, em que o mal fosse totalmente aniquilado assim como os inimigos de Cristo. Era o fim do final último. Hoje sabemos distinguir perfeitamente entre o fim de um tempo ou época, como era o fim de Jerusalém, e o fim escatológico do mundo que ainda está para se realizar. Vejamos alguns textos. Rm 13, 11: E isto digo, conhecendo o tempo, que já é hora de despertarmos do sono; porque a nossa salvação está agora mais perto de nós do que quando aceitamos a fé. Esse fim será também para Pedro o do mundo: Já está próximo o fim de todas as coisas; portanto, sede sóbrios e vigiai em oração (1 Pd 4, 7). Diante de semelhante proximidade, a procriação que era o modo de perpetuar-se de um homem não tinha muito sentido. Por isso, acrescenta Paulo: os que têm mulheres sejam como se não tivessem. Embora dentro dessa proximidade o próprio Pedro tenha que afirmar que o tempo do Senhor é diferente do tempo nosso: não ignoreis uma coisa, que um dia para o Senhor é como mil anos, e mil anos como um dia (2 Pd 3, 8). Somente o que retarda esse fim prometido é a paciência divina que espera a conversão do pecador: O Senhor não retarda a sua promessa, ainda que alguns a têm por tardia; mas é longânime para conosco, não querendo que alguns se percam, senão que todos venham a arrepender-se (2 Pd 3,9).
COM DESAPEGO: E os plangentes como não plangentes; e os que se alegram como se não estivessem alegres; e os compradores como se não fossem possuidores (30). Et qui flent tamquam non flentes et qui gaudent tamquam non gaudentes et qui emunt tamquam non possidentes. Paulo continua batendo na mesma tecla da brevidade e precariedade do tempo a disposição do homem. A dor como a alegria passam rapidamente e assim receita um remédio fácil e universal: quem chora por um familiar morto não se desespere. Pois é tão breve o tempo que nos separa do mesmo que é como se não tivesse morto. A despedida é como quem diz boa noite para se encontrar no dia seguinte. A palavra que temos traduzido por PLANGENTES [klaiontes <2799>=flentes] é o particípio presente do verbo klaiö com o significado de chorar ou derramar lágrimas. Usado por Mateus em 2, 18: Em Ramá se ouviu uma voz, Lamentação, choro e grande pranto: Raquel chorando [klaiousa] os seus filhos. Sempre o choro é por uma dor que tem como causa uma perda material ou espiritual. Daí o choro [klauthmos, da mesma raiz] pela perda de uma filha em Mc 5, 38; ou a perda do reino em que encontramos a frase tão repetida (6 vezes) em Mateus: haverá pranto [klauthmos] e ranger de dentes (8, 12). Também a alegria não deve ser motivo absoluto na vida. COMPRADORES [agorazontes<59>=ementes]. Parece um pouco fora de lugar esta frase. Mas a compra sempre enriquece o comprador e é precisamente essa riqueza que Paulo rejeita como coisa definitiva, segundo o que diz Jesus: Não ajunteis tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam (Mt 6, 19). É, pois, nessa base da caducidade das tristezas e bens terrenos que Paulo argumenta suas razões para não se deixar dominar por coisas efêmeras e transitórias. Já o afirmava Tiago na sua epístola: o rico passará como a flor da erva (1, 10), sendo a vida como um vapor que aparece por um pouco, e depois se desvanece (4,14).
A APARÊNCIA DO MUNDO: E os usantes deste mundo como não utilizantes; porque passa a aparência deste mundo (31). Et qui utuntur hoc mundo tamquam non utantur praeterit enim figura huius mundi. USANTES [chrömenoi<5530>=qui utuntur] particípio do verbo chraomai com o significado de usar, fazer uso de, empregar, abusar, como no caso de Paulo em 1 Cor 9,18: Logo, que prêmio tenho? Que, evangelizando, proponha de graça o evangelho de Cristo para não abusar do meu poder no evangelho. Porém o mais usual é o simples uso de, como em 1 Cor 9, 12: Temos o direito de participar dos vossos bens…..Mas nunca quisemos fazer uso desse direito. Confirma o uso da narração do naufrágio em que levado este (o bote) para cima, usaram de todos os meios, cingindo o navio (At 27, 17). Devemos, pois, segundo Paulo, usar dos bens deste mundo, sem pretender ser donos dos mesmos; porque a aparência do mesmo é transitória. APARÊNCIA [schëma<4976>=figura] é o que é visto como exterior de uma pessoa: sua figura, sua maneira de atuar. Além deste versículo, schëma sai unicamente outra vez em Fp 2, 8 falando sobre a humanidade de Cristo: Achado na forma de homem, humilhou-se a si mesmo, sendo obediente até à morte, e morte de cruz. Definitivamente Paulo tem também a ideia de que o mundo seria transformado, como diz Pedro, que assim como pereceu o mundo de então (tempos de Noé), coberto com as águas do dilúvio, (2 Pd 3,6), do mesmo modo o dia do Senhor virá como o ladrão de noite; no qual os céus passarão com grande estrondo, e os elementos, ardendo, se desfarão, e a terra, e as obras que nela há, se queimarão (idem 2, 10). Também podemos falar, sem pensar escatologicamente, do fim de cada vida individual em que já o mundo desaparecerá para cada homem no momento de sua morte.
EVANGELHO (Mc 1, 14-20) (paralelos: Mt 4, 12-22 e Lc 5, 1-11)
VOCAÇÃO APOSTÓLICA
INTRODUÇÃO: O texto tem duas seções diferentes: A primeira é a proclamação do Reino por Jesus, em pessoa. A segunda é a eleição dos 4 primeiros discípulos, chamados por parte de Jesus. O Reino sintetiza-se na pessoa e mensagem do próprio Jesus. Se aceita e se entra no reino, quando a palavra de Jesus se torna vida. Da mentalidade do AT que estava centrada na Lei Mosaica, na circuncisão, no templo, na pureza externa e no sábado, agora a justiça [a correção e bondade] do reino está na fé, na verdade de Jesus como Rei, na vida do seu mandato de amor, na graça de Deus Pai e na paz entre os irmãos, sem distinção de etnias entre judeus e gregos. Todos os povos são chamados e todos estão unidos na humanidade de Jesus. Este não era unicamente um profeta, a voz de Deus, mas todo ele era a vida de Deus conosco, o Emanuel; porque sua humanidade foi assumida na pessoa do Verbo. Como homem, Jesus era limitado no tempo e no espaço, e por isso era necessário que sua eficiência como voz e como pessoa fosse prolongada em outros homens que seriam os discípulos. Estes prolongariam a presença visível de Jesus, desde que nos entregassem suas palavras e operassem seu ministério de perdão na Nova Aliança.
