GOTAS DE REFLEXÃO - EVANGELHO DOMINICAL
17.02.2013
1º Domingo da Quaresma — ANO C
(ROXO, CREIO, PREFÁCIO PRÓPRIO – I SEMANA DO SALTÉRIO)
__ "No deserto, Jesus foi tentado durante 40 dias. Proposta de Deus, resposta do homem." __
Ambientação:
Sejam bem-vindos amados irmãos e irmãs!
INTRODUÇÃO DO FOLHETO DOMINICAL PULSANDINHO: Estamos no início de nossa caminhada quaresmal. No contexto do ano da fé, queremos iniciar essa caminhada deixando-nos iluminar pela fé. O ser humano de fé não é indiferente, e muito menos se vangloria daquilo que possui, pois é consciente de que em Deus se encontra a fonte de tudo. E professar a fé não é uma teoria que enumera conceitos, mas é reconhecer a presença divina que se coloca a serviço da vida humana através dos frutos da terra e do trabalho humano. Nesse sentido, a oração do homem e da mulher de fé não só se manifesta em súplicas, mas em ação de graças, pois reconhece que aquilo que Deus fez no passado, continua fazendo ainda hoje. Assim como Jesus, que foi conduzido ao deserto pelo Espírito Santo, deixemo-nos conduzir pelo mesmo Espírito nesse tempo quaresmal, para nos fortalecer com o pão da Palavra e da penitência.
INTRODUÇÃO DO FOLHETO DOMINICAL O POVO DE DEUS: No primeiro domingo do Quaresma celebramos as tentações do deserto, onde Jesus mostra-nos que o jejum, a oração e a caridade são meios eficazes para também nós vencermos as ciladas do Inimigo. Somente com o coração purificado, podemos restabelecer as relações fraternas e viver a juventude perene da fé. Que essa seja a nossa profunda conversão, inspirada pela Campanha da Fraternidade.
INTRODUÇÃO DO WEBMASTER: Neste primeiro domingo da quaresma é proposta uma reflexão fundamental sobre o destino do homem. É uma meditação religiosa, uma vez que põe em causa o justo relacionamento com Deus, libertando-o de duas concepções errôneas. - O homem é escravo das forças naturais ou históricas; sua presença no mundo é o fruto de um acaso que lhe pregou uma peça breve e cruel, dando-lhe a ilusão de felicidade e abandonando-o ao poder da morte. O homem é arbítrio absoluto de seu destino, senhor do bem e do mal, dominador das forças cósmicas, único protagonista da história. Mas Deus retoma seu plano lenta e constantemente. Todo homem, como toda geração e toda comunidade, é chamado a reviver a mesma opção fundamental de obediência, mostrada por Cristo ao sair vitorioso da provação e das tentações.
Sintamos o júbilo real de Deus em nossos corações e cheios dessa alegria divina entoemos alegres cânticos ao Senhor!
(coloque o cursor sobre os textos em azul abaixo para ler o trecho da Bíblia)
PRIMEIRA LEITURA (Deuteronômio 26,4-10): - "O Senhor tirou-nos do Egito com sua mão poderosa e o vigor de seu braço."
SALMO RESPONSORIAL 90/91: - "Em minhas dores, ó Senhor, permanecei, junto de mim!"
SEGUNDA LEITURA (Romanos 10,8-13): - "Todo o que nele crer não será confundido."
EVANGELHO (Lucas 4,1-13): - "Está escrito: Adorarás o Senhor teu Deus, e a ele só servirás."
Homilia do Diácono José da Cruz — 1º Domingo da Quaresma — ANO C
"AS TENTAÇÕES DE CRISTO"
Em certa ocasião ganhei de um amigo um par de pneus especiais para colocar no meu carro,, que segundo ele, eram ótimos para rodar no meio da lama e em estradas de terra de pista irregular, sendo que meu amigo garantiu-me ainda que não havia obstáculo que os mesmos não ultrapassassem, porque eram feitos com borracha especial e que tinham uma alta resistência. Confesso que nunca soube ao certo se todos esses atributos dos pneus era mesmo verdade, simplesmente porque jamais passei com eles por terrenos ou estradas com essas características. Da mesma forma, a nossa fé só se pode mostrar verdadeira e autêntica em sua fidelidade, se for comprovada diante das tentações.
Poderíamos ainda como exemplo, citar o caso de uma pessoa que está fazendo regime e assegura a todos que já aprendeu a se controlar em relação aos alimentos, porém, não pode passar diante de uma padaria que acabará não resistindo aos doces e guloseimas expostas no balcão e deverá, para o seu bem, manter-se longe das “tentações”. Na vida do cristão isso não pode acontecer. Jesus Cristo não fugiu das tentações, mas as enfrentou com coragem, confirmando assim sua total fidelidade ao Projeto do Pai.
Quando temos medo de freqüentar “certos ambientes” ou estar na companhia de certas pessoas de má fama, estamos manifestando o desejo de correr das tentações porque no fundo, achamos que talvez o mal presente nelas, tenha mais força do que a graça de Deus que trazemos conosco. Se Jesus pensasse dessa forma, com certeza não teria freqüentado a casa dos pecadores e nem andado com mulheres como Maria Madalena, e nem chamado para o seu grupo pessoas como Mateus, cobrador de impostos.
Na primeira tentação, o diabo tenta convencer Jesus a tirar vantagem da sua condição divina “Olha, deixa de ser bobo e use o seu poder divino transformando essas pedras em pães para saciar a sua fome”. Usar o poder que algum cargo nos confere, na vida pública, na vida profissional e até mesmo na comunidade, para beneficiar-se a si próprio, como Jesus, teremos de saber resistir a essa tentação que é muito forte, pois se ele tivesse caído na lábia do tentador, não seria realmente um homem, mas teria apenas a aparência humana e seu sofrimento seria uma grande farsa.
Na segunda tentação está outro grande perigo: ter poder para dominar a tudo e a todos, ser influente e importante e fazer com que as pessoas venham todas “comer na palma da nossa mão”, como costuma se dizer para mostrar a nossa superioridade. Ser o dono da vida das pessoas, mandar e desmandar, o diabo ofereceu todos os reinos do mundo a Jesus, isso significa dizer que toda a humanidade estaria submetida a ele, e nesse caso o seu reino seria imposto e os homens não teriam escolha, seria obrigados a aceitá-lo. Prostrando-se aos pés do diabo, Jesus estaria aceitando fazer o seu “jogo”, usando o seu método diabólico. Contrariando a proposta sedutora do diabo, Jesus irá prostrar-se não a seus pés, mas aos pés dos discípulos, colocando em lugar do Poder o Servir. Precisamos tomar muito cuidado para que na comunidade não sejamos surpreendidos cedendo a esta tentação.
E finalmente a terceira tentação: exigir de Deus uma prova do seu amor para conosco isso é, “poderei me jogar do vigésimo andar de um prédio, que nada irá me acontecer porque Deus não irá permitir”, foi esse verbo que o apóstolo Pedro empregou, quando tentou convencer Jesus a fugir do seu destino – Deus não permita tal coisa, Senhor. Isso é tentar a Deus e colocá-lo á prova! Nos momentos mais difíceis de sua vida Jesus nunca duvidou do amor do Pai, nem mesmo quando estava na cruz do calvário, experimentando o fracasso aos olhos dos seus aos quais tanto amou.
As tentações de Jesus resumem bem, todas as tentações que enfrentamos nessa vida, sendo ocasiões oportunas para provar a nossa fidelidade ao projeto de Deus e a nossa capacidade de usarmos com sabedoria a liberdade que o próprio Deus nos concedeu. É assim que devemos buscá-lo nesta quaresma, através do jejum, da oração e da esmola, que nos ajudará no processo de conversão aproveitando ao máximo todos os momentos que a vida nos oferece, porque como vimos na liturgia da quarta feira de cinzas, este é o tempo favorável em que o Senhor se deixa encontrar. Importante também lembrar que as tentações evoluem, quanto mais resistência e força tivermos, mais forte ela irá voltar, o diabo sempre acha que no segundo embate ele levará vantagem.
O texto afirma que o tentador deixou Jesus para voltar em outro tempo, que viria a ser na cruz do calvário onde se consolidou a vitória da Cruz, sinal da Fidelidade de Jesus ao Pai. Portanto, não descuidemos da retaguarda!
José da Cruz é Diácono da
Paróquia Nossa
Senhora Consolata – Votorantim – SP
E-mail jotacruz3051@gmail.com
Homilia do Padre Françoá Costa — 1º Domingo da Quaresma — ANO C
Otimismo na luta
G. K. Chesterton, converteu-se ao catolicismo em 1922. Para esse ilustre escritor inglês a Igreja Católica era um autêntico milagre porque se mantêm otimista em meio ao pessimismo generalizado. Escrevendo sobre o otimismo se perguntava: “Por que se publica no jornal a seguinte notícia: ‘Ontem um pedreiro caiu do andaime e morreu’? Não seria mais inteligente e, sobretudo mais consolador anunciar: ‘Ontem 68.224 pedreiros no país não caíram do andaime’? De fato, por pouco que se pense, dada a fragilidade dos andaimes e o distraído que os homens são, é muito mais extraordinário que 68.224 não caiam do andaime que um só tenha caído.”
O otimismo deveria estar sempre presente na nossa luta por agradar ao bom Deus. Alguns se queixam de que ser santo é muito difícil, que lutam sem nada conseguir, que voltam a cair nos mesmos pecados. Mas talvez não pensam que Deus os tem protegido sempre durante as tentações e de que seguir o Senhor é verdadeiramente belo. Precisamos ser mais otimistas! Jesus Cristo também foi tentado, não pela sua própria concupiscência, pois Jesus Cristo não tinha o pecado original. Cristo quis ser tentado – como explica Santo Tomás de Aquino – para trazer-nos o auxílio em nossas tentações; para que sejamos cautelosos, assim nenhum santo, por mais que o seja, confie em si mesmo nem se julgue imune de toda e qualquer tentação; para dar-nos o exemplo ao instruir-nos como devemos vencer as tentações do demônio; para que tenhamos confiança em sua misericórdia que sempre nos socorre em todas as nossas necessidades.
No nosso caso, Santo Afonso Maria de Ligório diz que “Deus permite as tentações em primeiro lugar, para que através delas conheçamos melhor a nossa debilidade e a necessidade que temos da ajuda de Deus para não cair (…); em segundo lugar, Deus permite-as para que cada um aprenda a viver desprendido das coisas materiais e deseje mais fervorosamente chegar à contemplação de Deus no céu (…); e, em terceiro lugar, para nos enriquecer de méritos (…)”.
Uma fé ardente no Senhor e uma luta constante através da oração e da penitência são os remédios contra toda e qualquer tentação. Por outro lado, a tentação ainda não é pecado, pecado é consentir na tentação. Podemos, ademais, demonstrar muito amor a Deus enquanto somos tentados. Inclusive, depois de vencidos numa determinada tentação, deveríamos perguntar-nos se nós lutamos de verdade para não ofender a Deus que nos ama tanto. Essa luta, mais intensa ou menos intensa, mostra também o nosso amor ao Senhor: pouco ou muito, o amor a Deus existe em nós e é ele que deve fazer com que nos distanciemos do pecado.
São Lucas (4,1-13) e São Mateus (4,1-11) deixaram muitos pormenores sobre o jejum e as tentações de Jesus Cristo. Jesus luta contra a tentação da seguinte maneira: na força da Palavra: “Não tentarás o Senhor teu Deus” (Lc 4,12); na força do jejum: “Nem só de pão vive o homem” (Lc 4,4); desprezando as sugestões do demônio, ao não dar-lhe atenção: “Para trás, Satanás” (Mt 4,10); fixando-se no seu Pai do céu: “Adorarás ao Senhor, teu Deus e a Ele prestarás culto” (Mt 4,10). Aprendamos do Senhor: ler as Sagradas Escrituras, fazer penitência, orar, olhar mais para Deus e para os demais que para nós mesmos são meios eficazes na nossa luta contra as tentações.
E, por último, não sejamos ingênuos: quem se põe na boca do lobo está esperando ser comido. Não se brinca com a tentação! Alguns não querem pecar por gula, mas sempre buscam satisfazer os caprichos na comida; outros até não queriam pecar contra a castidade, mas ficam lendo porcaria, assistindo bobagem, brincando com fogo no namoro e depois… um antigo refrão dizia que “o homem é fogo, a mulher é palha, vem o demônio e sopra”; outros, finalmente, não queriam pecar por orgulho, mas não param de falar de si mesmos. “Não nos deixeis cair em tentação”, peçamos mais uma vez ao nosso Pai do céu.
Pe. Françoá Rodrigues Figueiredo Costa - 21/02/2010
Comentário Exegético — 1º Domingo da Quaresma — ANO C
(Extraído do site Presbíteros - Elaborado pelo Pe. Ignácio, dos padres escolápios)
EPÍSTOLA (ROMANOS 10, 8-13)
INTRODUÇÃO: Uma das primeiras confissões de fé. Paulo a resume em três artigos: crer, confessar e ressurreição, esta como objeto dessa fé. E compara esta fé com as palavras da Escritura do AT, como sendo já prescritas pela voz de Deus. O que os antigos israelitas cumpriam com as filactérias, os cristãos podem realizar com o sinal da cruz, sendo esta última, também uma confissão de fé na Santíssima Trindade. Devemos, pois, fazer esse sinal externo como uma confissão de fé que será válida para nossa salvação, pois Jesus ressuscitado é a pedra de salvação. O credo do Shemá deve ser substituído pelo credo da cruz.
