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Ambientação: Sejam bem-vindos amados irmãos e irmãs! INTRODUÇÃO DO FOLHETO DOMINICAL PULSANDINHO: Estamos reunidos para no alimentar da palavra e do pão que o próprio Jesus nos oferece. Em momento algum, Jesus adaptou sua pregação ao gosto de seus ouvintes, nem traiu o Reino para agradá-los. Desempenhou sua missão na mais absoluta fidelidade ao Pai e a seu Reino, embora correndo o risco de escandalizar as pessoas e afastá-las de si. Por isso, sua linguagem se tornou, para muitos, dura e incompreensível. O discurso sobre o pão da vida chocou a sensibilidade de todos, levando os ouvintes de Jesus até mesmo a duvidar de sua sanidade mental. Na realidade, Jesus não aceitava ser seguido por quem não quisesse acolher sua mensagem, sem restrições. Por isso, a resposta de Pedro sintetizará a atitude do verdadeiro discípulo do Reino. Só Jesus merece ser seguido, por ter palavras de vida eterna, embora duras de serem assimiladas. Celebremos, hoje, em sintonia com todos os nossos leigos, de forma especial com todos os nossos catequistas, agradecendo ao Pai a dedicação deles no serviço da evangelização. INTRODUÇÃO DO WEBMASTER: As leituras de hoje encerram a reflexão sobre o tema da Eucaristia, interrompido domingo passado com a festa da Assunção. Depois que Jesus insistiu que se deve comer seu Corpo e beber seu Sangue, muitos discípulos se afastaram dele porque não acreditavam e diziam: "Esta palavra é dura. Quem consegue escutá-la?" E Jesus se volta para os doze e pergunta: "Vocês também querem ir embora?" Temos então uma escolha para fazer: ou ficamos com o Senhor, assumindo as conseqüências dessa escolha, que são vida de Deus, força de Cristo e também sacrifício, perdão, misericórdia; ou vamos atrás dos outros deuses, como nos diz a primeira leitura, e que são prazeres, orgulho, egoísmo. Devemos responder como São Pedro: "A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna". É a Eucaristia o ponto de união ou divisão. Ou ficamos com o Senhor, comendo sua carne e bebendo o seu sangue, ou vamos por outros caminhos. Não há meio termo. Hoje, no mês vocacional, celebramos o dia do leigo. É aquele que consagra sua vida a serviço do evangelho, pregando em todos os lugares, com o exemplo e a palavra, a mensagem de Jesus. Como político, dentista, operário, professor, ele é a voz e a mão de Deus. De modo todo particular, rezemos pelos nossos catequistas que trabalham diretamente na evangelização.. Sintamos o júbilo real de Deus em nossos corações e cheios dessa alegria divina entoemos alegres cânticos ao Senhor! (coloque o cursor sobre os textos em azul abaixo para ler o trecho da Bíblia) PRIMEIRA LEITURA (Josué 24,1-2.15-18): - "Nós também, nós serviremos o Senhor, porque ele é o nosso Deus" SALMO RESPONSORIAL 33(34): - "Provai e vede quão suave é o Senhor!" SEGUNDA LEITURA (Efésios 5,21-32): - "Por isso, o homem deixará pai e mãe e se unirá à sua mulher, e os dois constituirão uma só carne." EVANGELHO (João 6,60-69): - "Bendita és tu entre as mulheres e bendito é o fruto do teu ventre." Homilia do Diácono José da Cruz – 21º Domingo do Tempo Comum – ANO B "A QUEM IREMOS?" No colégio onde estudei, nas aulas de Educação Física, vez em quando o Professor nos exercitava com a prática de futebol, inclusive ele próprio atuava em uma das equipes. Não era um "racha" qualquer daqueles que jogávamos nos finais de semana, mas o professor, ao escolher a sua equipe, não considerava muito a habilidade do atleta, mas sim a sua disposição física, o seu esforço pela equipe, ele era rígido na disciplina, exigia o máximo de cada um, nas disputas de bola, na marcação, na estratégia do ataque, no seu time ninguém "empurrava com a barriga" ou fazia corpo mole. Nesses coletivos, a equipe disciplinada do "Sêo Armandão", via de regra superava o time adversário, onde às vezes atuavam os "craques" da escola, pois apregoava sempre, que um time vencedor deve saber aliar habilidade, disciplina e uma boa técnica, capaz de mudar a estratégia quando necessário. Os alunos do colégio o chamavam de "Marechal", ele era por aquele tempo um Felipe Scolari, e em competições escolares abertas, sua equipe conquistou muitos troféus. Interessante que os que se achavam "craques", não gostavam muito dessa "linha dura" do Professor. Lembrei-me do "Sêo Armandão", quando refleti esse evangelho onde alguns discípulos de Jesus começaram a "afrouxar" diante das suas exigências, querendo fazer "corpo mole" e "empurrar com a barriga" os seus ensinamentos e a Verdade por ele pregada. Também hoje, nós cristãos, muitas vezes queremos viver um cristianismo arraigado na carne, sem encarar o desafio de vivê-lo em Espírito, e foi exatamente para isso que o Verbo Divino se encarnou em nosso meio, para que fosse possível ao homem carnal, viver no Espírito, sem ser um alienado. Praticar um cristianismo a partir apenas da carne, isso é, das realidades meramente humanas, é a grande tentação dos discípulos de hoje, onde muitos vivem uma religião de normas e preceitos, achando que basta cumprir tudo o que a Santa Igreja ensina, e se algo der errado, a culpa é da Igreja, poderíamos chamar a isso de tradicionalismo, pois na verdade era esta a posição dos fariseus e Doutores da Lei, que não aceitavam o advento da Salvação, presente na pessoa de Jesus de Nazaré. A verdadeira prática do Cristianismo nos traz sempre o desafio da ascese, que significa fazer uma experiência profunda com Jesus na nossa vida, sem tirar