O PREGOEIRO: Depois, portanto, de ter sido entregue João, Jesus veio para a Galileia proclamando o evangelho do Reino de(o) Deus (14). E dizendo que está cumprido o tempo [kairós] e tem-se aproximado o Reino de(o) Deus. Arrependei-vos [metanoeite] e crede no evangelho (15). Postquam autem traditus est Iohannes venit Iesus in Galilaeam praedicans evangelium regni Dei. et dicens quoniam impletum est tempus et adpropinquavit regnum Dei paenitemini et credite evangelio Após a prisão do Batista, que Marcos narra como sendo uma entrega, uma traição, Jesus se retira para a Galileia. Quem entregou o Batista a Herodes Antipas? A entrega foi uma denúncia, ou a polícia da Decápolis o arrestou e o entregou a Antipas? Não o sabemos. Mas a animosidade de Herodíades dá motivo para pensar que houve uma conspiração para calar uma boca que era molesta, precisamente pela verdade que proclamava. A mesma razão dá Mateus, que diz que Jesus, por causa de ouvir que João fora entregue se retirou para a Galileia (Mt 4, 12). A questão que surge é por que razão Jesus que, segundo Marcos e Mateus, estava na Judeia, território não sujeito a Herodes Antipas, agora se mete na boca do lobo como dizem, pois Galileia era o território de Herodes. Talvez seja tudo, como dizem os modernos, questão de redação. A frase inicial tem o sentido de logo, ou depois que, uma introdução temporal, para indicar que Jesus respeitou o tempo do Batista e só iniciou seu tempo após o fim do profeta. É uma delicadeza de quem era superior, esperar o tempo do seu profeta para iniciar o seu, de pregador. Retirado o apresentador, Jesus entra em cena com uma nova proclama: o evangelho como Boa Notícia e não como o dia da ira de Jahveh. Mas também para este ano de graça é necessária a conversão, para a nova justiça [righteousnes=retidão] do Reino do Deus verdadeiro, que nós podemos traduzir como Deus em maiúscula, para manter o grego original. EUAGGELION: A palavra grega é composta de dois vocábulos gregos: eu [bom] e aggelos [mensageiro]. Evangelho significava originalmente a recompensa dada por uma boa notícia. Biblicamente no NT está sempre unida a uma notícia de origem messiânica, que podemos traduzir por novas que causam alegria. O evangelho é uma noticia alegre (Lc 1, 15) ou um grande júbilo (Lc 2, 10). Em Marcos, a palavra evangelho sai 5 vezes, 1 como evangelho de Jesus Cristo (1, 1), 2 vezes como evangelho do Reino de Deus ou simplesmente evangelho (5 vezes). Em Mateus, aparece como evangelho do Reino (3) ou simplesmente evangelho (1). Em Lucas, não se encontra evangelho, mas o verbo evangelizar (10 vezes), dos quais 3 com o objetivo do Reino de Deus. Tanto o verbo como o substantivo, não aparecem em João. Como estamos comentando Marcos, vemos como a palavra evangelho está diretamente conectada com a missão de Jesus. Deixando à parte o evangelho de Jesus Cristo de 1, 1, que realmente é uma recopilação do evangelista, parece que o Reino é o objetivo da boa nova ou notícia. É esse reino de Deus, que Jesus pede que venha na oração por excelência, o Pai Nosso, e que Mateus completa magistralmente com o parêntese de faça-se tua vontade na terra, assim como ela é absoluta nos céus. Conclusão: para entrar no Reino é preciso fazer a vontade do Pai, e esse desejo anterior ao nosso de felicidade [negar-se a si mesmo (Mt 16, 24)], constitui a base da METÂNOIA que Jesus prega. Unicamente, pois, aquele que faz a vontade do Pai é que pode ser chamado verdadeiramente irmão de Jesus (Mt 12, 50) e filho, portanto, de Deus, a quem ama e serve como Pai. Perguntará alguém: E qual é a vontade do Pai? Pois responderemos com a boa nova: Quem vê o Filho e nele crê, tem a vida eterna e ressuscitará no último dia (Jo 6, 40), coisa que confirma em 7, 17: Se alguém quer cumprir sua vontade, reconhecerá se minha doutrina é de Deus ou se falo por mim mesmo. No mundo atual, esta fé é tanto mais perseguida do que era nos tempos da primitiva Igreja e deve ter um valor primordial na vida dos que se intitulam discípulos de Jesus. Ou seja, existe uma entrada no Reino que depende de aceitar Jesus como Filho do Pai, e dessa aceitação depende a vida eterna. Jesus proclama: crede no evangelho. Com o qual completa a pregação do Batista que era só de metânoia. A entrada é gratuita e só necessita a fé; isto é, depende de aceitar Jesus como Filho de Deus e, dessa situação, depende a nossa nova família que será eterna (Mt 12, 50). Porém, Paulo afirmará que a fé não basta e os que praticam as obras da carne não herdarão o Reino de Deus (Gl 5, 21). Essas obras da carne ele as descreve nos versículos 19-20. Em definitivo: entra-se no Reino pela fé; mas essa fé deve ser demonstrada e realizada nas obras (Tg 2, 22). KAIRÓS: Em grego se distingue perfeitamente entre chronos [tempo] e kairós [oportunidade]. Aliás, este último nem é tempo na sua acepção original, mas justa medida, ocasião, coisa conveniente, oportunidade. Com essa palavra, o evangelista quer indicar que o Reino irrompe como uma ocasião única [parábola da pérola] que não pode ser desperdiçada. A própria palavra eggiken [se acercou, está às portas] indica que não existe muito tempo para deliberar ou esperar. A decisão deve ser imediata: conversão e fé na palavra que anuncia a nova era. Para mais detalhes, ver Exegese no 116 de Presbiteros.com.br no comentário de Mc 1, 1-8. Não cremos que exista motivo para traduzir acabou-se o prazo, isto é: o tempo do AT e suas instituições; pois temos um novo eon que é o reinado de Deus, como se o AT não estivesse sob o comando de Deus. Mas a verdadeira tradução é: Tem chegado a oportunidade.
O PASSEIO: Andando, pois, junto ao mar da Galileia, viu Simão e André, seu irmão, lançando a tarrafa no mar, pois eram pescadores (16). Et praeteriens secus mare Galilaeae vidit Simonem et Andream fratrem eius mittentes retia in mare erant enim piscatores. O MAR DA GALILEIA: Na realidade é um lago de água doce vinda das fontes do Jordão. Antes do lago, ou mar, também chamado de Genesareth, temos um outro lago, ao norte, de nome El-Huleh, unido ao nosso mar pelo pequeno Jordão. O nosso lago recebeu nos tempos de Antipas e de Tibério o nome de mar de Tiberíades [do imperador], nome com o qual o apresenta unicamente o quarto evangelho (Jo 6,1 e 21, 1). Evangelho que é mais correto no que diz respeito aos nomes geográficos e históricos da época. O nosso lago é de água doce e está situado a 210 m sob o nível do mar Mediterrâneo, tendo a forma de uma lira, com profundidade máxima de 48 m, comprimento de 21 Km e largura de 12 Km. Devido ao calor de suas águas, é abundante em peixes e as tempestades são frequentes, formando-se em menos de meia hora, com ondas de até 2 m de altura, do quais os evangelhos são testemunhas (Mt 8, 24). Junto ao lago, estava Betsaida que, em aramaico, significa casa de pesca. Era a Betsaida que o tetrarca Filipe engrandeceu até formar uma cidade ao leste do Jordão, a que chamou Júlia, do nome da filha de Augusto, onde teve lugar a multiplicação dos cinco mil pães (Lc 9, 10) e a cura do cego (Mc 8, 22). Foi a cidade onde nasceram Pedro, André e Filipe. Cafarnaum [aldeia da consolação segundo alguns, e aldeia formosa segundo outros] era uma vila ao noroeste do lago e onde se encontrava a casa de Pedro. No período de máximo esplendor, cobria uma área de 4 hectares e meio [uma hectare é 10 mil m2,, equivalente a campo e meio de futebol]. Calcula-se que então tivesse uma população aproximada de 1800 pessoas. Mas esta Cafarnaum é dos tempos bizantinos. No tempo de Jesus, teria unicamente algumas centenas de habitantes, não superando os 500. Jesus fez da cidade sua morada habitual, até que os habitantes da mesma, por instigação dos fariseus, o rejeitaram e obrigaram Jesus a deixar a cidade, imprecando sobre ela as suas deslealdades (Mt 11, 23). Corozaim se considera que seja Tell Khirbet Kerexah a 4 Km ao noroeste de Cafarnaum. Talvez seja esta a cidade de Corozaim da qual nada mais conhecemos. Estas três cidades terminaram desaparecendo na História e suas localizações permaneceram desconhecidas por séculos. Sua desaparição foi em cumprimento da profecia de Jesus (Mt 11, 21-24). Magdala [torre] era outro lugar com grande número de barcos de pesca. Talvez seja o Migdael de Josué 19, 38 que pertencia à tribo de Neftali. Segundo Mt 15, 39, após a segunda multiplicação dos pães, Jesus veio com seus apóstolos à região de Maedan que muitos códices traduzem por Mgdala. O Talmud distingue entre o Magdala do leste, perto de Gadar [atual Mukes] e o Magdala do oeste, perto de Tiberíades, distante desta cinco quilômetros e que é chamada de Magdala Nunaya [Magdala dos peixes]. Esta última era uma cidade rica e foi destruída pelos romanos. Seu nome grego foi Tariqueia, que significa salga ou salgadura em grego. O sal era abundante na Palestina, extraído puro, principalmente das salinas, perto do Mar Morto. Era o sal de Sodoma. Tendo sal e peixes em abundância, a indústria da salgação era uma forma de vida habitual na região. A bíblia menciona uma vez a salga de um peixe em Tobias 6, 6. Mas sabemos que os judeus comiam muito peixe seco e salgado como vemos na multiplicação dos pães em Mt 14, 17. Comiam os peixes salgados até em Jerusalém, onde existia a porta dos peixes que tomava seu nome de um mercado de peixes [necessariamente salgados] perto dali. Da Palestina se exportavam sal e peixe a todo o mundo. Pedro e seus companheiros, pescadores eram, sem dúvida, provedores de matéria prima para as salgadeiras de Tariqueia. Tiberíades se tornou a capital da Galileia no reinado de Antipas, que a fundou no tempo de Tibério, no ano 18 quando Jesus teria 25 anos. Localizada no lugar de um antigo cemitério, as prescrições legais impediam aos judeus de a habitarem. Antipas viu-se obrigado a levar para ela colonos à força: moradores dos arredores, mendigos, aventureiros, escravos libertados, etc. (ver a parábola do banquete real em Mt 22). A cidade não tinha mais de 5 km de circunferência. Quando começou a revolta do ano 66, a maioria da população era de judeus, principalmente de pescadores, e se rendeu sem luta aos romanos, e obteve o privilégio de estar habitada unicamente por judeus, com exclusão de pagãos e cristãos. Na sexta centúria, a escola de Tiberíades inventou a Massorá, fixando o texto hebreu de Bíblia em hebraico, acrescentando as vogais ao mesmo.