PAULO APELA A ESCRITURA: Porém, que diz? “Perto de ti, a palavra está em tua boca e em teu coração”, isto é, a palavra da fé que anunciamos”(8).Sed quid dicit prope est verbum in ore tuo et in corde tuo hoc est verbum fidei quod praedicamus. QUE DIZ?: Paulo está argumentando com palavras da Escritura. E neste versículo cita as palavras do Deuteronômio 30, 14: A palavra está bem perto de ti, está em tua boca e em tu coração para que a ponhas em prática.O Deuteronômio fala do mandato [Lei] do Senhor como não sendo um mandato promulgado em lugares afastados ou impossíveis como são os céus ou o mar, mas está perto de cada um. Para conhecer o evangelho não é preciso subir ao céu de onde procede Cristo ou descer aos infernos onde ele desceu, porque tanto de um lugar como de outro veio e falou de modo que todos os que quiseram possam ver sua figura e ouvir suas palavras. O mandato é basicamente o primeiro da Lei, que era recitado duas vezes ao dia por meio do Shemá. Daí que ele esteja na boca dos fieis israelitas. E se seguem os preceitos da Lei, os mandatos estarão tanto na frente como perto do coração nas filactérias que eram os escritos do Shemá a recitar de manhã e à noite e cuja recitação deveria preceder o momento da morte. Os quatro versículos, ou melhor passagens ( Dt 6, 4-9 e 11, 13-21 e Nm 15, 37-41) se consideravam como uma referência aos dez mandamentos. Além do Shemá, recitado em alta voz [pelo menos o Mezuzá= Dt 6:4-9 e 11:13-21], temos as filactérias com duas caixinhas que continham o Shemá, segundo o mandato dos versículos do Êxodo e Deuteronômio (Êx 13,9- 19e 16; Dt 6,6 e Dt 11,8). A Caixinha da cabeça tinha 4 compartimentos em cada um um dos versículos do Shemá; e a da mão esquerda, que ao levantar em oração, caia sobre o coração um só departamento, com os 4 versículos unidos na pequena tira de couro. As caixinhas eram colocadas durante a oração da manhã e da noite e retiradas após as mesmas. Explicitamente em Êx 13, 9 lemos: Para que tenhas em tua boca a lei de Jahveh e em Dt 6, 6 e estas palavras que eu te mando estarão sobre teu coração. PALAVRA: Paulo usa Rema [<4487>=verbum] que é a palavra dita como oráculo, ou mandato e corresponde ao davar<1696> ,ou omer<562> com o significado de mandato, ordem, oráculo ou promessa quando provindo de Jahveh. E logicamente é a palavra de Deus na Escritura, ou Torah. Do dito acima, vemos como se cumpria entre os hebreus essa Escritura que estava na boca pela recitação do Shemá diário e em teu coração ela queda na caixinha sobre ele. BOCA: Stoma [<4750>=os] especialmente temos em Mt 4, 4 não de pão só viverá o homem mas de toda palavra [rema] que procede da boca [stoma] de Deus. CORAÇÃO: Kardia [<2588>=cor] Na realidade, kardia pertence, como metáfora, a uma antiga suposição, em que o coração era a origem do pensamento e da vontade. De fato, o Kardia era antigamente o centro da vida física e espiritual. Hoje, vemos que o coração não tem semelhantes faculdades, pois é uma simples bomba de sangue, e sabemos que a base das mesmas é a mente. Já temos explicado a origem desta frase paulina tomada do AT, que ele usa para explicar o valor da fé em oposição aos mandatos da Lei.
A PROFISSÃO DA FÉ: Pois se confessares em tua boca Senhor (é) Cristo e creres em teu coração que o Deus dele o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo(9). Quia si confitearis in ore tuo Dominum Iesum et in corde tuo credideris quod Deus illum excitavit ex mortuis salvus eris. CONFESSAR: Omologeö [<3670>=confiteor] cujo significado é concordar, consentir, acordar. Logo, é não negar ou confessar e finalmente, professar publicamente um credo ou louvar e aplaudir. Temos optado com o latim traduzindo confessar no sentido de declarar publicamente uma fé, como diz Jesus:Todo aquele que me confessar diante dos homens, também eu o confessarei diante de meu Pai que está nos céus (Mt 10, 32). A confissão é que Cristo, o Ungido, é o Senhor, no sentido do novo Deus a ser adorado, pelo povo novo da nova Aliança. CORAÇÃO: Já temos explicado o significado real e não unicamente literal do vocábulo. A boca deve ser instrumento veraz do que admitimos como verdadeiro em nosso pensamento. E qual é o credo que devemos admitir como base de nossa fé? Aquele que Paulo declara insistentemente em 1Cor 15: a ressurreição de Jesus dentre os mortos. RESSUSCITOU: para Paulo esta é a verdade fundamental do cristianismo: crer na ressurreição de Cristo e crer na nossa ressurreição é acreditar uma vida, diante da qual, esta da terra é como escória e lixo; e, portanto, devemos viver na esperança de um mundo melhor e definitivo. SERÁ SALVO: Paulo repete o que João disse como palavra de Jesus: Por isso quem crê no Filho tem a vida eterna (Jo 3, 36), conclusão do evangelista diante da afirmação de Jesus: Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, ainda que morra viverá (Jo 11, 25).
CONSEQUÊNCIA: Já que com (o) coração se crê para justiça com (a) boca se aclama para salvação(10). Corde enim creditur ad iustitiam ore autem confessio fit in salutem. CORAÇÃO: Já temos falado que em linguagem atual, devemos traduzir por mente o leb ou kardia antigos, sempre que os usemos em termos simbólicos. JUSTIÇA: ADikaiosunë [<1343>=iustitia] que na Setenta é a tradução de Tsedek [<06664>=justitia], tem estes conceitos no AT: 1) - Como probidade ou integridade de conduta: Quem vive com integridade e pratica a justiça [tsedek] e o de coração fala a verdade (Sl 15, 2). Guia-me pelas veredas da justiça [tsedek] por amor de seu nome. (Sl 23, 3). 2) - Justiça em sentido de direito: Julgará com justiça [tsedek] os pobres e decidirá com equidade [miysor <04334>] a favor dos mansos da terra… E será a justiça [tsedek] o cinto de seus quadris (Is11, 4). No NT o grego emprega dikaiosunë 1) - no sentido de probidade ou conduta irrepreensível, em conformidade com a lei. Assim devemos entender Mt 3, 15: convem que cumpramos toda justiça [dikaiosunë]. E bemaventurados são aqueles que têm fome e sede de justiça [dikaiosunë]. 2) – Paulo fala da justiça de Deus [dikaiosunë Theou, que em inglês traduzem por righteousness of God] a começar em Rm 1, 17. Significa, sem dúvida, a essência divina que é bondade e que busca o bem das criaturas. Com Paulo tem um significado peculiar, 1) quando afirmado de Cristo: É sua pureza , sem pecado, é a santidade de Deus. 2) No homem se identifica com a observância integral dos mandamentos. 3) Mas especialmente em Paulo, tem um significado diferente do acreditado entre os judeus e os cristãos judaizantes: Atributo, em virtude do qual, Deus salva; e chega a ser fidelidade de Deus, força salvadora que justifica o homem, convertendo-o em amigo de Deus e filho, com participação da vida divina o que constitui a graça santificante [gratia gratum faciens], como em Rm 3, 21-26: Mas agora, independentemente da Lei, a justiça de Deus foi manifestada …pela fé em Jesus Cristo para todos os que creem …gratuitamente justificados em sua graça, em virtude da libertação realizada em Jesus Cristo. Foi a Ele que Deus destinou para servir de expiação por seu sangue ….a fim de justificar quem vive da fé em Jesus. É a graça recebida no batismo que tem estas consequências: conversão, arranca o homem do pecado, acolhe a justiça de Deus, é merecida pela paixão de Cristo e, portanto, gratuita de nossa parte, colabora com a moção divina livremente, obra excelente do amor de Deus e participação da vida divina, que por isso recebe o nome de santificante ou divinizante. SALVAÇÃO: Esse conjunto de favores divinos recebe o nome de justificação. Como consequência dessa graça ou mercê de Deus, o homem está destinado à vida eterna. Por isso é considerado salvo. O amor divino nele permanece e como tal filho, terá como fim a vida eterna, própria de Deus.
CONFIRMAÇÃO: Pois diz a Escritura: “Todo aquele que nele crê não será envergonhado” (11). Dicit enim scriptura omnis qui credit in illum non confundetur. É uma repetição em diminutivo do versículo 9, 33 da mesma epístola: Eis que ponho em Sião uma pedra de tropeço e rocha de escândalo: aquele que nela crê não será confundido. Ambas têm uma base em Is 28, 16: Assim diz o Senhor Deus: Eis que eu assentei em Sião uma pedra, pedra já provada, pedra preciosa, angular, solidamente assentada: aquele que crer, não foge. Eis algumas traduções diferentes do não foge: non festinet (Vulg), non turbabitur (Nova Vulg), não se apressará, não vacilará, não será abalado, will never be dismayed. A este oráculo, apela Jesus em Mt 21, 42. Porém, a Setenta traduz o verbo chush<02363> com significado de se apressar por Kataischinthë, futuro passivo de kataischinö<2617>cujo significado é desonrar, ou envergonhar. Logicamente, das diversas traduções, vemos que a de Paulo segue a Setenta, versão que era a usada pelos primitivos cristãos e que com suas citações elevaram a verdadeira Escritura. Foi a contundência da Setenta, que mostrava Jesus como Cristo, a que levou os judeus a novas traduções ao grego, como eram Áquila, Símaco e Teodocião. Hoje a Setenta é a Bíblia grega do AT usada pelos católicos e evangélicos. Dependendo de que versão usamos, hebraica ou grega, optaremos por não se apressará (praticamente sem muito sentido) ou não se envergonhará (que tem sentido próprio). A passagem de Mateus explica isso da pedra em lábios de Jesus: A pedra que os construtores rejeitaram foi a que se tornou pedra angular : isto é obra do Senhor, coisa admirável para nossos olhos (Mt 21, 42)
NULIDADE DE DIFERENÇA: Porque não existe diferença tanto do judeu como do grego, já que o mesmo (é) o Senhor de todos, rico para todos os invocantes(12). Non enim est distinctio Iudaei et Graeci nam idem Dominus omnium dives in omnes qui invocant illum. Na sua vocação particular de ser apóstolo dos gentios, e de pregar a estes o seu evangelho, Paulo agora desce ao terreno peculiar e casuístico: visto que a fé, e não a Lei, é a causa da salvação e da entrada no novo povo que tem como base essa pedra que é Cristo, não pode existir diferença entre ambos os povos. DIFERENÇA:Diastolë [<1293>=distinctio], distinção, ou diferença, sai unicamente 3 vezes em Paulo. Pois sedo o mesmo o Senhor [Jesus] e sendo rico [ploutos<4147>= dives] não há porque existir diferenças. Todos são súditos e formam o novo povo da nova aliança e existe para todos amplamente uma riqueza ilimitada. Pedindo, não diminui a fortuna que é infinita e existe riqueza em abundância para todos. Como dizia Sta. Teresinha, uns têm um copo maior e outros menor; mas todos eles serão cheios até a borda.
CAUSA DE SALVAÇÃO: Porque todo aquele que invocar o nome de (o) Senhor será salvo(13). Omnis enim quicumque invocaverit nomen Domini salvus erit. INVOCAR: O Epikaleö [<1942>=invocare] ser nomeado, acusar e invocar; pois toda prece iniciava-se com a invocação do nome da divindade. Daí, invocar o nome do Senhor, que logicamente é Cristo. SALVO: É a grande preocupação de Paulo. E esta afirmação esta explicitamente escrita em Joel 3, 5: Então todo o que invocar o nome do Senhor será salvo. O profeta fala do dia grande do Senhor, dia de juízo, pois será o dia do Senhor julgar (Idem 4, 2 segundo a TEB, tradução de Josafat). Com esta declaração Paulo substitui o Jahveh do AT pelo Cristo Jesus do NT. Nós dependemos de Cristo assim como o antigo povo de Israel dependia de Jahveh. Cristo é nossa salvação. Por isso, o anjo explica aos pastores: Nasceu-vos hoje, na cidade de Davi, um salvador que é o Cristo Jesus. (Lc 2, 11).
Evangelho (Lc 4, 1-13)
LUGARES PARALELOS: (Mt 4, 1-11 e Mc 1, 12-13)
INTRODUÇÃO: Estas tentações não são meramente humanas, mas messiânicas: Satanás intenta afastar Jesus do campo assinalado pelo Pai para completar uma obra que é um caminho de humilhação e sofrimento, o caminho da cruz, que termina com seu sacrifício. Por isso lhe mostra uma via gloriosa e triunfalista, esperada por sua vez pelos próprios judeus, que talvez fundavam esta sua opinião nos mesmos textos de que se serve o espírito tentador. Por outra parte, as tentações de Jesus têm sua imagem típica nas tentações do deserto do povo de Israel. Satanás substitui o povo de Israel e Javé está representado por Jesus, que responde às tentações com as palavras da Escritura. O deserto de Jesus representa o deserto do povo e assim ele mesmo está tipificado no guia e legislador Moisés. Ou melhor, talvez Jesus represente o novo povo de Deus que é tentado em sua pessoa pelo inimigo sob aparência de uma correta conduta religiosa. A fome [1ª tentação]: Israel tenta a Javé e essa prova serve, segundo Dt 8, 3 para um novo alimento saído da boca de Deus: Javé te humilhou, fez com que sentisses fome e te alimentou com o maná….para que aprendas que não só de pão vive o homem, mas de tudo aquilo que sai da boca de Javé. Na segunda tentação que o povo fez a Deus vemos como aquele o rejeita por uma maior segurança em Êx 32, 1 e por isso, pede que um novo deus seja forjado para que os guie no caminho do deserto, porque Moisés demorava a descer do monte. Na terceira tentação, o povo reclama, colocando à prova Javé, dizendo: Está Javé no meio de nós, ou não? E Deus responde por boca de Moisés: Não tentareis a Javé vosso Deus como o tentastes em Massa. É uma desconfiança na providência de Javé que o salmista rejeita em Sl 91, 11: Javé ordenou a seus santos anjos que te guardassem em todos os teus caminhos; te carregarão em seus braços, para que teu pé não tropece em pedra alguma.
CHEIO DE ESPÍRITO DIVINO: Jesus, pois, cheio de espírito divino desde o Jordão, então foi coagido no espírito para o deserto (1). Iesus autem plenus Spiritu Sancto regressus est ab Iordane et agebatur in Spiritu in desertum. O ESPÍRITO:As traduções vernáculas falam DO Espírito Santo, como se fosse a terceira pessoa da Trindade. Esse artigo definido não está no original grego. Qual a diferença? Jesus, que foi batizado no espírito, uma vez recebido o batismo de água de mãos do Batista, agora é levado por esse espírito ao deserto. Esse espírito é chamado de sagrado, ou divino (HÁGIOS), para distingui-lo do espírito impuro que tem sua origem em forças demoníacas ou malignas. O espírito santo é um Dom de Deus, fonte de atividade criativa ou profética. Corresponde ao enthusiasmos grego em que o homem é possuído pela força do deus correspondente. Fazer e atuar como Deus quer, e falar o que Deus decidir, é estar cheio do espírito santo. Esse espírito está dirigindo o homem, independente de sua mente ou NOUS, e dos apetites de seu corpo. É assim que Jesus foi guiado, ou melhor, coagido (passiva teológica) ao ermo, ou sertão da Judeia. O artigo definido indica um lugar conhecido, como era o deserto de Judá, lugar montanhoso, ermo e árido com total ausência de moradores humanos. O grego diz que o fez subir até o deserto. Lucas dirá que o fez voltar ao deserto. Ambas as expressões são perfeitamente exatas, caso o deserto seja o da Judeia. O Jordão estava a mais de 300m sob o nível do mar no lugar onde o Batista batizava; e o deserto, com artigo, era precisamente o lugar montanhoso que se encontrava a bastante altura do nível do mar, entre Jerusalém e a margem ocidental do mar Morto. No caso de que João estivesse batizando perto das planícies de Basan [em Enon, perto de Salim], também podemos falar de subir, pois o Jordão estava a 200m sob o nível do mar e as alturas de Golan o marginavam. Pelo que diz respeito a Lucas, este diz que Jesus voltou do Jordão e foi impelido pelo Espírito ao deserto. Em ambos os casos o agente da ação do movimento de Jesus foi o Espírito de que estava possuído após o batismo, segundo Lucas (4,1). Alguém poderá dizer: se no Pai-nosso rezamos não nos deixes cair na tentação como é agora o Espírito quem causa a ocasião da tentação? Devemos pensar que a linguagem bíblica não distingue entre causa e ocasião e entre causas segundas e primárias. Hoje diríamos que o Espírito conduziu Jesus para o deserto e assim foi facilitada a obra do tentador que, segundo os conceitos do tempo, era o lugar povoado pelos demônios com o qual a tentação era previsível.