os pés do chão da nossa história, e essa experiência querigmática só é possível quando nos abrimos ao Espírito do Senhor, presente em nossa fraqueza, e, portanto, o que está no centro do ensinamento de João às suas comunidades, é que nenhum recurso humano, científico, social, político ou até religioso, pode nos levar a essa ascese, só se aproxima dessa Verdade absoluta chamada Jesus, aqueles que o Pai atrair. Em João 6, 51 encontramos a afirmação que deu margem a discussão de Jesus com os Judeus "Eu sou o pão vivo descido do céu,. Quem comer desse pão viverá eternamente.E o pão que eu darei é a minha carne dada para a vida do mundo". No evangelho desse domingo, a discussão acontece no próprio grupo de seguidores, se entre os judeus, haviam aqueles que não acreditavam, era até compreensível, entretanto a situação torna-se mais grave quando entre os próprios seguidores, há discípulos que não têm fé, pois acham que ninguém consegue escutar a palavra, que é dura demais. Dentro da Igreja há muitas maneiras, e todas elas válidas, de se fazer essa experiência com Jesus, entretanto, é preciso muito cautela para não se criar um cristianismo mais light, menos intransigente e radical, onde a gente possa fazer parte da Igreja, mas sem ter que vestir e suar a camisa, o engajamento pastoral ou a adesão a um Movimento ou Associação, pode sim gerar em nós a ilusão de que aquela prática é suficiente, e dependendo do modelo eclesiológico, ficaremos ancorados apenas na carne, nos recusando a "levantar vôo na ascese do Espírito" ou então tiramos os pés do chão, ignorando a carne que sustenta o Espírito, mergulhando na perigosa fé da magia. E quando se trata de coerência naquilo que se crê, Jesus não é de ficar alisando o "ego" dos seus seguidores, mas concede a liberdade da escolha "Vocês também querem ir embora?". Pedro, falando em nome da comunidade, reconhece aquilo que os judeus rejeitam, nenhuma proposta ou ideologia humana, pode conduzir o homem a plena realização de si mesmo, só Jesus nos faz enxergar além dos horizontes humanos, comer a sua carne significa a aceitação radical da comunhão com sua pessoa, seu ensinamento e seu projeto de vida. O apóstolo Pedro aceita viver nessa ascese do homem espiritual, mesmo ainda estando na realidade da carne, em outras palavras, aceita Jesus como Deus, Senhor e Salvador, de maneira incondicional "A quem iremos Senhor?" Tu tens palavras de Vida eterna. Nós cremos firmemente e reconhecemos que tu és o Santo de Deus". Enfim, o cristianismo será sempre uma proposta que nos obriga a fazer uma escolha e tomar uma decisão, a favor ou contra Jesus. Na vida de Fé não dá para "empurrar com a barriga" e fazer "corpo mole", pois corre-se o risco de perder o "jogo", que Cristo já venceu, com a encarnação, paixão, morte e ressurreição....(21º. Domingo do Tempo Comum) José da Cruz é Diácono da Homilia do Padre Françoá Rodrigues Costa – 21º Domingo do Tempo Comum — ANO B “É Jesus Cristo. Adoremos!” É Jesus Cristo. Adoremos! Jesus deixa bem claro que ir ao seu encontro é uma graça concedida pelo Pai e, posteriormente, Pedro reconhece-o com essas palavras: “Tu tens as palavras de vida eterna” (Jo 6,68). Precisamos ir ao encontro de Cristo, considerando esse encontro como um dom, uma graça, um ato de bondade do nosso Deus. Comungar Jesus não é um direito dos fiéis, é um dom. Por isso, nós recebemos a Comunhão, não a tomamos por nós mesmos. Jesus tem palavras de vida eterna, ele é o Pão que nos alimenta, ele está entre nós em todas as celebrações eucarísticas e, consequentemente, em todos os sacrários da terra. Guardemos, por tanto, as duas atitudes primárias que todo ser humano deve ter diante de Deus presente entre nós: silêncio e adoração. O silêncio é já o começo da adoração: ao reconhecermo-nos criaturas e ao admirarmos a condescendência do nosso Deus, ficamos sem palavras e… adoramos! Neste sentido, é de grande utilidade ter em conta um parágrafo do “Credo do Povo de Deus” (1968) do Papa Paulo VI (n. 26): “A única e indivisível existência de Cristo nosso Senhor, glorioso no céu, não se multiplica, mas se torna presente pelo Sacramento, nos vários lugares da terra, onde o Sacrifício Eucarístico é celebrado. E depois da celebração do Sacrifício, a mesma existência permanece presente no Santíssimo Sacramento, o qual no sacrário do altar é como o coração vivo de nossas igrejas. Por isso estamos obrigados, por um dever certamente suavíssimo, a honrar e adorar, na Sagrada Hóstia que os nossos olhos veem, ao próprio Verbo Encarnado que eles não podem ver, e que, sem ter deixado o céu, se tornou presente diante de nós.” Na Sagrada Hóstia, adoremos o Verbo encarnado, Jesus Cristo! Ele “vem de Deus” (Jo 5,46); “desceu do céu” (Jo 5,50) para salvar-nos, e permanece conosco dando-nos a sua carne (cf. Jo 6,51) em alimento. É Jesus Cristo, Deus e homem. Adoremos! Aprofundemos um pouco mais na adoração que se deve a Jesus Cristo e, portanto, à Eucaristia. A fé cristã diz que em Cristo há uma única Pessoa, a Segunda da Trindade, que é divina, e duas naturezas, a humana e a divina, que estão unidas nessa única Pessoa divina (Concilio de Calcedônia, ano 451). Santo Tomás de Aquino estuda a adoração na S.Th. III, q. 25. Tomás de Aquino começa por dizer que na honra que se dá a uma determinada realidade há que considerar duas coisas: a realidade honrada e a causa dessa honra. Quanto à primeira: a honra que se deve, por exemplo a uma pessoa, é devida a toda a pessoa, não só à sua mão ou