O CHAMADO: Então disse-lhes Jesus:vinde após mim e vos farei ser pescadores de homens(17). E imediatamente, tendo deixado as suas redes, o seguiram (18). Et dixit eis Iesus venite post me et faciam vos fieri piscatores hominum. Et protinus relictis retibus secuti sunt eum VINDE APÓS MIM: Com estas palavras Jesus torna os chamados por Ele, discípulos. Naquela época, os discípulos dos mestres (Rabi) de Israel, moravam junto com estes últimos. De sua convivência, resultavam lições muito mais proveitosas que de suas palavras. A Jesus seguiram as turbas como ouvintes e como discípulos. Discípulo [mathêtês grego] é aquele que ouve a palavra com agrado e que a retém; e, portanto, nele é causa de frutos de salvação. A palavra mathêtês, [discípulo] derivada de matheuô [aprender] é aquele que aprende de um mestre. A palavra aparece 250 vezes nos Evangelhos e Atos. O discípulo, porém, mais do que aprender teoricamente, segue, obedece e se compromete com o mestre. Logo exige muito mais do que um assentimento intelectual. O centro de interesse do discípulo é o Mestre, Jesus, sua pessoa e sua autoridade (Mt 11, 29 e Ef 4, 20). O antigo Magister dixit [o mestre disse], se transforma em Magister imperat [o mestre comanda]. Sua palavra é definitiva, máxime que ele é divino na sua atuação e nos seus ensinamentos, e que a sua vida é um espelho da qual deve ser também a vida do discípulo (Lc 14, 27). Daí que o discípulo se torna testemunha dos ditos e situações do mestre, como magistralmente Jesus ressuscitado ensina aos onze na última lição de sua vida terrena e visível (Lc 24, 48). É fácil deduzir que se os evangelhos têm sido escritos como memória desses discípulos, eles nos oferecem o ensino de Jesus de um modo quase literal, como sucede numa gravação eletrônica. Já a palavra APÓSTOLO significa enviado. Os evangelhos sinóticos (Marcos, Mateus e Lucas) trazem a lista dos doze apóstolos dividida em 3 seções de 4, e cada uma encabeçada sempre com os mesmos nomes: Simão, Filipe e Tiago de Alfeu. Todos eles foram escolhidos pelo Senhor, após uma noite de oração (Lc 6, 12). Jesus constituiu 12 [o número das tribos de Israel] para que ficassem com ele e para enviá-los a pregar e terem autoridade para expulsar os demônios (Mc 3, 14-15). A principal missão de um apóstolo é a evangelização. Por isso, Paulo se considera apóstolo (Gl 1, 1), embora não tivesse conhecido Jesus na carne. Já em vida, Jesus enviou os doze a proclamar o Reino de Deus e a curar (Lc 9, 1). Com a mesma missão enviou outros 72 discípulos [era o número tradicional das nações pagãs] (Lc 10, 1+). Para se tornar apóstolo, um discípulo devia ter acompanhado Jesus desde seu batismo por João, até o dia em que foi arrebatado (At 1, 21-22). Tal foi o caso de Matias, incluído no lugar de Judas, o traidor. Ou seja, um apóstolo era precisamente uma testemunha, tanto da doutrina como principalmente da ressurreição de Jesus (At 1, 22). No evangelho do domingo anterior, temos visto como foi o primeiro contato de Jesus com André, Pedro, Filipe, Natanael e um outro discípulo do Batista que, sem dúvida, passou a formar parte dos novos discípulos de Jesus (Jo 1, 25-32). Natanael é o nome próprio e Bartolomeu é o nome familiar ou sobrenome. Por isso, a maioria dos intérpretes concordam em que os dois nomes designam a mesma pessoa, que os sinóticos preferem chamar pelo sobrenome e João escolhe chamá-lo pelo nome, que significa dom de Deus. O relato de João é o encontro de determinadas pessoas com Jesus. Mas o relato dos sinóticos é a narração de uma escolha e eleição que se origina no próprio Jesus. É Jesus quem os escolherá definitiva e livremente de modo que, os assim escolhidos, deixarão tudo para o seguirem totalmente.
DISCÍPULOS DO BATISTA: Na seleção dos primeiros discípulos de Jesus, todos eles, ao que parece, eram discípulos de João, o Batista. Chama a atenção que alguns dos nomes sejam gregos: André, Filipe. Isso quer dizer que estamos ante uma sociedade mista como a descrita por Mateus, a Galileia das Nações [isto é, dos gentios] (4, 15). Desde o início, Jesus quer seguir a profecia de Simeão: seria luz para a revelação dos gentios e glória de Israel, seu povo (Lc 2, 32). Naquela época, os discípulos dos mestres (Rabi) de Israel moravam junto com estes últimos. De sua convivência resultavam lições muito mais proveitosas que de suas palavras. Eram às 4 da tarde quando André e outro discípulo de João seguem Jesus. Com este passam a noite e de manhã é quando André revela a Simão, seu irmão, que tinham encontrado o Messias. No encontro com Jesus, Simão muda de nome e quem impõe o novo nome como se fosse seu pai, ou melhor, exercendo um atributo divino: Chamar-se-á Kefas, Rocha. Mateus também traz esta mudança de nome, na ocasião em que Simão reconheceu a missão de Jesus como sendo o Messias (Mt 16, 18).
OUTROS DOIS: E tendo ido adiante um pouco viu Jacob, o do Zebedeu e João seu irmão e eles na barca consertando as redes (19). E imediatamente os chamou; e, tendo abandonado o seu pai, Zebedeu no barco com os assalariados foram depois dele (20). Et progressus inde pusillum vidit Iacobum Zebedaei et Iohannem fratrem eius et ipsos in navi conponentes retia. Et statim vocavit illos et relicto patre suo Zebedaeo in navi cum mercennariis secuti sunt eum. O texto grego usa uma palavra para rede dificilmente traduzida às outras línguas. É diktion um termo geral para rede, que aqui se usa em plural. Na realidade, em grego temos: Amfiblëstron, [tarrafa], sagënë [de arrastão] e diktion [rede em geral], que é a usada aqui. João, o quarto evangelista fala de ploiarion [pequeno barco] em 6, 22 e 21, 8, que pode ser traduzido por barca, ou navícula em latim, e Mateus distingue entre tarrafa (4, 12) e rede de arrastão (13, 47). JACOB: nome hebraico que em português é traduzido por Tiago [o inglês James, derivado de Jacomus francês do baixo latim] e que significa suplantador, do Jacó, o irmão de Esaú e pai das doze tribos. O nome de Tiago provém de Sancti Jacobi apocopado em Santiago; e, retirado o San, temos o Tiago, com que é conhecido. JOÃO [Javé favoreceu] é o apóstolo preferido do Senhor, segundo a tradição. ZEBEDEU, forma grega de Zebadaias [meu presente], esposo de Salomé [perfeita], que pede em Mt 20, 29 os primeiros postos para seus filhos. Razão não faltava, pois o pai era de posição de classe média alta, pois tinha operários às suas ordens (Mc 1, 20) e até relacionado com o Sumo Pontífice (Jo 18, 15). Uma velha tradição fala também de Salomé como parente de Maria.
EXCURSUS
Existem umas diferenças notáveis entre os sinóticos e o 40 evangelho sobre a vocação ao apostolado dos primeiros discípulos. João fala de que Jesus encontrou em Betabara [Decápolis] ou Betânia [Pereia] discípulos do Batista como vimos no domingo anterior. Já os sinóticos realizam essa escolha no mar da Galileia, quando os que seriam pescadores de homens, abandonam barco e rede de pesca para seguir Jesus. Sem dúvida, que João é o mais exato em seu relato, já que parece ser uma testemunha do fato, indicando até a hora (4 da tarde). Por que, pois, a diferença? Houve um segundo chamado que podemos considerar como definitivo? Em primeiro lugar devemos entender que os relatos evangélicos [não os ditos] não são exatos, mas têm muito de redacionais, e nessa redação existe uma alta percentagem de intencionalidade. Encontrar esta é saber a razão do relato como exemplo e moral de uma história. No caso, querer transformar pescadores de peixes em pescadores de homens, para mostrar que não era importante a humilde condição dos apóstolos para dar crédito aos mesmos. Mas para João, tardio em seu evangelho, e em circunstâncias diferentes, quando encontra ainda discípulos do Batista que nele acreditavam, o caso é mostrar como, desde o início, os discípulos de João o abandonam e, de seu 10 mestre passam a ser apóstolos de Jesus, com o qual, nem o Batista é diminuído, nem a figura de Jesus pode ser vista como igual no plano da salvação. Pois há uma continuação necessária entre o discipulado de João e o de Jesus. Talvez fosse esta forma de narrar do quarto evangelista, uma maneira de dizer aos discípulos do Batista, ainda existentes na época, que deviam mudar de mestre e que era Jesus o apontado pelo Batista como quem devia vir e se tornar primeiro antes dele. Em segundo lugar, existe uma outra razão: Os pescadores eram considerados como de segunda classe entre os judeus. João escreve seu evangelho para os judeus de Jerusalém. Não era conveniente exaltar um fato que dificultava a fé inicial, devido aos costumes contrários da época. Por isso, das 6 vezes que sai a palavra pescador, João não a emprega nunca. Até quando devem tomar o barco para voltar a Cafarnaum, o evangelista disse que subiram num barco. Somente no apêndice do capítulo 21 é que sabemos que Pedro sabia pescar (Jo 21, 3) e com ele uma parte substancial dos apóstolos. Para nós, o ofício de Pedro e dos primeiros apóstolos é indiferente, mas para os antigos cristãos provenientes do judaísmo, era uma questão importante. Sempre poderemos pensar que Jesus escolheu o lixo do mundo para confundir a sabedoria dos sábios (1 Cor 1,18 + e 4, 9+).
PISTAS:
1) Jesus se apresenta como um continuador do Batista, que era profeta do AT. Só que, agora, a pregação de Jesus adquire dois pontos importantes: 10 ) O novo reino não é um juízo, como pensava o Batista (Mt 3, 12), mas uma Boa Nova, uma grande alegria, daí o evangelho. 20) Pede fé nas suas palavras num mundo desconfiado e descrente de possibilidades que não fossem para o triunfo do mal. Esse mesmo é o dever da Igreja de hoje: Se não somos eco das palavras de Jesus, não podemos afirmar nosso discipulado, pois não existe discípulo superior a seu mestre (Mt 10, 24).
2) A fé na palavra é precedida da conversão. É preciso abrir a mente e, sobretudo, libertar o coração para escutar as palavras de Jesus com o máximo proveito. Enquanto os fariseus as rejeitavam por não concordar com seus sentimentos e desejos, pescadores humildes aceitam a conversão na pregação do Batista e a obedecem de imediato na voz de Jesus.
