Quando
não sentimos mais motivação religiosa
, quando nossas orações “caem no vazio”,
e a fé dá sinais de haver desaparecido, perplexos,
admitimos que fracassamos espiritualmente...
O que estaria acontecendo conosco? Nossas
mãos encontram-se vazias e nos sentindo fracos, nada
temos para ofertar ao Criador.
Alguém disse , a esse propósito,
que a verdadeira experiência de Deus passa pela nossa
fraqueza e pelos nossos fracassos.
Felizmente que é assim... Podemos
estar passando por um processo !
Embora nos sintamos áridos, sem qualquer
vontade para a oração e não tenhamos
nada para ofertar, não devemos nos
afligir, pois, em contra-partida temos muito para entregar:
a entrega do nosso coração em frangalhos, ou
aquilo que restou dele. Foram-se, - (e não sabemos
para onde) - as verdades que admitíamos fossem conquistas
nossas, fruto de nossos esforços par chegar mais perto
de Deus. Foram-se os nossos bons propósitos, desapareceram,
deixando uma forte sensação de fracasso. Não
somos mais, capazes de sustentar aquilo que julgávamos
possuir. Sentimo-nos como se estivéssemos no ponto
zero, no início de nossa caminhada, convencidos de
que nesses anos todos não chegamos a lugar algum.
Nesse estado de prostração
– devemos nos convencer que os favores de Deus, nunca
devem ser encarados como recompensas pelos nossos esforços,
mas, como dom – (um presente) e respostas à nossa
própria fraqueza...
Esse estado de prostração ,
pelo qual podemos estar passando, nos convida a aceitarmos
que as graças de Deus, continua agindo em nós
e está nos conduzindo à virtude da humildade,
ao conhecimento e à aceitação profundas
de que não somos nada e assim, a partir dai, permitir
que Ele continue trabalhando em nós, conduzindo e nos
oferecendo – agora sim! – uma noção
mais profunda da verdadeira humildade, o que permite que Ele
reorganize-nos, purificando todas as nossas intenções,
conduzindo-nos para um crescimento espiritual mais autêntico..
Agora e a partir desse ponto, Deus vai agir,
mais livre e intensamente em nosso íntimos e, sem a
nossa interferência, sem os entraves de nossas preferências,
sem os vícios que cometíamos.
Reconhecidamente, devemos nos abandonar total
e integralmente à graça divina, e como crianças
- deixar-nos ficar em Seus braços. Quando essa realidade
que estamos descrevendo, penetrar o nosso coração,
não resta outra saída senão entregarmo-nos
a Ele. Assim, todos os muros que havíamos levantado
entre nós e Sua graça caem e seremos restaurados,
de maneira generosa.
Não nos resta outra coisa senão
abrir as mãos e prostrados, capitularmos diante de
Deus, entregando-LHE nossa fraqueza, nossos pecados e nossas
trapalhadas.
Você já percebeu como os santos, - (os emocionalmente
sadios e espiritualmente crescidos) lamentavam-se e choravam
seus pecados ? Mas que pecados são esses para provocar
tanto arrependimento e choradeira?
E, por mais que nos esforçássemos
não conseguíamos identificar quais são
esses pecados...
Agora, todavia, fica mais claro que não
são propriamente “pecados”, mas, no fundo
uma consciência profunda, intensa, que lhes sobrevêm
como fruto da virtude da humildade, quando constatam a infinita
estatura do Criador e a insignificância da natureza
humana criada por Ele. Ficam assombrados, ficam estarrecidos,
ficam pasmos, temendo e tremendo por essa constatação,
fruto da virtude da humildade que Deus infunde em suas almas,
libertando-as de uma série e enganos.
E ao se sentirem assim, - e porque não
há para onde correr – impressionam-se vivamente
com suas descobertas e, batendo no peito, admitem não
estar correspondendo , como criaturas de Deus, à sua
vocação para o amor.