ao seu pé, a uma parte; se por algum motivo alguém dissesse que honra a mão ou outra parte de alguém só o faria em razão de toda a pessoa, pois nessas partes se honraria toda a realidade. Quando à segunda, a causa da honra encontra a sua justificação na excelência da pessoa honrada. E conclui o nosso teólogo: como em Cristo há uma única Pessoa, a divina, na qual estão unidas a natureza humana e a natureza divina, a Cristo se dá uma única adoração em razão de sua única Pessoa. Contudo, a adoração que se dá à Humanidade de Cristo é adoração de “latria”, isto é, a adoração devida só a Deus, ao qual o homem se entrega colocando sua esperança de salvação? Considerando que a Encarnação é para sempre, ou seja, a Humanidade e a Divindade em Cristo desde a Encarnação nunca se separaram e jamais se separarão, a pergunta pareceria sem sentido. No entanto, pensando apenas na Humanidade de Cristo, é preciso dizer, em primeiro lugar, que a adoração que se lhe dá em razão de sua união à Pessoa divina, é uma verdadeira adoração de “latria”. Ao adorar a Santíssima Humanidade do Senhor, estamos a adorar o mesmo Verbo de Deus encarnado. Nesse sentido, diz São João Damasceno que se adora a carne de Cristo não por causa da carne em si mesma, mas por que está unida à pessoa do Verbo de Deus. Considerando a Humanidade de Cristo enquanto cheia de todos os dons da graça, devemos-lhe uma adoração de hiperdulia, ou seja, a mesma adoração que se damos às criaturas (a Humanidade de Cristo foi criada). Chegados aqui o leitor poderia assustar-se: Santo Tomás de Aquino diz que se deve adorar às criaturas? Não. Tomás de Aquino simplesmente mostra que na sua época a palavra adoração não tinha o mesmo peso que tem nos nossos dias. Para ele adoração é o mesmo que “honra”. Desta maneira, o determinante não é a palavra “adoração”, mas a “latria”, que é a o tipo de adoração que se deve só a Deus; a adoração de “dulia” é para ele o que nós hoje em dia conhecemos como “veneração”; finalmente a adoração de “hiperdulia”, traduz-se na nossa concepção como uma “veneração especial”. Um exemplo: cantamos no Hino Nacional referindo-nos ao Brasil as seguintes palavras: “Ó terra amada, idolatrada”. Será que estamos idolatrando a nossa Pátria? Claro que não. Quando dizemos “terra idolatrada” referindo-nos ao Brasil queremos dizer simplesmente que o nosso País é-nos muito querido, estamos simplesmente cumprindo com o quarto mandamente que inclui a amor à Pátria. Que perigo seria ficar só nas palavras sem dar-nos conta do sentido que elas nos trazem! Cada palavra quer significar uma realidade e não podemos simplesmente ficar preso à palavra em si, mas procurar chegar à realidade que essa palavra nos quer transmitir. É impressionante como Jesus no dia de hoje quis deixar bem claro aos seus discípulos que o que ele estava a falar era algo muito sério: a Eucaristia é o seu Corpo e o seu Sangue, é ele mesmo. E, como sempre, pela verdade Jesus estava disposto a tudo, inclusive a “perder” alguns dos seus, mas não estava disposto a retirar uma só palavra do que ele tinha dito, por mais duras que parecessem: “quereis vós também retirar-vos?” (Jo 6,67). É ele mesmo. Adoremos! Pe. Françoá Rodrigues Figueiredo Costa Comentário Exegético – 21º Domingo do Tempo Comum — ANO B EPÍSTOLA: Ef 5, 21-32 INTRODUÇÃO: Paulo inicia sua parênese com o amor mútuo entre os esposos para daí transcender sua doutrina ao amor entre Cristo e a Igreja, que ele declara constituir um grande mistério, porque é um matrimônio em que os dois são como uma só carne. Por conseguinte, deduz o apóstolo, sendo dois em uma só carne, a Igreja e Cristo comunicam seus bens em tudo. A Igreja completa o sacrifício de Cristo como remate da redenção. Os sofrimentos e orações dos fiéis são contados como sofrimentos e orações de Cristo. Cristo vive e sofre em cada um de seus membros. O pleroma de Cristo chega a todos e em todo o tempo. O problema não é tanto a relação marido-mulher como o mistério da relação Cristo-Igreja, comparado a um verdadeiro matrimônio em que os dois são uma só carne. SUBMISSOS MUTUAMENTE: Subordinai-vos mutuamente em(o) temor de Deus (21). Subiecti invicem in timore Christi. SUBORDINAI-VOS [ypostassomenoi<5293>=subjecti] é o particípio passivo de presente do verbo ypostassö de significado estar sujeito, subordinado, obedecer, como em Ef 1, 22: Sujeitou todas as coisas a seus pés. Mais conforme com o significado desse versículo, está Lc 2, 51: [Jesus] desceu com eles, e foi para Nazaré, e era-lhes sujeito. Por isso, pode ser traduzido como obedecendo, ou seja, não queirais ser os mandantes, mas os que a todos obedecem e se sujeitam seguindo a reverência [ev fobö] que a lei divina impõe, como nos diz At 9, 31: Assim, pois, as igrejas em toda a Judeia, e Galileia e Samaria tinham paz, e eram edificadas; e se multiplicavam, andando no temor [tö fobö] do Senhor e consolação do Espírito Santo. Uma variante do latim na Vulgata faz que no lugar de Deus encontremos Cristo, como causa da veneração ou respeito. Devemos pensar que Paulo pede isto mesmo com uma frase bem clarificadora do seu tempo: Sede servos uns dos outros pelo amor (Gl 5, 13). Tudo o qual implica obediência, como diz em Rm 6, 16: A quem vos apresentardes por servos para lhe obedecer, sois servos daquele a quem obedeceis. OBEDIÊNCIA DAS ESPOSAS: As esposas aos próprios maridos obedecei como ao Senhor (22). Mulieres viris suis subditae sint sicut Domino. ESPOSAS [gynaikes<1135>=mulieres]: na realidade literalmente