3) Se tivéssemos perguntado aos conterrâneos de Jesus, que pessoas do seu tempo, estavam mais preparadas para receber e poder anunciar a palavra de Deus, escolheriam os Rabis e Grammateoi [doutores], abundantes entre os fariseus. De rejeitar, seriam os pastores e pescadores, como os mais ineptos e incompetentes. Deus sabe como escolher, quando seu evangelho está dirigido com mais propriedade aos humildes da terra, os anowim do AT.
4) A conversão-fé-vocação é o trinômio próprio de todo cristão que toma a presença de Jesus como importante em sua vida. Que devemos fazer? – perguntavam as turbas ao Batista. E ele respondia assim: Quem tem duas túnicas dê uma a quem nada tem. A conversão do bolso –dizia um velho sacerdote – é a única que podemos comprovar como verdadeira.
5) Vemos pela História, como Jesus escolheu vilas sem importância, para a sua primeira apresentação pública. Como, o fato de que alguns o aceitaram e outros muitos o rejeitaram, deu origem a essa profecia de maldição de quem tendo ouvidos não ouve e quem tendo olhos não enxerga. A história atual repete as mesmas conclusões que Jesus tirava da conduta de seus conterrâneos. Por isso, não devemos desanimar com os resultados do anúncio atual do evangelho.
EXCURSUS: NORMAS DA INTERPRETAÇÃO EVANGÉLICA
- A interpretação deve ser fácil, tirada do que é o evangelho: boa nova.
- Os evangelhos são uma condescendência, um beneplácito, uma gratuidade, um amor misericordioso de Deus para com os homens. Presença amorosa e gratuita de Deus na vida humana.
- Jesus é a face do Deus misericordioso que busca o pecador, que o acolhe e que não se importa com a moralidade ou com a ética humana, mas quer mostrar sua condescendência e beneplácito, como os anjos cantavam e os pastores ouviram no dia de natal: é o Deus da eudokias, dos homens a quem ele quer bem e quer salvar, porque os ama.
Interpretação errada do evangelho:
- Um chamado à ética e à moral em que se pede ao homem mais que uma predisposição, uma série de qualidades para poder ser amado por Deus.
- Só os bons se salvam. Como se Deus não pudesse salvar a quem quiser (Fará destas pedras filhos de Abraão).
Consequências:
- O evangelho é um apelo para que o homem descubra a face misericordiosa de Deus [=Cristo] e se entregue de um modo confiante e total nos braços do Pai como filho que é amado.
- O olhar com a lente da ética, transforma o homem num escravo ou jornaleiro:aquele age pelo temor, este pelo prêmio.
- O olhar com a lente da misericórdia, transforma o homem num filho que atua pelo amor.
- O pai ama o filho independentemente deste se mostrar bom ou mau. Só porque ele é seu filho e deve amá-lo e cuidar dele.
- Só através desta ótica ou lente é que encontraremos nos evangelhos a mensagem do Pai e com ela a alegria da boa nova e a esperança de um feliz encontro definitivo. Porque sabemos que estamos na mira de um Pai que nos ama de modo infinito por cima de qualquer fragilidade humana.
Ambientação:
Sejam bem-vindos amados irmãos e irmãs! Um novo tempo se inicia. Estamos no Tempo Comum. Encontrar o Messias é a maior descoberta que também nós poderemos fazer. Um encontro que se torna vocação, partilha de vida, solidez renovada. Pedra nova de um edifí- cio que é a Igreja, que tem o seu fundamento em Cristo e, em Cristo, os Apóstolos. Quem se deixa encont rar por Cr isto inicia uma histór ia nova. "Vinde ver" e, vendo-o, descubramos a riqueza do seu amor. Em nossa Eucaristia dominical, fazemos nosso ato de fé e realizamos o encontro pessoal com o Messias. Envolver nossa vida com Jesus e conviver com Ele para sempre deve ser nosso projeto pessoal, diante do chamado que Ele nos faz. Sendo discípulos missionários, nossa vida inteira se resume numa grande missão: levar o Cristo a todos os corações. Nessa perspectiva, a Eucaristia fortalece nosso compromisso de anunciar Jesus nesta Cidade, que foi fundada para ser morada de Deus e terra da fraternidade. Sintamos o júbilo real de Deus em nossos corações e cheios dessa alegria divina entoemos cânticos jubilosos ao Senhor!
(coloque o cursor sobre os textos em azul abaixo para ler o trecho da Bíblia)
PRIMEIRA LEITURA (1 Samuel 3,3-10.19): - "Falai, Senhor; vosso servo escuta!"
SALMO RESPONSORIAL 39(40): - "Eu disse: Eis que venho, Senhor! Com prazer faço a vossa vontade."
SEGUNDA LEITURA (1 Coríntios 6,13-15.17-20): - "não sabeis que o vosso corpo é templo do Espírito Santo, que habita em vós, o qual recebestes de Deus"
EVANGELHO (João 1,35-42): - "Rabi (que quer dizer Mestre), onde moras?."
Homilia do Diácono José da Cruz – 2º Domingo do Tempo Comum
"O QUE ESTAIS PROCURANDO?"
A vida é marcada por muitos encontros, conseqüência de uma procura, um dos mais belos é quando alguém encontra o grande amor de sua vida! Há um momento solene e inesquecível na celebração de um casamento na igreja, é quando após a entrada da noiva, o noivo vai acolhê-la ainda no corredor, há muitos que vêem aquele momento como a uma despedida do pai que entrega filha para o futuro genro. No fundo é isso mesmo, porque aquele encontro é diferente de todos os demais que já tiveram, pois mesmo o primeiro encontro que é tão emocionante para muitos, não tem o significado deste, realizado aos pés do altar. Por quê?
Porque se trata de um encontro definitivo, para sempre, por toda a vida, vão formar uma nova família, vão ser uma só carne, vão morar sob um mesmo teto. Não haverá mais, ou pelo menos, não é para haver, nenhuma separação, até que a morte os separe – afirma categoricamente o rito do casamento. O encontro que fazemos com Deus em nossa vida, através da experiência com Jesus, tem e precisa ser algo definitivo, como uma aliança de casamento, precisamos consentir que Jesus entre em nossa vida e ali permaneça, mas para isso é preciso que entremos na vida nova que ele nos oferece e ali permaneçamos. Talvez por isso o verbo permanecer é tão repetido no evangelho de João.
O amor autentico e verdadeiro não se contenta com encontros casuais, que não geram compromisso de vida, os encontros do namoro e do noivado, embora importantes, nunca são definitivos, quem já não viu noivos que desistiram do casamento uma semana antes da cerimônia? Não há vínculo em tais encontros, embora sejam eles muito importantes porque exercitam o coração para a busca do verdadeiro amor que só será possível na comunhão de vida.
Às vezes muitos cristãos vivem esse relacionamento com Jesus, se dizem apaixonados por ele, encantados com a sua pessoa, com suas palavras, com seu corpo e sangue, mas a vida de fé se resume em encontros ocasionais com o Senhor, sem muito compromisso de vida, em uma assembléia é difícil encontrar alguém que não se sinta fortemente atraído por Jesus Cristo, mas ao deixarem a igreja templo e voltarem para suas casas, seu trabalho, seu estudo, será que permanecem fiéis a este amor, ou vivem procurando encontros fortuitos com outros amantes?
A este respeito recordo-me dos encontros jovens do meu tempo, que eram denominados “Encontro com Cristo”, sempre muito comovedor onde a moçada se derretia em lágrimas nas reflexões, que eram muito profundas, mas depois... Ficava só nisso, amava-se o Cristo, mas não se amava a sua igreja, a família, os amigos, a esposa, os filhos, um amor que não gera compromisso de vida não pode se dizer que é verdadeiro.
João Batista encontrou este amor que requer desprendimento, que nunca nos leva a nós, mas aos outros, por isso aponta a dois de seus discípulos aquele que é o “cordeiro de Deus”, isso é, o amor capaz de imolar-se pelo bem do homem. Os discípulos passam a seguir Jesus, pois o que procuravam não encontraram em João, mas agora a procura terminou. Querem saber onde Jesus mora, porque desejam com ele uma relação mais íntima e forte, o que sentem não é um entusiasmo passageiro, mas algo que é para sempre. Por isso vão e passam a morar com o Senhor. Nessa casa do Senhor, que é o nosso coração, Jesus não pode ser um simples inquilino ou visitante, ele terá que ser o dono da nossa vida, porque sem ele o nosso coração não passa de uma casa vazia e abandonada.
Quando se está comprometido com o Senhor, tudo o que é nosso torna-se dele, e tudo o que é dele, torna-se nosso.suas palavras, seus ensinamentos, seu evangelho passa a ser as diretrizes de nossa vida. Daí o nosso testemunho coerente, que manifesta a alegria de quem encontrou o verdadeiro amor, é contagiante como o de André, que conduz Simão até Jesus.
E Simão se torna Pedra, rocha firme capaz de abrigar e acolher o novo povo que está surgindo, povo da nova aliança, prefiguração da nova humanidade que terminou sua procura ao encontrar-se com Jesus. Assim como esses primeiros discípulos, a Igreja nada mais busca ou procura, mas apenas anuncia o Cristo, Messias, salvador e libertador do homem, único capaz de tirar o seu pecado e revesti-lo da sua graça operante e santificante.
José da Cruz é Diácono da
Paróquia Nossa
Senhora Consolata – Votorantim – SP
E-mail jotacruz3051@gmail.com
Homilia do Padre Françoá Rodrigues Costa – 2º Domingo do Tempo Comum
“Domingo: permanecer com o Senhor!”
