Textos criados ou coletados por Dermeval Pereira Neves. A mensagem
abaixo foi extraída do site http://www.montfort.org.br/oracoes/index.html
Excelências da Ladainha Lauretana
por Valdis Grinsteins
Muitos católicos costumam rezar, após
o Rosário, a Ladainha de Nossa Senhora, mas poucos conhecem
bem o grande valor teológico e simbólico de suas
invocações
Sábado à tarde, entrei numa igreja
de uma pequena cidade do interior. Na penumbra, algumas pessoas
que haviam terminado de rezar o Rosário começaram
a recitar diversas invocações em honra de Nossa
Senhora, seguidas todas elas do pedido "rogai por nós".
Várias das invocações são
óbvias, nem precisariam de explicações. Por
exemplo: "Santa Mãe de Deus, rogai por nós"
ou "Mãe do Criador, rogai por nós". Se
Nossa Senhora é Mãe de Jesus Cristo, e Ele é
nosso Deus e Criador, é normal invocá-La desse modo.
Mas, confesso, eu passaria por um aperto se me
perguntassem: por que Nossa Senhora é invocada como Torre
de Davi ou Espelho de Justiça? Por que Torre de Davi e
não Torre de Abraão ou de Moisés? Qual a
origem dessas invocações? Não seria espiritualmente
mais proveitoso repetir uma invocação sabendo seu
significado?
Se amanhã, numa reunião com algum
alto dignitário, eu tivesse que dizer algo, preparar-me-ia
para não repetir mecanicamente coisas ouvidas sem conhecer
bem seu sentido. Quando rezamos, em última análise
dirigimo-nos a Deus, superior a qualquer dignitário deste
mundo; portanto, devemos procurar entender razoavelmente o sentido
das preces que fazemos.
É claro que Deus é misericordioso
e aceita benignamente as orações feitas com devoção
e desejo de agradá-Lo, mesmo se não compreendemos
inteiramente o significado delas. Estamos certos de que, se a
Santa Igreja colocou em nossos lábios pecadores aquelas
orações, é porque elas são agradáveis
a Deus.
Mas o próprio desejo de agradar a Deus
deve levar-nos a procurar entender com profundidade o significado
daquilo que Lhe dizemos, e com isso, também tornar mais
eficaz o pedido que fazemos.
Assim sendo, vejamos a procedência de algumas
invocações da Ladainha Lauretana, o que certamente
resultará em aperfeiçoarmos nossa vida espiritual.
Para isso ajudou-me muito o livro "Na escola de Maria",
de autoria de André Damino (*).
Origem das ladainhas
A palavra ladainha vem do grego e significa súplica.
Mas desde o início da Igreja ela foi utilizada para indicar
não quaisquer súplicas, mas as que eram rezadas
em conjunto pelos fiéis que iam em procissão às
diversas igrejas. Há, naturalmente, numerosas ladainhas,
dependendo do que é pedido nas diversas procissões.
Quando a casa na qual morou Nossa Senhora na
Palestina foi transportada milagrosamente para a cidade de Loreto
(Itália), em 1291, a feliz novidade espalhou-se rapidamente,
dando início a numerosas peregrinações. Com
o correr do tempo, uma série de súplicas a Nossa
Senhora foi sendo composta pelos peregrinos que ali iam, os quais
A invocavam por seus principais títulos de glória.
Posteriormente essa ladainha era cantada diariamente no Santuário,
e os peregrinos que de lá voltavam a popularizaram em todo
o orbe católico. Chama-se lauretana por ter sua origem
em Loreto.
Algumas invocações têm sido
acrescentadas pelos Papas ao longo dos tempos, outras são
agregadas para honrar a proteção de Nossa Senhora
a alguma Ordem religiosa, como fazem os carmelitas, os quais rezam
a ladainha lauretana carmelitana, com quatro invocações
a mais. Mas o corpo central das ladainhas permanece o mesmo.