O DESERTO: a) DESERTO REAL: O eremos [<2048>=desertum] grego é um lugar descampado, solitário, [desertus, desamparado, abandonado, solitário e em inglês wilderness] que como adjetivo tem o mesmo significado; ao qual voltou [Ypestrefen <5290>], ou se desviou desde o Jordão. Com artigo, e referido com um verbo que significa subir, indicaria que esse deserto é o famoso de Judá. Deserto por ser lugar inóspito, não por ser um deserto de areia, já que o deserto de Judá é um deserto abrupto, pedregoso e principalmente estéril. Unicamente na primavera existe alguma vida vegetal. Tem 80 Km de comprimento, por 20 ou 25 Km de largura. É uma área montanhosa, desabitada, entre Jerusalém e o mar morto. Unicamente há uma fonte de águas termais em Engadi que formava ao seu redor um oásis fértil, cheio de palmeiras, vinhas e árvores de bálsamos. Ao seu redor existem numerosas covas. Foi o lugar escolhido por Davi para fugir de Saul e onde este esteve nas mãos do futuro rei que poupou sua vida.(1 Sm 24, 1-12). Na parte mais alta não havia nada, a não ser pedras como as que o diabo assinala para serem convertidas em pão. Em Lucas, nosso caso, o eremos aparece 12 vezes. Das 4 vezes que o deserto se refere ao Batista, uma delas está em plural [nos desertos] lugares que eram as moradias de João antes de tornar público seu anúncio como arauto do Messias. No deserto, é a frase com a qual o evangelista distingue dos lugares desertos onde Jesus se retirava para orar ou lugar deserto onde ele multiplica os pães. Unicamente no deserto é que o pastor abandona as 99 ovelhas para buscar a transviada (15, 4). Somente Mateus usa esta expressão [no deserto] no início da pregação de João, o Batista, determinando praticamente o lugar: pregando no deserto da Judeia (3, 1). Mas é estranho que João batizasse no Jordão, pregando no deserto de Judeia, situado este a mais de 20 Km de distância do rio. Certamente o lugar onde João batizava não poderia ser chamado de deserto de Judeia. Consequentemente, Mateus não pode ser tomado como referência geográfica para os sucessos do batismo de Jesus e sua retirada ao deserto. Onde estava, pois, este deserto no qual encontramos feras [thêrion], impossíveis de serem achadas no deserto da Judeia? Muito mais confiança oferece João que situa Betabara [ou Betânia do outro lado do Jordão] como o lugar em que Jesus foi batizado, ao norte, em território da Decápolis e perto da Galileia. Perto de Betabara encontramos lugares desertos como era a morada habitual do endemoninhado geraseno, que segundo Lucas, era impelido pelo demônio para os lugares desertos (Lc 8, 29). Tudo isso indica que o deserto não é um nome restritivo a um determinado lugar, ou nome próprio, mas nome comum, determinado por sua solidão e inabilitação. Logicamente, podemos afirmar, sem descartar em absoluto a postura tradicional, que o deserto ao qual Jesus se retirou estava muito mais próximo da Galileia do que da Judeia, que o deserto das tentações eram os montes do que antigamente chamava-se de Gileade, [escabroso] e que ao norte do mesmo estava Basã, de cuja região eram famosos os touros, ao parecer selvagens (Sl 22, 13), ou vacas que moravam nas montanhas (Am 4, 1). Uma confirmação de que não era o deserto da Judeia podemos vislumbrar em João 3, 22: Depois disso Jesus veio para o território da Judeia. Isso indica que o batismo de Jesus, que precede de imediato a sua ida ao deserto, não foi feito na Judeia mas muito próximo da Galileia, e que o deserto de Jesus era um deserto comum. b) BÍBLICO: Na bíblia, o deserto tem dois sentidos, um negativo, como terra estéril, maldita de Deus e habitada pelos espíritos impuros. O deserto era terra medonha e terrível não abençoada por Deus, em que o povo se encontrava como enterrado na terra (Êx 14.3). Na linguagem bíblica, a aridez do deserto é símbolo de uma terra à qual Deus nega sua bênção e, portanto, privada de chuva e fertilidade. Neste sentido é comparado com a cidade que foi objeto do castigo divino (Lc 13,35). E o outro positivo, como lugar e época privilegiada em que Deus dirigia o povo para a terra prometida. Do deserto se pensava que devia proceder o Messias para a instalação do seu reino (Mt 24,26). Historicamente, Israel viveu no deserto 40 anos. A solidão do povo com Jahvéh transformou a vida, de extrema penúria em época privilegiada, em que Israel nasceria como povo e teria como único guia o Senhor Jahvéh (Ex 13,21-22). Foi o lugar da purificação e experimentação da pobreza do povo (Dt 8,2-5) para que aprendesse que não só de pão vive o homem (Dt 8,2-5). O deserto é sinal de salvação (Is 35,1-10). Os profetas anunciavam as promessas do reino, dizendo que o deserto se transformaria em jardim, donde as feras seriam inofensivas (Is 32,15-17). Isto deve ser tomado em conta para ver como, sob os fatos narrados, existe um simbolismo que não devemos desprezar.
O JEJUM: Por quarenta dias, estando sendo tentado pelo diabo, e não comeu nada nesses dias; e acabados eles, depois teve fome (2). Diebus quadraginta et temptabatur a diabolo et nihil manducavit in diebus illis et consummatis illis esuriit. QUARENTA DIAS: Lucas fala só de dias mas Mateus e Marcos falam também de noites. Como devemos entender os quarenta dias e quarenta noites de Mateus e Marcos? Os judeus, como atualmente os árabes no período do Ramadão, jejuavam de sol a sol. O jejum terminava com o dia, aproximadamente seis da tarde. Por isso os dois evangelistas acrescentam as quarenta noites. Uma outra questão é se o número 40 corresponde a um tempo matemático ou cronológico, ou é um número redondo, mais ou menos prolongado, em razão da falta de adjetivos indefinidos nas línguas semitas. Neste último caso, facilitaríamos a exegese para manter a saúde de Jesus, sem recorrer a causas sobrenaturais. O tempo é comparável ao de Moisés no Sinai (Êx 24, 18) e ao de Elias no caminho do Horeb (1 Rs 19, 8). SENDO TENTADO: O verbo usado pelos três evangelistas que narram os fatos é Peirazo, na sua forma passiva e como particípio [peirasmenos ser tentado, ou tentare em latim]. É o verbo usado para experimentar se uma pessoa é digna de respeito ou merece confiança. Os fariseus experimentaram Jesus em várias ocasiões (Mt 19, 3). O próprio Jesus experimentou o comportamento de seus discípulos ante o problema de como alimentar a multidão que o seguia num lugar inóspito. É nesse sentido de experimentar qual poderia ser o comportamento de Jesus como Filho de Deus, que o tentador o experimenta em situações limites. O peirasmós [tentação] tinha dois diferentes sentidos: 1o) Um sentido bom, experimental, como ver se uma coisa é boa. 2o) Um sentido mau: experimentar a fé, a virtude, o caráter, de uma pessoa. E neste sentido, está a solicitação ao pecado. Também podemos dividir a tentação em três apartados segundo a causa: Deus que inflige os males como justiça ou como repreensão. O Homem que testa Deus como se não tivesse confiança, tal como fizeram os israelitas em Massa e Meribá. Finalmente os Ímpios ou homens maus que tentam os justos e a paciência divina. Evidentemente o tentador é no nosso caso o diabo do qual falaremos mais tarde. E a tentação é para saber que tipo de homem extraordinário era esse Jesus que estava jejuando durante um tempo tão prolongado, separado de todo contato humano. Daí que as duas primeiras tentações estejam precedidas de uma condição que é a base da experiência que pretende: Se és Filho de Deus, ou melhor: Se filho fosses do Deus, como parece indicar o grego. O DIABO: é tradução grega da palavra Satãn <07854>[adversário] que a setenta também mantém como Satanás. Diabo é o nome derivado do verbo diaballein (caluniar), o Diábolos grego, como adjetivo, significa caluniador, difamador (Tt 2, 3). Como substantivo, calúnia e caluniador ou adversário. Claro que com o artigo definido aponta ao inimigo de Deus, Satanás. Lucas usa também o nome de Satanás em outras ocasiões (Lc 10, 18 ou 22, 3.31). Era o inimigo especial de Jesus e, portanto, dos planos de Deus. Os Setenta traduzem Satanás, ou Satã (oponente, adversário, acusador, fiscal) sempre por Diábolos. Mateus usa o grego diábolos no relato paralelo das tentações e Marcos, Satanás. Quem era ele, segundo o pensamento contemporâneo dos judeus em tempo de Jesus? Era o príncipe dos demônios. Distinguem perfeitamente os autores sagrados entre príncipe e Senhor. Miguel é o príncipe dos anjos e príncipe do povo de Deus (Ap 12, 7 e Dn 12, 1). Senhor é o Deus único e seu Filho Jesus Cristo (Fp 2, 10-11) a quem foi-lhe dado todo poder (Ef 1, 20-21). O próprio César não quis ser chamado imperator, mas príncipe do senado. Princeps de primus capiens (ocupante do principal lugar) era o primeiro a votar no senado em tempo da República, e em tempo do Império era o filho do Imperador. O Diabo (grego), ou Satanás (hebraico) era, pois, um personagem real, individual, que se intitula a si mesmo como Senhor do mundo ou dos reinos da terra (Lc 4,5-6) e que João diz ser o príncipe (archon) deste mundo (16, 11) que será lançado fora, pois se aproxima o momento do julgamento do mundo, quando Jesus for elevado na cruz (como rei). Os judeus pensavam que determinadas doenças eram produto da posse demoníaca como a loucura, a epilepsia, a paralisia e até a mudez. E falavam do príncipe ou maioral dos demônios como sendo Belzebu (Lc 11, 15). Os demônios têm em grego duas palavras: daimon masculino ou feminino, que é uma divindade inferior do mundo que Platão chama o mundo do Demiurgo, em que temos os deuses, os gênios, os demônios e as almas. E daimonion, neutro, diminutivo de daimon, com o mesmo significado de ser intermédio entre deuses e homens. Para os gregos podiam ser bons, como o daimon de Sócrates ou maus como os causadores de diversas doenças. Lucas usa ambos, daimon em 8,29 ou daimonion em 4,33. Podemos, pois, afirmar que ambos são equivalentes. Também, segundo o pensar da época, os demônios moravam nos lugares áridos (Lc 11,24), desérticos ou inabitados como eram as casas em ruína. Daí que o ermo era o lugar onde se encontravam de modo especial e por isso foi levado a ele Jesus, para aí ser tentado. O Diabo era o chefe, e especialmente no NT é considerado o inimigo frontal de Jesus e de sua obra redentora, de modo que impede o fruto da semente no coração do homem (Lc 8,12). Aparece pela primeira vez em forma de serpente no Gênese. Com o nome de Satã aparece pela primeira vez em 1 Cr 21, 1, como causa impulsora do recenseamento feito por Davi. Ele é um dos principais personagens do livro de Jó, constituindo o opositor a Javé e pretendendo, através de sérios males, abalar a fé do justo em seu Deus. Finalmente aparece no livro do profeta Zacarias que dá uma definição de Satã como sendo o personagem que estava à direita do anjo de Javé para acusar o sumo-sacerdote Josué a quem defende o anjo. Em Tobias temos o nome de Asmodeo [Asmodaus o demônio mau, como o define o grego] que, por não ser o livro escrito em hebraico, não sai em bíblias evangélicas e é considerado deuterocanônico pela Igreja e apócrifo pelos evangélicos. Parece que depois do exílio o nome de Satã, assim como o de outros espíritos malignos, foi eliminado e proibido. O diabo é, pois, uma pessoa singular que recebe outros nomes como Abadom [destruição]em hebraicoe Apoliom em grego (Ap 9, 11). Ambos os termos têm o mesmo significado: destruidor ou destruição, sendo o seu ofício o de príncipe das regiões infernais ou do abismo, tendo como ministério a morte e o estado de desordem e perturbação da terra. O mal é seu fim e o produz até nos corpos, por meio da possessão. Jesus identifica o diabo com Satanás na última rejeição de sua solicitação: Retira-te, Satanás (10). E o rejeitará com as mesmas palavras [ypage, Satanás] com as quais afastará a proposta de Pedro (16, 23) contrária ao ministério messiânico, projeto do Pai. Jesus reconhece o poder de Satanás como príncipe (senhor ou rei é só Deus) deste mundo (Mt 12, 16). Marcos diz claramente que o Diabo era Satanás (1, 13) nas tentações do deserto. Satanás ou o diabo tem, segundo Jesus, um ofício principal: ser o inimigo do projeto de salvação do homem do qual Jesus era causa principal por meio do seu messiado ou Reino. Jesus é o semeador da verdade [meu reino é a verdade e para isso vim ao mundo] e no campo do mundo existe um inimigo que semeia joio [a mentira] entre o trigo: ele é o diabo (Mt 13, 39). É o pai da mentira e dos que não aceitam a verdade (Jo 8, 44). Não só é pai da mentira, mas como diz o livro da Sabedoria o pai da morte, pois por causa da inveja do diabo, a morte entrou no mundo e a experimentam os que lhe pertencem (2, 24). Seu pecado é a soberba (I Tm 3,6). É o semeador do joio contra a obra de Deus (Mt 13, 39). A ele estávamos sujeitos por meio do pecado e da morte que o seguiu (Rm 5,12). Escravos do pecado, somente o Filho consegue nos libertar (Jo 8, 36). É o grande dragão, a antiga serpente, chamado Diabo e Satanás (Ap 12,9) para quem foi preparado o fogo do inferno ( Mt 25,41), mas que terá um tempo de domínio sobre a terra antes de ser totalmente derrotado (Ap 12, 12 e 20, 2 e 10). O Diabo, pois, com artigo determinado, existe. Os demônios, que geram determinadas doenças que hoje a ciência logra explicar, não existem mais; porém existem como anjos do mal, tentadores dos homens santos de modo especial, que só podem atuar por permissão divina; e em raríssimas ocasiões sua influência poderá se transformar em posse demoníaca. De fato, na história eclesiástica do Brasil não temos um só caso comprovado, segundo afirma o Pe. Quevedo. Como conclusão podemos dizer que o relato de hoje é um paradigma da luta entre duas pessoas: O Logos, como Jesus, e o Diabo, como tentador. O JEJUM: No judaísmo clássico pressupõe completa abstenção de alimento e bebida. Os judeus tinham dois dias de completo jejum de ocaso a ocaso, ou dia e noite: o Dia da Expiação e o dia 9 do mês Av [quinto mês correspondente a julho-agosto]. Os demais dias de jejum eram do nascer do sol até seu ocaso, como os dias de Ramadão dos árabes. Nos dias de jejum os jejuantes costumavam se sentar no chão vestidos de aniagem [o famoso saco] e com cinzas sobre a cabeça (2 Sm 12, 16; Est 4, 1e Jn 3, 6). Se o jejum de Jesus foi de 40 dias e noites sem comer e possivelmente sem beber, foi um fato extraordinário que não podia passar por alto ao diabo, que como demônio habitava nos lugares desérticos (Mt 12, 43), segundo a crenças da época. Em termos médicos atuais, o jejum prolongado produz um estado de neurose em que o real e o imaginário podem se confundir. Seria esta a explicação da visão diabólica de Jesus, e de seus transportes ao templo e à montanha alta onde todos os reinos estavam representados? É uma hipótese que não é totalmente descartável. Entre as causas do jejum está a preparação para estar em contato com Deus como fez Moisés que precisamente subiu a uma montanha desértica e jejuou 40 dias e 40 noites sem comer nem beber (Êx 34, 28). Mas é possível do ponto de vista humano um homem jejuar 40 dias de 24 horas sem ser um super-homem? Caso possa beber água, a resposta é sim. Porém existem alguns fenômenos que aparecem após um determinado número de dias, especialmente uma confusão mental, que se origina por falta de alimento energético nos neurônios cerebrais. A realidade e a imaginação se confundem. E o estado do paciente é semelhante ao de brotes de esquizofrenia. Talvez assim, a ciência moderna, desse modo, explique os traslados de Jesus e as visões correspondentes. O que não é possível é passar tanto tempo sem beber. Do ponto de vista bíblico, Jesus é comparado com Moisés (Êx 34, 28) e com Elias (I Rs 19,8. Ambos estiveram 40 dias em jejum. Mas os dois foram fortalecidos pela intervenção especial de Javé.