André e João “foram e ficaram com ele aquele dia” (Jo 1,39). Também a nós foi dado um dia para que permaneçamos com Jesus, o domingo. Nós, os cristãos, precisamos redescobrir o domingo como o kyriaké, Dies Domini, Dia do Senhor. Não deixa de chamar a atenção como às vezes a Missa dominical é vista mais como um preceito do que como um encontro necessário à vida de um filho de Deus. O preceito de fato existe, pois a Igreja quis garantir um mínimo vital para o cristão: participar da Missa aos domingos e dias santos. A razão da lei da Igreja não é o preceito em si, mas esse mínimo vital do qual falávamos antes. Os primeiros cristãos compreendiam bem essa realidade quando, por exemplo, quarenta e nove cristãos da cidade de Abitene (na atual Tunísia) foram surpreendidos numa celebração dominical, apesar das ordens contrárias do imperador. Perguntados por que tinham desobedecido às ordens imperais, Emérito, um dos participantes daquela eucaristia, deu a seguinte resposta: sine domínico non possumus, ou seja, nós, os cristãos, não podemos ser, nem existir, nem viver sem a celebração da Eucaristia dominical.
É-nos necessário o domingo! Esse foi o dia feito por Deus para que fiquemos bem perto dele. Como canta o Salmista: “Esse é o dia que o Senhor fez: seja para nós dia de alegria e de felicidade” (Sl 117,24). Antes, durante a antiga a aliança, foi o sábado; depois da Ressurreição de Jesus, os cristãos seguem o domingo. O sábado, celebração da criação e do repouso de Deus, era figura da realidade que o domingo significa: a nova criação e o repouso eterno iniciados com a ressurreição do Senhor Jesus. O apóstolo Paulo deixou bem claro que os cristãos já não devem sentir-se vinculados ao sábado: “ninguém, pois, vos critique por causa de comida ou bebida, ou espécies de festas ou de luas novas ou de sábados. Tudo isto não é mais que sombra do que devia vir. A realidade é Cristo” (Cl 2,16-17). Santo Inácio de Antioquia (+110 d.C.) explicou aos cristãos de Magnésia a passagem do sábado para o domingo da seguinte maneira: “aqueles que viviam na antiga ordem das coisas chegaram à nova esperança, e não observam mais o sábado, mas o dia do Senhor, em que a nossa vida se levantou por meio dele e da sua morte” (Aos Magn., 9,1). Obviamente, tais afirmações não resultam um desprezo para com as prescrições do Antigo Testamento, de fato o Catecismo diz o seguinte: “o culto dominical cumpre o preceito moral da Antiga Aliança, cujo ritmo e espírito retoma ao celebrar cada semana o Criador e o Redentor de seu povo” (Cat. 2176). O Antigo Testamento cumpriu a sua missão de preparação em relação ao Novo e, diria mais, continua cumprindo; mas quando chegou a realidade, Cristo, já não tem sentido continuar insistindo nas figuras antigas.
O domingo é o dia para que também nós façamos como João e André: permanecer com o Senhor! Como? Em primeiro lugar, participando da Missa dominical em comunhão com os nossos irmãos. É na Eucaristia que nós encontramos o acontecimento fundacional do dia do Senhor, ou seja, o Mistério Pascal da Paixão, Morte e Glorificação de Jesus Cristo. Este também é o acontecimento fundacional da nossa nova vida em Cristo. Podemos entrar em contato com a grande Páscoa de Cristo na páscoa dominical. Daí que nós não podemos dizer: “ah, eu rezo em casa, não vou à igreja”. É na celebração eucarística que se atualiza de maneira misteriosa o acontecimento que nos deu nova vida e é no domingo que nós celebramos o triunfo de Cristo sobre o demônio, o pecado e a morte. São João Crisóstomo explicava aos cristãos do seu tempo: “não podes rezar em casa como na Igreja, onde se encontra o povo reunido, onde o grito é lançado a Deus de um só coração. Há ali algo mais, a união dos espíritos, a harmonia das almas, o vinculo da caridade, as orações dos presbíteros” (Incomprehens. 3,6).
Em segundo lugar, podemos permanecer com o Senhor encontrando-o nos nossos semelhantes. O domingo é o dia da caridade, do serviço generoso e do descanso que também faz descansar os outros. “Durante o domingo e os outros dias de festa de preceito, os fiéis se absterão de se entregar aos trabalhos ou atividades que impedem o culto devido a Deus, a alegria própria ao dia do Senhor, a prática das obras de misericórdia e o descanso conveniente do espírito e do corpo” (Cat. 2185). Tudo isso, porque “Esse é o dia que o Senhor fez: seja para nós dia de alegria e de felicidade” (Sl 117,24).
Pe. Françoá Rodrigues Figueiredo Costa
Comentário Exegético – 2º Domingo do Tempo Comum - Ano B
(Extraído do site Presbíteros - Elaborado pelo Pe. Ignácio, dos padres escolápios)
EPÍSTOLA (1 Cor 6, 13c-5a, 17-26)
INTRODUÇÃO: Paulo tinha falado aos de Corinto sobre a liberdade cristã que alguns, com estas palavras da filosofia estóica usavam como lei evangélica: tudo me está permitido. E as rejeita com duas consequências de ordem natural: Porém, nem tudo é conveniente; e não posso me escravizar a desejos que me animalizam (v. 12). De fato está falando a cidadãos de uma polis em que o vício sexual era a coisa mais comum. As prostitutas sagradas tornavam a fornicação um hábito social que dominava mentes e costumes entre os habitantes de Corinto. Aqui se inicia a epístola de hoje.
O FIM DO CORPO: O corpo não para a fornicação, mas para o Senhor; e o Senhor para o corpo (13). Corpus autem non fornicationi sed Domino et Dominus corpori. Ao argumento natural de que não é conveniente a fornicação e que ela leva a uma escravidão como acontece com todo vício, agora Paulo oferece uma nova razão do tipo teológico: o corpo de um cristão pertence a Cristo pois é parte de seus membros, como dirá na continuação no versículo 15: Não sabeis vós que os vossos corpos são membros de Cristo? Tomarei, pois, os membros de Cristo, e fá-los-ei membros de uma meretriz? Não, por certo. Como próprio da argumentação semítica a tese precede o silogismo. Paulo afirma o senhorio de Jesus no versículo 13, e nos 14 e 15 aduz as razões para validar o mesmo: a ressurreição que teve como causa tanto modelar como eficiente a de Cristo; e consequentemente que nossos corpos devem sua vida eterna e definitiva ao Senhor Jesus. Logo este é o Senhor dos corpos e a ele pertencem em definitivo, não podendo usar dos mesmos fora dos planos divinos. Numa outra ocasião, Paulo afirmará que o sacrifício dos que são sacerdotes leigos [sacerdócio real segundo 1 Pedro em 2, 4-6] é o de seu próprio corpo: Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional (Rm 12:1).
A RESSURREIÇÃO: Pois o Deus tanto ressuscitou o Senhor como também vos ressuscitará por meio de seu poder (14). Deus vero et Dominum suscitavit et nos suscitabit per virtutem suam. A razão do princípio anterior [o corpo é para o Senhor] é que a nossa vida futura depende de Deus que será o que nos dará o novo corpo ressuscitado como o deu a Cristo, o Senhor. Ressurreição que devemos também a intercessão, melhor diríamos, mediação de Cristo; porque se fomos plantados juntamente com ele na semelhança da sua morte, também o seremos na da sua ressurreição (Rm 6,5) pois se o Espírito daquele que dentre os mortos ressuscitou a Jesus habita em vós, aquele que dentre os mortos ressuscitou a Cristo também vivificará os vossos corpos mortais, pelo seu Espírito que em vós habita (Rm 8, 11). Sabendo que o que ressuscitou o Senhor Jesus nos ressuscitará também por Jesus, e nos apresentará convosco (2 Cor 4, 14). E efetivamente, esse Espírito que é PODER [dynamis<1411>=virtus] e que habita em nós é quem fará o milagre de nossa ressurreição como fez o milagre da ressurreição de Cristo, erguendo-o dos mortos pelo poder não de sua carne como homem, mas de seu Espírito, como Filho de Deus, ao ressuscitar Jesus Cristo da morte e ao dar-lhe o lugar de honra à sua direita, no céu (Ef 1, 20). Que, como diz Paulo no versículo anterior, é um poder extraordinário que ele nos dá, a nós os crentes. Porque foi esse grande e extraordinário poder que ele manifestou no mais alto grau, ao ressuscitar Jesus Cristo da morte (Ef 1, 19-20). De modo que a ressurreição é pelo poder do Espírito que habitava em Cristo e habita em todo cristão batizado no seu nome. Espírito que é superior a toda carne. Daí que no versículo anterior Paulo podia afirmar que o corpo pertence ao Senhor e não à fornicação.