Composição da Ladainha
No início da Ladainha Lauretana, as invocações
não se dirigem a Nossa Senhora, mas a Nosso Senhor e à
Santíssima Trindade, pois dizemos Senhor, tende piedade
de nós, Jesus Cristo, ouvi-nos, etc. Depois invocamos o
Padre Eterno, o Filho e o Espírito Santo. Por quê?
Tudo em Nossa Senhora nos conduz a seu divino
Filho, e por meio dEle à Santíssima Trindade, que
é nosso fim último. Isto é algo que os protestantes
não entendem ou não querem entender: Maria Santíssima
é o melhor caminho para se chegar a Deus.
Após essa introdução da
ladainha, seguem-se três invocações, nas quais
pronunciamos o nome da Virgem (Santa Maria) e lembramos dois de
seus principais privilégios: o ser Mãe de Deus e
Virgem das virgens. A seguir, há um grupo de 13 invocações
para honrarmos a Maternidade de Nossa Senhora, e outras seis para
honrar sua Virgindade. Em seguida, 13 figuras simbólicas;
quatro invocações de sua misericórdia e,
finalmente, 12 invocações dEla enquanto Rainha gloriosa
e poderosa.
Em geral, é no grupo das 13 invocações
com figuras simbólicas que surgem as maiores dificuldades
de compreensão. Nossa civilização fechou-se
para o simbolismo, e aquilo que poderia ser até evidente
em outras épocas, hoje ficou obscurecido pelo exclusivismo
concedido ao espírito prático. A própria
vida contemporânea contribui para isto. Assim, por exemplo,
como explicar ou ressaltar, a pessoas que ficam fechadas em cidades
feias e perigosas, a beleza de uma estrela? Igualmente, o ritmo
de vida corrida e excitante de hoje não favorece a meditação
ou a contemplação das maravilhas da criação.
Alguns significados
Vejamos então o significado destas 13
invocações simbólicas.
Espelho de Justiça —
Justiça, aqui, entende-se em seu sentido mais amplo de
santidade. Nossa Senhora é chamada assim, porque Ela é
um espelho da perfeição cristã. Toda perfeição
pode ser admirada nEla, do mesmo modo como podemos admirar uma
luz refletida na água.
Sede da Sabedoria — Nosso
Senhor Jesus Cristo é a Sabedoria, pois, enquanto Deus,
tudo sabe e tudo conhece. Ora, Nossa Senhora durante nove meses
encerrou dentro de si seu divino Filho; Ela foi, portanto, a sede
da Sabedoria. E continua a sê-lo, pois é nEla que
encontramos infalivelmente a Nosso Senhor.
Causa de Nossa Alegria —
a verdadeira alegria não é o riso. Rir muito nem
sempre significa felicidade. É muito mais feliz a mãe
carregando amorosamente seu filho do que um papalvo que ri à-toa.
E a maior alegria que um homem pode ter é a de salvar-se
e estar com Deus por toda a eternidade. Ora, antes da vinda de
Nosso Senhor, o Céu estava fechado para nós. Foi
o sacrifício do Calvário que nos reconciliou com
o Criador e nos proporcionou a verdadeira e eterna felicidade.
Como foi por meio de Nossa Senhora que o Redentor da humanidade
veio à Terra, Maria Santíssima é, pois, a
causa de nossa maior alegria.
Vaso Espiritual — Nada
tem mais valor do que a verdadeira Fé. Na Paixão
e Morte de Nosso Senhor, quando até os Apóstolos
duvidaram e fugiram, foi Nossa Senhora quem recolheu e guardou,
como num vaso sagrado, o tesouro da Fé inabalável.
Vaso Honorífico —
Em nossa época, a honra quase não é considerada.
Pelo contrário, muitas vezes a falta de caráter
e a sem-vergonhice são louvadas. Mas a honra e a glória,
na realidade, valem muito. E Nossa Senhora guardou cuidadosamente
em sua alma todas a graças recebidas, e manteve a honra
do gênero humano decaído. Se não tivesse existido
Nossa Senhora, ficaria faltando na criação quem
representasse a perfeição da criatura, fiel até
o extremo heroísmo.