1ª TENTAÇÃO A PROPOSTA: Então disse a Ele o diabo: Se Filho és de(o) Deus diz a esta pedra para que se torne pão (3). Dixit autem illi diabolus si Filius Dei es dic lapidi huic ut panis Fiat. Para Marcos o período dos quarenta dias e quarenta noites foi um tempo de tentação sem explicar quais e quantas. Para os outros dois sinópticos, as tentações foram principalmente três, sem que com isso possamos excluir outras. Uma coisa é clara: a tentação foi externa à pessoa de Jesus, tendo origem em quem será seu inimigo implacável, que, no caso, aparentemente pretende ser seu amigo. Aí está o perigo da tentação: confundir o discurso do mal com a palavra do bem de Deus. Geralmente nós, os humanos, ouvimos a palavra da paixão do momento, da escolha imediata, da felicidade sem esforço, da fortuna repentina, da vida fácil, do amor egoísta. O sacrifício, a abnegação, o desprendimento, a privação, e até o esforço, o que poderíamos chamar a cruz de cada dia, são motivos de repulsa e rejeição. Mas vejamos como foram vencidas as tentações do maligno por Jesus. FILHO DE DEUS: Como mais tarde veremos, as tentações são motivadas pela frase se és filho do Deus. O artigo serve para indicar entre os muitos deuses o único verdadeiro. O Diabo, que vamos indicar como agente pessoal, com a maiúscula correspondente após o artigo definido, estabelece uma proclamação de fé, chamando Jesus filho do (Senhor) Deus, indicando com isso a existência desse único Deus. Que significa a frase filho do Senhor Deus em lábios de Satanás? O povo de Israel, por ser escolhido, é o amado filho de Deus. Também o rei davídico é filho de Deus, pois representa o povo. Na anunciação, o anjo declara que o menino a ser concebido será filho do Altíssimo (do Elyon = Altíssimo ou Supremo). Após o batismo de Jesus no Jordão, a voz ouvida pelo Batista foi: Tu és o meu filho, o amado. Em ti encontrei agrado [satisfação]. Ou se preferimos, de ti sinto orgulho. Teve notícia desta epifania o Diabo? Aparentemente Satanás unia o Messias com um atributo especial de ser amado especialmente como filho por Deus. Por isso dirá Lucas que saiam muitos demônios de doentes gritando: Tu és o Cristo, o filho do (Senhor) Deus (Lc 4, 41). Provavelmente essa filiação tinha muito com a que Davi profetizou em Sm 2, 7: Tu és meu filho, eu, hoje te gerei. Essa filiação dava ao Messias uma série de qualidades distintivas como a profecia, a realeza, o sacerdócio. Como profeta, à semelhança de Elias e Eliseu teria o poder de realizar milagres. O diabo vem dizer: eu sei que és filho de Deus. Se, portanto, queres te comportar como tal, podes muito bem transformar estas pedras em pão. Não sejas bobo e sacia tua fome. O que o diabo pede é que Jesus use seus poderes sobrenaturais em proveito próprio, para saciar sua fome.
A RESPOSTA: Então respondeu Jesus a ele dizendo: Está escrito: não sobre pão só viverá o homem, senão sobre toda palavra de Deus (4). Et respondit ad illum Iesus scriptum est quia non in pane solo vivet homo sed in omni verbo Dei. Jesus sabe que a petição é um desafio à sua entrega aos planos do Pai em que sua vida é dar-se e não receber. Por isso a resposta é que, segundo a palavra divina, (a Escritura) não só de pão vive o homem. É também uma citação de Dt 8,3: O senhor humilhou Israel e o deixou ter fome e sustentou-o com o maná que nem tu, nem teus antepassados conheciam, tudo para te mostrar que o homem não só vive do pão, há de viver o homem, mas que o homem vive de tudo aquilo que sai da boca de Deus.Qual é o verdadeiro sentido da resposta de Jesus? Segundo o que temos visto através dos textos, parece que podemos deduzir que Jesus opta pela obediência às leis divinas ou naturais, que respeita, mesmo estando em grande necessidade, porque sabe que Deus proverá a essa necessidade sem a intervenção sobrenatural. Ele inaugura um novo povo de Deus [é o simbolismo do qual temos falado com Jesus representando o novo Israel] em que a comida não será tão essencial como a palavra de Deus, que deve ser aceita e obedecida. Ou seja, antes de procurar o pão, devemos saber qual é a vontade de Deus e cumpri-la fielmente.
2ª TENTAÇÃO. PROPOSTA: Então, tendo-o elevado o Diabo a um monte alto, mostrou-lhe todos os reinos do império romano [oikoumenes] num instante de tempo (5). E lhe disse o Diabo: A ti darei todo este domínio e a magnificência dos mesmos, porque a mim foi entregue e a quem quero, a dou (6). Se, portanto, tendo te prostrado na minha frente, serão todos teus (7). Et duxit illum diabolus et ostendit illi omnia regna orbis terrae in momento temporis. Et ait ei tibi dabo potestatem hanc universam et gloriam illorum quia mihi tradita sunt et cui volo do illa. Tu ergo si adoraveris coram me erunt tua omnia. OS REINOS: Lucas fala de que o conduziu ao alto, mostrando todos os reinos civilizados (da oikumene, ou seja do império), num instante de tempo. Parece que podemos identificar esta visão com uma aparência imaginária, como temos declarado acima. Mentiroso como sempre, o Diabo afirma que o poder, ou domínio [exousia] e a glória, faustosidade ou magnificência [doxa] desses reinos lhe pertenciam. Realmente o Império Romano era o domínio de Satanás, porque seu fundamento era a idolatria, que Daniel descreve como os reinos saindo do fundo do mar [o abismo onde estava o reino das trevas ou de Satanás], contrários ao povo de Deus, especialmente o quarto, que o perseguiu de forma violenta (Dn cap 7). Por que reinos, se na realidade era o império que os dominava e ao qual o oikoumenes se referia? Não esqueçamos que nesse império havia reis como o nabateu, ou tetrarcas como Antipas, etc que eram mais ou menos independentes, desde que pagassem certos tributos ao César. Neste caso, Satanás trata Jesus como futuro Messias/Rei, assim como anteriormente o reconheceu como profeta. O diabo quer tirá-lo da obediência ao Pai e frustrar a entrega do Filho, como servo, dando-lhe o que ele mesmo, o Diabo, como rebelde e soberbo, tinha presunçosamente almejado: o domínio absoluto do mundo dos homens. A PROSKINESE era o ato de submissão de um súdito ao seu rei, ou de um vencido ao vencedor, reconhecendo sua superioridade. Tratando-se de ato religioso a proskinese significava adoração. O Diabo pede uma submissão a seu poder para assim entregar os reinos e transformar o Messiado do Ungido de Deus num Messiado submisso ao poder das trevas. Era a história com um giro de 180 graus.
A RESPOSTA: Então, tendo respondido, disse Jesus: retira-te atrás de mim, Satanás. Pois está escrito: prostrar-te-ás ante o Senhor teu Deus e a Ele só servirás (8). Et respondens Iesus dixit illi scriptum est Dominum Deum tuum adorabis et illi soli servies. As citações de Mateus e Lucas são idênticas e não correspondem literalmente ao texto grego dos setenta. Ambos empregam dois verbos proskineou e latreuo, que significam prostrar-se em sinal de admitir a superioridade e oferecer obediência e adorar como Deus. Jesus claramente indica que o diabo não tem lugar em sua vida. Por isso a palavra final é UPAGE, retira-te, vá embora. A resposta de Jesus é uma citação de Dt 6, 13: Temerás o Senhor teu Deus e a ele adorarás [latreuseis] e a ele servirás [kolletheseis] e pelo seu nome jurarás. O advérbio MONO [só] não pertence ao texto original, mas enfatiza o vínculo com o único Senhor de Israel. Jesus se mostra obediente até a morte como dirá Paulo (Fp 2,8). No simbolismo antes explicado, vemos o povo, representado por Jesus, dando uma resposta de obediência e culto ao único Senhor verdadeiro: teu Deus.
3ª TENTAÇÃO: Então o conduziu até Jerusalém e o pôs de pé sobre o pináculo do templo e lhe disse: Se és o Filho de (o) Deus, lança-te daqui embaixo (9). Pois está escrito que enviará seus anjos sobre ti para te guardarem (10). E que em suas mãos te tomarão para que não choques o pé contra uma pedra. Et duxit illum in Hierusalem et statuit eum supra pinnam templi et dixit illi si Filius Dei es mitte te hinc deorsum. Scriptum est enim quod angelis suis mandabit de te ut conservent te.Et quia in manibus tollent te ne forte offendas ad lapidem pedem tuum PINÁCULO:O termo grego pterigyon, significa ângulo, de pterix que significa asa, sendo, pois o significado de pterygion, extremo, barbatana, asa pequena. Como fala do ierós, qual era o pterigion [asa ou extremo] do templo? Não existe ente os comentaristas uma ideia clara. Devemos pensar num dos quatro ângulos da parte externa do templo, ou seja, dos quatro pórticos que o rodeavam. Deles, a parte mais alta era o Pórtico Real do sul. Deste lugar Jesus devia saltar para que se cumprisse o salmo 91 sobre o justo que em Deus confia. Existia entre os contemporâneos de Jesus a opinião de que o Messias devia se apresentar, descendo das alturas do templo, no átrio do mesmo, diante da multidão que o aclamava. Seria este o sinal que esperavam os fariseus e saduceus em Mt 16,1 ou Lc 11, 16? Como o Diabo pede um milagre, daí que inicia seu discurso com se és Filho do (Senhor) Deus. E reforça sua petição com um texto dos salmos ( 91,12) em que o justo é declarado sob proteção especial : Pois disseste: O Senhor é o meu refúgio; fizeste do Altíssimo a tua morada, nenhum mal te sucederá; praga nenhuma chegará à tua tenda. Porque a seus anjos dará ordens a teu respeito, para que te guardem em todos os teus caminhos. Eles te sustentarão nas suas mãos para não tropeçares nalguma pedra. O maligno interpreta este texto para argumentar uma confiança temerária na providência divina, para interpretar de modo atrevido e arriscado a vontade de Deus. Ou talvez para que Jesus demonstrasse, como pediam os fariseus, que ele era realmente o Messias, submetendo Deus a uma prova de origem humana. Sabemos como Jesus rejeitou a proposta dos fariseus, afirmando que nenhum sinal seria dado, exceto o sinal de Jonas [a ressurreição]. O milagre era uma atuação totalmente divina que interrompe as leis da natureza. Jesus devia viver uma vida humana e como tal atuar, a não ser por impulsos do Espírito Santo, não para se salvar, mas para salvar os outros. Daí que ele nunca realizara milagres em seu favor. O caso estava no mesmo nível que o grito dos fariseus ao pé da cruz: a outros salvou, a si mesmo não pode salvar! Se és filho de Deus desce da cruz e creremos em ti (Mt 27, 42).
A RESPOSTA: Então, tendo respondido, lhe disse Jesus que está dito: Não tentarás ao Senhor teu Deus (12). Et respondens Iesus ait illi dictum est non temptabis Dominum Deum tuum. A resposta de Jesus é tomada de Deuteronômio 6 16-18: Não tentes a Javé teu Deus como o tentastes em Massa (17). Observa cuidadosamente os mandamentos de Javé, teu Deus, e também os testemunhos e estatutos que ele te ordenou (18). Faz o que é justo e bom aos olhos de Javé para que tudo te corra bem. Tentar significa por à prova. A prova, a qual submeteram os filhos de Israel o poder e a fidelidade divina, está encerrada nesta frase do Êxodo 17, 7: Está Javé no meio de nós, ou não? A tentação consistia, ante a dificuldade de achar água, pensar: está o Senhor conosco ou não está? Significaria: devemos confiar nele ou permitirmos outro deus para nós? É tratar de ver se Deus está sempre da parte de uma pessoa, faça o que faça esta pessoa de sua vida. No nosso caso, a tentação consistiria em obrigar o Senhor a realizar um ato extraordinário e tremendamente temerário. Era obrigar o Senhor a realizá-lo sem causa nenhuma justificável. A resposta de Jesus é a de admitir a verdadeira vontade de Deus que está em não querer fazer fatos extraordinários quando a vida deve ser vivida de forma comum. O resto é tentar o Senhor como fizeram em Massa os israelitas segundo Dt 6, 16. Nesta tentação Jesus representa o povo de Israel no deserto diante da presença sobrenatural de Deus.