são mulheres, mas a palavra tem o sentido de esposas, pois, em quase todas as línguas, minha esposa pode se dizer como minha mulher. MARIDOS [andres<435>=vires] Propriamente homens, mas em todas as línguas estão no lugar de maridos ou esposos. OBEDECEI [ypostassesthe<5293>= subditae sint] imperativo presente do verbo ypostassö estar sujeito, subordinado e na voz média se submeter ou obedecer, como Jesus menino a seus pais: E desceu com eles, e foi para Nazaré, e era-lhes sujeito (Lc 2, 51). Já em Cl 3, 6, Paulo regula com a mesma norma as relações dentro da família entre os chamados membros fortes – maridos, pais, senhores – e os membros débeis – esposas, filhos, servos. COMO AO SENHOR indica o motivo e a razão dessa obediência. O esposo representa o Senhor Jesus dentro da igreja doméstica que é a família. Aqui devemos ver, em primeiro lugar, o alto conceito paulino do matrimônio cristão completando o dito em 1 Cor 7, 1-9, em que apesar de pôr como modelo a virgindade, admite o matrimônio como uma coisa boa. Agora vê nele a união de Cristo com sua esposa que é a Igreja. Dificilmente podemos encontrar uma relação mais sublime entre duas pessoas que a oferecida por Paulo nesta perícope. Se no Gênesis o homem recebe sua mulher como se fosse seu corpo próprio, aqui Paulo o relaciona como cabeça de um desposório em que deve se entregar pelo bem da esposa como Cristo se doou pela Igreja. A submissão da mulher ao marido não é um ato de escravidão, mas um ato de entrega para que se cumpra o que disse o Senhor: Se alguém quiser ser o primeiro, será o derradeiro de todos e o servo de todos (Mc 9, 35). Contrariamente ao que nos diz o socialmente correto, que é a igualdade do gênero, Paulo apela a uma diferença que ele considera natural e até bíblica: pois o homem foi criado primeiro e a mulher lhe foi dada como ajudante [boethos<998>= ezer< 05828>=adjutor=ajudante]. Não devemos deixar de lado as ideias da época na qual Paulo escreve. Em todas as culturas, a mulher era considerada inferior. Porém, sobre essa cultura, Paulo outorga uma lógica concessão, ao mesmo tempo, que brilhante norma de conduta: obedecer não é uma submissão de escravos mas uma entrega de amor. E nesse amor, quem aparentemente perde, ganha; porque representa a figura pela qual Cristo se humilhou e entregou sua vida. O triunfo não é do mais forte, mas do amor que em geral é a vitória do mais necessitado e mais débil, como a mãe que se dedica mais ao filho enfermo ou mais indigente. Com a igualdade do gênero, a rivalidade, a luta e a violência dominam o ambiente. Com o amor, o outro nos deslumbra e a vontade dele se cumpre pelo serviço que nos exige o amor. Cedemos não à violência, mas ao desejo de agradar. HOMEM É CABEÇA: Porque o homem é cabeça da mulher, assim como o Cristo é cabeça da Igreja e Ele é salvador do corpo (23). Quoniam vir caput est mulieris sicut Christus caput est ecclesiae ipse salvator corporis. Neste versículo corrobora Paulo o que tinha escrito aos de Corinto: Quero que saibais que Cristo é a cabeça de todo o homem, e o homem a cabeça da mulher; e Deus a cabeça de Cristo. Adão como pai, era a cabeça de todo homem natural [psikikos]; mas Cristo com a sua entrega como lytron [resgate] era a cabeça de todo homem novo [pneumatikos] o conjunto dos quais constituía a Igreja. Por isso, Paulo dirá de Cristo ser o Salvador, quem restitui a vida a quem estava morto, o corpo da Igreja agora vive. Da cabeça era, segundo o sentir da época, de onde procedia a vida como diz o Gênesis: E soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente (2, 7). O EXEMPLO DE CRISTO-IGREJA: Mas assim como a Igreja está sujeita ao Cristo, assim também as mulheres aos próprios maridos em tudo (24). Sed ut ecclesia subiecta est Christo ita et mulieres viris suis in omnibus. Uma vez constituída a família com a sua hierarquia própria, a obediência da mulher ao marido toma seu exemplo da sujeição da Igreja a Cristo. DEVER DOS MARIDOS: Os maridos amai vossa mulheres, como também o Cristo amou a Igreja e entregou-se a si por ela (25). Viri diligite uxores sicut et Christus dilexit ecclesiam et se ipsum tradidit pro ea. Porém, a submissão não é a de um escravo pelo temor, porque os cristãos foram comprados por bom preço; não vos façais servos dos homens (1 Cor 7, 23). E a única escravidão admitida por Paulo é a voluntariedade do servo de todos, quem sendo livre para com todos, fiz-me servo de todos para ganhar ainda mais (1 Cor 9, 19). Daí que o marido seja, em sua entrega, como o escravo que diz Paulo foi seu sino para ganhar os homens a Cristo. O amor de Cristo pela Igreja será o modelo do amor do esposo pela sua esposa. A imagem do esposo que ama a Igreja tem seu fundamento no AT em que os profetas descrevem a relação de Jahveh com Israel como a de um esposo com sua amada em matrimônio (Jr 3, 14 e Is 54, 6-7), de modo que é frequente a aclamação de adultério para os que adoram outros deuses que não seja Jahveh: Chegai-vos aqui, vós os filhos da agoureira, descendência adulterina, e de prostituição (Is 57, 3). Do que se faz eco o próprio Jesus declarando: Uma geração má e adúltera pede um sinal (Mt 12, 30). Jesus toma como imagem do Reino as bodas do filho do rei e ele disse de si mesmo que é o esposo, afirmando: podem porventura andar tristes os filhos das bodas, enquanto o esposo está com eles? (Mt 9, 15). FINALIDADE: Para que a santificasse, purificando na água lustral, na palavra (26). Ut illam sanctificaret mundans lavacro