COMO MEMBROS DE CRISTO: Não sabeis que vossos corpos são membros de Cristo? (15). Nescitis quoniam corpora vestra membra Christi sunt. Essa identidade entre Cristo e os cristãos não é só como comunidade de Espírito, mas também como identidade de corpos. Paulo usa a palavra melë [<3196>=membra], plural neutro de melos, membro ou parte de um todo como em Mt 5, 25: É melhor que se perca um dos teus membros [tön melön sou] do que seja todo o teu corpo lançado ao inferno. Significado que vemos confirmado por Paulo em Rm 7, 5: Quando estávamos na carne, as paixões dos pecados, que são pela lei, operavam em nossos membros para darem fruto para a morte. Esta afirmação paulina é de extraordinária valia: Estamos unidos a Cristo, não unicamente pelo Espírito de filhos, que nos foi dado (Rm 8, 16), mas também pelo corpo. Ou seja, todo nosso ser foi divinizado pelo batismo, de modo que entre nós e Cristo, como homem, a diferença é já de grau e não de substância. Essa união é melhor compreendida com a segunda parte deste versículo, em que Paulo compara a união Cristo-batizado com a união meretriz-parceiro, união esta íntima como a dada entre esposos, porém com fins puramente voluptuosos. Dirá Paulo: Tomarei, pois, os membros de Cristo, e fá-los-ei membros de uma meretriz? (v 15 b). Assim o explica Paulo, afirmando no versículo seguinte que não entra a formar parte da leitura da epístola de hoje: Não sabeis que o que se ajunta com a meretriz, faz-se um corpo com ela? Porque serão, disse, dois numa só carne (16).
UNIÃO DE ESPÍRITOS: Quem, pois, está unido ao Senhor um só Espírito é (17). Qui autem adheret Domino unus spiritus est. Paulo retoma, após o pequeno exemplo da meretriz, o fio essencial de seu discurso: Estar unido a Cristo é ter o mesmo e único Espírito. Nele era pessoal como Filho único. Em nós é participativo como imbuídos. Mas o trabalho desse Espírito é o mesmo em ambos os sujeitos: a união com a pessoa do Verbo que nos santifica. Daí que a frase Christianus alter Christus seja tão real como verdadeira.
A PROSTITUIÇÃO: Fugi da fornicação. É pecado tudo o que o homem fizer fora do corpo; mas o fornicador contra seu próprio corpo peca (18). Fugite fornicationem omne peccatum quodcumque fecerit homo extra corpus est qui autem fornicatur in corpus suum peccat. FORNICAÇÃO [porneia<4202>=fornicatio] em geral porneia é uma relação sexual ilícita. Distinto de moicheia [<3430>= adulterium] (Mt 15, 19) era a prostituição ou relação com uma meretriz, que pelo que Paulo escreve, era vício comum entre os de Corinto e seguido também pelos novos cristãos. Porneia é o termo usado por Mt 5, 32 repudiar sua mulher, a não ser por causa de prostituição, faz que ela cometa adultério. E em Mc 7, 21 claramente se distingue do adultério: Do interior do coração dos homens saem os maus pensamentos, os adultérios [moicheiai], as prostituições [porneiai], os homicídios. No caso de Mt 5, 32 parece que o evangelista, um magistrado, usa um termo legal indicando uma mulher não legítima como era uma segunda mulher ou uma parente próxima que era considerada como pornë [meretriz] pela lei. Na realidade a tradução mais correta de porneia seria prostituição, pois a palavra é derivada de pornë que segundo Mt 21, 31 era uma mulher pública como confirma Jo 8, 41 quando os judeus respondem a Jesus: Nós não somos nascidos de prostituição; temos um Pai, que é Deus. A prostituição era vício comum entre os pagãos e por isso no Concílio de Jerusalém se recomenda que se abstenham das contaminações dos ídolos, da prostituição, do que é sufocado e do sangue (At 15, 20). Se no versículo anterior as razões eram de ordem transcendente, agora Paulo aduz uma outra que implica ser a prostituição pecado íntimo em que o corpo é tratado com impura desordem e degradação. De modo que a malícia é interna, depravando a santidade do corpo que pertence a Cristo (v 15) e que como dirá logo (v.19) é templo do Espírito Santo.
O CORPO TEMPLO DE DEUS: Ou não sabeis que vosso corpo templo é do Santo Espírito que em vós (habitante) tendes (recebido) por parte de Deus e não sois de vós mesmos? (19). An nescitis quoniam membra vestra templum est Spiritus Sancti qui in vobis est quem habetis a Deo et non estis vestri. A primeira coisa a notar é que a Vulgata fala de membros quando o grego usa a palavra corpo, muito mais em conformidade com o contexto. Esta ideia paulina do corpo/templo é repetitiva de Paulo: Não sabeis vós que sois o templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós (1 Cor 3, 16). E para afirmar que não é uma invenção sua, Paulo citará um texto do AT: Porque vós sois o templo do Deus vivente, como Deus disse: Neles habitarei, e entre eles andarei; e eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo(2 Cor 6, 16). O texto mais próximo do AT é Êx 29, 45: Habitarei no meio dos israelitas e serei seu Deus. Segundo a maneira de usar como citação o AT, este versículo e outros, como Ez 36, 28, são a base para uma interpretação livre e completa ao se referir a cada indivíduo o que em Êx 25, 8 diz Jahveh do seu santuário: Me harán un santuario y habitaré en medio de ellos. De um templo matéria, Paulo passa ao templo corporal de cada cristão, pois é aí onde o Espírito tomou posse no batismo. Sendo, pois a casa de Deus, o corpo não pertence a cada um, mas é propriedade do Deus que nele habita. Deve ser considerado sagrado, como todo templo era, e toda impureza deve ser evitada como era na época toda comida impura. Ainda mais: se a prostituição era em Corinto especialmente sagrada por causa das prostitutas, Paulo poderá clamar com razão: Que consenso tem o templo de Deus com os ídolos? (2 Cor 6, 16). A consequência é clara: como templos de Deus, podemos assegurar com Paulo que nenhum de nós vive para si, e nenhum morre para si. Nenhum de nós vive para si, porque, se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor morremos. De sorte que, ou vivamos ou morramos, somos do Senhor (Rm 14, 7-8).
O PREÇO: Fostes, pois, comprados por um (bom) preço; glorificai, portanto, a Deus em vossos corpos(20). Empti enim estis pretio magno glorificate et portate Deum in corpore vestro. PREÇO [timë<5092>=pretium] como diz 1 Pd 1, 18-19: Não foi com coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados da vossa vã maneira de viver que por tradição recebestes dos vossos pais; mas com o precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro imaculado e incontaminado. Por isso, Paulo adverte aos de Corinto: Fostes comprados por bom preço; não vos façais servos dos homens. O preço da cruz nos torna escravos de Cristo e como não podemos servir a dois senhores (Lc 16, 13), daí a conclusão de Paulo: devemos glorificar a Deus em nossos corpos, do modo que o Apocalipse declara em 5, 9: Cantavam um novo cântico, dizendo: Digno és de tomar o livro, e de abrir os seus selos; porque foste morto, e com o teu sangue compraste para Deus homens de toda a tribo, e língua, e povo, e nação. O cristão em corpo e alma se deve ao seu Senhor que o resgatou a preço muito alto e deve viver para servi-lo e glorifica-lo.
EVANGELHO (Jo 1, 35-42) - O CORDEIRO DE DEUS
No dia seguinte, de novo, estava João e de seus discípulos, dois (35). Altera die iterum stabat Iohannes et ex discipulis eius duo. NO DIA SEGUINTE: Este e a outra concretização cronológica [4 da tarde] indicam uma memória testemunhal que conserva palavras e detalhes de maneira pessoal, como quem esteve presente a toda a narração. DISCÍPULOS: É a primeira vez que o evangelista fala dos discípulos de João. Serão logo nomeados em 3, 25 na disputa entre um judeu de Jerusalém e os discípulos do Batista. Este é um episódio de difícil interpretação, que não corresponde a este evangelho.