A RETIRADA: Então, acabada toda tentação, o Diabo afastou-se dele até ocasião oportuna (13). Et consummata omni temptatione diabolus recessit ab illo usque ad tempus. KAIRÓS: A tradução do kairos grego nada tem a ver com o tempo. Significa medida conveniente, ocasião, conjuntura favorável, lugar oportuno. Daí que a tradução do tempo deve ser sempre acompanhada com um adjetivo para indicar ser um tempo oportuno ou propício. Esse momento foi no tempo de sua paixão, quando Jesus afirmará que essa é a vossa hora e o poder das trevas (Lc 22, 53). Os outros dois evangelistas falam que imediatamente após a tentação os anjos o serviam.
CONCLUSÕES E PISTAS:
1) É um pouco estranha esta referência às tentações de Jesus, visto que aparentemente nada aportam à mensagem evangélica. Nada disso: as respostas de Jesus são respostas à pergunta de muitos judeus e contemporâneos sobre o uso do milagre pelo Filho de Deus todo-poderoso. Por que tendo em suas mãos o poder divino só o usou para curar doenças e aplacar fomes alheias? Por que, sendo Filho de Deus não desceu da cruz e esmagou seus inimigos (Mt 27, 40)? Como é possível que podendo com um sinal estupendo reduzir oposições e mostrar com total evidência a sua divindade, não o fizesse (Lc 11, 16)? A resposta a estas questões está nas palavras com as quais Jesus rejeita as tentações. Devemos estudá-las com atenção.
2) Já que também nós, em determinadas circunstâncias, tentamos o Senhor: por que a mim, por que tenho eu de ser sujeito de determinada desgraça e infelicidade? Será que tenho que mudar de Senhor?
3) Passando do sujeito individual ao coletivo: por que tantas guerras, por que tanto mal no mundo? Deus que pode tudo, por que permite que os bons sejam os mais vulneráveis e os maus os mais seguros e felizes em suas vidas atuais? A resposta seria, sem dúvida, a que nos deu Jesus: Deus ama também seus inimigos.
4)Uma pergunta óbvia: Os traslados, a presença do Diabo foram reais ou foram fatos imaginários? Cremos ter dado a resposta: o jejum prolongado transforma em realidade o que podemos chamar sonho ou imaginação.
5) Jesus representa o novo povo de Deus e as tentações de Jesus respondem às que sofrem os membros da sua Igreja: O pão material pode ser o fim principal do evangelho; o poder pode substituir o serviço e finalmente esperar que Deus faça o milagre de mostrar-se com um sinal extraordinário, especialmente quando tudo parece estar contrário aos seus adoradores, situados na cruz do sofrimento ou da humilhação.
EXCURSUS: NORMAS DA INTERPRETAÇÃO EVANGÉLICA
- A interpretação deve ser fácil, tirada do que é o evangelho: boa nova.
- Os evangelhos são uma condescendência, um beneplácito, uma gratuidade, um amor misericordioso de Deus para com os homens. Presença amorosa e gratuita de Deus na vida humana.
- Jesus é a face do Deus misericordioso que busca o pecador, que o acolhe e que não se importa com a moralidade ou com a ética humana, mas quer mostrar sua condescendência e beneplácito, como os anjos cantavam e os pastores ouviram no dia de natal: é o Deus da eudokias, dos homens a quem ele quer bem e quer salvar, porque os ama.
Interpretação errada do evangelho:
- Um chamado à ética e à moral em que se pede ao homem mais que uma predisposição, uma série de qualidades para poder ser amado por Deus.
- Só os bons se salvam. Como se Deus não pudesse salvar a quem quiser (Fará destas pedras filhos de Abraão).
Consequências:
- O evangelho é um apelo para que o homem descubra a face misericordiosa de Deus [=Cristo] e se entregue de um modo confiante e total nos braços do Pai como filho que é amado.
- O olhar com a lente da ética, transforma o homem num escravo ou jornaleiro:aquele age pelo temor, este pelo prêmio.
- O olhar com a lente da misericórdia, transforma o homem num filho que atua pelo amor.
- O pai ama o filho independentemente deste se mostrar bom ou mau. Só porque ele é seu filho e deve amá-lo e cuidar dele.
- Só através desta ótica ou lente é que encontraremos nos evangelhos a mensagem do Pai e com ela a alegria da boa nova e a esperança de um feliz encontro definitivo. Porque sabemos que estamos na mira de um Pai que nos ama de modo infinito por cima de qualquer fragilidade humana.
10.02.2013
5º Domingo do Tempo Comum — ANO C
(VERDE, GLÓRIA, CREIO – I SEMANA DO SALTÉRIO)
__ " Em atenção à tua Palavra, vou lançar as redes. Somos uma comunidade de Missionários! " __
Ambientação:
Sejam bem-vindos amados irmãos e irmãs!
INTRODUÇÃO DO FOLHETO DOMINICAL PULSANDINHO: Reunidos para a celebração do mistério central da nossa fé, queremos, nesta liturgia, fazer a experiência da misericórdia e da santidade de Deus. Nos quatro Domingos da primeira parte do Tempo Comum, a Palavra de Deus esteve no centro de todas as reflexões. Nas Bodas de Caná, Maria pediu para fazer tudo o que Jesus diz. Com sua Palavra na sinagoga, Jesus declara que a Palavra anunciada pelos profetas realiza-se nele e, por causa da Palavra, Jesus é expulso de sua cidade natal. Agora, neste Domingo, ouvimos Pedro dizer: "em atenção à tua Palavra, vou lançar as redes". Portanto, através da Palavra se faz experiência de Deus e, dessa experiência, se acolhe a missão, o envio e a preparação para o discipulado de Jesus. Antes do envio, porém, é preciso passar pela experiência do encontro com Deus, que acontece pelo acolhimento da Palavra. Amanhã, dia 11, celebraremos o dia de Nossa Senhora de Lourdes, padroeira de nossa Diocese. Que Maria interceda por nós e por todos os que se dedicam no trabalho de evangelização.
INTRODUÇÃO DO FOLHETO DOMINICAL O POVO DE DEUS: Ao celebrar esta Eucaristia, somos chamados a mergulhar nas águas mais profundas da fé que age pelo amor. Nesse sentido nos preparamos para celebrar o Tempo da Quaresma, a iniciar na próxima quarta-feira. Que os quarenta dias de penitência que antecedem a Páscoa do Senhor purifiquem nossos corações e unifiquem nosso olhar na fé.
INTRODUÇÃO DO WEBMASTER: Para anunciar a Deus, é preciso tê-lo "conhecido". Para conhecer a Deus é necessário que "Ele se revele". Não podemos atingir a Deus com nossos silogismos, encerrá-lo em nossos raciocínios. A revelação de Deus é ato soberanamente livre, é iniciativa sua, totalmente gratuita. O homem não tem poder sobre Deus. Ora, o profeta não anuncia uma doutrina abstrata, meramente humana, mas o Deus vivo; ele só é profeta se Deus se lhe revela, se o chama, se o envia. Revelação, vocação e missão estão estreitamente unidas. A Igreja só pode revelar o amor de Deus partilhando este amor com todos os seres humanos.
Sintamos o júbilo real de Deus em nossos corações e cheios dessa alegria divina entoemos alegres cânticos ao Senhor!
(coloque o cursor sobre os textos em azul abaixo para ler o trecho da Bíblia)
PRIMEIRA LEITURA (Isaías 6,1-8): - "Eis-me aqui, disse eu, enviai-me."
SALMO RESPONSORIAL 137/138: - "Vou cantar-vos ante os anjos, ó Senhor, e ante o vosso templo vou prostrar-me."
SEGUNDA LEITURA (1 Coríntios 15,1-11): - "pela graça de Deus, sou o que sou, e a graça que ele me deu não tem sido inútil."
EVANGELHO (Lucas, 5,1-11): - "Faze-te ao largo, e lançai as vossas redes para pescar."
Homilia do Diácono José da Cruz — 5º Domingo do Tempo Comum — ANO C
"CHAMADOS PARA O DESAFIO"
Não sei se os quatro primeiros discípulos, André, Pedro, Tiago e João, estavam de bom humor ao serem chamados por Jesus á margem do Lago de Genesaré, quando trabalhavam duramente limpando suas redes dos “enroscos” que havia nelas, após uma noite de pescaria fracassada. É bom lembrar que tratava-se de um trabalho profissional e não de uma pescaria de lazer, como é uma prática mais perto da nossa realidade.
A proposta de Jesus ao grupo de pescadores parecera descabida, ele pedia-lhes para que insistissem em uma tarefa, que não dera certo ao longo de uma jornada inteira de trabalho noturno, de um jeito diferente, jogando as redes onde ele fosse indicar. Ora, que profissional aceitaria orientação de um estranho em seu trabalho? O horário era desfavorável, quem conhece o litoral sabe que os barcos pesqueiros trabalham à noite, e que de manhã é hora de contabilizar os ganhos com a descarga dos peixes na praia. A proposta vinha como um desafio e implicava em aceitar ou não a palavra de Jesus. Após terem aceitado, fizeram conforme o Senhor lhes ordenara e o resultado fora surpreendente: as redes não resistiram a quantidade de peixes apanhados, sendo necessário partilhar a tarefa com companheiros da outra barca.
Nas barcas de nossas comunidades o resultado do nosso trabalho nem sempre é o que esperamos, pois é preciso estar sempre preparados para o fracasso das “noites” em que as redes voltam vazias, com “coisas indesejadas” que somos obrigados a ‘limpar”, buscamos a santidade de uma vida em comunhão, na justiça, partilha e fraternidade e acabamos encontrando fofocas, intrigas, divisões, coisas que estão em nossa rede embora não façam parte da vida da comunidade, não as queremos, ninguém as deseja, mas elas estão lá, exigindo um trabalho de superação que requer muita paciência e compreensão. Quem já tirou enrosco de uma linha de pesca ou de uma rede, sabe que não é tarefa das mais fáceis.
E de repente, em meio a essa tarefa somos chamados como os primeiros discípulos à “irmos mais fundo”, avançando para águas mais profundas. Será que o nosso papel na comunidade é só ficar consertando as coisas que não deram certo? Claro que não!
A missão primária da igreja não é a excessiva preocupação com si mesma, sua estrutura e seu funcionamento, mas sim em anunciar aos de fora o evangelho de Cristo. Por experiência própria e muitas vezes por puro comodismo, achamos que o trabalho proposto por Jesus não dará nenhum resultado e na maioria das vezes em que o nosso coração nos pede mais ousadia na missão, acabamos preferindo as águas sempre rasas da nossa comunidade, grupo, pastoral, movimento ou associação onde é sempre muito fácil falar de Jesus e do seu evangelho, pois todos gostam, aceitam e até aplaudem! As pessoas vêm até nós e assim passamos o nosso tempo “pescando” no aquário, onde até causamos espanto e admiração, não pelo resultado do trabalho, mas apenas pela nossa performance e desempenho.
Não foi para isso que Jesus chamou os discípulos e nem é para isso que o Senhor nos chamou. Ser missionário é sair do nosso “mundinho” conhecido e entrar na realidade das pessoas, lá onde elas estão e vivem, feiras livres, shopings, grandes avenidas, condomínios residenciais de alto luxo, favelas e áreas verdes onde o medo do narcotráfico mata qualquer esperança, nos hospitais, presídios, asilos etc. E se acharmos que a tarefa é muito grande para as nossas modestas possibilidades, então podemos começar pelas nossas famílias e ambiente de trabalho.
O verdadeiro missionário vai sempre além de suas expectativas, do seu conhecimento, da sua bagagem e experiência, ele sabe que sempre há o risco de um fracasso, mas arrisca-se de maneira corajosa porque é o Senhor quem determina. “...em atenção á sua palavra, vou lançar as redes”. Quando assim o fazemos, acabamos nos surpreendendo com o resultado e rapidamente, como Pedro, descobriremos que não foram nossas aptidões, mas sim a graça de Deus que realizou a missão, dando os frutos em quantidade muito maior do que esperávamos.
E ao tomarmos conhecimento de que a graça de Deus, derramada por Jesus Cristo, move-se e age mesmo em cima de nossas fraquezas e erros, somos tomados pelo medo de nos entregarmos totalmente a Deus.
Então aí só nos resta um caminho: confiar em Jesus e vivermos somente á luz da fé, na certeza de que doravante faremos não do nosso modo, mas do modo dele, mesmo que isso signifique ir contra a nossa lógica e razão. Essa atitude requer uma ruptura até mesmo com aquilo que nos pareça ser essencial, os primeiros discípulos abandonaram na praia as redes e o barco e seguiram a Jesus, pois é impossível edificarmos o reino de Deus do nosso modo.
Pensemos em nossa vocação e nos perguntemos em que águas andamos “pescando”. A resposta irá exigir de nós uma atitude, a partir do evangelho. (5º. Domingo do Tempo Comum)
José da Cruz é Diácono da
Paróquia Nossa
Senhora Consolata – Votorantim – SP
E-mail jotacruz3051@gmail.com
Homilia do Padre Françoá Costa — 5º Domingo do Tempo Comum — ANO C
Outro Cristo, o mesmo Cristo!
Rezemos muito pelos sacerdotes, esses homens valiosos que deixaram tudo e seguiram o Senhor. Eles não se decidiram pelo sacerdócio porque não tinham outra coisa a fazer. Ao contrário, muitos antes de serem padres já tinham inclusive uma profissão, outros tinham as suas namoradas, outros viam um futuro intelectual brilhante diante de si, outros eram de família humilde… homens preciosos e entregues ao Amor de Deus! Os sacerdotes são conscientes de que a felicidade só se encontra no serviço de Deus e pedem insistentemente ao Senhor a graça de serem cada vez mais fiéis, já que o segredo da felicidade é a fidelidade. Os sacerdotes sabem que podem dar às pessoas de hoje o que tanto procuram: o fundamento, o centro e o fim da felicidade humana, que é Jesus Cristo.