Vaso Insigne de Devoção
— Devoto quer dizer dedicado a Deus. A criatura que mais
se dedicou e viveu em função de Deus foi Nossa Senhora,
tendo-o realizado de forma tal, que melhor é impossível.
Rosa Mística —
A rosa é a rainha das flores. É aquela que possui
de forma mais definida e esplêndida tudo quanto carateriza
uma flor. Igualmente Nossa Senhora, no campo da vida espiritual
ou mística, possui de forma mais primorosa tudo aquilo
que representa a perfeição.
Torre de Davi — Lemos
na Sagrada Escritura que o rei Davi tomou a fortaleza de Jerusalém
dos jebuseus e edificou a cidade em torno dela. "E Davi habitou
a fortaleza, e por isso se chamou cidade de Davi" (Paralipômenos,
11-7). Naturalmente, o rei Davi fortificou a cidade, para torná-la
inexpugnável, e a dotou de forte guarnição.
A Igreja Católica é a nova Jerusalém, e nela
temos uma torre ou fortaleza que nenhum inimigo pode invadir ou
destruir, que é Nossa Senhora. Ela constitui o ponto de
maior resistência e melhor defesa. Por isso, nesta invocação
honramos a Nossa Senhora reconhecendo que nunca houve, nem haverá,
quem melhor proteja os fiéis e defenda a honra de Deus
do que Ela.
Torre de Marfim — O marfim
é um material que tem caraterísticas raras na natureza.
Ele é ao mesmo tempo muito forte e muito claro. Igualmente
Nossa Senhora é muito forte espiritualmente, a maior inimiga
dos inimigos de Deus, e de uma pureza alvíssima. Assim
Ela contraria a idéia falsa de que as coisas de Deus devam
ser sempre muito doces, suaves e fracas, ou que a verdadeira força
têm-na os impuros.
Casa de Ouro — O ouro
é o mais nobre dos metais. Por isso, sempre que desejamos
dar alguma coisa que seja insuperável, a oferecemos em
ouro — uma medalha de ouro numa competição,
por exemplo. Se tivéssemos que receber o próprio
Deus, procuraríamos fazê-lo numa casa que não
fosse superável, neste sentido uma casa de ouro. E a Virgem
Santíssima é a casa de ouro que acolheu Nosso Senhor
quando veio ao mundo.
Arca da Aliança —
No Antigo Testamento, na Arca da Aliança ficavam guardadas
as tábuas da lei dadas por Deus a Moisés e um punhado
do maná recebido milagrosamente no deserto. Por isso ela
lembrava as promessas e a proteção de Deus. Nossa
Senhora é, no Novo Testamento, a Arca da Aliança
que protege o povo eleito da Igreja Católica e lembra as
infinitas misericórdias de Deus.
Porta do Céu —
Nossa Senhora é invocada desse modo, pois foi por meio
dEla que Jesus Cristo veio à Terra, e é por Ela
que nos vêm todas as graças, as quais têm como
finalidade nos levar ao Céu, nossa morada eterna. Assim,
Ela favorece nossa entrada no Céu, como a porta favorece
a entrada num local.
Estrela da Manhã —
Pouco antes de nascer o sol, quando a escuridão é
maior e vai começar a clarear, aparece no horizonte uma
estrela de maior luminosidade. Depois, quando as outras estrelas
desaparecem na claridade nascente, ela ainda permanece. Assim
foi Nossa Senhora, pois seu nascimento significava que logo nasceria
o Sol de Justiça, Nosso Senhor Jesus Cristo. E quando a
Fé se perdia até entre o povo eleito, Ela continuava
a acreditar e esperar. Ela é o modelo da perseverança
na provação e o anúncio da Luz que virá.
Temos assim, resumidamente, algumas explicações
das invocações da Ladainha Lauretana. Esperemos
que a compreensão delas nos ajude a rezar com maior fervor
tão meritória oração.
* André Damino, Na escola de Maria, Ed.
Paulinas, 4ª edição, São Paulo, 1962.