aquae in verbo. Cristo purificou a Igreja por meio do batismo, comparado aqui com a água lustral. Provavelmente o apóstolo esteja inspirado nos costumes do antigo Oriente onde a desposada, tanto entre os gregos como entre os semitas, embora com ritos diferentes, era lavada e cuidadosamente preparada para ser apresentada a seu novo esposo. A água lustral era feita com as cinzas de uma bezerra sacrificada, misturadas com água e tinham, no conceito dos antigos, o poder de purificação. Poderíamos compará-la com a água benta de nossas igrejas. Ez 16, 9 já fala desta lavagem ao escrever: te lavei com água, e te enxuguei do teu sangue, e te ungi com óleo, falando de Jerusalém. A alusão ao batismo é clara. Pelo que diz respeito à palavra, aparece no evangelho de João 15, 3: Vós já estais limpos, pela palavra que vos tenho falado. A menção da palavra pode ser explicada pela confissão de fé feita no batismo que acompanhava o mesmo que era uma lavagem por imersão total. IGREJA IMACULADA: Para apresentá-la a si uma Igreja gloriosa, sem ter mácula, ou ruga, ou algo semelhante; mas para ser santa e imaculada(27). Ut exhiberet ipse sibi gloriosam ecclesiam non habentem maculam aut rugam aut aliquid eiusmodi sed ut sit sancta et inmaculata. Seguindo o modelo de purificação da esposa antes do matrimônio, Paulo diz que quem adorna e limpa a Igreja, sua nova esposa, é o próprio Cristo que a quer GLORIOSA [endoxos<1741>=gloriosa] com o significado também de esplêndida, vistosa. De modo a não ter MÁCULA [spilon<4696>=macula] borrão, mancha; ou RUGA [rutida<4510>=ruga] ou coisa semelhante; mas a quer SANTA [agia<40>=sancta] propriamente consagrada e IMACULADA [amömos<299>=inmaculata] derivada de a [sem] e mömos [mancha, mácula]. O AMOR DOS ESPOSOS: Assim devem os maridos amar suas esposas como seus próprios corpos: quem ama a sua mulher a si mesmo ama (28). Ita et viri debent diligere uxores suas ut corpora sua qui suam uxorem diligit se ipsum diligit. Aqui temos uma citação implícita do Gênesis que em 2, 23 exclama, ao despertar do sono em que Deus formou do seu lado a mulher: Aqui está alguém feito dos meus próprios ossos e da minha própria carne. Por isso, dirá que quem ama a sua mulher a si mesmo ama. Na realidade a felicidade do matrimônio não é a de uma só pessoa, mas a de toda a família se eles buscam o bem comum e não o próprio proveito. Assim se cumpre o dito paulino atribuído a Cristo: Há mais felicidade em dar que em receber (At 20, 35). Jesus, na última ceia, lavou como um escravo os pés dos discípulos e logo disse este comentário: É um exemplo que eu vos dei: o que fiz por vós fazei-o vós também…Sabendo isso, sereis felizes se ao menos o puserdes em prática (Jo 13, 15-17). O AMOR A SI MESMO: Porque ninguém nunca odiou sua carne senão alimenta e regala como o Senhor à Igreja (29). Nemo enim umquam carnem suam odio habuit sed nutrit et fovet eam sicut et Christus ecclesiam. Sendo dois numa só carne, como diz a Escritura (Gn 2, 24) Paulo argumenta dizendo que ninguém ODIOU [emisësen<3404>=odio habuit] sua carne que em linguagem grega diríamos desprezou ou não cuidou dela. Mas pelo contrário a ALIMENTA [ektrefei<1625>=nutrit] e REGALA [thalpei<2282>=fovet] verbo que significa tratar com carinho, afagar, regalar. Assim faz Cristo, o Senhor com sua Igreja. MEMBROS DO CORPO DE CRISTO: Porque somos membros do seu corpo, da sua carne e dos seus ossos (30). Quia membra sumus corporis eius de carne eius et de ossibus eius. Esta é a mais inaudita e surpreendente afirmação paulina: É tal a união de Cristo com sua Igreja, que cada um dos membros [melë] da mesma pode dizer: ser carne [sarx] de Cristo e osso [osteon] do mesmo. Tudo com base na Escritura, que no matrimônio diz serão dois numa só carne. Esta afirmação tem uma série de consequências extraordinárias: a comunhão dos santos, a co-redenção dos fiéis, chamados a completar em nossas carnes o que falta às tribulações de Cristo (Cl 1, 24), os méritos dos fiéis, a intercessão dos mesmos e a realidade do que os antigos afirmavam com a expressão christianus alter Christus [o cristão é um outro Cristo]. Esta ideia paulina de sermos parte do corpo de Cristo não é uma explosão repentina de Paulo, mas está bem elaborada em seus escritos como em 1 Cor 6, 15: Não sabeis vós que os vossos corpos são membros de Cristo? E em 12, 27: Vós sois o corpo de Cristo, e seus membros em particular. E dele mesmo declara: Cristo será, tanto agora como sempre, engrandecido no meu corpo, seja pela vida, seja pela morte (Fp 1, 20). Nos tempos modernos a vida do Pe. Pio confirma com suas chagas e seu sacerdócio extraordinário esta afirmação paulina que em membros femininos a vemos confirmada com o matrimônio místico entre a criatura e o Cristo Senhor. DE DOIS UM: Por isto deixará um homem seu pai e mãe e se unirá a sua mulher e serão os dois em uma carne (31). Este mistério é grande: Eu, portanto, digo a respeito de Cristo e da Igreja (32). Propter hoc relinquet homo patrem et matrem suam et adherebit uxori suae et erunt duo in carne un. Sacramentum hoc magnum est ego autem dico in Christo et in ecclesia. Paulo resume nesta frase citada do Gênesis a base da argumentação sobre o matrimônio de Cristo com a sua Igreja. Os dois constituem uma só carne. Finalmente, como num momento de exaltação após considerar tudo com admiração, Paulo explode numa frase de extraordinário assombro: É um grande mistério este de Cristo como esposo de sua Igreja. Por meio dele um fiel que sofre carrega