Descobriram que toda vez que o coração
humano estiver ocupado por coisas ou situações
para compensar carências – ( ocupado pelo egoísmo
) a pessoa não vai ter espaço e condições
para um melhor crescimento espiritual. Esses amigos de Deus,
há certa altura de suas experiências, perceberam
isso e deixaram se levar por esse sentimento tão profundo.
A constatação dessa realidade,
por outro lado, dá-lhes segurança e aumenta-lhes
a confiança no amor divino. Deus provê a esses
corações muitas graças e consolações,
não permitindo que essas almas, assim tocadas, entrem
em pânico, mas que, compreendam que gozam do amor de
Deus e agora, mais livres podem se dedicar a Ele e ao próximo,
amando e sendo amadas...
Como é oportuno, nesse instante, repassar
o Salmo 23, que dá uma idéia muito significativa
da realidade da presença de Deus nessas almas:
”O Senhor é meu Pastor, nada
me falta.
2 Em verdes pastagens me faz repousar,
conduz-me até às fontes tranqüilas
3 e reanima minha vida,
guia-me pelas sendas da justiça
por causa de seu nome.
4 Ainda que eu ande por um vale tenebroso,
não temo mal algum, porque tu estás comigo;
teu bordão e teu cajado me confortam.
5 Diante de mim preparas a mesa,
bem à vista dos meus inimigos;
tu me unges com óleo a cabeça,
e minha taça transborda.
6 Sim, prosperidade e graça me seguem,
todos os dias de minha vida;
habitarei na casa do Senhor ,
por longos dias”
Quanto amor da parte do Criador. Quanta segurança!
Quanta certeza e quanta libertação, pois pela
virtude da humildade e com impulso novo, importa e vai importar
sempre a maneira como passo a interpretar minhas experiências
e como reajo a elas. A alma experimenta infinito e se abre
pra o perdão, mesmo sabendo-se fraca e cheia de imperfeições,
inclinada ao pecado , (às trapalhadas compensatórias):
a) - Posso interpretar meu pecado como um
fracasso e reagir com as auto-incriminações.
Isto, então, irá espiritualmente puxar-me para
baixo e impelir-me à resignação;
b) - Posso também diminuir a importância dos
meus pecados e com isso a minha vida espiritual se tornará
aburguesada;
c) - E posso reprimir o pecado e com isso me transformo em
um fariseu.
A virtude da humildade à qual Deus vai nos introduzindo,
através de um longo processo, nos convida a vermos
no pecado , uma oportunidade para nos lançarmos totalmente
em Suas mãos . Isto, evidentemente, não quer
dizer que devamos pecar conscientemente. Devemos lutar (entregar-se)
para ser transformados por Deus. Porém, mesmo assim,
sempre de novo haveremos de cair em pecado. Se fizermos as
pazes com a nossa condição humana, se reconhecermos
nossa incapacidade para alcançar a perfeição
por esforço próprio, prescindindo do auxílio
divino, então precisamente esta queda será a
oportunidade para uma entrega total a Deus.
No pecado, Deus arranca todas as máscaras
de nossa face , de nossa mentirosa santidade. Assim, caem
por terra os conceitos, a pose, e os muros que havíamos
construído, em torno de nós, nesse tempo todo.
Dessa forma, nus e despidos poderemos nos
apresentar ao Criador para que nos cure, permitindo que o
Seu amor nos levante novamente.
“Quando sou fraco, então é
que sou forte” – afirma o Apóstolo Paulo.
Esse é o paradoxo do caminho espiritual
O fracasso, em forma de oferta,
nos ajuda a perceber que dependemos inteiramente da graça
de Deus, sendo esse o caminho correto , se desejarmos nos
fazermos melhores.
O Espírito – disse alguém
– só pode nos transformar “quando
destrói, quando quebra a rebeldia de nosso espírito.
Ele precisa derrubar muros e fortalecer castelos"
A graça da “entrega humilde”
parece atingir mais profundamente o nosso ser, curando-o,
do que as “ofertas” que muitas vezes e de maneira
pretensiosa ousamos manifestar.
Mario Eugenio Nogueira
nogueiramario@terra.com.br
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