CORDEIRO DE DEUS: E tendo olhado para Jesus, estando deambulando, diz: Eis o cordeiro de(o) Deus! (36). Et respiciens Iesum ambulantem dicit ecce agnus Dei. O evangelista usa um presente histórico, misturado com o aoristo inicial de ter descoberto Jesus, que caminhava nesse instante perto de onde se encontrava. CORDEIRO DE DEUS: Os títulos messiânicos conhecidos são: Messias, Cristo, Ungido, Eleito de Deus, Amado de Deus, Rei de Israel, Filho de Davi e Filho do homem (=título este, que Jesus se dá a si mesmo, interpretando Daniel 7,15+). Mas por que o título de Cordeiro de Deus? Somente em outra ocasião, e unicamente o quarto evangelista, aponta Jesus como tal cordeiro (1,19). Vamos explicar esse título que se torna messiânico no quarto evangelho. Sabemos como João foi considerado novo Elias, semelhante no vestir (II Rs 1,8) e cujo espírito batalhou contra a nova Jezabel (I Rs 16,31), neste caso Herodiades, e as práticas antiéticas dos dirigentes do povo (Mt 3,7). No versículo 19 o Cordeiro de Deus está unido a quem tira o pecado do mundo. E finalmente no versículo 34 temos o testemunho claro, messiânico de João ao declarar Jesus como o Eleito de Deus, leitura hoje preferida à de outros códices que trazem Filho de Deus. Os outros 3 evangelistas falam da palavra ouvida por João após o batismo de Jesus: Tu és o meu Filho, bem amado; Aprouve-me escolher-te.(Mc 1,11). Ou em Lucas Tu és o meu filho, eu, hoje te gerei (Lc 3,22). Em Lucas, claramente, temos uma alusão ao salmo 2,7 como sendo o batismo de Jesus o dia da coroação do novo rei. A palavra Cordeiro, amnoj <286>[amnos] em latim agnus, que também admite o arnion [cordeirinho] diminutivo de aren provém de uma tradução grega da palavra TALEH [<0294>]. Os modernos, desde J. Jeremias, explicam a palavra Cordeiro como sendo uma tradução grega da palavra Talya, que pode significar tanto servo, como menino, ou cordeiro [pessoalmente não tenho encontrado a tal palavra talya nos dicionários, só nos comentários]. Jeremias, o intérprete da palavra, diz que Talye Jahveh não tem significado algum como servo de Jahveh {só ebed Jahve, ou ebed elohim como é chamado Moisés pais tou theou, oiketes ou doulos (Dt 34, 5 e Dn 9, 11 respectivamente) e Davi (Sl 18, 1)} e, portanto, deveria ser traduzido como cordeiro de Deus. Em Dn 9, 10 os profetas são chamados de servos do Senhor. Por isso, é possível que João, o Batista, esteja interpretando a passagem de Isaías do 4o canto do servo, desde 52,13 até 53,12. Este canto, chamado de quinto evangelho, é uma profecia de como, através do sofrimento, o servo toma sobre si as iniquidades do povo. Nele encontramos o versículo 7 que, na tradução RA, diz: Ele foi oprimido e humilhado, mas não abriu a boca; como cordeiro [taleh], foi levado ao matadouro, e, como ovelha [she], muda perante os seus tosquiadores ele não abriu a boca. Neste trecho, o servo é levado ao matadouro como um cordeiro; o que unido ao versículo 12, levou sobre si o pecado de muitos e pelos transgressores fez intercessão, pode ser suficiente para o Batista chamá-lo de Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. De todas as formas, será o mesmo evangelista que, tanto no fim do evangelho como no Apocalipse, retomará a ideia de Cristo como cordeiro sacrificado. Ele mesmo, ao se referir à lança que transpassou o corpo morto de Jesus, testemunha que nenhum osso fora quebrado, referência clara ao cordeiro pascal. Paulo também se torna solidário desta ideia em I Cor 5,7. Já no Apocalipse o símbolo base de Cristo é o Cordeiro imolado (5,6). Se os judeus foram excluídos do castigo no dia da páscoa no Egito, ao ver o exterminador o sangue nas portas, esse sangue de Jesus também é salvação para quem o invoca como proteção. Daí que o pecado do mundo é por ele tirado. PECADO DO MUNDO: Vamos explicar o pecado do mundo pelas palavras do mesmo escritor do evangelho. Em 1 Jo 3, 5-6 lemos: Sabeis também que ele (Jesus) se manifestou para tirar os pecados e nele não existe pecado. Todo aquele que permanece nele não vive pecando; todo aquele que vive pecando não o viu, nem o conheceu. E em 1 Jo 3, 9: Quem nasceu de Deus não peca, porque a semente de Deus está nele. A diferença entre o singular [pecado] e o plural [pecados] é que estes últimos são os atos pecaminosos das pessoas e o singular se refere à condição pecaminosa à qual estava submetido o mundo antes de Cristo. Existe alguma tradição anterior ao Batista para que este, e não o evangelista, atribua a frase completa a Jesus? Sim. Na apocalíptica judaica, no começo do juízo final, aparece a imagem de um cordeiro vitorioso que aniquilará o mal que existe no mundo. O Testamento de José fala de um cordeiro [amnos] que derrota as bestas do mal e as pisoteia. E a figura encaixa muito bem na pregação do Batista que fala da ira vindoura como final de uma época e início da messiânica. Portanto, não é difícil imaginar que o Batista definisse ‘aquele que vem’ como o Cordeiro apocalíptico de Deus. Tirar o pecado do mundo é paralelo, por outra parte, a destruir a obra do diabo, do mesmo autor (Jo 3, 8). A esta interpretação de Raymond Brown, podemos acrescentar uma outra de Jeremias, Cullman e De la Potterie: O fundamento é que a palavra Taleh [hebraica por cordeiro] é em aramaico Talyâ que pode significar também servo, embora a palavra usada por Isaías para designar servo seja ‘ebed [aramico ‘abdâ]. Uma terceira posição é a dos que veem o cordeiro como pascal. 1 Pd 1, 18-19 fala do resgatados da vida fútil …pelo sangue precioso de Cristo como de um cordeiro sem defeito e sem mácula. Todas têm sua força, mas inclino-me pela primeira, a de Isaías, que tem como base interpretativa o Testamento de José, parte do livro apócrifo do Testamento dos doze patriarcas, escrito na última metade do século aC.!
O SEGUIRAM: E ouviram os dois discípulos ele falando e seguiram Jesus(37). Et audierunt eum duo discipuli loquentem et secuti sunt Iesum. O texto grego usa o genitivo absoluto [falando ele] e o verbo ouvir em impessoal, construção que tenho tentado conservar. A rapidez da resposta dos dois discípulos de João indica que eles compreenderam perfeitamente o ministério subordinado de seu Mestre.
RABBI, ONDE MORAS? Tendo-se voltado, pois, Jesus e olhado a eles acompanhantes, diz-lhes: Que buscais? Eles, então, disseram-lhe: Rabbi, o que é interpretado Mestre, onde moras? (38). Conversus autem Iesus et videns eos sequentes dicit eis quid quaeritis qui dixerunt ei rabbi quod dicitur interpretatum magister ubi habitas RABBÍ: De origem semita, composta de Rab [excelente, grande] e o sufixo pessoal I [meu] de primeira pessoa. Seria traduzido por minha excelência. Hoje nós falamos de sua Excelência, abstraindo o título que anteriormente aportávamos, referindo-o à pessoa do falante. Porém, nos tempos de Jesus, significava o título com o qual designava a pessoa do mestre [didáskalos grego], instrutor ou professor [ magister latino]. Oposto a didáskalos está o mathetês [estudante, aluno, discípulo]. Quando referido a Jesus, Rabbí indica um termo de respeito, que era dado aos escribas judeus (Lc 2,46), os didaskaloi aos quais o menino Jesus perguntava no átrio de Salomão, no templo. Eram esses mestres que os evangelhos chamam de grammates, intérpretes da Lei ou da Tonak [letras iniciais dos três componentes: Torah (Lei), Neviim (profetas) e Ketuvim (hagiógrafos)]. O apóstolo, escritor do evangelho, testemunha ainda viva dos fatos, recorda bem a palavra semítica inicial do diálogo [rabbí] e como não era corrente no mundo greco-romano, a traduz imediatamente, se é que essa tradução não fosse devida ao amanuense circunstancial da cópia. Uma outra palavra, usada para indicar a posição de superioridade de Jesus é epistatês, com o significado de chefe, comandante, ou mestre. Como em Lc 5, 5, Simão disse: Epistata [chefe] toda a noite nada apanhamos. É a tradução que Lucas dá ao Rabbí dos outros evangelistas, que não usam o epistatês, mas unicamente Rabbí ou Kyrios. De fato, também Lucas usa o Kyrios, porém jamais emprega o vocábulo Rabbí. ONDE MORAS: O grego usa o verbo Menô, que, inicialmente, significa permanecer, ficar, e daí, podemos traduzir por morar, residir [ubi habitas, latino]. Os antigos mestres moravam junto com os alunos, constituídos em verdadeiros discípulos. Isto indica o propósito de serem não meros ouvintes ou alunos, mas verdadeiros discípulos do novo mestre, apontado como tal por um profeta, o Batista. Na vida pública de Jesus vemos como os discípulos o acompanhavam e formavam uma família nova, segundo as palavras de Jesus: Quem é minha mãe e quem são meus irmãos? E estendendo a mão para seus discípulos, disse: Eis minha mãe e meus irmãos (Mt 12, 48-49).
A RESPOSTA: Diz-lhes: Vinde e vede. Vieram e viram onde está morando e permaneceram junto a ele naquele dia; pois a hora era como décima (39). Dicit eis venite et videte venerunt et viderunt ubi maneret et apud eum manserunt die illo hora autem erat quasi décima. Discípulos: Pelo que sabemos em outras passagens, entre as normas dos discípulos de João estavam os jejuns (Mc 2, 18) e algumas orações particulares (Lc 5, 33). À parte, como batizados por João, tinham feito a sua metânoia [conversão] própria da preparação para os novos tempos. Dispostos, como clamava o Batista, a repartir comida e vestidos (Lc 3, 10) com os que nada tinham. O desprendimento dos bens externos é sinal de interior abnegação que responde perfeitamente ao que Jesus exigia de seus seguidores: negar-se a si mesmo para estar disposto a tomar a cruz. Nada de jejuns, que viriam após sua morte e por outra parte só anunciou a oração comum a pedido dos discípulos (Lc 11, 1). Realmente o que Jesus pediu como sinal de seu discipulado era se negar a si mesmo e tomar a cruz, para o seguir (Mt 16, 24), fato que abrange toda a vida do discípulo. HORA DÉCIMA: Como Judeu, o evangelista, conta as horas , doze e doze, tendo como origem as 6 da manhã para as horas do dia e as 6 da tarde para as da noite. Consequentemente, seriam as 4 da tarde. O detalhe não parece ter simbolismo algum, mas é um dado que nos indica que o narrador estava presente como testemunha.