realmente a cruz de Cristo, associado à redenção do Salvador de modo que o sofrimento, aparentemente inútil, se torna o mais valoroso dos instrumentos do Reino, cumprindo-se de modo total a verdade da promessa de Jesus: Vinde a mim todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei (Mt 11, 28). A manifestação mística desta verdade está nas vidas que o sofrimento acorrentou na cama da dor: Ana Catarina Emmerick, Marta Robin, Teresa Newman, em que até as chagas de Cristo foram vistas como aconteceu com Francisco e Pe. Pio. Santa Faustina Kowalski declara: bemaventuradas as comunidades que cuidam de seus doentes como se fosse o próprio Cristo. EVANGELHO : Jo 6, 60-69 - A FÉ QUE ESCANDALIZA INTRODUÇÃO: Jesus, na sinagoga de Cafarnaum, exorta a procurar pelo alimento que não perece, o pão novo que substitui o maná do deserto. Era a fé no Filho do homem, ou seja, na Encarnação de Deus na raça humana. Porém, a fé não é a única maneira de estar e viver com Jesus. Como o profeta Elias, antes de chegar ao encontro com o Senhor, necessitamos do pão da vida. Se quem crê tem a vida eterna, isto significa que a escatologia já tem começado aqui e agora, que o eterno está dentro do tempo. Nesta segunda parte, além da fé, Jesus oferece um novo alimento: seu corpo e sangue como verdadeira comida e verdadeira bebida. Fé e comunhão que no sacramento recebido se misturam quando o sacerdote apresenta a hóstia consagrada dizendo: o corpo de Cristo. E o fiel responde: Amém; assim é, assim o creio. Neste domingo temos o final com duas reações: a de Pedro, coluna da fé, que encontra nas palavras de Jesus palavras de vida eterna e a dos que não aceitam essa palavra e não admitem o oculto, o mistério dentro da visão natural das coisas. Diante dos mistérios divinos que Jesus revela, a sua palavra é a única razão que nos impele a acreditar e acreditando viver de modo diferente uma vida que estaria longe de nossos propósitos. O COMENTÁRIO: Muitos, pois, dentre os discípulos dele, tendo ouvido, disseram: Brutal é esta palavra. Quem pode escutá-lo? (60). Multi ergo audientes ex discipulis eius dixerunt durus est hic sermo quis potest eum audire. Temos traduzido por brutal o grego sklhrov <4642> [skleros] que o latim traduz por durus, difícil de entender ou intolerável, como outros traduzem, com os requisitos de fantásticos e ofensivos. O verbo akouw [akouo] pode ser traduzido por ouvir, um simples ato físico ou por escutar, um ato psíquico que responde ativa e livremente aos sons emitidos, admitindo-os compreensivelmente. Ouviram, segundo eles, um despropósito, uma loucura. O que menos poderiam pensar era que estava louco, como em Jo 7, 20 que dizem dele ter um demônio. O ESCÂNDALO: Tendo então conhecido Jesus por si mesmo que seus discípulos resmungavam sobre isso, disse a eles: Isto vos escandaliza? (61). Sciens autem Iesus apud semet ipsum quia murmurarent de hoc discipuli eius dixit eis hoc vos scandalizat. Se, pois, vísseis o Filho do Homem subindo onde estava antes? (62). Si ergo videritis Filium hominis ascendentem ubi erat prius. As palavras por si mesmas indicam um conhecimento independente das circunstâncias ou da observação feita das mesmas no momento. O evangelista aponta a um conhecimento sobrenatural. O escândalo, neste caso particular, é causa de um julgamento desfavorável sobre as palavras e a pessoa de Jesus. E Jesus agora apela a um fato que será real: sua ascensão aos céus. Para uma tradição fundada na unicidade de Deus, essa igualdade entre um homem e o Deus transcendente, era uma blasfêmia para os ortodoxos judeus. Assim o entenderam Caifás (Mt 26, 65) e os da sinagoga dos libertos que apedrejaram Estevão (At 7, 57). O Filho do Homem, [ho ‘yios tou anthropou] conjunto de palavras próprias do NT, pois o AT desde Ezequias até Daniel e o Salmo 80 a setenta diz um filho de homem. Especialmente em Dn 7, 13, que é tomado como modelo para a imputação por Jesus do título ho ‘yiós tou anthropou [o filho do homem]. O texto original, de onde os exegetas dizem provém esse título como messiânico, em Dn 7, 13 é aramaico, e diz bar enash, [filho de mortal] [bem adam, filho de homem]. Em geral podemos afirmar que quase a totalidade dos filhos de homem do AT são vocativos como em Ezequiel em que Jahvé se dirige ao profeta chamando-o de filho de homem nada menos que em 31 ocasiões. A setenta traduz sempre ‘yios anthropou, filho de homem, ou simplesmente homem. Já no NT sempre é Jesus quem se refere a si mesmo e usa o título com ambos os artigos determinados tanto antes de filho como de homem [‘o ‘yios tou anthropou, o filho do homem], indicando um homem especial, diferente do mortal comum, o ser humano em geral. Se no AT bem adam significa um membro da espécie humana, isto não pode ser dito no NT quando a frase é usada por Jesus e traduzida ao grego com artigos determinados. O filho do homem se refere unicamente a um indivíduo especial da raça humana e a expressão é sempre usada por Jesus referindo-se a si mesmo. Aparece 29 vezes em Mateus, 13 em Marcos, 24 em Lucas e 12 em João, em diversas circunstâncias. Em todas elas é a humanidade de Jesus, em si mesma ou como paciente nos momentos de seu sofrimento e morte, ou como sujeito do poder divino sobrenatural com autoridade de julgar o mundo e de representar o juízo divino na parousia. Mas sempre com o destaque de ser alguém em que a divindade pousa como escolhido para mostrar seu rosto ao mundo. O filho do homem é Jesus humano que tem como pessoa o filho