Certa vez, João Paulo II perguntou a um jovem se ele já tinha pensado ser sacerdote. O jovem ficou surpreendido e respondeu que não, o desejo dele era ser pintor. O Papa explicou-lhe que sendo sacerdote poderia – ao pregar a Palavra de Deus e celebrar os Sacramentos – pintar magistralmente sobre o lenço do seu tempo e apresentar a Deus um quadro maravilhoso. “Apenas terá mudado – disse-lhe o Papa – de sala de exposição”. O jovem deixou a pintura para preparar-se para ser padre. Que visão tão positiva do sacerdócio!
Como no Evangelho de hoje, Jesus continua vendo que o povo se comprime ao redor dele para escutar a palavra de Deus. Não é magnífico ver no nosso querido Brasil tanta gente nas nossas igrejas, também nas comunidades evangélicas, querendo ouvir a palavra do Senhor? Graças a Deus, o povo brasileiro tem sede de Deus! Quando se observa outros ambientes, penso especialmente na velha Europa, e se vê o cansaço também em relação às coisas de Deus, entende-se a afirmação de que a nossa América é o Continente da Esperança. E o Brasil com o verde estampado até na bandeira, não fica para trás: País da esperança! Terra de Santa Cruz! Terra de Nossa Senhora Aparecida!
No panorama brasileiro onde se percebe uma grande sede de Deus, a Igreja vem recordar-nos que a palavra de Deus e as graças sacramentais chegam até nós através dos ministros de Jesus Cristo, os padres. Eles são homens escolhidos por Deus e constituídos naquelas coisas que se referem a Ele (cf. Hb 5,1). O sacerdote é um varão preparado para dar Deus aos demais. Ele mesmo é consciente da sua própria fraqueza, sabe-se um vaso de barro, mas sabe também que Deus quer utilizar esse pobre vaso, esse pobre instrumento, para derramar as suas graças sobre a humanidade. Quando o padre celebra a Missa, é Cristo quem a celebra; quando o padre absolve, é Cristo quem absolve; quando o padre batiza, é Cristo quem batiza. Ele dá a sua voz, as suas mãos e todo o seu ser a Cristo para que as graças venham sobre os fiéis e sobre toda a humanidade através dele e apesar dele. O sacerdote é um servidor da causa de Deus e, portanto, cada vez que ele celebra os sacramentos, estes acontecem infalivelmente: não importa o estado do sacerdote, ainda que ele esteja em pecado mortal, ele batiza, absolve, consagra. Logicamente, um sacerdote que celebra os sacramentos em pecado mortal comete pecado grave, mas nem por isso a palavra de Deus e os sacramentos deixam de atuar para o bem de todo o povo de Deus. O “bom Deus”, essa era a expressão que o Cura d’Ars gostava de utilizar para referir-se ao Senhor, cuida do seu povo através dos seus sacerdotes. Como São Pedro, eles são os primeiros a dizer, “Senhor, sou um pecador” (cf. Lc 5,8), mas Jesus lhes diz constantemente: “Eu vos faço pescadores de homens, não temais!” (cf. Lc 5,10).
A vocação sacerdotal pode parecer uma loucura e algumas moças talvez até diriam que é um desperdício de rapazes. Verdadeiramente, a vocação sacerdotal é uma “loucura de amor”. Não se trata de deixar de amar, mas de ser um aristocrata do amor. O coração do sacerdote é grande demais para ser entregue a uma só mulher, daí a necessidade que ele tem de entregar-se a todos num serviço sacrificado e alegre, todos encontram lugar no coração do sacerdote: mulheres, homens, crianças, velhos e velhas, jovens, pobres e ricos. Todos, ao passar pelo coração do padre, chegam ao coração de Deus. Que durante esse ano de graça amemos mais o sacerdócio de Jesus Cristo e que muitos jovens se deixem contagiar com essa loucura do amor e se decidam a “amar o Amor”.
Pe. Françoá Rodrigues Figueiredo Costa - 10/02/2013
Comentário Exegético — 5º Domingo do Tempo Comum — ANO C
(Extraído do site Presbíteros - Elaborado pelo Pe. Ignácio, dos padres escolápios)
EPÍSTOLA (1Cor 15, 1-11)
INTRODUÇÃO: Parece que os de Corinto aceitavam uma ressurreição parcial, ou seja, uma sobrevivência da alma, sem o corpo. Esta perícope é, por isso mesmo, tanto mais essencial e importante, porque define a ressurreição como sendo uma ressurreição corporal, e portanto, rejeita, desde o início, as teorias modernas dos que falam de aparições subjetivas ou internas sem que a visão seja tal que até poderia ser captada por uma máquina fotográfica ou uma câmara de filmar. Dentre os testemunhos, o do próprio Paulo é importante, não só porque temos o escrito de uma testemunha viva, mas porque este escrito é anterior aos evangelhos [23 anos após a morte de Cristo] e até mais completo em certos detalhes, indicando que o número dos que viram o Cristo ressuscitado é tal que não existe depoimento semelhante em toda a história de um fato extraordinário tão unânime e numeroso como este. Paulo viu o Senhor no caminho de Damasco [cerca de 8 anos após a morte de Cristo] e ninguém poderia tirar de sua cabeça a idéia, ou melhor, a fé de que ele viu o Cristo vivo em corpo e alma. Um corpo espiritual, mas corporal e físico. A este corpo apontam os dois relatos de João quando afirma que, estando tudo fechado, Jesus entrou (Jo 20, 19 e 26). Para que o detalhe das portas, se era uma simples visão mais ou menos imaginária? Porém se era um corpo real então o detalhe aumenta o prodígio da aparição, que é, sem dúvida, o que o evangelista deseja realçar. Vejamos os versículos em separado.
A TRANSMISSÃO: Portanto, vos transmito, irmãos, o evangelho que vos anunciei, esse que também recebestes e no qual tendes permanecido (1). Notum autem vobis facio fratres evangelium quod praedicavi vobis quod et accepistis in quo et statis. TRANSMITO: O verbo gnörizö [<1107 =notum facere] é traduzido fielmente pela Vulgata. Lembrar, trazer à memória, recordar, parece um tanto livre e sem de vigor. A tradução inglesa literal fala de reveal [revelar] que se fosse pela primeira vez estaria muito bem escolhido, pois é o sentido que lhe dão os clássicos. Preferimos o transmitir no sentido de comunicar ou propagar uma notícia. EVANGELHO: Em grego euaggelion <2098> palavra que sai 57 vezes nas cartas paulinas, com diferentes adjetivos que a determinam como anúncio: 1) simplesmente evangelho (27), ou anúncio de uma Boa Nova como é a vinda do Reino de Deus, que para Paulo tem conotações de perdão e salvação gratuitos por parte de Deus em seu Filho.- 2) de Cristo , Jesus Cristo, ou Filho de Deus (10 vezes).- 3) de Deus (8 vezes).- 4) próprio de Paulo no sentido de ser dirigido aos gentios com especial cuidado para anular a Torah antiga, evangelho dos incircuncisos (11).- 5) Uma vez evangelho da paz (Ef 6, 15). Qual é a essência deste evangelho? Veremos a solução de imediato nos próximos versículos desta carta. Antes de mais nada, teremos que afirmar que a base desse evangelho é a Ressurreição de Cristo, testemunhada pelos que foram seus apóstolos, como anunciantes desse fato extraordinário, do qual foram testemunhas. (1Cor 15, 14).
ANUNCIEI: São Três os estágios que levaram à fé aos de Corinto: anúncio por parte de Paulo; recepção submissa por parte dos fieis convertidos, e finalmente perseverança na fé recebida. Nisso podemos ver as características da fé de cada cristão autêntico.
A DOUTRINA: Pelo qual também estais salvos com uma [certa] palavra, com a qual vos evangelizei, se a retendes, a não ser que acreditastes em vão (2). per quod et salvamini qua ratione praedicaverim vobis si tenetis nisi si frustra credidistis CERTA PALAVRA: Tini logö; a tradução literal seriacerta palavramas o tis acompanha um nome para indicar o artigo mais ou menos indeterminado como Samareites tis, certo samaritano [=um samaritano sem nome, comum], que indica uma indeterminação, como sendo um uso geral ou comum do nome. No caso, esse evangelho foi anunciado de palavra e poderíamos traduzir salvos pela palavra que vos anunciei. PALAVRA: logos [<3056>= ratio] pode ser traduzido por palavra, discurso, doutrina, razão. A Vulgata usa ratio. Poderíamos traduzir pela doutrina que vos anunciei. Essa salvação depende de manter firme essa doutrina na qual acreditaram os evangelizados, exceto o caso de ser inútil a fé por não acreditar na ressurreição fica fora de nossa fé, como era o caso do romance S. Manuel Bueno, Mártir de Unamuno. Tendo o conjunto da perícope atual, a tradução por ele também sois salvos, se retiverdes a palavra tal como vo-la preguei, a menos que tenhais crido em vão é uma tradução interpretativa legítima, que, embora não seja literal, reflete perfeitamente o pensamento do apóstolo, por vezes algo confuso em sua redação.
A BASE DA FÉ: Principalmente vos entreguei o que também recebi: que Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras (3). tradidi enim vobis in primis quod et accepi quoniam Christus mortuus est pro peccatis nostris secundum scripturas. PRINCIPALMENTE: é a tradução de en prötois, uma frase adverbial que é traduzida como first of all [=antes de mais nada], que indica prioridade em ordem mais do que em tempo e lugar. ENTREGUEI/RECEBI: Estafrase de Paulo é uma confirmação de que não só as Escrituras, mas a tradição é a base da fé que Paulo entrega como a recebeu. Em ordem lógica e cronológica deveríamos falar de receber para transmitir ou entregar. Claro que a última razão que dá valor à tradição é sua conformidade com as Escrituras. Sendo estas um documento escrito, sua interpretação ou manipulação é mais difícil e, portanto tem um valor documental probatório maior que a palavra das testemunhas. Tudo isto Paulo sabe perfeitamente e daí seu empenho em apresentar as testemunhas, variadas e múltiplas em conformidade com as Escrituras. Porém se no campo judicial a palavra das testemunhas [a tradição] é válida, por que no campo religioso não é e se rejeita como palavra de homem e não como testemunha viva de fatos e ditos como é a palavra de Deus? Para que os profetas se os evangelistas e apóstolos dizem tudo? Como interpretá-los caso aconteça dúvida ou incerteza? É uma norma e senso comum que existem várias interpretações e nenhuma delas pode ser verdadeira. É o que acontece com a livre interpretação das escrituras, que, aliás, receberam sua autenticidade não por livre escolha, mas pela aceitação de sua doutrina com a tradicional anunciada pelos apóstolos. Mas vejamos o primeiro artigo de fé desse pequeno credo apostólico, anterior ao credo dos apóstolos, este tardio, anterior ao de Niceia (325), pois aparece em Hipólito em 215 e, em formas similares, em Irineu e Tertuliano; porém, não aparece na Igreja oriental e só com Pirminio (+753) encontramos uma forma idêntica à atual que chamamos de Credo breve. O evangelho que Paulo resume neste pequeno credo tem só 3 artigos: morte, sepulcro, ressurreição. Todos eles dizem respeito ao Cristo. O primeiro é a morte. Se Cristo não morreu é inútil pregar a ressurreição. MORREU: Apethanen [<599>= mortuus est] A morte de Jesus é indiretamente assumida como certa, porque foi feita para remissão dos pecados como pagamento/resgate da dívida, e isso recebe o nome de redenção [lutron <3083>e apolutrosis <629>=redentio] (Mt 20, 28 e Rm 3, 24). Comenta Davic Guzik: Num determinado momento, antes do grito Tudo está consumado, uma terrível mudança espiritual realizou-se: O Pai depôs em seu Filho Jesus toda a culpa e o castigo que nossos pecados mereciam. Ele recebeu toda a ira divina que devia ser arremessada contra nós, daí que Jesus se sentisse pecado e abandonado por Deus (Mt 27, 46). Este era o cálice que tinha de beber, como se fosse um inimigo de Deus, o cálice da ira de seu Pai ( Is 51, 17) para que nós não tivéssemos que bebê-lo, como está escrito em Jr 25, 15 e Sl 75, 8. assim, lemos em Is 53-3-5: (o meu servo) era desprezado e o mais rejeitado entre os homens; homem de dores e que sabe o que é padecer; e, como um de quem os homens escondem o rosto, era desprezado e dEle não fizemos caso. Certamente Ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas dores levou sobre si; e nós O considerávamos por aflito, ferido de Deus e oprimido. Mas ele foi traspassado pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre Ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados. ESCRITURAS: Da morte de Jesus está escrito no Salmo 22, 15: a língua se me apega ao céu da boca. Assim me deitas no pó da morte. E em Dn 9, 26: Depois das sessenta e duas semanas será morto o Ungido [Cristo] do Senhor e já não estará; e o povo de um príncipe que há de vir destruirá a cidade e o santuário. Finalmente em Is 53, 8: por juízo opressor foi arrebatado e de sua linhagem quem dela cogitou? Porquanto foi cortado da terra dos viventes; por causa da transgressão do meu povo, foi Ele ferido.
SEPULTADO E RESSUSCITADO: E que foi sepultado e que ressuscitou no terceiro dia segundo as Escrituras (4). et quia sepultus est et quia resurrexit tertia die secundum scripturas. SEPULTURA: Lemos em Isaías 53, 9: Designaram-lhe a sepultura com os perversos; mas com o rico esteve na sua morte porque nunca fez injustiça nem dolo algum se achou em sua boca. O dito do profeta concorda com os fatos que lemos nos evangelistas. RESSURREIÇÃO: Nas Escrituras temos este versículo que foi citado por Pedro no seu discurso do dia de Pentecostes: Não deixarás a minha alma na morte , nem permitirás que o teu Santo veja a corrupção (Sl 10, 16). TERCEIRO DIA: Está implícito em não ver a corrupção. Os judeus acreditavam que a alma estava unida ao corpo depois da morte e que no quarto dia quando começava a corrupção se afastava do seu corpo porque para ela era então irreconhecível. A ressurreição não é um adendo, como um postulado ou corolário, mas é a maior prova de Jesus como enviado do Pai e constitui o fundamento da fé. Os atenienses riram de Paulo quando este, deixando a sabedoria humana apela para a ressurreição de Cristo ( At 17, 32). Tanto em Pedro como em Paulo, o tema da ressurreição foi a base dos discursos mais importantes de ambos os apóstolos. A supervivência da alma era crença bastante comum entre os gregos, mas a ressurreição do corpo era um absurdo para os mesmos ambientes culturais.