ANDRÉ: Era André, o irmão de Simão Pedro, um dos dois que escutaram de João e o acompanharam (40). Erat autem Andreas frater Simonis Petri unus ex duobus qui audierant ab Iohanne et secuti fuerant eum. Dos dois discípulos, sabemos a identidade de um deles e seu nome inconfundível: André, o irmão de Simão Pedro. André, nome de origem grega que significa varonil, e que sabemos era, como seu irmão, pescador, natural de Betsaida, mas morando em Cafarnaum. Apesar de ser um dos primeiros discípulos do Senhor, não foi preferido de modo especial como seu irmão e os dois filhos de Zebedeu. Quem era o outro discípulo? E, como sendo galilleus, se encontravam morando com o Batista? Vamos responder a estas perguntas a começar pela última. Porque João batizava em Betabara, ou a chamada Betânia do outro lado do Jordão [Bethany beyond the Jordan]. Betabara estava na Decápolis muito perto de Pela e de Citópolis [antiga Betsan] distante 35 km de Caná em linha reta. A isso contribuem os dias a contar para chegar a Caná e os personagens, todos da Galileia: tudo isso não seria possível caso identificássemos Betânia como uma cidade que estava perto de Jericó. O mapa da bíblia KJ Key Word o confirma, assim como a narração de Jo 3, 23 em que se diz que João batizava em Enon [as fontes] a alguns quilômetros de Citópolis. Respondendo agora à primeira pergunta, quem era o outro discípulo devemos pensar que muito provavelmente João o evangelista, o irmão de Tiago e filho do Zebedeu. Foi o discípulo preferido [que Jesus amava] e seu nome sai 3 vezes em Mateus, 10 em Marcos e 6 em Lucas. Mas não sai no quarto evangelho. Quando junto com Tiago, seu irmão, o nome deste o precede como precedeu seu nascimento. Unicamente em Jo 21, 22 aparecem os dois filhos do Zebedeu, mas sem nome próprio e mais dois discípulos [também sem nome] que são testemunhas, junto com Tomé e Natanael [o de Caná] da aparição de Jesus ressuscitado no lago da Galileia. Dentre estes três está o discípulo preferido pelo Senhor, testemunha viva do quarto evangelho e quem o escreveu (Jo 21, 24). Porém, nenhuma vez aparece o nome de João como discípulo do Senhor neste quarto evangelho. Por isso, a tradição aponta a João, o filho do Zebedeu e irmão menor de Tiago, como tal testemunha e discípulo predileto de Jesus. Não temos, pois, razões válidas para desconfiar dessa crença, praticamente universal.
O MESSIAS: Encontra este primeiro, seu próprio irmão Simão e diz-lhe: Encontramos o Messias o qual é interpretado o Cristo (41). Invenit hic primum fratrem suum Simonem et dicit ei invenimus Messiam quod est interpretatum Christus. SIMÃO é o nome grego, e Simeão [=ouvinte] o nome semita do apóstolo. O nosso evangelista prefere o nome grego. Isso indica que este era o comum, por ser, como seu irmão, oriundo de uma cidade, Betsaida, que, em grande parte, era formada por pessoas helenizadas. Sabemos que, segundo nos dizem os outros evangelhos, ambos eram irmãos (Mt 10, 2 e Lc 6, 14) e filhos de Jonas (Mt 16, 17) ou de João (Jo 1, 42 e 21, 15). A translação ao grego de João pode dar lugar à escrita de Jonas [=pomba] no lugar de João [=Deus é bondoso]. MESSIAS: Em grego messias<3323>, do aramaico que traduz o hebraico mashiah <04899> que significa ungido e que em grego, se traduz por Christós <5547>, donde a palavra Cristo.
PEDRO: E o levou para junto de Jesus. Tendo lhe olhado, Jesus disse: Tu és Simão, filho de João; tu serás chamado Kefas, o qual é interpretado Rocha [petrov <4074>] (42). Et adduxit eum ad Iesum intuitus autem eum Iesus dixit tu es Simon filius Iohanna tu vocaberis Cephas quod interpretatur Petrus. KEFAS: Em aramaico significa rocha e o grego petra também significa rocha, penhasco, ou rochedo e não pedra, pois esta é líthos. Esta mudança de nome está relacionada com Mateus 16, 18. Como compaginar este relato de João com os relatos dos sinóticos que dizem serem os discípulos escolhidos por Jesus nas margens do lago de Genesaré, sem intervenção do Batista e sem saber certamente quem era Jesus? Os intérpretes modernos falam de uma composição tardia de João para ressaltar a figura de Jesus, como aquele a quem João apontava como seu sucessor e superior, que não podia ser outro que o Messias. O nome de Kefas dado a Pedro é confirmado também por Mateus (16, 18). Marcos em 8, 29 também confirma o título de Messias dado a Jesus, mas desta vez não por André, mas por seu irmão Pedro. O apelido de Kefas é também o usado por Paulo em suas cartas aos Coríntios (1, 12; 3, 22; 9, 5e 13, 5) e em Gálatas (2, 9).
PISTAS:
1) Como vemos, o motivo da aproximação de Jesus com os novos discípulos é a amizade com outros que o tinham experimentado como mestre. André atrai Simão, seu irmão. E Filipe convida seu amigo Natanael. Encontramos o Messias – dirá André, e aquele de quem escreveram Moisés, a Lei e os profetas – será o convite de Filipe a Natanael. E mesmo que este último fosse descrente, porque o apontado como Ungido era de uma miserável aldeia, mais detestável por ser vizinha {Natanael era de Caná}. Ambos, os novos discípulos, foram dirigidos até Jesus por seus amigos.
2) Não existe melhor conduto nem melhor amigo do que a Igreja. Ela faz o papel do Batista, indicando quem é o verdadeiro Messias ou Salvador, pois os livros sagrados dão origem a tantas interpretações que já nos tempos apostólicos Pedro podia afirmar que os ignorantes e vacilantes torcem, como fazem com as demais Escrituras, para a sua própria perdição (2 Pd 3, 16). A segurança de que interpretamos corretamente os evangelhos é dada pela Igreja. O seu magistério é como a Estrela que indicou aos magos onde estava o rei que eles esperavam adorar.
3) Além da Igreja e os amigos, será a família quem nos aproxima de Cristo. Uma família que vive sua fé na oração e na assistência à missa dominical, é a melhor aproximação do Salvador nos primeiros anos de nossa vida.
3) Finalmente, na idade madura, o melhor contato com Jesus, pessoal e individual, é a Eucaristia. Nos tempos modernos temos demasiadas proclamas para reduzir esse contato aos livros santos. Porém, para nós católicos, a Eucaristia segue sendo o melhor contato com Jesus. Ele não disse quem me ler terá a vida, mas se não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes o seu sangue, não tereis a vida em vós (Jo 6, 54). Temos que voltar mais para a Eucaristia e saber conversar com Jesus nesses momentos íntimos em que ele habita dentro de nós.
4) Só dois dos discípulos do Batista, entre outros muitos, escutaram a sua palavra. Os outros a ouviram, mas não a acompanharam. É um paradigma do que acontece na vida real, hoje também. Jesus é cada vez mais conhecido; mas também preterido; porque, aparentemente, corta liberdades e se torna um desmancha-prazeres neste nosso mundo, em que tanto a liberdade como as diversões são os deuses novos a serem desejados e adorados. Porém, tanto o Papa anterior como o atual Pontífice, nos dizem [eles o sabem experimentalmente]: Não tenhais medo! A alegria cristã não pode ser confundida com as farras das discotecas e as folias dos carnavais.
EXCURSUS: NORMAS DA INTERPRETAÇÃO EVANGÉLICA
- A interpretação deve ser fácil, tirada do que é o evangelho: boa nova.
- Os evangelhos são uma condescendência, um beneplácito, uma gratuidade, um amor misericordioso de Deus para com os homens. Presença amorosa e gratuita de Deus na vida humana.
- Jesus é a face do Deus misericordioso que busca o pecador, que o acolhe e que não se importa com a moralidade ou com a ética humana, mas quer mostrar sua condescendência e beneplácito, como os anjos cantavam e os pastores ouviram no dia de natal: é o Deus da eudokias, dos homens a quem ele quer bem e quer salvar, porque os ama.
Interpretação errada do evangelho:
- Um chamado à ética e à moral em que se pede ao homem mais que uma predisposição, uma série de qualidades para poder ser amado por Deus.
- Só os bons se salvam. Como se Deus não pudesse salvar a quem quiser (Fará destas pedras filhos de Abraão).
Consequências:
- O evangelho é um apelo para que o homem descubra a face misericordiosa de Deus [=Cristo] e se entregue de um modo confiante e total nos braços do Pai como filho que é amado.
- O olhar com a lente da ética, transforma o homem num escravo ou jornaleiro:aquele age pelo temor, este pelo prêmio.
- O olhar com a lente da misericórdia, transforma o homem num filho que atua pelo amor.
- O pai ama o filho independentemente deste se mostrar bom ou mau. Só porque ele é seu filho e deve amá-lo e cuidar dele.
- Só através desta ótica ou lente é que encontraremos nos evangelhos a mensagem do Pai e com ela a alegria da boa nova e a esperança de um feliz encontro definitivo. Porque sabemos que estamos na mira de um Pai que nos ama de modo infinito por cima de qualquer fragilidade humana.
CAMPANHA DA VELA VIRTUAL DO SANTUÁRIO DE APARECIDA
CLIQUE AQUI, acenda uma vela virtual, faça seu pedido e agradecimento a Nossa Senhora Aparecida pela sagrada intercessão em nossas vidas!
QUE DEUS ABENÇOE A TODOS NÓS!
Oh! meu Jesus, perdoai-nos, livrai-nos do fogo do inferno,
levai as almas todas para o céu e socorrei principalmente
as que mais precisarem!
Graças e louvores se dê a todo momento:
ao Santíssimo e Diviníssimo Sacramento!
Mensagem:
"O Senhor é meu pastor, nada me faltará!"
"O bem mais precioso que temos é o dia de hoje! Este é o dia que nos fez o Senhor Deus! Regozijemo-nos e alegremo-nos nele!".
( Salmos )
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