* por Tom Coelho
* Tom Coelho, com formação em Economia
pela FEA/USP, Publicidade pela ESPM/SP, especialização
em Marketing pela MMS/SP e em Qualidade de Vida no Trabalho pela FIA-FEA/USP,
é empresário, consultor, professor universitário,
escritor e palestrante. Diretor da Infinity Consulting e Diretor Estadual
do NJE/Ciesp. Contatos através do e-mail
atendimento@tomcoelho.com.br.
Visite:
http://www.tomcoelho.com.br.
Numa época em que a responsabilidade
social é preconizada como atributo de organizações
conscientes e alinhadas com os propósitos de um novo mundo, é
justo questionarmos por onde anda a responsabilidade bancária.
Uma iniciativa já foi dada.
"A melhor coisa do mundo é um banco bem
administrado,
a segunda melhor do mundo é um banco mais ou menos administrado,
e a terceira melhor coisa do mundo é um banco mal administrado.”
(Miguel de Oliveira)
O lucro dos bancos bateu novo recorde histórico
no Brasil. Fruto de uma política econômica que há
mais de uma década privilegia o investimento no capital financeiro,
em detrimento do capital produtivo, as instituições bancárias
estão legitimamente aproveitando-se das regras do jogo para ganharem
mais.
As receitas com serviços bancários, ou
seja, oriundas da cobrança de tarifas, vêm galopando a
passos largos desde o fim da crise inflacionária. Naqueles tempos,
não havia motivos para se cobrar pelo fornecimento de talonários
de cheques, emissão de extratos ou realização de
uma transferência de recursos para terceiros. Afinal, vivíamos
sob a égide de uma inflação que bateu em 3% ao
dia. O importante era realizar uma aplicação no overnight
e garantir o poder de compra da moeda no dia seguinte.
O advento do Plano Real ensinou aos bancos outras formas
de se ganhar dinheiro. E eles aprenderam muito bem a lição.
Atualmente a receita média dos bancos apenas com tarifas é
suficiente para pagar, com folga, toda sua folha de salários.
O conjunto dos sete maiores bancos no país faturou R$ 19,8 bilhões
em 2003 apenas com tarifas, cifra elevada para R$ 22,4 bilhões
em 2004. As despesas com pessoal, por sua vez, caíram de R$ 18,7
bilhões em 2003 para R$18,3 bilhões no ano passado. O
Banco Central assiste passivamente a este filme. Há incidência
de tarifas até sobre valores depositados – nada surpreendente
para quem passou a cobrar inclusive pelo estacionamento.
Contudo, as tarifas não são, evidentemente,
a única fonte de receita dos bancos. Os ganhos com “tesouraria”,
ou seja, investimento em títulos do governo federal, aqueles
remunerados pela famigerada Selic, representam nada menos que 36% do
total de lucros do sistema bancário.
Mas a maior receita provém das operações
de crédito. A concessão de empréstimos representou
43% do faturamento bancário no primeiro semestre de 2004. Aqui,
a grande alavanca atende pelo nome de spread, isto é, a diferença
entre o prêmio pago pelos bancos para captar dinheiro numa ponta,
junto a outras instituições financeiras ou a poupadores,
e o quanto se cobra dos tomadores destes recursos, sejam eles pessoas
físicas ou jurídicas.
Todavia, não tenho a pretensão de usar
deste espaço, nesta oportunidade, para falar sobre os ganhos
dos bancos ou sobre o fato de termos as mais elevadas taxas de juros
e spread bancário do mundo. Chamou-me a atenção
o alerta de um executivo do setor financeiro, Filiphe Falchioni (**),
para o que ele denominou de ausência de “Responsabilidade
Bancária”. Afinal, não bastassem todas as receitas
apresentadas anteriormente, os bancos tornaram-se também, grandes
lojas, com produtos e serviços dispostos em prateleiras, tais
como seguros, planos de previdência privada e investimentos diversos.
Os profissionais, por sua vez, viraram, todos, vendedores.
A palavra de ordem é “reciprocidade”. Você
tem um empréstimo concedido apenas se adquirir um titulo de capitalização.
Falta-nos apenas o segurança da empresa terceirizada oferecer-nos
um seguro de vida para passarmos pelo detector de metais...
A grande preocupação reside no fato de
que somos um país de desinformados. Se a matemática já
é disciplina considerada das mais difíceis no ensino fundamental,
o que se dirá de matemática financeira, que chega ao cúmulo
de ser tratada como matéria optativa em cursos de graduação
em Economia, Administração e Contabilidade. A maioria
dos empresários ignora como formar preços de venda. A
maioria dos consumidores desconhece o poder predatório da capitalização
composta, ou seja, da incidência de juros sobre juros.
Sob esta ótica, os bancos contribuem diariamente
para o agravamento de nossa distorcida distribuição de
renda, vilipendiando o bolso de cada um de seus correntistas na medida
em que concedem “benefícios” como cheque especial
e crédito rotativo no cartão de crédito, a taxas
elevadíssimas, sem ensinar a seus clientes como utilizar adequadamente
tais recursos.
Numa época em que a responsabilidade social
é preconizada como atributo de organizações conscientes
e alinhadas com os propósitos de um novo mundo, é justo
questionarmos por onde anda a responsabilidade bancária. É
nobre a criação de Fundações que assistam
a crianças carentes. É admirável o patrocínio
a atividades culturais. Mas é necessário ensinar a cada
novo correntista como gerenciar seu orçamento doméstico,
como decidir entre uma compra à vista e outra parcelada, como
optar por investimentos, por menores que sejam, mas que realmente lhes
tragam alguma rentabilidade futura. E, por que não dizer, ofertar
crédito com taxas de juros sociais, reduzidas para atender a
pessoas de baixa renda.
(Artigo publicado originalmente na Revista Venda Mais. Visite o site
http://www.vendamais.com.br.)
PS: A vida de um escritor é
balizada por pautas e prazos. Às vezes, temos a liberdade de
escolher os temas que desejamos abordar, mas evidentemente não
podemos determinar quando serão publicados. Este artigo, por
exemplo, foi redigido no dia 4 de março último, porém
sua divulgação estava programada apenas para este mês
de maio a partir da Revista Venda Mais, com a qual tenho o compromisso
de fornecer conteúdo editorial inédito. Surpreendentemente,
por ocasião do último Dia das Mães, o Banco Itaú
S/A apresentou uma campanha de lançamento de uma cartilha denominada
“Guia para Uso Consciente do Crédito”. Trata-se exatamente
da demanda postulada neste artigo. Trata-se propriamente do alerta feito
pelo amigo Filiphe Falchioni. Trata-se certamente de exercer a propalada
“Responsabilidade Bancária”. Como não sou
jornalista, não me entristece o fato de ter perdido o “furo
de reportagem”. Alegra-me o fato de uma das maiores instituições
financeiras do país ter adotado uma iniciativa inédita.
Parabéns ao Itaú. E que as demais sigam o exemplo!
** Filiphe Falchioni, formado em Comunicação Social pela
PUC-Campinas, pós-graduado em Marketing pela Metrocamp e em economia
pela FGV–EASP/SP, é executivo do setor financeiro. Contatos
através do e-mail f_falchioni@yahoo.com.br.