INÍCIO DAS APARIÇÕES: E que foi visto por Kefas; depois pelos doze (5). et quia visus est Cephae et post haec undecim.Esta é a terceira afirmação dogmática deste credo primitivo que provavelmente era pedido antes do batismo. FOI VISTO: em grego öfthë [<3700>=visus est] indica uma visão real e não uma aparição como um fantasma ou um espírito ( ver Mt 14, 26 e Lc 24, 37). Mas como disse Jesus aos doze, na primeira aparição, um espírito não tem carne nem ossos como vedes que eu tenho (Lc 23, 39). De fato, vejamos os relatos das aparições de Jesus. Mt 28, 9: As mulheres aproximando-se abraçaram-lhe os pés e O adoraram. Marcos usa o verbo fainö [<5316>=apparere] vir à luz, aparecer (Mc 16, 9). Em Lucas 24, 4 o efistëmi[<2186> =stare] dos anjos e o optanomai<3700> =apparuit de Pedro (Lc 24, 34) ou istëmi [<2476>=stare] de 24,37 . Opthomai é ver em todos os sentidos possíveis como em Mateus 5, 8 os limpos de coração verão a Deus ou metaforicamente tu verás como foi a resposta a Judas, após este ter-se arrependido (Mt 27, 4) ou Lc 3, 6 em que toda carne verá a salvação de Deus. Em aoristo e passiva é visto ou apareceu (Lc 22, 43). Os relatos da ressurreição são breves resumos em que à exceção de João é mais importante a catequese ou teologia do que a história propriamente dita. Porém, em Paulo, todos coincidem na veracidade de que o Cristo visto é o Cristo morto cujo corpo está vivo agora de modo que a ressurreição é o triunfo sobre a morte. Antes de fazer uma incursão textual em João temos que certificar que a aparição particular a Pedro forma também parte da chamada tradição de Lucas, pois os doze afirmaram aos de Emaús: o Senhor ressuscitou e já apareceu [öpthë de öptomai<3700>] a Simão (Lc. 24, 34). João, fiel à sua promessa de unicamente narrar o que tinha visto como testemunha ocular ou diretamente ouvido de quem era testemunha usa os seguintes verbos gregos que comparamos com as traduções latinas: Theöreö <2334>=videre em 20, 12; oraö <3708>=videre em 20, 18 e 20, 29; istemi<2476>stetit estar de pé em 20, 19; eidö<1492>=videre (20,25; 29 e 21,4) e finalmente faneroö<5319>=manifestare em 21, 1 e 21, 14). Theoreö é ver detalhadamente, ou seja, observar como é o empregado quando as mulheres observaram o sepultamento de Jesus (Mt 27, 55). Oraö é olhar com os olhos ou com o entendimento como em Marcos 8, 24 vejo os homens como árvores e Olha, que a ninguém digas nada (Mc 1, 41). Realmente o verbo Blepö <991> é olhar com a vista como dirá Jesus porque vendo não veem e ouvindo não ouvem (Mt 13, 13), mas também metaforicamente tem o mesmo sentido que oração: Vede que ninguém vos engane (Mt 24, 4). Mas este verbo não sai nas visões da ressurreição. Eidö que além de ver tem o sentido desconhecer. Como ver é vimos o seu astro ao nascer e viemos para adorá-lo (Mt 2, 2) como conhecer, pois vosso Pai celeste sabe que necessitais (Mt 6, 32). Faneroö é manifestar, ou uma verdade como em Mc 4,, 22:nada está oculto senão para ser manifesto, ou a aparição de uma pessoa que se torna visível como em Mc 16, 14: apareceu Jesus aos onze quando estavam na mesa. Como vemos, todos os vocábulos empregados têm uma base comum: a visão como manifestação de uma pessoa viva que está presente e com a qual podemos falar e conversar. Nada de visões interiores ou sonhos em vigília. São muitos os que veem e ouvem como para afirmar que existe uma auto-sugestão ou que é uma visão interior. Evidentemente ninguém viu a ressurreição, mas muitos viram o ressuscitado. Entre eles, primeiro e principalmente Simão Pedro, a quem Lucas chama Simão (Luke 24:34) e Paulo Kefas. É o cumprimento da promessa de Jesus na última ceia (Lc 22, 32). PELOS DOZE: Este encontro com Jesus ressuscitado foi feito em duas etapas, segundo João (20, 19-23 e 26-29), das quais a primeira foi também narrada por Lucas (24, 36-40) e Marcos (16, 14-20) e Mateus (28, 16-20). Como nota curiosa Marcos e Mateus falam dos onze com mais propriedade e a aparição aos onze de Mateus foi feita num monte da Galileia. Estes detalhes servem para esclarecer sobre toda a veracidade dos evangelistas, como se houvesse contradição entre as testemunhas. A história dos tempos de Jesus não era crítica e os evangelistas não pretendiam relatos exatos, mas narrações catequéticas em que podemos ver uma história estereotipada. Uma prova são os dois relatos de Lucas: o final do evangelho e o início dos Atos que parece não terem nada em comum. Paulo, por sua parte, usa o nome comum com que era conhecido o grupo apostólico: os doze, título evidentemente figurativo.
OUTRAS APARIÇÕES: Posteriormente, foi visto por mais de quinhentos irmãos juntos, dos quais a maioria permanece até agora, mas alguns dormiram (6). deinde visus est plus quam quingentis fratribus simul ex quibus multi manent usque adhuc quidam autem dormierunt. Esta é uma afirmação paulina da qual não encontramos correspondência nos evangelhos a não ser nos relatos finais de Marcos e Lucas em Atos 1. 3 sobre as aparições dos 40 dias. A razão de ter trazido este testemunho é que ainda na data da epístola a maioria estava viva para testemunhar. Provavelmente era o ano 57, ou seja 23 anos após a morte de Jesus. DORMIRAM: É uma expressão que oscristãos usavam para a morte.
TIAGO E OS DOZE: Posteriormete foi visto por Tiago depois por todos os apóstolos (7). deinde visus est Iacobo deinde apostolis omnibus. Não sabemos se esse Tiago é o irmão do Senhor, que é diferente do grupo dos apóstolos, caso seja o de Alfeu(Lc 6, 15) teríamos que um dos dois discípulos de Emaús seria este Tiago ou Cleopás (Lc 24, 18). Logo, de novo, por todos os apóstolos, com o quais Paulo confirma as duas vezes em que apareceu o Senhor aos mesmos, segundo João (20, 19-23 e 20, 26-30).
VISÃO DE PAULO: Finalmente, porém, de todos como de um último nascido, foi visto também por mim. (8). novissime autem omnium tamquam abortivo visus est et mihi, ÚLTIMO NASCIDO: Ogrego Ektröma [<1626>=abortivus] é um composto de ek [fora] e tritösko [causar ferida] que pode ser traduzido como nascido fora de tempo, muito mais do que aborto, cuja palavra em grego é melhor traduzida por examblöma. Assim como nascido ultimamente, é traduzido no NASB, e Paulo explicará esse seu nascimento como coisa especial no versículo 9. Já sabemos como Paulo viu o Senhor no caminho de Damasco, através de uma luz que o cegou e que foi narrada três vezes, com alguma diferença de detalhes, no livro dos Atos, capítulos 9, 22 e 26.
CONFISSÃO DE PAULO: Pois eu sou o último dos apóstolos que não sou digno de ser chamado apóstolo, porque persegui a Igreja de (o) Deus (9). ego enim sum minimus apostolorum qui non sum dignus vocari apostolus quoniam persecutus sum ecclesiam Dei. Parece que Paulo usa o significado do seu nome, Paulos [pequeno de estatura] para se nomear como o últimoentre os apóstolos e, além disso, pela razão de ser um perseguidor. Precisamente esta última razão é suficiente para afastar toda sugestão nessa revelação e manifestação divinas.
A GRAÇA QUE FRUTIFICOU: Pois por mercê de Deus sou o que sou; e a mercê dEle, a sobre mim, não foi vazia, mas trabalhei melhor que todos eles, não eu porém, mas a graça de (o) Deus, a comigo (10). gratia autem Dei sum id quod sum et gratia eius in me vacua non fuit sed abundantius illis omnibus laboravi non ego autem sed gratia Dei mecum.A tradução é um tanto esquisita, mas quis que fosse a mais literal possível. Diante desse título de paulos [pequeno] o apóstolo Paulo, que a si mesmo se intitula o mínimo e indigno entre todos os apóstolos, agora eleva um hino à bondade de Deus que se dignou escolhê-lo por pura graça no sentido de um favor imerecido que traduzimos por mercê. Mas também tem Paulo um pouco de vanglória ao afirmar que ele não foi indigno dessa graça, mas cooperou até mais do que os outros, não por ser ele melhor, mas porque a graça de Deus assim o quis. De fato ele adquiriu o Status de Pedro, como apóstolo da Igreja dos gentios, comparado com Pedro como apóstolo da igreja dos judeus (Gl 2, 8).
A FÉ COMUM: Pois, já eu, já eles, assim anunciamos e assim acreditastes (11). sive enim ego sive illi sic praedicamus et sic credidistis. E termina Paulo com uma norma que deveria ser o fundamento de toda crença na Igreja: a fé comum anunciada e, portanto, acreditada pelos anunciantes, que constituem o sensus fidelium, o dom profético de Cristo participado e testemunhado pela massa dos fieis, que não pode falhar na crença e que a aplica integralmente na vida (Lumen Gentium 12).
Evangelho: A PESCA MILAGROSA ( Lc 5, 1-11)
(LUGARES PARALELOS: Mt 2, 5-22 E Mc 1, 16-20)
INTRODUÇÃO: Este domingo pode ser chamado de domingo da vocação, que brota da palavra de Deus, patente na vocação de Isaías (1ª leitura), de S. Paulo (2ª Leitura) e dos quatros discípulos de Jesus (evangelho). O evangelho de hoje contem três seções em conexão progressiva: Pregação de Jesus. Pesca milagrosa. Vocação dos quatro primeiros discípulos. Em todos os casos de vocação, vemos que terminam com uma resposta incondicional por parte do vocacionado. O abandono de toda outra ocupação, optando pela missão divina até deixar familiares, como Jesus pretende e fez na sua vida pública, é a resposta humana ao chamado divino. Jesus fundamenta seu convite, de modo especial a Pedro, na captura excepcional de peixes que indica o número de seguidores que eles logo iriam conquistar.
LUGARES PARALELOS: Mateus e Marcos oferecem relatos paralelos a este de Lucas. Porém faltam neles alguns detalhes importantes, sem os quais o chamado dos primeiros discípulos tem um ar de efeito sobrenatural. Lucas, após Jesus se auto-proclamar enviado divino em Nazaré, inicia a vida pública de Jesus, pregando às margens do lago de Genesaré. Lucas, ante o caso singular de serem pescadores, mal vistos como classe no mundo da oikumene (sob o domínio romano), explica sua eleição com detalhes que a justificam. O ensinamento de Jesus, proferido do barco como nova cátedra da qual ensina seu evangelho para não ser esmagado pela multidão, deu lugar a que: sendo o barco de Simão Pedro, será este quem usará a cátedra da qual o Espírito fala à Igreja. A pesca milagrosa identifica simbolicamente pescadores de peixes com seguidores que procuram discípulos e ampliam sua obra em todos os lugares e tempos. Os primeiros cristãos verão no peixe o símbolo mais exato daqueles que desenhavam como peixe e chamavam Iesus Xristós Theou Uiós Soter, com as letras em negrito formando o nome do peixe [IXTHUS]] em grego, que, extensivamente, é lido Jesus Cristo, de Deus Filho, Salvador. Todo Cristão, pelo batismo, está imerso no Espírito como um peixe está na água e pode ser chamado de peixe de Deus. Assim pescadores e peixes, discípulos e conversos, estão intimamente unidos na barca de Pedro e em Jesus que é representado pela figura simbólica do peixe. Existe também um paralelo com Jo 21, 4-11 relato de especial importância para a vocação de Pedro em que anuncia a grande quantidade de gentios que formariam parte do reino com a captura de grande número de peixes.
À BEIRA MAR: Sucedeu, pois, que ao comprimi-lo a multidão para ouvir a palavra do (sic) Deus, porque Ele estava de pé junto ao lago de Genesaret (1), então viu dois barcos que estavam junto do lago já que os pescadores, tendo descido deles, lavavam as redes (2).Factum este autem cum turbae inruerent in eum ut audirent verbum ut audirent verbim Dei et ipse stabat secus stagnum Gennesareth. Et vidit duas naves stantes secus stagnum piscatores autme decenderant et lavabant retia. Lucas emprega o egeneto de [factum est latino] como carimbo da casa. É a frase típica para começar um novo capítulo ou episódio, sem ligar temporariamente as duas narrações, a anterior e a posterior ao enlace. Ao afirmar que estava comprimido pela multidão diz o mesmo que Marcos em 3, 9, pelo qual teve que pedir um pequeno barco [ploiarion, navícula] para se separar do povo que o apertava. Se em Marcos, Jesus pede aos discípulos para que lhe proporcionassem o barco, em Lucas, foi Ele quem viu dois barcos varados na praia, junto ao mar, já que os donos tinham descido deles e estavam limpando as redes.
A CÁTEDRA: Tendo embarcado, pois, num dos barcos, que pertencia a Simão, pediu a ele afastá-lo um pouco da terra e, tendo se assentado, ensinava desde o barco às multidões(3). Ascendens autem in unam navem quae erat Simonis rogavit eum a terra reducere pusillum et sedens docebat de navicula turbas. O fato de ser o barco de Simão indica um detalhe, que dá um sentido verídico aos fatos narrados e um pormenor essencial para a Igreja primitiva. O barco em questão indicava a cátedra, lugar oficioso ou oficial do qual os mestres lecionavam assim como a curul era a cadeira oficial do magistrado da justiça. O afastamento era o suficiente para que as multidões não o comprimissem porque todos desejavam tocá-lo por causa da dynamis [poder] que dEle saia para curar as doenças (Mt 14, 36). Jesus estava de pé junto à margem e era praticamente impossível não ser oprimido ou apertado pela multidão, impedindo que sua voz chegasse a todos os ouvintes. Por isso escolhe geralmente o cimo de um monte (Mt 5, 1) ou o portal de uma casa (Mc 2, 2). Aqui, ele escolhe um barco de pesca, que Marcos chama com propriedade ploiarion (barquinho), diminutivo de ploion, barco em geral, ou nave. Alguns manuscritos gregos importantes também usam ploiarion neste relato, com mais propriedade do que ploion. No inglês distinguem entre small ship e ship em geral. Somente Marcos e João fazem distinção entre barquinho e barco. A primeira palavra sai duas vezes em Marcos (3,9 e 4, 36) e 4 vezes em João. O ploion [barco], é usado em todas as ocasiões por Mateus, 12 vezes, e 8 vezes em Lucas. Sem dúvida que estes fatos confirmam que Marcos, discípulo de Pedro, e João, o pescador de Betsaida, são as fontes e até autores dos dois evangelhos a eles atribuídos. Lucas não conhecia a geografia do norte da Palestina e fala de barcos em geral, sem saber que os pequenos botes dos pescadores deveriam ter uma palavra mais apropriada. Talvez por isso haja uma tradução, não muito conforme com o original grego, na segunda parte da vulgata: ploion é barco e ploiarion é barquinho ou bote. A segunda vez a vulgata traduz navícula que não corresponde ao ploion grego, mas ao ploiarion.