único de Deus Pai. A exaltação do homem como igual a Deus era um conceito impossível e blasfemo para um judeu da época. Constituía o grande escândalo de que Jesus se faz eco neste versículo. EXPLICAÇÃO: O espírito é o que dá a vida; a carne de nada serve. As palavras que eu vos falo são espírito e são vida (63). Spiritus est qui vivificat caro non prodest quicquam verba quae ego locutus sum vobis spiritus et vita sunt. Parece que esta parte do discurso, sem dúvida um tanto artificial como um capítulo de um todo ao modo dos diálogos platônicos, está unida aos versículos 35-50 sendo que os 51-58 é um parêntese referente à Eucaristia. Esta parte, pois, é sapiencial, em que a palavra é fonte de vida. Não se referem estas palavras ao pão eucarístico, mas as palavras de Jesus como palavras que devem ser interpretadas pelo espírito, pois Ele tinha afirmado que era o pão descido do Céu (vers. 50). É uma explicação do versículo 62. A primeira parte deste versículo é um provérbio admitido provavelmente como verdadeiro pelos ouvintes. Como se dissesse: Todos admitem que quem dá a vida é o espírito e que a carne de nada serve. É provável que este aforismo tenha razão no Gn 2, 7: Então Jahvé Deus modelou o homem com a argila do solo, insuflou em suas narinas um hálito de vida e o homem se tornou um ser vivente. A argila representava a carne e o espírito ou alento [neshamá hebraico, pnoé grego, sopro, espírito em português] representava a vida. A argila representava a carne o basar<91320> que o grego traduz por sarx<4561>, e a vulgata por caro. Explicada a primeira parte, devemos agora encontrar uma interpretação, a mais racional possível, da segunda parte: Por que as palavras de Jesus são espírito e são vida? Logicamente é uma frase simbólica, ou se queremos matizar melhor, uma comparação. Assim como o espírito é a vida do corpo, assim as palavras de Jesus são a vida dos que as ouvem e em conformidade dirigem suas vidas. Ele pede uma fé que tem, como origem, a razão de ser Ele o único que conhece bem o Pai, pois com Ele morava e do céu – onde se supunha que o Pai-Deus morava – tinha descido para revelá-Lo (Jo, 6, 46). No capítulo 8 João explicará que suas palavras estão avaliadas por duas testemunhas: o Pai do qual procedem as obras que realiza e a sua palavra que as acompanha (8, 18). A verdadeira vida, pois, consistia em conhecer a Verdade, da qual Jesus se proclamava testemunha, como disse a Pilatos (Jo 18, 37). Por isso, Ele pedirá ao Pai que consagre seus apóstolos na verdade de modo que a verdade do Pai seja a verdade dos discípulos (Jo 17, 17), podendo assim afirmar que a palavra do Pai –Jesus em pessoa – era a Verdade e por isso eles serão enviados ao mundo como Ele, Jesus, foi enviado ao mundo, como consagrados e identificados com a verdade (Jo 17, 18-19). Se as palavras de Jesus se parecem com o espírito que dá vida a carne, rejeitá-las – para os judeus que as estavam escutando – é ficar unicamente como o maná que os pais comeram e morreram. O PARÊNTESE: Porém, há dentre vós alguns que não creem. Pois Jesus tinha conhecido desde o início quais são os não crentes e quem é o que o entregará (64). Sed sunt quidam ex vobis qui non credunt sciebat enim ab initio Iesus qui essent credentes et quis traditurus esset eum. O primeiro hemistíquio corresponde às palavras de Jesus. O segundo hemistíquio é um parêntese do evangelista e indica nele, como mestre da verdade, um conhecimento muito superior – infuso - ao que correspondia às pessoas comuns, e o confirma ao apontar como, desde esse mesmo momento, sabia quem era o que o entregaria como traidor. Sem dúvida, a falta de fé da maioria dos judeus, foi um desapontamento entre os primeiros discípulos e seria bom, apologeticamente, arguir com razoamentos consistentes essa lacuna que podia constituir um escândalo insuperável para os mesmos. EXPLICAÇÃO: Porque falava: por isso vos tenho dito que ninguém pode vir a mim senão lhe esteja dado de parte de meu Pai (65). Et dicebat propterea dixi vobis quia nemo potest venire ad me nisi fuerit ei datum a Patre meo. Temos explicado esta doação do Pai na explicação do versículo 44 na exegese do domingo XIX deste mesmo ano. Segundo a mentalidade da época, Deus é a causa principal dos eventos humanos e a Ele se refere Jesus. A esse artigo e a explicação correspondente citamos e convidamos o leitor. A DISPERSÃO: Desse fato em diante muitos dos seus discípulos arredaram e não andavam com Ele (66) Ex hoc multi discipulorum eius abierunt retro et iam non cum illo ambulabant. A tradução é um tanto livre, dada pelo grego aphlyon eiv ta opisw [apelthon eis ta opiso] um advérbio que significa detrás, para trás, que podemos traduzir por “se foram para trás”. Pode ser também traduzido por deram meia volta ou se retiraram, para não mais andar com Jesus. A tradução espanhola diz: se volvieron atrás e a portuguesa voltaram atrás ou o abandonaram. De fato, muitos, não todos, mas a maioria abandonou Jesus. JESUS COMENTA: Disse em consequência, Jesus aos doze: Acaso também vós quereis partir? (67).Dixit ergo Iesus ad duodecim numquid et vos vultis abire. A debandada foi, ao que parece, geral. As fileiras ficaram praticamente vazias. Era o momento de Jesus animar aos que restavam e que Ele tinha escolhido a dedo: os 12 apóstolos. A pergunta não deixa de ocultar, implicitamente, uma recriminação, caso a resposta fosse negativa. Jesus praticamente lhes diz: Vós também sois do tipo pusilânime e covarde que na dificuldade desanima