O MANDATO: Porém, como cessasse de falar, disse a Simão: conduzi ao profundo e lançai vossas redes para a captura (4). Ut cessavit autem loqui dixit ad Simonem duc in altum et laxate retia vestra in capturam. Não sabemos a hora do dia. Talvez fosse ao entardecer, quando Jesus acabou seu sermão, livre de travas legais ou escriturísticas, usando linguagem popular e exemplos para gravar seu ensinamento que geralmente chamamos de parábolas. Jesus teve dois motivos para a pesca que seria espetacular, senão milagrosa. O primeiro era pagar a contribuição de Pedro. O segundo era prepará-lo para obedecer o chamado como pescador de homens. O grego abaixar é traduzido ao latim por estender as redes. Tratava-se de uma rede de arraste.
PEDRO: Então, tendo respondido, Simão disse-lhe: Mestre, durante toda a noite temos nos esforçado; nada apanhamos. Mas sobre tua palavra, abaixarei a rede(5). Et respondens Simon dixit illi praeceptor per totam noctem laborantes nihil cepimus in verbo autem tuo laxabo rete. PEDRO: Simeão, ou Simão como abreviatura, recebe uma preeminência notável por parte do terceiro evangelista. Na eleição dos apóstolos ele figura em todas as listas em primeiro lugar e Lucas diz que era Simão ao qual deu o nome de Pedro, no qual coincide com Marcos. Mateus dirá Simão a quem chamam Pedro. Simeão significa famoso e Pedro é a tradução latina de petra (rocha em grego) que por sua vez traduz o Kefas aramaico. A barca de Pedro deu lugar a diversos simbolismos: Nave, que como a antiga arca de Noé salva do naufrágio universal. Nave, dirigida com certeza ao porto de salvação. Nave, de onde podemos melhor ouvir a voz do Senhor Jesus, como aconteceu no lago. Nave, transformada em cátedra de verdade pela escolha divina. Simão Pedro sabia perfeitamente que a hora e as circunstâncias não eram propícias. Por isso ele inicia sua resposta com um é inútil, Senhor. MESTRE: A palavra mestre, tem em grego duas palavras: epistates, que poderíamos traduzir por patrão e didaskalos, cuja tradução é mestre]. Somente em Lucas encontramos o epistates, nesta ocasião muito mais apropriado do que didaskalos. Um outro apelativo com o qual se dirigem a Jesus, especialmente os inimigos, é o de Rabbi. Aqui Pedro trata a Jesus como um superior, um chefe que deve ser obedecido. Epistátes, originalmente com o significado de chefe, patrão (o que é superior ou está por cima) tem também o significado de mestre com poder de mando, com o poder que dá a sabedoria, assim como didáskalos tem o significado de mestre que ensina. Em Lucas, somente os discípulos chamam Jesus de epistátes, porque submetidos ao seu domínio e direção enquanto os outros o chamam de didáskalos. AS REDES: Já temos falado sobre o verbo chalao, laxare, afrouxar ou abaixar, que, tratando-se de redes, implicava numa rede de arrastão.
A PESCA: E tendo feito isto apanharam uma grande quantidade de peixes, pois rompia-se a sua rede (6). Et cum hoc fecissent concluserunt piscium multitudinem copiosam rumpebatur autem rete eorum. O milagre, como provindo de parte de Deus, é de uma abundância assombrosa. Sobraram 12 cestos após todos comerem de forma satisfatória (Mt 14, 222). Também aqui a abundância é notória, de modo que a rede estava a ponto de se romper pela massa enorme da captura.
A AJUDA: Então sinalizaram aos sócios os no outro barco para que chegando, os ajudassem, e vieram e encheram ambos os barcos de modo que se afundavam (7). Et annuerunt sociis qui erant in alia navi ut venirent et adiuvarent eos et venerunt et impleverunt ambas naviculas ita ut mergerentur. Segundo alguns comentaristas a narração é um duplicado de João 21,6, a pesca frutífera dirigida por Jesus após a sua ressurreição. O motivo é a tendência a não admitir o milagre ou o sobrenatural nos relatos evangélicos. Porém os detalhes em ambos os relatos são completamente diferentes, embora algumas pessoas e a geografia sejam comuns. Por isso devemos admitir uma cena própria, independente, para o relato de hoje. Esta é a única interpretação verdadeiramente lógica: Jesus quis indicar como sinal, o que devia acontecer com os pescadores de peixes que logo, logo, transformar-se-iam em “captadores de homens vivos”. Essa é a tradução de Zogron grego, capiens latino. A pesca milagrosa de João tem como figura central unicamente um barco. Como protagonistas, pessoas diferentes dos dois irmãos filhos de Jonas. Era o amanhecer, que não condiz com a hora em que Lucas propõe o mandato de Jesus, que seria uma hora próxima ao meio dia ou ao entardecer.
A CONFISSÃO: Tendo, pois, visto, Simão Pedro se prostrou aos joelhos de Jesus, dizendo: Afasta-te de mim porque sou homem pecador, Senhor (8). Porque o pasmo o dominava e a todos os que com ele (estavam) sobre a captura dos peixes que recolheram (9). Quod cum videret Simon Petrus procidit ad genua Iesu dicens exi a me quia homo peccator sum Domine. Stupor enim circumdederat eum et omnes qui cum illo erant in captura piscium quam ceperant. A primeira coisa que encontramos neste versículo é a fé de Pedro. Bastava contemplar a pesca com o espírito religioso como os pescadores do rio Paraíba no porto de Iguaçu encontraram a imagem da santa que hoje conhecemos como Aparecida. Precisamente, Pedro contempla o fato como uma Epifania, uma demonstração de alguém que é superior, (o epistátes já o indicava) com poderes extraordinários, próprios de uma manifestação divina. Ele vê o fato como testemunha direta; e imediatamente se enche de estupor e sabe que está diante de um milagre, um dynamis [poder] sobrenatural. E deduz que o milagre é produto do poder e mandato de Jesus, a quem tinha chamado de patrão e que agora chama de Senhor, no sentido transcendental da palavra. É por isso que em espontânea adoração, se prostra para beijar os pés de Jesus, como um escravo fazia com seu amo: é a proskinesis, em que os pés neste caso são substituídos por joelhos, embora alguns manuscritos falem de pés. O importante é que Pedro acompanha sua ação com umas palavras nas quais, não unicamente expressa sua admiração, mas também sua profunda humildade: Sou homem pecador. É o não sou digno, dito com expressão de reconhecimento de sua indignidade. Pecador aqui é um adjetivo, diferente de quando é usado como nome, com o significado de gentio, como na frase de publicanos e pecadores (ver Lc 7, 34). Por isso dirá Paulo: Nós somos judeus de nascimento, não pecadores (descendentes) dos gentios (Gl 2, 15). Sem dúvida que esta disposição de aceitar o mal e o erro dentro da vida como própria responsabilidade, é a melhor disposição para se tornar instrumento da intervenção divina. É o caso de Isaías em 6, 5. O testemunho de Pedro não é único. Os colegas e sócios também o confirmam cheios do mesmo estupor que dominava os sentimentos de Simão.
O CHAMADO: Também e de modo semelhante Jacob e João, filhos de Zebedeu, os que eram sócios de Simão. Então Jesus disse a Simão: Não temas desde agora serás captador de homens(10). Similiter autem Iacobum et Iohannem filios Zebedaei qui erant socii Simonis et ait ad Simonem Iesus noli timere ex hoc iam homines eris capiens. Com esta introdução o evangelista indica que também os outros discípulos se prostraram diante de Jesus como sendo alguém superior, em contato com a divindade. A proskinese, como o ato de submissão de um súdito a seu rei, ou de um vencido ao vencedor, reconhecendo sua superioridade, não tinha por que ser uma adoração; mas estava unida a uma relação do grande rei com a divindade cujo principal ofício era ser seu representante na terra. Hoje diríamos beijar a mão, como vemos nos atos oficiais ao saudar os monarcas ou com sacerdotes e representantes da autoridade religiosa (ver comentário deste mês, em Epifania). SIMÃO: A sua nova missão será também uma captura: mas não de peixes numa rede mas de homens vivos na rede mística do evangelho por ele anunciado (Mt 13, 47). A NOVA PESCA: De agora em diante o pescador terá um novo ofício: apanhará vivos os homens. Essa a tradução literal do texto. Que significa esta metáfora que muda a vida de Pedro e a vida de muitos homens enredados na sua nova rede? É a metáfora que recolhe seres humanos para aumentar o Reino. Jeremias, no capítulos 16, diz como o Senhor recolherá para a volta do exílio através de pescadores e caçadores, os homens. Era um momento de esperança e de atuação direta de Jahweh para bem de seu povo. Também Amós 4,2 usa o simbolismo do peixe fisgado pelos anzóis dos pescadores, neste caso para julgar os malvados. Porém, no nosso caso, Pedro é escolhido para bem dos homens, para congregá-los, salvos da morte (por isso vivos) e preservados para a vida, ao formar parte do Reino como seguidores de Jesus. Evidentemente que os outros discípulos que aqui deixam tudo e se reúnem com Jesus tem o mesmo ofício. Mas é Pedro, sempre singularmente, quem recebe diretamente essa incumbência de modo especial. Um emprego material é substituído por uma missão totalmente espiritual e atemporal.
O SEGUIMENTO: E tendo puxado os barcos sobre a terra, tendo abandonado todas as coisas, o seguiram (11). Et subductis ad terram navibus relictis omnibus secuti sunt illum. Assim, tão simplesmente, descreve Lucas a resposta dos primeiros discípulos após esta pesca milagrosa. Sem se despedir dos familiares. Marcos dirá que os filhos de Zebedeu abandonaram o pai com os assalariados (Mc 1, 20). De Pedro nada se diz. Parece que ele era o único dono do barco já que o seu nome está unido como proprietário ao barco. Será o próprio Pedro quem mais tarde argumentará: e nós que temos abandonado tudo e te seguimos, que vamos receber? (Mt 19, 27).
PISTAS:
1º) A pesca dos homens para a entrada no Reino segue os grandes traços da pesca milagrosa de hoje. Podemos comparar como trabalhamos inutilmente, confiando em nossos esforços. Mas se confiamos na palavra do Senhor, este será quem definitivamente suscita as pessoas para que elas aceitem a doutrina do evangelho.
2º) Depois de uma pesca milagrosa, Jesus atua favorecendo a ação dos discípulos, aqueles que abandonaram tudo (e aí está a força do êxito). Ao que parece o lago atual (o mundo) não tem peixes, os tempos são os piores, ou as circunstâncias o desaconselham, mas o verdadeiro discípulo só espera a voz do Mestre para começar a trabalhar.
3º) É necessário que toda a Igreja ative sua consciência de missão. Junto com Pedro, também foram chamados outros discípulos. Assistimos a uma venda de igrejas protestantes. A Igreja da Inglaterra, como exemplo, vendeu 1600 templos em menos de quatro décadas. Assistimos a um vazio de jovens nas igrejas católicas da Europa. Mas como afirmava um líder eclesiástico, os resultados não se medem pelos números, mas pela qualidade dos discípulos. O homem põe seu esforço, mas a rede necessária é a palavra, e ela trabalha em silêncio quando os operários dormem.(Mc 4, 26-27).
4º) O anúncio sempre deve ser a vitória de Cristo crucificado e ressuscitado: seu triunfo sobre a morte, sobre o mal (Lc 4, 21), sua escolha pelos irremediavelmente perdidos, sua mensagem de salvação aos pecadores que nele encontram a mais ardorosa das acolhidas. Os resultados nem sempre serão visíveis; mas terão um fim escatológico definitivo de salvação, porque o Pai sempre está à espera do filho pródigo.
EXCURSUS: NORMAS DA INTERPRETAÇÃO EVANGÉLICA
- A interpretação deve ser fácil, tirada do que é o evangelho: boa nova.
- Os evangelhos são uma condescendência, um beneplácito, uma gratuidade, um amor misericordioso de Deus para com os homens. Presença amorosa e gratuita de Deus na vida humana.
- Jesus é a face do Deus misericordioso que busca o pecador, que o acolhe e que não se importa com a moralidade ou com a ética humana, mas quer mostrar sua condescendência e beneplácito, como os anjos cantavam e os pastores ouviram no dia de natal: é o Deus da eudokias, dos homens a quem ele quer bem e quer salvar, porque os ama.
Interpretação errada do evangelho:
- Um chamado à ética e à moral em que se pede ao homem mais que uma predisposição, uma série de qualidades para poder ser amado por Deus.
- Só os bons se salvam. Como se Deus não pudesse salvar a quem quiser (Fará destas pedras filhos de Abraão).
Consequências:
- O evangelho é um apelo para que o homem descubra a face misericordiosa de Deus [=Cristo] e se entregue de um modo confiante e total nos braços do Pai como filho que é amado.
- O olhar com a lente da ética, transforma o homem num escravo ou jornaleiro:aquele age pelo temor, este pelo prêmio.
- O olhar com a lente da misericórdia, transforma o homem num filho que atua pelo amor.
- O pai ama o filho independentemente deste se mostrar bom ou mau. Só porque ele é seu filho e deve amá-lo e cuidar dele.
- Só através desta ótica ou lente é que encontraremos nos evangelhos a mensagem do Pai e com ela a alegria da boa nova e a esperança de um feliz encontro definitivo. Porque sabemos que estamos na mira de um Pai que nos ama de modo infinito por cima de qualquer fragilidade humana.
CAMPANHA DA VELA VIRTUAL DO SANTUÁRIO DE APARECIDA
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QUE DEUS ABENÇOE A TODOS NÓS!
Oh! meu Jesus, perdoai-nos, livrai-nos do fogo do inferno,
levai as almas todas para o céu e socorrei principalmente
as que mais precisarem!
Graças e louvores se dê a todo momento:
ao Santíssimo e Diviníssimo Sacramento!
Mensagem:
"O Senhor é meu pastor, nada me faltará!"
"O bem mais precioso que temos é o dia de hoje! Este é o dia que nos fez o Senhor Deus! Regozijemo-nos e alegremo-nos nele!".
( Salmos )
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