e foge? (semente que cai nas pedras: Mt 13, 20). PEDRO: Respondeu-lhe então Simão Pedro: Senhor, detrás de quem iremos? Palavras de vida eterna tens (68). Respondit ergo ei Simon Petrus Domine ad quem ibimus verba vitae aeternae habes. A resposta de Pedro tem como sujeito a quem interpelar a palavra Senhor [Kyrie em grego]. Evidentemente, não é o mesmo Senhor do ressuscitado, que recebeu o poder, segundo Ef 1, 20 +, mas indica no caso uma submissão a quem tem autoridade. Pedro não encontra outro líder porque as palavras de Jesus, segundo o mesmo mestre, tinham afirmado eram palavras que continham uma verdade eterna, a única que propriamente pode ser declarada como verdade. A CONFISSÃO: Por isso nós temos acreditado já que temos conhecido que tu és o Ungido, o Filho do Deus (o vivente) (69). Et nos credidimus et cognovimus quia tu es Christus Filius Dei. São duas afirmações, segundo a tradução que temos feito, pensando que o kai grego é uma ilação tanto copulativa como causativa. As traduções em uso, no lugar do já que empregam o simples e, e a frase seria temos acreditado e estamos seguros que tu és esse Ungido, o Filho do Deus vivente, que é a tradução do King James. Como vemos, a vulgata deixa o adjetivo vivente, que o grego quase sempre une à palavra Theós para distinguir o mesmo dos deuses que eram estátuas mortas. Ao traduzir temos conhecido, como o grego dá a entender, vemos que a versão estamos certos ou seguros é uma interpretação completamente correta. O Ungido, com artigo determinante, é uma tradução literal de Messias, o Ungido do Senhor. Afirmar que é o Filho do Deus vivo, é um ato de fé inusitado entre os discípulos de Jesus, não por aclamá-Lo Messias, mas por declará-Lo Filho de Deus, aceitando que o Pai é Deus. A frase tem sentido porque a ausência dos outros discípulos era devida a afirmação de Jesus que dizia ser Deus o seu Pai, como Jesus afirmava no versículo 64, uma conclusão do versículo 69 em que a união de Jesus e o Pai é modelo da que deve existir entre discípulo e Jesus. Esta foi a causa da separação de quem afirmava: estas palavras são inadmissíveis (ver 60). Pedro ouviu e interpretou corretamente as palavras de seu Mestre. Certamente, se Ele afirmava que seu Pai era Deus, o Deus vivo de Israel, Pedro estava disposto a admitir e acreditar nessas palavras que eram palavras de vida. PISTAS: 1) Os comentaristas modernos dizem que os versículos próprios da Eucaristia (51-59) não foram pronunciados na sinagoga de Cafarnaum, mas na instituição do sacramento na última ceia, correspondente ao capítulo 13. Interrompido o discurso sobre as exigências da fé como pão da vida, agora Jesus retoma o tema e nos encontramos com a resposta variada dos ouvintes. Jesus pede uma resposta clara a seus apóstolos e Pedro, em nome de todos, dá a única possível para um seguidor de Jesus. Este é o Ungido do Senhor [Deus] e como Filho sabe perfeitamente a vontade do Pai, cujo seguimento é a verdadeira vida. 2) As palavras de Jesus constituem um fracasso. Os homens as escutam não com o espírito de obediência a quem fala da experiência como viva, mas com o critério de uma razão humana que se julga independente e absoluta. É o critério de Tomé: Se não vejo não creio. Jesus é o vidente que nos declara existirem matizes nas cores e nós somos os cegos que não podem captá-los. Negá-los porque não os podemos experimentar é cerrar-se ao mistério que sempre existe na grande verdade divina. 3) Vemos que Jesus se intitula o filho do homem como um caso particular de ser membro da família humana. Isto significa que Ele pode ser visto e ouvido como um homem; mas com a particularidade de ser representante da divindade, ou seja, a face humana de Deus. Logicamente Ele sabe como conduzir a humanidade e seu exemplo é paradigma de todos os que desejam viver suas vidas em conformidade com os planos e desígnios de Deus. Até dirá aprendei de mim que sou pacífico e humilde em minhas ambições e propósitos (Mt 11, 29). 4) No texto de hoje se descrevem duas reações opostas ao discurso – e poderíamos dizer à história – de Jesus. A sua palavra tem uma resposta negativa: a incredulidade porque é palavra difícil, e exige uma submissão prática da vida não só no modo de pensar, mas também no modo de atuar. Ou pode ter uma resposta positiva como a dada por Pedro: é a fé. Mas uma fé, não no homem sábio, brilhante, mas na testemunha que conta o que viveu no seio de Deus. A sua palavra está corroborada por obras admiráveis. Se nestas não acreditamos, desaparece o Filho de Deus e só fica o homem Jesus, admirável em palavras e condutas, mas puramente humano de quem podemos tomar as palavras que nos convêm e descartar as palavras difíceis que atrapalham o nosso ideal ou a nossa maneira de vida. Jamais serão vida para nós. EXCURSUS: NORMAS DA INTERPRETAÇÃO EVANGÉLICA - A interpretação deve ser fácil, tirada do que é o evangelho: boa nova. - Os evangelhos são uma condescendência, um beneplácito, uma gratuidade, um amor misericordioso de Deus para com os homens. Presença amorosa e gratuita de Deus na vida humana. Interpretação errada do evangelho: - Um chamado à ética e à moral em que se pede ao homem mais que uma predisposição, uma série de qualidades para poder ser amado por Deus. Consequências: - O evangelho é um apelo para que o homem descubra a face misericordiosa de Deus [=Cristo] e se entregue de um modo confiante e total nos braços do Pai como filho que é amado.
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